Spock's Beard: Boa música, desafiadora e ainda relevante
Resenha - Oblivion Particle - Spock's Beard
Por Ricardo Pagliaro Thomaz
Postado em 21 de outubro de 2015
Nota: 8
O Spock's Beard é um grupo que eu já venho acompanhando de anos a fio. Passei por todas as formações da banda, inclusive acreditando, durante uma época do grupo, que eles estavam tentando realizar todas as manobras possíveis que uma das bandas que mais inspiraram o som do grupo, o Genesis, havia realizado em sua época. No entanto, foram simplesmente algumas coincidências de momento e esse negócio acabou passando. A banda não somente acabou mudando seu destino, mas também mudou demais o seu som. Essa transitividade teve mais um capítulo quando o vocalista Ted Leonard assumiu os vocais no disco anterior, e aqui neste novo álbum, ela se mostra ainda mais forte.
Claro que o grupo não perdeu suas influências e jamais deixou de tocar o progressivo pelo qual é bem conhecido, mas percebe-se que eles estão explorando, nestas mesmas influências, outras áreas pouco visitadas. E quando uma banda de Rock Progressivo consegue mudar assim de forma tão interessante, é realmente um feito e tanto. Claro, há ainda um probleminha ou outro, que a gente não encontrava tanto nos álbuns da era Neal Morse, mas a banda vem se provando de disco a disco, após a saída do multi-instrumentista, e se virando muito bem.
O 12º álbum de estúdio do grupo americano, e o 2º desde a entrada de Leonard na banda, está cheio de boas surpresas que os fãs como eu curtem e também novas aventuras; a nave do Spock's Beard que este ano completa 20 anos de existência continua corajosamente viajando pela sua sonoridade em constante mutação.
O disco abre com a quebradeira e as melodias genesianas de "Tides of Time", e quando eu falo genesianas, eu não estou exagerando; basta uma escutada em alguns refrões para imediatamente lembrarmos daquela sonoridade do Genesis da época do Duke, claro, toda embalada na roupagem instrumental do Spock's Beard que já conhecemos de longa data.
A segunda faixa, "Minion", foi uma das primeiras faixas que a banda liberou na internet. E contrário ao que se pensa, meu amigo, a letra nada tem a ver com as criaturinhas amarelas do cinema que fazem um imenso sucesso entre crianças e adultos, uma vez que o termo em inglês significa "pequeno trabalhador", e é como Ted Leonard descreve o personagem da música em seus esforços para alcançar seus objetivos. Ou pelo menos acredito que tenha sido isso, mas que o nome acabou atraindo a atenção para a criação da Universal, acabou. E não é surpresa que ela se pareça com uma música do Enchant, uma vez que o próprio Leonard a escreveu.
A seguir temos mais uma quebradeira em "Hell's Not Enough", também escrita por Leonard, que tem um daqueles trechos instrumentais clássicos da banda, com muitas viradas de bateria e Jimmy Keegan mostrando que foi uma excelente adição à banda após ter tocado como baterista de turnê por quatro álbuns, quando o baterista Nick D'Virgilio ainda integrava a banda.
E agora vou falar de uma das minhas faixas favoritas do álbum, cantada pelo baterista Jimmy Keegan. "Bennett Built a Time Machine" é uma excelente adição ao catálogo das músicas mais viajantes do grupo, e sente-se com muita intensidade as influências do Yes aqui no som deles. Aliás, eu não somente gostei da música em si como também do tema, posso dizer que combina muito comigo e com minha predileção por temas de ficção-científica. E olha que a harmonização é bem simples, nada que já não tenhamos visto antes, mas o trabalho de arranjos do grupo aqui em cima da composição de John Boegehold é ótimo.
"Get Out While You Can" é aquela faixa filler do disco, não tão interessante, mas não compromete. Sabe aquela música que você pode tentar ouvir umas quinhentas vezes e não se importar as quinhentas vezes que ouvir? Essa. É o que eu gosto de chamar de "skipper track", aquela faixa que você inevitavelmente pula quando o disco estiver tocando. Mais interessante é a próxima, "A Better Way to Fly". Mesmo na época que Nick D'Virgilio substituía Neal Morse eu achava as composições do John Boegehold inconstantes; às vezes agradavam, às vezes não. Aqui, isso continua.
E vou aproveitar para fazer um parêntesis aqui relacionado ao cara, para quem não sabe. Quando Neal Morse estava na banda, era ele que escrevia todas as músicas. Após o álbum Snow (2002), com o cara fora, eles se viram obrigados a escreverem as próprias músicas, mas sempre contaram com a ajuda do webmaster do site da banda, Boegehold, e com o produtor Stan Ausmus para escreverem músicas, só que tanto um quanto o outro são meio inconstantes com o material que escrevem, as vezes acertam e as vezes acabam compondo fillers; isso não foi tanto um problema nos dois primeiros discos sem Morse, Feel Euphoria (2003) e Octane (2005), mas depois acabou sendo nos dois últimos com Nick, Spock's Beard (2006) e X (2010).
