Arandu Arakuaa: cultura cantada em Tupi Antigo
Por Vicente Reckziegel
Fonte: Witheverytearadream
Postado em 24 de setembro de 2012
Não é de hoje que ouvimos algumas criticas sobre a música, tanto nacional quanto estrangeira, de que não há mais nenhuma novidade, o lema "nada se cria, tudo se copia". Para estes, sugiro conhecerem o Arandu Arakuaa, grande banda do Distrito Federal que, apesar de ainda recente, demonstra um grande potencial e originalidade em todos os aspectos, seja nas letras, compostas em Tupi Antigo, como na música, que não se prende a nenhum estilo, e mesmo assim ficando longe do tradicional "balaio de gatos", que às vezes surge quando uma banda não se firma a um estilo propriamente dito. Nessa entrevista muito interessante com Nájila Cristina (Vocal), Zândhio Aquino (Guitarra, Teclado e Vocal), Saulo Luceno (Baixo e Vocal) e Adriano Ferreira (Bateria), eles explicam um pouco mais sobre a proposta da banda, ficando aqui uma grande dica para quem está cansado do mesmo de sempre...
Vicente - Inicialmente uma pergunta que todos devem se fazer. Qual o real significado do nome da banda e de quem foi a ideia de batizá-la desta forma?
Nájila – Primeiramente gostaríamos de agradecer pelo espaço dado para falarmos sobre nossa música. Bem, Arandu Arakuaa significa sabedoria do cosmos. O Zândhio teve essa ideia depois de ler o livro de Kaká Werá Jecupé "A Terra dos Mil Povos – História do Brasil Contada por um índio".
Vicente - Apesar de ser relativamente recente, qual avaliação fazem da trajetória do Arandu Arakuaa até este exato momento?
Zândhio – Apesar das dificuldades a caminhada está sendo positiva cara, estamos felizes de poder tocar juntos e levar nossa música às pessoas e com o tempo a Arandu Arakaua irá mostrando seu valor. Estamos sempre pensando pra frente, ainda nem gravamos o álbum de estreia e já surgem algumas ideias de composições para o segundo álbum (risos).
Vicente - Vocês lançaram em Junho sua primeira Demo. Como foi a gravação, e onde ela foi realizada?
Saulo – As gravações foram feitas por Guilherme Peixoto no RS Estúdio aqui em Brasília. O processo foi excitante e tentamos captar o sentimento e a pegada das músicas o mais próxima possível de como soam ao vivo. O resultado foi satisfatório para esse primeiro registro.
Vicente - Ainda é muito recente, mas o retorno que tem obtido com ela tem agradado vocês?
Saulo - De início as pessoas estranham um pouco, mas depois que ouvem tem uma visão mais ampla da nossa proposta. Depois dos shows tem sempre uma galera que vem falar com a gente e dá apoio. Também através dessa Demo foi possível divulgar melhor a banda.
Nájila – Sempre recebo palavras positivas e de apoio das pessoas sobre nosso trabalho. Isso é muito gratificante e nos da motivação para superar os obstáculos.
Vicente - Gostei principalmente da faixa Tupinambá. Como foi a composição dessa música em especial. E no geral, o que surge primeiro para vocês, a música ou a letra?
Zândhio – Massa saber que curtiu cara! Legal essa pergunta, pois essa foi a primeira a ser composta nesse formato. O tema surgiu após eu ler o livro Viagem ao Brasil no qual o aventureiro alemão Hans Stander narra como foi sequestrado e quase morto em um ritual de canibalismo por índios da etnia Tupinambá no litoral norte paulista em janeiro de 1554. Tupinambá definitivamente não é a música mais alegre que temos (risos) e funciona muito bem ao vivo.
Até o momento as letras são escritas antes da parte instrumental. Com o tema bem desenvolvido fica mais claro que elementos explorar musicalmente.
Vicente - E o EP, logo estará saindo do forno, correto? Conte-nos um pouco sobre ele.
Adriano - Sim é isso mesmo, antes da 2ª quinzena desse mês (Setembro) lançaremos a versão física do nosso EP. Lançamo-lo virtualmente no mês de Junho desse ano e estamos tendo um retorno positivo do público e crítica e acredito que ele cumpre sua função de apresentar a banda.
Já temos material suficiente para gravar o álbum de estreia e o planejamento é começar a gravar no início de 2013, aí sim as pessoas terão uma dimensão mais ampla do nosso trabalho.
Vicente - Um ponto extremamente positivo na banda é o resgate da cultura e folclore indígena, inclusive as letras são compostas em Tupi Antigo. Como surgiu e foi sendo trabalhada essa ideia?
Zândhio - Passei a maior parte de minha vida morando perto de comunidades indígenas. Na infância e pré-adolescência só ouvia músicas e lendas do folclore brasileiro cantadas e contadas por minha avó. Também ouvia música nordestina (baião, vaquejada...) e moda de viola no curto período que meu pai tinha um radinho de pilha. Só depois de ir estudar em uma pequena cidade tive contato com o rock, mas nunca tive vergonha de minhas raízes. Então foi natural na hora de compor tudo isso vir à tona e ir amadurecendo com o tempo. A escolha pelo tupi antigo se deu pelo fato de segundo estudiosos ter sido a língua mais falada no Brasil até metade do séc. XVI e por soar bem musicalmente.
