Oswaldo Malagutti (Pholhas, Womp!, Estúdio Mosh)
Por Rodrigo Werneck
Postado em 02 de abril de 2008
As bandas Pholhas e Casa das Máquinas se misturam com a própria história do rock brasileiro. Para nos ajudar a compreender melhor esses importantes capítulos da nossa música, conversamos com o baixista Oswaldo Malagutti, que tocou no Pholhas e hoje em dia comanda o Estúdio Mosh, um dos mais requisitados da América Latina, além de tocar nas horas vagas com a banda Womp! (assim mesmo, com ponto de exclamação), que faz sucesso em especial no circuito paulistano de bares, já tendo entretanto aberto shows de ícones do "classic rock" como Focus e Uriah Heep. De quebra, tivemos ainda a colaboração do tecladista Marinho Testoni, que como Oswaldo é ex-Pholhas e atual membro do Womp!, e que nos falou um pouco sobre o Casa das Máquinas.
Fotos: Arquivos Pholhas / Casa das Máquinas / Womp!
Oswaldo, o Pholhas surgiu em fevereiro de 1969 com Hélio Santisteban (teclados), Paulo Fernandes (bateria), Wagner "Bitão" Benatti (guitarra) e você no baixo. Fale-nos um pouco sobre esse início...
Oswaldo: Foi em junho de 1968, quando a antiga banda The Wander Mass Group se dissolveu. Essa banda contava com Helio, Oswaldo, Paulinho, Wanderley Mascarenhas, Tinho e João Santisteban e foi a vencedora de um concurso de bandas promovido pela TV Record em 1966. O programa se chamava Brotos 66 e participavam bandas de escolas de São Paulo. Na final do programa, nossa banda foi a vencedora executando a "Marcha Turca" de Mozart, solada pela guitarra do Wanderley, com alguns backings do Helio, Paulinho e Tinho. Nós ganhamos como prêmio uma aparelhagem da Giannini (amps Tremendão, True Reverber e uma bateria que acho que era Pingüim). Ganhamos também a gravação de um compacto duplo pela gravadora Chantecler, e ganharíamos um contrato para tocar no programa Jovem Guarda, do Roberto Carlos. O contrato acabou não vingando, pois curiosamente no mesmo dia em que tocamos a final do programa, a Record pegou fogo pela primeira vez (duas horas após termos nos apresentado) e daí as coisas desandaram. Mesmo assim, fizemos alguns programas no antigo Teatro Record, para onde foi transferida toda a programação. Lembro que tocamos na Hebe Camargo, um dia na parte da tarde. Bom... Isso foi em 1966, e a gravação em 1967. Logicamente não aconteceu nada com o disco, embora tivéssemos tentando trabalhar.
Oswaldo: Em 1968, a banda se dissolveu e ficamos só eu, Helio e Paulinho. Daí fomos descobrir o Bitão que já era conhecido (Bitão vem de Beatles, pois ele tocava quase todas as músicas deles).
Oswaldo: O Bitão participou dos Megatons, que era famoso na época.
A proposta inicial era fazer covers de grupos ingleses e norte-americanos, mantendo as letras em inglês, certo? A cena da época privilegiava os vocais em inglês? Parece que o público chegava a pensar que a banda era estrangeira...
Oswaldo: Formamos a banda com a intenção de tocar o que a gente gostava na época que era Beatles, Stones, The Who, mas para poder sobreviver tínhamos que fazer os "bailes", e daí tinha que tocar de tudo, inclusive samba e às vezes no final "Carnaval". Ficamos nessa de 1968 até 1972, quando fomos convidados para gravar um disco na RCA.
Quando e por que vocês decidiram compor material próprio?
Oswaldo: Tínhamos várias composições próprias na época, todas com influências dessas bandas. Quando fizemos o teste para gravar na RCA, eles escolheram as músicas nossas.
Todos os integrantes cantavam, sendo o Santisteban o vocalista principal. Como eram divididos os vocais nas músicas?
