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Músicas: As 10 mais tristes (para o Blend Guitar) e as 15 mais lúgubres da minha vida

Por Rodrigo Contrera
Postado em 14 de agosto de 2017

Neste meu terceiro (e último) post com seleções do canal Blend Guitar, meto-me a discordar de várias das escolhas do canal, e também a elencar minhas próprias escolhas. Mas tem mais: como é mais do que óbvio que o pessoal do rock e do heavy não ouve apenas esses gêneros, vou para além deles, citando referências em outros gêneros, conectados a eles, mas não restritos a eles. Claro que as escolhas, como toda escolha, são idiossincráticas, apenas. E têm muito a ver com minha própria trajetória. Quem quiser ir direto à seleção do Blend, vá ao fim do post.

Não irei dar a dica do que ando escrevendo, mas todos nós sabemos como nossos ídolos beberam de outras fontes. Eu, que nasci no Chile, bebi de uma espécie de pop espanhol que fazia muito sucesso em Santiago na década de 70 e 80. Nesse pop, sobressaía um sujeito, ainda vivo, chamado Raphael. O cara, que cantou muito, lotava estádios e ginásios em minhas paragens e fazia-nos imaginar o amor como algo sofrido demais, uma sofrência inesgotável, que a gente precisava compensar com nosso canto. Escolho uma música dele, para começar esta minha pequena seleção das músicas mais tristes de todos os tempos em minha vida. Ave Maria.

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Houve uma época, relativamente há pouco tempo, em que eu me especializei em cantar Raphael. Mas ele passou batido por boa parte de minha vida, na verdade. Pois, quando eu estava no ginásio e no colegial, já aqui no Brasil, a pegada era bem outra. O rock já ditava meu gosto, e eu já caíra de amores por algumas garotas (geralmente loiras). Lembro-me em especial de uma, a Carla Martini, pela qual eu fiquei realmente apaixonado. Para ela, eu cantava I Still Loving You, do Scorpions, embora ela em geral me fizesse calar a boca. Eu ouvia essa balada nos meus fones de ouvido, e não adiantava para nada mesmo. Ela simplesmente não gostava de mim (pelo menos, enquanto homem). Nunca ouvi mais falar dela. Deve ter ido morar no exterior.

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O tempo foi passando e algumas garotas foram se apaixonando por mim. Lembro-me de várias, todas as vezes não dando certo. Eram bem bonitas, e elas devem se lembrar bem de como gostavam de mim. Mas eu não gostava tanto assim delas, então paciência. Ocorre que nessa época meu pai já demonstrava efeitos de sua psicose maníaco-depressiva, e dessa forma a tristeza tinha em mim outro motivo, outra pegada. Pois nesse momento comecei a ouvir Leonard Cohen, e a cantá-lo no meu quartinho. Mal eu sabia que o meu pai ouvia e que cantava baixinho para si mesmo algumas faixas. Esta, I Can't Forget, era uma de suas preferidas - algo que minha mãe me contou anos depois de sua morte. Hoje essa faixa apresenta para mim um clima estranho, que não consigo identificar muito bem. Quase ouço meu pai moribundo cantando a faixa.

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Após a morte do meu pai, eu fiquei frequentando puteiros por vários anos. E a pegada do rock em minha vida meio que ficou esquecida por um bom tempo. Diria que a década de 90 passou batida, e que eu não consegui curtir aqueles anos da forma devida. Mas com o tempo fui me amigando com uma moça, e depois nos casamos. Nessa época, minha vida era bastante feliz, comparada com as décadas anteriores, então não tenho faixas tristes para elas. Com o tempo, porém, o nosso casamento foi degringolando e algumas faixas foram se assomando como minhas preferidas. Apareceram no meio do casamento, e não tinham tanto a ver com ela, com minha ex-esposa, mas com pessoas nas quais eu não acreditava mais. Era o auge do Motörhead em minha vida.

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Ocorre que o desencanto que o Motörhead me atribuía não dizia respeito apenas a pessoas que mentiam. Dizia também respeito a relacionamentos que iam embora - como o meu casamento - e a um desencanto ainda mais profundo, relativo à minha própria existência. Esses acontecimentos (na verdade, processos) ficavam claros nas duas faixas a seguir, que hoje não canto por simples cansaço, porque elas ainda dizem bastante respeito àquilo que aconteceu. Por vezes, cheguei a cantá-las a todos pulmões em meu apartamento, agora que moro sozinho, mas já reacendem a algum passado, um tanto quanto remoto.

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Esse desencanto metafísico que o Lemmy tão facilmente traduzia ao meu coração tinha, porém, um outro lado. Um lado mais grunge e roqueiro, e mais biográfico, que me era fornecido pelo Kurt Cobain, cuja biografia já lera e cujas músicas aprendia a curtir. Ocorre que eu era fruto de um lar separado, e nesse sentido que sofria muito com esta pérola que ele fez relembrando momentos (um pouco exagerados) de sua adolescência. Uma época em que eu, de forma análoga, sofria andando com minhas motos pela Paulista, Santa Cruz e centro de São Paulo, conhecendo o lado duro da vida.