Outra crítica minha aqui é que os caras deixaram Boegehold e Ausmus escreverem grande parte do material. Das nove faixas do disco, os dois escreveram seis, sendo a de abertura do disco, de Ausmus, e o restante de Boegehold. É muita coisa. Antes a banda escrevia as músicas juntos aos dois amigos, mas neste novo disco, eles simplesmente deixaram os dois assumirem a autoria de muitas. Mas enfim, é só minha opinião, se eles se sentem bem com isso, OK, mas que o trabalho de Boegehold e Ausmus é bem inconstante, isso é.
Dito tudo isso, chegamos na única faixa do álbum inteiro que foi escrita por dois membros mais clássicos do Beard, Alan e Ryo. O primeiro é um dos fundadores da banda, irmão de Neal, o segundo entrou no segundo álbum do grupo, mas ambos fazem parte do período mais clássico do Beard; e isso se mostra de forma clara como água nesta faixa, "The Center Line". É a primeira vez, em todo o álbum, que eu dou de cara com a sonoridade clássica do Beard, desde a introdução erudita de piano de Ryo Okumoto até a instrumentação complexa e trabalhada de Dave Meros e Alan Morse que sempre foi marca registrada deles na era Morse. Ouvindo as passagens instrumentais iniciais eu fico aguardando Neal Morse começar a cantar a qualquer momento. Não é ele, e sim Ted, mas poderia ser. Um grande momento nostálgico com o som mais vintage do grupo, som esse que fez eu e outras pessoas se apaixonarem pelo trabalho da banda. Desnecessário dizer quer isso tudo faz com que ela seja pra mim a melhor faixa de todo o disco.
Em "To Be Free Again" o som do Beard volta a se fundir com o estilão da era de Nick D'Virgilio, com pequenas incursões que hora lembram o som do Yes, hora lembram o som folk do Jethro Tull e hora apresentam incursões jazzísticas. Fechando a versão normal do disco, temos "Disappear", que começa meio apagada mas melhora e fica acelerada e bem interessante lá pelo meio, e termina com arranjos épicos que são marca registrada da banda.
Na versão Special Edition do álbum ainda temos uma cover contando com um retorno inusitado. Trata-se de uma versão do Beard para a música "Iron Man" do Black Sabbath, contando com o baixista Dave Meros sendo o Ozzy da vez e o retorno na bateria de Nick D'Virgilio, que resolveu fazer uma visitinha a sua ex-banda só para tocar essa saideira com os amigos. Não me perguntem porque resolveram incluir uma cover do Sabbath como faixa bônus do disco, mas é bem legal ver o Beard executar a música daquele jeitão deles e ainda ouvir o baterista original da banda tocando novamente com Dave, Alan e Ryo. Em outras palavras, temos aqui um breve retorno da segunda formação do Beard, a quarteto, que durou de 2003 a 2010.
Enfim, o Spock's Beard, em sua terceira era segue firme, com mais um disco bacana na praça, ainda contendo um tropeço ou outro, mas nada que comprometa. Os músicos seguem fortes e preparam ainda mais uma surpresa para nós este ano. Vamos aguardar. Se você é muito fã do grupo, recomendo que vá atrás deste disco novo deles, pois em meio às mutações sonoras do grupo, tem ainda muita coisa de interessante que eles podem nos oferecer. Se você é fã de Rock Progressivo, também recomendo a audição. Trata-se de boa música, desafiadora e ainda relevante no cenário atual, mesmo tendo muitas influências setentistas, e que irá desafiar seus sentidos, garanto. E que a nave do grupo continue nos levando ainda para muitos e belos lugares sonoros.
The Oblivion Particle (2015)
(Spock's Beard)
Tracklist:
01. Tides of Time
02. Minion
03. Hell's Not Enough
04. Bennett Built a Time Machine
05. Get Out While You Can
06. A Better Way to Fly
07. The Center Line
08. To Be Free Again
09. Disappear
10. Iron Man (cover Black Sabbath; Special Edition bonus track)
Selos: InsideOut Music
Spock's Beard é:
Ted Leonard: voz, guitarra
Alan Morse: guitarra, violão, voz, mandolin, autoharp
Dave Meros: baixo, voz (voz principal em "Iron Man")
Ryo Okumoto: órgão hammond, mellotron, piano, sintetizador, clavinete, vocoder
Jimmy Keegan: bateria, percussão, timpani, voz (voz principal em "Bennett Built a Time Machine")
Com participação especial de:
David Ragsdale: violino em "Disappear"
Nick D'Virgilio: bateria em "Iron Man"
Discografia anterior:
- Brief Nocturnes and Dreamless Sleep (2013)
- X (2010)
- Spock's Beard (2006)
- Octane (2005)
- Feel Euphoria (2003)
- Snow (2002)
- V (2000)
- Day for Night (1999)
- The Kindness of Strangers (1998)
- Beware of Darkness (1996)
- The Light (1995)
Site oficial:
http://www.spocksbeard.com
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