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Transatlantic: Minha épica viagem de dirigível em São Paulo

Resenha - Transatlantic (Carioca Club, São Paulo, 14/02/2014)

Por Ricardo Pagliaro Thomaz
Postado em 20 de fevereiro de 2014

Lembro ainda do começo da década passada, em 2002 para ser mais exato, e todo o frenesi que foi a chegada do Rush no Brasil após 30 anos de espera. Foi certamente um momento mágico e inesquecível para muitas pessoas, momento que, quem foi, ainda guarda no coração e na lembrança cada segundo e cada nota tocada. A visita apoteótica do trio Canadense deixou todos com aquela impressão de finalmente terem visto Papai Noel, o momento único na vida de quem foi naqueles concertos certamente jamais será esquecido.

Via-se de tudo. Pessoas recitando trechos de músicas, ostentando sua coleção e seu fanatismo, erguendo as mãos para os céus e agradecendo a quem quer que habite a imensidão azul dele por finalmente poderem estar ali. Está tudo registrado, veja tudo isso no DVD Rush in Rio, se não acredita! A comoção pela chegada do trio Canadense no Brasil em 2002 pode ser equiparada à chegada dos Beatles nos EUA dos anos 60.

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Mas você deve estar se perguntando qual a razão de eu estar mencionando a passagem do Rush pelo Brasil. Bom, aos meus caros amigos e irmãos que compareceram no concerto do Transatlantic em São Paulo já devem imaginar o porque de eu trazer isso a tona. Aos que não puderam comparecer (meus mais sinceros sentimentos, para começar), devo abrir meus comentários dizendo que a sensação foi imensamente semelhante àquela que todos tiveram quando o Rush pisou pela primeira vez em terras Brasileiras.

Claro que o impacto do trio Canadense em termos midiáticos foi bem diferente, uma vez que são bem mais conhecidos, mas mesmo antes de adentrarmos o Carioca Club dava para sentir a expectativa geral. O sentimento atribuído somente pode ser comparado à expectativa gerada da entrada do trio Canadense em 2002 nos palcos do Rio, São Paulo e Porto Alegre.

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E não era para menos. Era a primeira visita do Transatlantic ao Brasil após 15 anos de sua origem. Bom, pelo menos do quarteto inteiro, enfim. Roine Stolt, Pete Trewavas e Mike Portnoy já haviam visitado o Brasil com suas respectivas bandas, o Flower Kings, o Marillion e o Dream Theater, algumas dessas mais de uma vez, mas para Neal Morse e o músico convidado, era a primeira vez.

Mas vamos voltar no tempo por alguns parágrafos. Após pegar alguns metrôs pela capital Paulista, finalmente chegamos à estação próxima do evento. Estava eu acompanhado de meu caro irmão e companheiro de aventuras e sua ilustríssima companheira que fez a gentileza de me guiar pelos metrôs da cidade e, eu não consigo deixar de pensar que talvez alguma força do universo tenha conspirado na tentativa de nos fazer desistir da empreitada, pois uma forte chuva havia acabado de começar minutos antes de saírmos da estação.

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Lado positivo da chuva a parte, a verdade é que isso dificultou consideravelmente a locomoção, fazendo com que preocupações com relação ao evento ou até mesmo em chegar lá viessem a tona. Mas, de súbito, me lembrei que estava a caminho de conferir a estreia de Neal Morse no meu país e não haveria chuva nem tempestade que me impediria de ver isso! Com a determinação de um espartano, enfrentei o mau tempo e consegui entrar no Carioca Club; casa cheia, me via entre pessoas de todos os tipos, desde amantes de boa música em geral, a fãs de Rock Progressivo e Headbangers, pessoas de todas as idades.

