Uriah Heep: Em 72 a banda se vestiu de coragem e convicção
Resenha - Magician's Birthday - Uriah Heep
Por Ricardo Seelig
Fonte: Collectors Room
Postado em 02 de março de 2012
Lançado em novembro de 1972, "The Magician's Birthday" é o quinto álbum do grupo inglês Uriah Heep. Ele é o sucessor do clássico "Demons & Wizards", que chegou às lojas em 19 de maio daquele ano e transformou a banda em um dos maiores nomes do hard rock setentista.
Seria de se esperar que, por ter sido composto e gravado apenas alguns meses após o aclamado "Demons", e tendo o peso de suceder o disco que mudou as suas vidas, os músicos seguissem em "The Magician's Birthday" o mesmo direcionamento musical, mas não foi o que aconteceu. Vestidos de coragem e convicção, David Byron (vocal), Mick Box (guitarra), Ken Hensley (teclado e guitarra), Gary Thain (baixo) e Lee Kerslake (bateria) surpreenderam com um álbum totalmente diferente. No lugar do hard rock pesado e cru surgia um som mais limpo, com uma grande presença de instrumentos acústicos e uma característica muito mais progressiva, revelando uma até então insuspeita faceta do grupo. O passo inicial dado pelo Uriah Heep em "The Magician's Birthday" serviria de pedra fundamental para a sonoridade que a banda desenvolveria durante os anos seguintes, tornando o seu hard rock mais complexo e atraente ao incluir elementos prog e folk ao peso de sua música.
A melodia é o traço que mais se sobressai. Influenciados pela música tradicional inglesa, os músicos, capitaneados pela mente inquieta e criativa de Hensley, compuseram um álbum que não devia nada ao seu antecessor. As letras viajantes e um tanto esotéricas, recheadas de magos e duendes, ganharam a moldura perfeita com arranjos refrescantes e idílicos. A bela arte da capa, criada por Roger Dean, famoso pelo seu trabalho para o Yes, reforça ainda mais essa sensação, levando o ouvinte para um mundo fantástico, recheado de cores e sons.
A magia do trabalho, a sua força, provém da capacidade que o álbum tem, até hoje, de cativar o ouvinte. Sabe aqueles discos que parecem cercados por uma aura sobrenatural, de outro mundo? "The Magician's Birthday" é um deles. A força das composições prende o ouvinte em uma dimensão paralela, tornando impossível encontrar o portal de saída antes que os últimos acordes da faixa-título, que fecha a bolacha, se encerrem.
Os gritos agudos de Byron em "Sunrise", primeira faixa, são como o anúncio da chegada de um enxame de bruxas carregadas de más intenções. Fazendo o instrumental respirar e fluir naturalmente, "Sunrise" leva o ouvinte sem escalas para o boogie de "Spider Woman", prima não tão distante de "Easy Livin'", um dos maiores clássicos do grupo.
O primeiro choque vem com a ótima "Blind Eye", onde uma base acústica faz a cama para guitarras gêmeas derramarem uma melodia simples e bela. Mais teatral do que nunca, Byron canta uma letra enigmática que mais parece uma revelação, um testemunho, de um ser antigo que há muito está entre nós.
"Echoes in the Dark" é um hard misterioso dono de uma beleza melancólica e perturbadora. A melodia sombria que serve de fio condutor torna o ambiente mais escuro e congelante, fazendo as palavras soarem como presságios de algo que está por vir. E o que está por vir é "Rain", uma balada arrepiante conduzida pelo piano de Ken Hensley, que fecha as cortinas do primeiro ato, encerrando o lado A do vinil.
O segundo lado do LP começa com a melodia fantasmagórica de "Sweet Lorraine", que cai em um hard cadenciado com uma surpreendente, e muito bem encaixada, guitarra com um certo tempero funk e um apimentado wah-wah a cargo de Mick Box.
E então um novo universo se abre. "Tales" é uma obra-prima sensitiva e sensorial, uma passagem de primeira classe para um mundo muito mais atraente do que esse em que vivemos. Uma das melhores composições da carreira do Uriah Heep, carrega o ouvinte em um tapete voador aconchegante, levando-o através das paisagens criadas por Roger Dean para a capa. Com Byron cantando de forma iluminada e com um arranjo onde os instrumentos se entrelaçam infinitamente, a audição conduz e acalma a mente, colocando cada coisa em seu devido lugar.
Os mais de dez minutos da faixa que dá nome ao disco encerram o álbum em uma odisséia épica cativante, onde o ceú – ou o inferno, você escolhe – é o limite. O arranjo vai do hard rock a passagens mais cadenciadas e swingadas que remetem ao soul psicodélico sessentista e até mesmo ao jazz. Como em uma explosão multicolorida, traz novas matizes e tons de maneira surpreendente, colocando em primeiro plano a criatividade cristalina do quinteto. O solo de Mick Box é o destaque, jogando notas faiscantes pelo ar enquanto o conjunto segura tudo lá atrás com um groove hipnotizante.
Duas faixas foram lançadas como single. "Blind Eye" alcançou a posição 97 na parada norte-americana, enquanto "Sweet Lorraine" ficou na 91. "Spider Woman" virou hit na Alemanha, alcançando a décima-terceira posição nos charts do país. Tudo isso fez com que o álbum tivesse uma boa performance nas vendas, ganhando Disco de Ouro nos Estados Unidos em janeiro de 1973.
Em 2004, a gravadora inglesa Castle lançou uma edição turbinada de "The Magician's Birthday" com nove faixas bônus, incluindo outtakes e versões alternativas.
"The Magician's Birthday" acabou ofuscado por "Demons & Wizards", mas o fato é que é tão bom quanto o seu antecessor. Na minha opinião, as mudanças que a banda fez em seu som tornaram a sua música ainda mais atraente e, por essa razão, o álbum é o meu favorito em toda a discografia do Urian Heep.
Mergulhe em um mundo mágico repleto de elfos, duendes e fadas, e saiba porque certos discos são, e sempre serão, imortais.
Faixas:
A1 Sunrise
A2 Spider Woman
A3 Blind Eye
A4 Echoes in the Dark
A5 Rain
B1 Sweet Lorraine
B2 Tales
B3 The Magician's Birthday
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