Joe Satriani: o mago que nos faz preferir nem entender o que ele mesmo diz
Por Rodrigo Contrera
Postado em 27 de julho de 2016
Joe Satriani, ou de agora em diante apenas Joe, é o cara, desde o final da década de 80, cujos solos ou bases de guitarra eu gosto mais de ouvir e MENOS de assobiar. Sim, porque a gente gosta de ouvi-lo e de assobiá-lo inclusive; mas a gente SABE que assobiá-lo MESMO é impossível - e por isso o de que a gente gosta é de ouvi-lo mesmo, seja como for, e especialmente desde Surfing with the Alien, o disco (LP, na época) que o tornou efetivamente conhecido para todo o mundo.
Eu já comentei algo sobre o Joe em um texto anterior. Disse lá algumas coisas sobre o seu jeito de tocar do seu primeiro LP, Not of this Earth, que eu ouvia em fita K-7 copiada de um original estrangeiro, absorto, não entendendo como é que ele me assombrava tanto. De lá para cá, Joe lançou muita coisa, e se meteu em outros projetos, com vários colegas de peso. Seria muito arrogante - e até impossível - eu me meter a comentar TUDO o que ele fez desde então, ou sua relação comigo, no caso, enquanto fã, que o acompanhou - como muitos de nós o acompanharam e ainda o acompanham - em sua carreira. Quero aqui apenas comentar algo, como se fosse uma espécie de literato e comentador do seu toque, como uma contribuição a nossa fixação por seu trabalho, por suas músicas, por seus sentimentos, por sua vida. Desde já aviso que não sou um GRANDE conhecedor de sua vida, mas sei de algumas passagens, e conheço boa parte de sua obra.
Quando o Joe surgiu com o surfista prateado na capa do LP, eu era um mero garoto em meados dos 80 fazendo faculdade. É claro que, como com a maioria de nós, o que me atraiu naquele LP foi em especial a faixa-título, que reacendia de alegria e que usava um tipo de distorção que se diferenciava da distorção usada pelos outros guitarristas da época. Claro também que o jeito ainda meio experimental do CD também me atraiu: não era um rock pesado o tempo todo; tinha timbres e texturas estranhos; a pegada era de rock, mas a gente sentia outros ritmos e outras influências ali, embora não conseguisse identificá-las; havia as faixas lentas, muito lentas, e havia os solos matadores mas especialmente fundos, profundos, que pareciam rebasar um sofrimento nosso, e dele; havia muita coisa em um lugar só. E até hoje o CD me parece inesgotável, em especial porque ele não cansava, não cansa, a gente não se cansa de ouvi-lo, parece não acabar mais.
Ocorre que com o passar do tempo ele foi mudando, um pouco pelo menos, mas permanecendo em última instância quase o mesmo. Eu não consigo ouvir o que ele produz e sentir tédio. Não sinto que nos solos ele exagera no virtuosismo. Eu continuei a ouvi-lo, minha vida mudando, eu enfrentando novos desafios, e ele sempre, em algum momento, se comunicando comigo. Seria pessoal demais eu lhes dizer em que medida Echo falava do sofrimento que eu experimentava no final da década de 90; seria estranho demais eu lhes dizer como eu podia inferir o amor em Always with me, always with you, sem saber efetivamente o que era amor; seria pessoal demais eu lhes contar em que medida alguns agudos de sua guitarra eram a dor encarnada que eu experimentava em episódios marcantes de minha vida. Seria demais até. Mas seria verdadeiro, porque é. Agora mesmo ouço Echo e mal acredito como pouco se passou, como a música permaneceu, e como consigo reaviver momentos passados, sem sofrê-los, especificamente.