Até lá fora mesmo já começavam a pipocar os animados, cantarolando melodias do quarteto e chamando a atenção para si. Aliás, confesso que isso para mim foi uma agradável surpresa. Quando comprei ingresso em Outubro de 2013 para esse show, achei que iria me ver entre diversas pessoas que não faziam ideia do que a banda se tratava, que iriam porque era o ex-baterista do Dream Theater, sabe, esse hype aí. Portanto, foi uma agradável surpresa ao saber que haviam tantas pessoas alí que vieram pelos mesmos motivos que eu vim, ou seja, para ver uma legítima banda de Rock Progressivo com músicos gabaritados que eu conhecia de cor, independente da fama deste ou daquele.

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Conversa com esse, com aquele, bebidas e bate-papo e o tempo passa e já eram quase 19:00 horas. Já era hora de eu e meus dois comparsas garantirmos nossos lugares na multidão. Chegado o horário e a banda não entrava! Confesso que fiquei com um frio na barriga. Após dez minutos do horário de começar, ouvíamos playbacks de "Duel With The Devil" e outros samples da banda. 19:30 e nada! "Estariam com algum problema?", eu ficava pensando e o vídeo na telona do palco ficava sendo testado. A cortina estava entreaberta, eu só conseguia ler um tal de "Check TX's... " e sei lá mais o quê... ouvia sons... "Será que é o Neal testando o teclado lá atrás? O técnico talvez?" pensava eu. E o que parecia ser uma bandeira do Brasil aparece no vídeo, eu fiz questão de olhar lá atrás na tela de projeção para confirmar. 19:37 e finalmente o cara com a lanterna no palco dá sinal que vai começar. "É agora!", pensei afoito.

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Esfreguei as mãos... e então o palco se iluminou e lá estavam eles!! Roine, Pete, o Portina e... SIM, ERA ELE! Neal Morse!! Era Neal Morse bem diante de mim! A ovação do público presente parecia não ter fim e eu quase fiquei rouco das mãos de tanto aplaudir! Eis que o quarteto abre o show com "Into The Blue", primeiro épico do novo álbum, Kaleidoscope, com uma performance que deixou o público estasiado, cantando cada verso e cada nota, com os olhares fixos em cada integrante. Foi sensacional! Foi um momento único e singular poder conferir Morse, Stolt, Trewavas, Portnoy, um encontro de quatro fantásticos músicos fazendo sua mágica no palco.

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Eu ainda não estava acreditando! Morse, Stolt, os criadores de clássicos musicais como "The Light" e "Rising The Imperial" estavam lá, para o deleite de todos, debulhando seus instrumentos e confirmando seu status de estrelas do Rock Progressivo que são. Portnoy "arroz de festa", terminado o lindo épico, levanta então de seu kit e cumprimenta a todos com uma grande saudação comemorando a estréia do grupo no Brasil, elogiando a audiência Brasileira e ensinando Morse a dizer "obrigado", carismático e visivelmente animado com o público, Morse responde descontraído e então introduzem a longa "My New World" de seu primeiro disco, SMPT:e, fazendo a audiência vibrar novamente, e foi nesse momento que uma lágrima quase escorreu de meu olho, pensando que eu já sabia essa faixa de cor lá no início da década passada e agora finalmente iria ter a chance de ver o quarteto executá-la e cantá-la com o grupo, de onde eu estava, a plenos pulmões.

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Ted Leonard, o talentosíssimo vocalista e multi-instrumentista da clássica banda Enchant, atualmente no Spock's Beard, também estreia no Brasil substituíndo Daniel Gildenlöw do Pain of Salvation como músico convidado no Transatlantic, que não pôde comparecer por problemas de saúde. Como eu não havia checado as notas mais recentes sobre o show demorei um pouco a reconhecer Ted, mas lá pelo meio do primeiro épico já começava a notar que aquele cara ao fundo me parecia ligeiramente familiar! Leonard também capricha em sua estréia, fazendo as linhas de Gildenlöw com a competência de sempre e se mostrando um faz-tudo tão competente quanto o sueco, confirmando a todos a razão de ele estar hoje na ex-banda de Morse.