Vicente - Muitas bandas nacionais tem letras com temáticas que valorizam culturas estrangeiras. Acredita que falta valorização da cultura local, seja nas músicas quanto nas letras?
Zândhio – O ideal é que o músico componha de forma sincera e coloque sua alma no que faz e para tal creio que seja necessário abordar temas que lhes fascinam. Por outro lado o saber é livre, logo podemos sim lançar mão dessas manifestações artísticas culturais oriundas de outros povos. Nós da Arandu Arakuaa sentimos que devemos compor sobre coisas com as quais nos identificamos e ficaremos muito felizes se nossa música fizer as pessoas refletirem sobre algumas questões e passarem a verem as manifestações culturais de nossa terra com outros olhos.
Nájila - Sabemos que os precursores de vários estilos como Death, thrash, Black Metal, Punk, tem origem estrangeira e influenciam músicos em todo o mundo. Nós também temos influências de bandas de fora, mas acrescentamos algo da música do nosso povo.
Vicente - Até mesmo pela proposta diferenciada, foi complicado encontrar músicos que compartilhassem o mesmo ponto de vista e a ambição de criar uma banda como o Arandu Arakuaa?
Zândhio - Bem complicado. Na verdade ainda estamos em busca de um (a) flautista, então se você toca flauta e/ou pífano e se identificou com a proposta da banda entre em contato conosco, prometemos que terá muito trabalho e diversão (risos). Geralmente as bandas têm seu início com amigos fazendo homenagem a seus heróis (ou tentando desesperadamente copiá-los). Eu tinha um projeto claro e isso implicaria que os músicos se identificassem e trouxessem sua contribuição. Na maioria dos casos as pessoas não gostavam e faziam piada sobre, alguns admitiam ser uma boa ideia que poderia funcionar comercialmente (esses sem chances, pois a música não soaria honesta) e alguns poucos se identificavam, mas talvez tivessem medo, vergonha... No entanto isso jamais me abalou e era até um indicativo que talvez eu estava indo pelo caminho certo (risos). Então quando Nájila, Adriano e Saulo, músicos que eu sequer tinha visto tocar, chegaram de mangas arregaçadas e punhos erguidos nós só fomos ao trabalho.
Vicente - Quais são as suas maiores influências?
Adriano - Falar em influências na banda é até um pouco complicado (risos) por que todos nós admiramos e curtimos desde o rock/metal até artistas com seus trabalhos mais direcionados para músicas regionais riquíssimos em suas obras e que só o nosso Brasil possui. Acredito que toda essa gama de influências que todos na banda tem contribui para que nossa música tenha identidade própria.
Zândhio – Exatamente. A banda foi concebida com a proposta de mesclar elementos da música folclórica e indígena brasileira ao rock pesado, mas não ficamos presos somente a isso, só deixamos a música fluir e sempre fazendo as coisas do nosso jeito.
Vicente - Vocês vivem na região centro-oeste do Brasil. Como é a cena musical ai, pode se perceber alguma melhora num todo, seja em bandas como no espaço para shows?
Adriano - A cena musical no Centro-Oeste e mais especificamente em Brasília e Goiás, lugares esses que já tocamos, vem numa crescente evolução, embora haja ainda "grupinhos" e "festivais" fechados que pouco dá oportunidades para bandas novas, sobretudo, para bandas com sonoridade que foge um pouco do convencional. Mas de uma maneira geral isso está mudando aos poucos. Acreditamos que a criação de novos festivais, feiras culturais dentre outros, venha a contribuir para divulgar melhor o rock não só aqui na região Centro-Oeste, mas na cena musical brasileira de uma forma geral.
Nájila – No caso da nossa banda no começo ouve insegurança de produtores e mesmo de donos de pub em relação a nossa música, mas aos poucos estamos abrindo algumas portas e mostrando do que a Arandu Arakuaa é capaz.
Vicente - Uma mensagem para os fãs e amigos que curtem o trabalho do Arandu Arakuaa e para aqueles que gostariam de conhecer melhor seu som e apostam na música nacional.
Saulo – Obrigados a todos que curtem e apóiam nossa banda. Fiquem atentos para as bandas nacionais, pois nós brasileiros temos uma maneira única de fazer música e isso ninguém pode nos tirar.
Nájila – Quem ainda não conhece a banda é só baixar nas músicas no http://aranduarakuaa.tnb.art.br/ ou acessar os canais da banda.
http://www.myspace.com/aranduarakuaa,
http://www.youtube.com/channel/UCBvvDkUutlYUwXRGYKSfDNQ/videos,
https://www.facebook.com/pages/Arandu-Arakuaa/300527933306895
Obrigado a todos pelo apoio e nos vemos na estrada!
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