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Eu ainda não havia me separado, contudo. E, nesse processo de separação, a minha futura ex-esposa navegava solertemente em faixas que lhe diziam tanto respeito que consistiam numa espécie de recado para mim mesmo. Eram faixas da amplamente conhecida Adele, que na época estourava, e que hoje são o exemplo mais acabado de algo que me faz invariavelmente chorar desconsolado. Poderia escolher várias faixas da artista. Não faria muita diferença. A Cris ouvia essas músicas em seu carro, e eu as ouvia enquanto percebia que eram o canto do cisne, uma espécie de recado de que tudo o que vivíamos era apenas nada além de passado.

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Hoje, o cantor que mais fielmente retrata minha condição (de um sujeito ultrapassado pelos acontecimentos) é o Rei, Elvis Presley. A ele, tive acesso um pouco depois, e surpreendo-me realmente ao ver como ele sabe expressar em melodia e letra uma situação que eu não saberia fazê-lo de outra forma. Um sujeito idolatrado pela mãe de uma garota que conheci depois, e que parece ir tão fundo na dor que a gente não consegue deixar de chorar.

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Após a separação, acabei sendo envolvido por um relacionamento que durou dois anos de bastante prazer e algum sofrimento (na época, excessivo). A garota com que me envolvi gostava de música industrial, e na época me apresentou algumas bandas e músicas que iriam ficar indelevelmente na minha mente. São músicas que nada evocam o rock (ou muito pouco), mas que me fazem lembrar da garota, e da minha situação após termos rompido (na verdade, fui eu que rompi). Essas músicas expressam uma espécie de evocação do passado (que também me lembram minha ex-esposa) e uma gratidão por algo que todos nós fizemos um para o outro. Nesse sentido, não são músicas propriamente tristes, na verdade.

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Ocorre que eu já havia sido capturado por um pessimismo atroz, advindo de minhas experiências e de minhas leituras (especialmente com a Filosofia da USP), e que os filmes me traduziam muita da dor que sentia. Esta faixa a seguir, que virou hit com diversas outras bandas, me toca especialmente ao ver o filme (Pat Garrett e Billy the Kid, de Sam Peckinpah), na versão original (que comprei) do Bob Dylan. Note-se que nessa época eu já refletia sobre o relacionamento de amizade entre amigos e que já estabelecia que, para mim, a traição mais cruel poderia ser uma via passável ou mesmo adequada. Seja como for, a divisa de que "what do you want and what do you get are two different things" já fazia parte indissoluvelmente de mim.

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Foi então que me deixei envolver por outra garota, pela qual realmente me apaixonei. Uma garota cujo gosto musical era diferente, mais mainstream, e sobre a qual já comentei um pouco. Uma garota que mora no mesmo prédio que eu, linda de (me) dar pena, e que hoje virou uma boa amiga. Uma garota que vi hoje mesmo, saindo no seu carro, e pela qual tive que vacilar. Uma garota cuja música preferida é esta a seguir, que me causa arrepios, sempre que a ouço, e que um dia tivemos que procurar sem parar no meu micro até encontrar. Uma música linda, que me dá uma certa tristeza, embora não tão grande quando outrora. Porque já me recuperei da paixão, e me recupero cada vez mais da vida que vivo.

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Atualmente, procuro trabalho. Estou com acertos com escolas de línguas (estou virando professor), com agências de publicidade (trabalho também nessa área), e preciso ler manuais de empregos feitos à distância (da Suíça) com sistemas de apuração de dados. Sexta-feira agora irei numa entrevista presencial, e muito provavelmente conseguirei meus objetivos em várias das tentativas que ainda vislumbro. Compartilho minhas pequenas conquistas em grupos de facebook, e relembro músicas de minhas origens que tanto têm a ver com meu atual panorama. Fecho então com esse clássico do bluesman Atahualpa Yupanqui, que tanto me diz atualmente. Um ser humano sofrido que soube retirar da sua dor pedaços de lirismo aparentemente insuperáveis num país (a Argentina) que ainda o encara com certo ceticismo. Fecho também com Zitarrosa, uruguaio de ótima cepa, que tanto comentou a ditadura em seu país, que hoje tão bons exemplos nos dá.

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Fecho então com a seleção do Blend Guitar, sendo que nem comento muito a seleção, que me diz apenas parcialmente respeito.

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Sobre Rodrigo Contrera

Rodrigo Contrera, 48 anos, separado, é jornalista, estudioso de política, Filosofia, rock e religião, sendo formado em Jornalismo, Filosofia e com pós (sem defesa de tese) em Ciência Política. Nasceu no Chile, viu o golpe de 1973, começou a gostar realmente de rock e de heavy metal com o Iron Maiden, e hoje tem um gosto bastante eclético e mutante. Gosta mais de ouvir do que de falar, mas escreve muito - para se comunicar. A maioria dos seus textos no Whiplash são convites disfarçados para ler as histórias de outros fãs, assim como para ter acesso a viagens internas nesse universo chamado rock. Gosta muito ainda do Iron Maiden, mas suas preferências são o rock instrumental, o Motörhead, e coisas velhas-novas. Tem autorização do filho do Lemmy para "tocar" uma peça com base em sua autobiografia, e está aos poucos levando o projeto adiante.
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