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O grupo então anuncia "Shine" que o público recebe com igual empolgação e advinhando o nome da música antes mesmo de Morse anunciá-la, e foi realmente uma surpresa, pois por ser uma canção mais Pop eu esperava uma recepção mais morna, porém foi também cantada a plenos pulmões por todos os presentes; até eu mesmo que acho uma música mais tranquila tenho que dizer que ela ficou ótima ao vivo.

Então somos brindados com a introdução de "The Whirlwind" e foi algo sensacional, a audiência explodiu, cheguei a pensar, "cara, eles vão fazer os 80 minutos de música?", seria realmente épico presenciar uma performance na íntegra do incrível terceiro disco do grupo; mas não rolou, fizeram apenas alguns trechos do épico, o que achei perfeitamente compreensível, afinal tinha muita música ainda para ser tocada. Talvez ainda façam de novo, como fizeram na turnê do terceiro disco, numa próxima vez, quem sabe. Houve a introdução, emendada com "A Man Can Feel", seguida de "Rose Colored Glasses", "Evermore", "Is It Really Happening?" e "Whirlwind (Reprise)", e ao final extasiante deste apanhado de The Whirlwind, meu disco favorito do quarteto, meu cabelo da nuca arrepiado, eu não me contive e bradei de onde eu estava um sonoro "BRAVO!", emocionado. Aliás, emocionados com certeza estavam os membros da banda, especialmente Morse de ver um público tão animado!

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E foi com essa animação que, após "The Whirlwind", Neal Morse apenas pegando seu violão, de súbito começa a tocar a belíssima "We All Need Some Light" e o público vai ao delírio, canta junto com as mãos erguidas, compensando uma abstinência de anos sem a banda. E de fato, todos esperamos por esses momentos especiais. Ted Leonard divide os vocais com Neal de forma inspirada. Portnoy acende seu isqueiro, uma grande vela acesa aparece no telão em momentos históricos dos palcos Brasileiros e todos cantam em uníssono. Segue o concerto com a inédita "Black As The Sky", uma das mais empolgantes do novo disco e o público demonstra que não está cansado e vibra, pula e canta o refrão com a banda, a essa altura já contagiada com a empolgação geral.

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Finalmente Neal pede a todos permissão para tocarem um grande e longo épico, e assim, concedida naturalmente por todos, começa "Kaleidoscope" o grande épico "tour-de-force" do novo álbum do quarteto, segundo eles em seu making off, contendo alguns temas e ideias abandonadas à época do SMPT:e. O épico é acompanhado por todos com atenção, seguido a cada trecho e acompanhado em cada virada, no telão, imagens acompanhando a letra. "Ride the lightning!" todos bradam em uníssono no final do épico caminhando ao final apoteótico do concerto e a banda parece não acreditar na grande ovação, e quando ela sai, passados alguns segundos começam os gritos para voltarem para mais alguns momentos. E então eles retornam para fazerem a dobradinha "All Of The Above / Stranger In Your Soul", foram apenas alguns momentos do segundo álbum "Bridge Across Forever" no final mas que valeram cada segundo para a audiência presente que nunca teve a chance de prestigiar a banda e com mais esse final apoteótico a banda vai ao centro do palco para se despedir.

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Foi inacreditável! Todos os músicos estavam na mais perfeita sintonia e tocavam suas partes com maestria. Neal e seu imenso carisma, espírito positivo, disposição e simpatia e sua técnica instrumental incrível, adicionados a sua voz suave, enérgica, seus olhos brilhavam de ver a audiência Brasileira festejar a cada momento e, contagiado, começava a dançar no palco em dado momento enquanto destilava sua mágica, interagindo com a plateia. Seu sorriso enorme em ver tais coisas só pode ser comparado ao imenso "UAU!" que saiu de sua boca quando ao final olhava para nós, o público, com brilho nos olhos contemplando a alegria geral. O cara nunca deve ter visto tanta animação antes na vida.