Oswaldo: Exato. Na gravação todos participavam. Às vezes, o Santisteban fazia outras vozes, e normalmente dobrava a dele.
Você poderia nos falar um pouco sobre os LPs iniciais, cantados em inglês? As altas vendas chegaram a surpreender (positivamente)?
Oswaldo: O primeiro disco foi um compacto duplo com "My Mistake". Logo em seguida, saiu o compacto simples de "My Mistake", que vendeu na época mais de 1 milhão de discos.
Com o LP de 1977 "O Som das Discotheques", vocês optaram por um som mais comercial, com covers dos principais hits do movimento da discoteca. Por que houve essa mudança?
Oswaldo: Esse disco não era para ter acontecido, pois não tinha nada a ver com a gente. A pedido da gravadora RCA tivemos que gravar, pois nessa época só dava esse tipo de som no mercado...
Logo depois disso, o Hélio deixou o grupo para seguir carreira solo, sendo substituído pelo Marinho Testoni, na época oriundo do Casa das Máquinas. Com isso, a banda assumiu uma sonoridade mais progressiva, e com vocais em português. Apesar de ser um trabalho aclamado, não proporcionou o mesmo sucesso anterior. Como você viu esses acontecimentos, naquele momento?
Oswaldo: O disco em português e a saída do Helio, foram antes do da discoteque. Foi em 1976 que o Helio saiu para fazer carreira solo. Fomos buscar o Mario Testoni, que era do Casa das Máquinas, e então mudamos para o rock nacional, mais dirigido ao progressivo. Já era esperado que não iria fazer o sucesso da carreira em inglês. A verdade é que nos enjoamos de fazer aquelas baladas, pois o nosso sangue sempre esteve voltado para o rock.
O que gerou a sua própria saída do conjunto? O trabalho em estúdio te pareceu mais atraente, pelas mudanças do cenário de rock brasileiro?
Oswaldo: Um pouco de decepção. Chegou uma hora em que me enjoei de viajar, de tocar sempre as mesmas músicas, etc., e resolvi deixar a banda. Daí me dediquei à construção do Estúdio Mosh, em 1979.
Depois disso, o grupo prosseguiu, alterando formações sempre girando em torno dos mesmos músicos. Existe ainda espaço para um grupo como o Pholhas na cena musical do Brasil?
Oswaldo: Eles ainda continuam tocando pelo Brasil e com muito sucesso, embora não tenha mais rolado nenhum sucesso, nenhuma música nova desde 1975.
Você foi substituído no Pholhas pelo João Alberto, que também havia tocado no Casa das Máquinas. Logo, vamos falar um pouco dessa banda. O Casa foi formado por ex-integrantes dos Incríveis, e após um começo mais na linha do hard rock (com o disco homônimo), seguiu por um caminho mais progressivo, com o lendário "Lar de Maravilhas". Essa era uma tendência da época, comercialmente aceita pelas gravadoras?
Oswaldo: Nessa época, o rock nacional começou a pintar, inclusive com a volta da Rita Lee e Tutti Frutti, e vários outros. Daí o porquê de resolvemos também gravar em português.
Marinho, depois do disco "Lar de Maravilhas", o vocalista Simbas se juntou ao grupo. Pique também deixou a banda nessa época. Por que ocorreram essas mudanças, o "Lar de Maravilhas" não trouxe os resultados esperados? Quais os objetivos do grupo para o projeto seguinte, o LP "Casa do Rock", numa volta a um estilo mais "básico"?
Marinho: Em primeiro lugar, o Pique saiu do Casa após a gravação do primeiro LP, e com a minha entrada e do Marinho Thomaz, partimos para a gravação do "Lar de Maravilhas", onde o grupo tomou um outro caminho, mais progressivo, explorando muito o meu trabalho, teclados, que acabou agradando a todos nós e ao público e gravadora também.
