Soundgarden: Um concerto espetacular, intenso, alto e pesado
Resenha - Soundgarden (Lollapalooza, São Paulo, 06/04/2014)
Por Thiago Lima
Postado em 12 de abril de 2014
A vinda do SOUNDGARDEN ao Brasil gerou muita expectativa e animação entre os fãs de rock, principalmente aqueles que eram adolescentes no início dos anos 90, e sentiram na pele e nos ouvidos toda a revolução que o som de Seattle provocou na música naquela década. A organização do evento foi elogiada e aclamada por conseguir trazer ao Brasil o único expoente do "grunge rock" que nunca tinha vindo ao país, e que a maioria dos fãs já havia perdido as esperanças de um dia ver ao vivo. Sem dúvida um grande êxito da produção do Lolla.
No entanto, sendo o Lolla de hoje um festival de MÚSICA ALTERNATIVA, e não exatamente de ROCK, as bandas ditas "indie" receberam maior destaque e o SOUNDGARDEN, destoando do resto do line-up, foi escalado não como headliner do evento, mas para fechar um palco menor no canto mais afastado do evento. E no final esse foi o maior presente que os grunges que se deslocaram a Interlagos puderam receber, já que tudo isso, somado à performance da banda, deu ao show um clima dos Lollapalooza americanos dos anos 90, os primeiros em que o SOUNDGARDEN participou. Sem dúvida o clima perfeito para o que estava por vir.
A cerca de uma hora do início do show, os óculos de aro grosso e os tênis de bolinha dos shows anteriores começaram a deixar o Palco Onix para dar lugar às camisetas pretas, mostrando que muitas pessoas estavam lá somente para ver o SOUNDGARDEN. A excitação cresceu quando o banner com a capa do álbum King Animal foi estendido nos fundos do palco, e pontualmente às 18h55 CHRIS CORNELL (voz/guitarra), KIM THAYIL (guitarra), BEN SHEPHERD (baixo) e MATT CHAMBERLAIN (bateria) subiram ao palco, tendo como fundo um som pré gravado que somente os fãs mais hardcore puderam identificar, a música instrumental The Telephantasm, um b-side composto por KIM THAYIL que ficou por anos esquecido, sem nunca receber as letras.
A essa altura a empolgação da galera já estava no máximo, e assim que a banda assumiu seus instrumentos e mandou os primeiros acordes de Searching With My Good Eye Closed, todos explodiram. O público estava tão disposto a deixar para trás os 20 anos de espera que ninguém reclamou da qualidade ruim do som, que foi corrigida já para a segunda música, o hit Spoonman, que foi executado com muito peso e uma interpretação vocal de CORNELL um pouco diferente do que se ouve na gravação de estúdio. Ainda nesse início do show, entre demonstrações de alegria e pedidos de desculpas por demorar tanto tempo a vir ao Brasil, a banda tocou a música Flower, do primeiro álbum da banda, Ultramega OK, de 1988. Um presente para os fãs mais antigos.
Em seguida veio uma das sequências mais explosivas e matadoras que se poderia esperar. Primeiro, veio Outshined, acompanhada de uma performance furiosa de BEN SHEPHERD, e alguns improvisos de KIM THAYIL nos solos que deram mais peso e brilho à música em relação à versão de estúdio. Na sequência, o hino Black Hole Sun colocou todo o público em êxtase, cantando o refrão em uníssono com a banda. CHRIS CORNELL então pediu a palavra, e contou ao público que a música seguinte não estava prevista no setlist, mas no último ensaio antes da turnê a banda decidiu pela sua inclusão, já que não daria para vir ao Brasil e não tocá-la. Aquela velha conversinha para ganhar a galera, já que na Argentina o setlist foi o mesmo, e provavelmente o discurso também. De qualquer forma, enquanto CORNELL, de forma simpática, dedicava a música ao Brasil, MATT CHAMBERLAIN começou a espancar a bateria de uma forma única, rápida e pesada, em um "riff de bateria", se é que se pode usar essa expressão, que levantou a galera. Para quem ainda não havia percebido se tratar de Jesus Christ Pose, CHRIS CORNELL fez questão de erguer a guitarra e o pedestal do microfone empunhando-os em forma de cruz, relembrando toda a polêmica causada no passado pela letra e pelo vídeo da música. O destaque desse música ficou para o baterista MATT CHAMBERLAIN, que muito rápido e pesado, fez com que o público não sentisse falta de MATT CAMERON, a quem substitui temporariamente.
