A sincronia entre o rock brasileiro dos anos 1980 e o cenário argentino dos anos 1970
Por Gustavo Maiato
Postado em 22 de outubro de 2023
Brasil e Argentina são dois países que viveram histórias semelhantes, já que ambos sofreram com a ditadura militar. Enquanto por lá o rock contestador surgiu nos anos 1970, aqui isso aconteceu na década seguinte. Essa história foi relatada por Torcuato Mariano, argentino radicado há décadas no Brasil e que tocou com nomes como Cazuza e Ivan Lins, no podcast Corredor 5.
"Eu percebi uma correlação interessante entre o que aconteceu no Brasil nos anos 80 e o que ocorreu na Argentina nos anos 70. O tango na Argentina começou a se misturar com o rock. Sempre fui atento para enxergar não apenas a música, mas a vida como um todo. Eu pensei: ‘Cara, isso está parecido com o que estava acontecendo na Argentina há 10 anos atrás.’ No Brasil começou essa mistura com a MPB também. Na Argentina, tivemos a ditadura, e dizem que enfrentamos um atraso devido a isso.
Isso estava relacionado à forma como as bandas de rock se comportavam lá. Os músicos eram constantemente abordados e viviam em condições difíceis. O rock argentino era nervoso, contestador, mas eles estavam em uma fase em que não podiam contestar abertamente. O que o Chico Buarque fazia com as letras no Brasil, o Charly García fazia de uma maneira mais sutil nas letras de rock na Argentina. Era uma forma de falar de uma coisa, mas na verdade, estava falando de outra, driblando a censura".
Rock Brasil e ditadura
O rock brasileiro atravessou desafios durante a ditadura, mas o evento "Rock Brasil 40 anos" surgiu como uma homenagem ao movimento musical dos anos 1980, marcando o término desse período sombrio. Concebido pelo produtor Peck Mecenas, o evento contou com uma eclética seleção de shows, incluindo artistas renomados como Biquini, Arnaldo Antunes, Paralamas do Sucesso, Fernanda Abreu, Nando Reis, entre outros.
No entanto, a gestão delicada da relação entre os artistas e a origem dos recursos, provenientes de um edital e, portanto, dinheiro público, trouxe desafios adicionais. Peck Mecenas compartilhou essas nuances em uma entrevista ao Corredor 5.
O projeto, que foi inscrito em maio, teve seu resultado divulgado em outubro, sendo escolhido entre os impressionantes 9.944 inscritos, apenas seis na área de música. O projeto central, "Rock Brasil 40 anos", foi considerado um grande acerto, celebrando a importância cultural do rock como um patrimônio nacional e destacando seu papel na transição política da ditadura para a democracia.
Ao desenvolver o projeto, Peck destacou a relevância de resgatar a memória daquela época e compreender o papel da empresa patrocinadora, o Banco do Brasil, naquele momento específico. Apesar das críticas enfrentadas devido ao patrocínio governamental, o produtor enfrentou essas situações com destreza, instando as bandas a focarem na entrega de entretenimento e alívio para o público.
Peck Mecenas revelou ter conversado com artistas mais próximos, explicando compreensivamente que, apesar das divergências políticas, o projeto era, em parte, financiado pelo governo federal. Essa abordagem permitiu superar as barreiras iniciais e prosseguir com o evento. Mesmo discordando de vários acontecimentos da época, o objetivo central permaneceu claro: proporcionar música, cultura e diversão ao público.
Além disso, Peck destacou a importância crucial do apoio financeiro, especialmente durante a pandemia, onde muitos artistas enfrentavam dificuldades financeiras. Sua contribuição significativa incluiu o adiantamento de 50% do cachê do artista Leoni, uma medida que foi particularmente relevante em um contexto desafiador, como expresso pelo produtor Hernani durante um encontro.
Este relato destaca não apenas os desafios políticos, mas também a habilidade do produtor em equilibrar a sensibilidade artística com as complexidades financeiras e políticas, resultando em um evento bem-sucedido e significativo.
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