O Simbas não era o primeiro músico do pop brasileiro a ter uma postura "glam", antes dele vieram o Cornelius do Made in Brazil, Ney Matogrosso dos Secos & Molhados, e outros. O público do Casa aceitou bem o novo integrante e sua proposta?
Marinho: O Simbas entrou no Casa já com o terceiro LP em andamento, "Casa de Rock", e ao contrário do "Lar de Maravilhas" a gravação deu uma virada para um rock mais simples, mais básico. Dessa forma, apesar de comprovado que o caminho teria sido ficar no progressivo do "Lar de Maravilhas", com as várias mudanças que ocorreram, saídas de uns, entrada de outros, o estilo acabou ficando mais "básico". No início, o público que estava acostumado a ver e ouvir as vozes do Aroldo e do Carlinhos, estranhou um pouco, mas como já estava saindo o "Casa de Rock", tudo ficou mais fácil de digerir.
Entre o LP "Casa do Rock" e o fim do conjunto em 1978, se passaram dois anos. Nesse tempo, estava em preparação o repertório para um quarto disco do casa das Máquinas? Como ocorreu o fim do grupo? Algumas composições acabaram se perdendo com o fim prematuro da banda?
Marinho: Após o lançamento de "Casa de Rock", eu acabei saindo do grupo, o estilo que estavam seguindo já não me agradava, então resolvi sair, e com o convite do Oswaldo Malagutti, acabei entrando no Pholhas onde gravamos o primeiro LP em português pela RCA, onde se tornou um disco "cult" até hoje. Até a minha saída do Casa, não tínhamos nada para um próximo disco. Depois de um "acidente" ocorrido na TV Record, o grupo entrou em queda. Após uma apresentação no Luna Park, Argentina, o Netinho comunicou a dissolução do grupo.
Como rolou a questão do retorno recente do grupo às atividades, contando com a dupla de bateristas/irmãos Netinho e Marinho Thomaz, você (Marinho Testoni) nos teclados, e os novos integrantes Faíska (guitarra) e Andria Busic (baixo, vocais)? Trata-se de um projeto montado apenas para alguns shows, ou há planos mais concretos em vista?
Marinho: Tivemos duas apresentações em Matão para uns amigos em 2003, se não me engano, nada muito sério, só que percebemos o potencial do grupo, e achamos que poderíamos pensar numa possível volta, e isso passou a ser pensado, estudado e cogitado, até que no carnaval de 2008, aceitamos o convite para fazer o Psicodália, festival de rock em pleno carnaval, em Santa Catarina, São Martinho. Foi muito bom, faremos a Virada Cultural e mais um festival em Curitiba, e parece que temos mais uns shows a caminho... Uma volta? Quem sabe, tudo vai depender de como rolar esses shows e os acertos com a Som Livre ou outra gravadora, produtores e uma série de coisas que envolvem uma coisa sólida. Se tudo correr como pensamos, existe sim a possibilidade de uma volta, aliás, já temos até algumas músicas, muito boas, que foram mandadas para nós pelo Aroldo, e outras que estamos compondo, mas de imediato estamos pensando em um entrosamento com o grupo, aí quem sabe teremos uma volta.
Oswaldo, você e o Hélio montaram o estúdio MOSH em 1979, sendo o nome uma interessante combinação das iniciais dos seus próprios nomes (M.O.S.H. = Malagutti Oswaldo Santisteban Hélio). Vocês tinham planos ousados, ou a proporção que o estúdio acabou atingindo te surpreendeu?
Oswaldo: Quando se faz uma coisa que a gente gosta, é claro que sempre a gente sonha... Mas acredito que quando montei o Mosh em 1979, não pensava que a coisa pudesse ter ido tão longe assim.
Em 1984, o Hélio se retirou da sociedade para se dedicar novamente ao Pholhas. Ele não acreditou no crescimento que o MOSH viria a experimentar?
Oswaldo: Estávamos passando por uma época difícil e na verdade ele não era tão ligado ao estúdio quanto eu.