Após tocar Like Suicide, música que encerra o álbum Superunknown, CORNELL voltou a interagir com a plateia, explicando que o banner ao fundo era a capa do último álbum, King Animal, lançado há pouco mais de um ano, marcando o retorno da banda. Dedicando o álbum aos fãs, recomendou a todos que conferissem o trabalho, mesmo que através de um download ilegal. Apresentou então a primeira música do disco, Been Away Too Long, que foi muito bem recebida pelo público.
O retorno aos anos 90 se deu com uma sequência de músicas do álbum Superunknown, que está completando 20 anos de lançamento – The Day I Tried To Live, My Wave, e finalmente a faixa título do disco. Depois, vieram Blow Up The Outside World, que o público continuou cantando junto ao fim da parte instrumental, como na gravação de estúdio – Blow up the outside... blow up the outside... blow up the outside... – e as introspectivas Fell On Black Days e Burden In My Hand, que os fãs acompanharam com muita emoção. Junto com elas veio a percepção de que o show caminhava para o final, o que foi rapidamente esquecido quando se ouviu uma guitarra aguda, estridente, produzindo notas muito conhecidas – a introdução de Rusty Cage.
A plateia explodiu junto com a música. Um grande mosh pit surgiu à frente do palco e mesmo a banda parecia descarregar toda sua força nesse momento. Sem dúvida o momento alto do show, é como se todos os presentes extravasassem de uma só vez toda a fúria acumulada desde os anos 90. Em seguida, encerrando a apresentação, mais uma do disco Ultramega OK, Beyond The Wheel. Durante essa música, CHRIS CORNELL desceu do palco e circulou pelo fosso e pelo corredor central de serviço, levando à loucura as pessoas que se acumulavam junto às grades. Enquanto isso, KIM THAYIL, em cima do palco, despejou um som pesado e mostrou porque, ao lado de JERRY CANTRELL do ALICE IN CHAINS, é o maior guitar hero do grunge. Um herói desconhecido para a maioria, uma lenda para os fãs. No final, enquanto CHRIS CORNELL agradecia ao público e deixava o palco junto com MATT CHAMBERLAIN, KIM THAYIL e BEN SHEPHERD ainda mandaram ficaram um pouco mais, misturando a distorção e o feedback de seus instrumentos ao aplauso e à ovação de um público que certamente nunca se esquecerá desse concerto.
Como comentário final, fica o registro de que, além de um grande espetáculo, o público mais interessado na parte instrumental pôde acompanhar um show à parte, as sucessivas trocas de guitarras feitas por THAYIL e CORNELL, devido às diferentes afinações das músicas, característica que torna o som do SOUNDGARDEN tão particular e apreciado. Durante o show ficou claro também que a voz de CHRIS CORNELL, obviamente, não é a mesma de vinte anos atrás. Isso não impediu que o vocalista atingisse o tom certo em todas as músicas, ainda que usando efeitos de eco para mantê-lo por mais tempo. Nenhum demérito aqui, pelo contrário, demonstra o crescimento e a capacidade de adaptação do artista às novas condições que lhe são impostas. Em nenhum momento o vocalista parece um clone de si mesmo. A banda como um todo mostrou grande forma.
No final, um concerto espetacular, intenso, alto e pesado, épico, que compensou com sobras as duas décadas de espera. Ficou a sensação de que poderia ter durado mais – sendo o SOUNDGARDEN a última banda a se apresentar naquele palco, a organização do festival poderia ter estendido o tempo de apresentação além da 1h30 prevista, já que com certeza os roqueiros presentes não tinham nenhum interesse em ver o NEW ORDER ou o ARCADE FIRE. Mas valeu. E muito.
Setlist:
1. The Telephanstam (Instrumental – Tape Intro)
2. Searching With My Good Eye Closed
3. Spoonman
4. Flower
5. Outshined
6. Black Hole Sun
7. Jesus Christ Pose
8. Like Suicide
9. Been Away Too Long
10. The Day I Tried to Live
11. My Wave
12. Superunknown
13. Blow Up the Outside World
14. Fell on Black Days
15. Burden in My Hand
16. Rusty Cage
17. Beyond the Wheel
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