Hoje a gente consegue achar facilmente muito sobre a carreira do Joe bastando clicar no Google. Mas meu afundamento (diria assim) em muito de seus CDs se deu de outra forma, achando meio sem querer seus CDs nas lojas, comprando-os e de vez em quando - quando a grana dava, ou a companhia permitia - frequentando seus shows. Eu só me lembro de um deles. Foi no Credicard Hall e ficamos, ambos, ela e eu, muito distantes do palco, talvez excessivamente. E eu não curti. Não sei o que aconteceu. Acho que talvez fosse ela estar lá, e não compartilhar comigo da paixão, e estar porque queria me acompanhar e ainda acreditava no relacionamento (que se mostrou gorado com os anos, para meu grande sofrimento, eu não sabia o que fazer). Ou talvez fosse eu não conseguir me concentrar, tentando vê-lo de longe, naquilo que ele queria dizer. Porque eu sempre sinto que o Joe quer dizer algo para nós. Ele é um cara que surfa, porras; é um cara que se resguarda; que sabemos deve ter seus problemas, e seus limites; mas é um cara que se comunica com as cordas, caramba. E é por isso que eu sempre sinto que ele quer nos falar algo. Não quer aparecer, nunca quer aparecer; é um cara da costa Oeste, descolado, que soube viver com pouco, e que vive do que ama, e que não vem com declarações bombásticas. Viver, afinal, é apenas isso; fazermos o que amamos e tocarmos a vida para a frente. Ou não é?
Claro, também, que sabemos que a vida, no fundo, é e sempre será uma incógnita. E isso eu também sempre sinto em suas músicas, seja quando têm grandes e complexos solos, ou quando não têm nada disso, como The Forgotten, em Flying in a Blue Dream, que começa de um jeito que nos deixa estranhados e que depois se torna uma das mais conhecidas melodias que ele soube elencar em vida e obra. Foram centenas as vezes que eu ouvia a segunda parte dessa The Forgotten e imaginava algo a que ela pudesse se referir, sem sucesso. Porque parece, ao ouvi-lo, que chegamos num limite da comunicação, que nos impele a tentar algo mais, a saber algo que fica jogado, mas que não conseguimos ultrapassar e que NÃO QUEREMOS que ele nos revele, porque, ao se tornar desconhecida, essa parte torna-se nossa, ela É o que queremos ver, e porque vemos o que queremos não queremos sequer que ele se intrometa. E continuamos escutando, absortos em melodias e harmonias que sabemos que ficam conosco - e que VÃO conosco. É estranho, isso. Porque, quando ouço muita coisa por aí, sinto que ouço algo que permanece externo, enquanto, ao ouvir o Joe, ouço muitas vezes - não sempre - coisas que queremos que permaneçam nossas, e que assim acontece. É muito estranho, não é invenção.
Claro, também, que muitas vezes o Joe fala claramente o que o título da música diz, como em Crying, em The Extremist. E nesse sentido ele parece meio batido, parece trair a si mesmo, trair o próprio enigma, ao dar à pessoa que ouve exatamente o que ela parece estar querendo ouvir. E confesso que nesses momentos o Joe se afasta um pouco de mim. Mas é fácil notar, com o passar dos anos, como ele surpreende sempre, e nos mostra acepções à vida que nós não imaginaríamos conhecer. E nesse sentido ele parece inesgotável - eu já comentei antes como ele me parece quase um eterno garoto. Comento isso citando Love Thing, por exemplo, em que o Joe fica mais plácido e nos comenta algo que sentimos é compartilhado, não é bem amor romântico, é algo que sentimos que podemos sentir em conjunto com alguém, ou que nos diz algo em privado, como se ele soubesse o que sentimos a respeito da pessoa que amamos. E isso eu considero às vezes algo quase milagroso. Porque é como se ele falasse por nós, sabem? Mas é mesmo!
Eu ficaria aqui linhas sem conta comentando tudo o que posso auferir de ouvir o meu colega das seis cordas. Eu ficaria inclusive emocionado demais, e acho que a pegada aqui não deve ser bem essa. Mas dizer-lhes: vamos ouvir o Joe, caras? Vamos? Logo ele chega entre nós, não é? Então! ...
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