Fale-nos um pouco da estrutura atual do estúdio, e quais os perfis de artistas que normalmente trabalham com vocês...
Oswaldo: No momento estou construindo um novo estúdio com 130 metros quadrados de área, com vários propósitos: gravação de áudio (orquestra, coral, etc.), gravação de vídeo para filmes, publicidade e até programas de TV e, é claro, gravação ao vivo de DVD's musicais e outros. O Estúdio continua indo muito bem, apesar de toda a virada do mercado que teve nos últimos anos. São 5 salas de gravação, uma de edição de vídeo e autoração de DVD e sala de Masterização. O Mosh tem uma grande estrutura, localizada num prédio de 2.200 metros quadrados aqui em São Paulo, próximo à TV Cultura. O Mosh hoje atende a todo tipo de perfil, desde bandas de rock, MPB, sertanejo, escola de samba, trabalhos de dublagem, a produção de DVD’s.
Falando agora um pouco sobre o projeto atual de vocês, o Womp!... Ele surgiu como uma banda de "classic rock", fazendo basicamente covers, com a proposta de tocar antigos sucessos mantendo os arranjos e solos originais, e para tal utilizando instrumentos da época, como forma de obter um som mais adequado. Correto?
Oswaldo: Na verdade o Womp! surgiu da seguinte maneira: o pessoal do Dr. Sin estava gravando no Mosh, e no dia do meu aniversario, 26 de Maio, me deram um baixo de presente. Eu não estava tocando mais desde 1980 quando deixei o Pholhas!!! Com esse presente, comecei a me interessar de novo pela música e tive a idéia de convidar os meus amigos do Pholhas (Bitão, Marinho, Helio e Paulinho) para fazermos uma banda cover de uma banda americana do Texas chamada Bloodrock, da qual todos nós sempre fomos fãs de carteirinha. O pessoal aceitou, e então começamos a montar o Womp! em junho/julho de 2001.
Quais os equipamentos que vocês utilizam no palco?
Oswaldo: Quase todos os básicos que se usava nos anos 70: órgão Hammond B-3, Leslie 147 e 122, amplificadores Hiwatt para baixo de guitarra, dentre outros.
Como foram as experiências de tocar antes do Focus (no Rock In Concert Brazil festival) e do Uriah Heep (num evento na Universal distribuidora que precedeu o show de 2006 do Heep em São Paulo)?
Oswaldo: As duas apresentações foram muito importantes para nós, por serem o Focus e o Uriah Heep bandas dos anos 70, as quais a gente era e é fã até hoje. É sempre uma grande responsabilidade. Fomos bem tranqüilos durante as duas apresentações, graças também aos quase 40 anos de estrada que todos nós da banda também temos.
Com a entrada do Marinho Thomaz na bateria agora em junho de 2007, que foi dos Incríveis e do Casa, um ciclo foi fechado, pois agora todos os integrantes foram da dupla Pholhas/Casa: você, Bitão e o Marinho Testoni foram do Pholhas, e o Marinho Thomaz e (novamente) o Marinho Testoni foram do Casa. Ou seja, o legado está mantido?
Oswaldo: Exato. Agora banda é 50% Pholhas e 50% Casa das Máquinas. É muito bom tocar com esses caras, pois eles têm o espírito da coisa. Não é simplesmente técnica ou boa execução. Acho que por todos nós termos vivido intensamente o final dos anos 60 e 70, o nosso repertório tem tudo a ver com o que passamos.
Vocês têm planos de gravar material original, ou somente tocar covers? Pelo menos um DVD ao vivo está nos planos, para registrar as já antológicas performances para a posteridade? Poderia ser uma idéia interessante, incluindo também entrevistas com todos os integrantes, falando de seus passados...
Oswaldo: Acho que qualquer hora vamos gravar um DVD, mas na minha opinião seria mais para registro. Pelo menos eu, não tenho nenhuma ambição de fazer sucesso com uma nova banda.
Colaborou: Rodrigo Araujo
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