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Portnoy era só elogios e simpatia para com o público. Fanfarrão, animador nato, o baterista finge que chora ao ouvir Neal tocar, faz truques com as baquetas, limpa o suor da cabeça, se joga no chão de cansaço, toca em pé, dá a volta em seu kit, rege, chama o público, anima, interage e recebe ovações e a aprovação de todos, pergunta se queremos ir embora, enfim, dá uma verdadeira aula de como ser um showman e mais uma aula técnica nas baquetas. E suas passagens vocais também saem ótimas, inspiradas.

Stolt e Trewavas mostraram a competência de sempre, um com suas linhas vocais sempre bem vindas e seu estilo jazzístico na guitarra que compunham solos ótimos e bastante interessantes e o outro, com suas interessantíssimas linhas de baixo dinâmicas e seu ocasional vocal, aliás, bom ver que o Trewavas está tendo a oportunidade de fazer algo que não faz no Marillion com destaque. E finalmente, como já falamos, Leonard também mostrou sua competência e talento de costume, sempre interagindo com a banda. Claro que houve um ou dois desencontros, seja com a acústica do local, seja entre o grupo, mas ninguém se importava, uma vez que isso em nada comprometeu o resultado final, proporcionando a todos uma noite inesquecível.

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Saí do Carioca Club em êxtase, com um sorriso de orelha a orelha e a certeza de que testemunhei um show sensacional e que valeu cada centavo do ingresso. No ônibus de volta a minha cidade ainda ficava relembrando os melhores momentos do show, já com uma saudade enorme daquilo tudo, inclusive achei uns quatro comparsas de lá que também foram ao show, o que me deu uma grande alegria!

E Portnoy nos deixou com a promessa de que não iriam demorar a voltar. Podemos cobrar essa promessa, Portina? Estaremos aguardando o próximo encontro! No momento, fica a certeza de que Papai Noel existe e é fã de Rock Progressivo! E que o presente que nos deu foi além do que esperávamos! Um caleidoscópio enorme de cores, sons, envolto em uma embalagem reluzente e magnífica! Que esse tenha sido o Rush in Rio dos Paulistas que estiveram presentes. E que continuem a nos maravilhar por muito tempo, que o Brasil vire ponto de visita obrigatório para esses grandes músicos e que realmente não demorem muito a nos visitar novamente. São os votos deste garoto que viajou no dirigível azul e espera voltar muito em breve.

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Finalmente: BRAVO Neal, Roine, Pete, Mike e Ted!! Meu convite a voltarem está mais do que garantido! Não demorem! E tragam também suas bandas para cá!

Transatlantic - Ao vivo no Carioca Club, São Paulo
14 de Fevereiro de 2014

Setlist:

1. Into The Blue
2. My New World
3. Shine
4. The Whirlwind:
- Overture Whirlwind
- A Man Can Feel
- Rose Colored Glasses
- Evermore
- Is It Really Happening?
- Whirlwind (Reprise)
5. We All Need Some Light
6. Black As The Sky
7. Kaleidoscope

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Encore
8. All Of The Above / Stranger In Your Soul


Outras resenhas de Transatlantic (Carioca Club, São Paulo, 14/02/2014)

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Sobre Ricardo Pagliaro Thomaz

Roqueiro e apreciador da boa música desde os 9 anos de idade, quando mamãe me dizia para "parar de miar que nem gato" quando tentava cantarolar "Sweet Child O'Mine" ou "Paradise City". Primeiro disco de rock que ganhei: RPM - Rádio Pirata ao Vivo, e por mais que isso possa soar galhofa hoje em dia, escolhi o disco justamente por causa da caveira da capa e sim, hoje me envergonho disso! Sou também grande apreciador do hardão dos anos 70 e de rock progressivo, com algumas incursões na música pop de qualidade. Também aprecio o bom metal, embora minhas raízes roqueiras sejam mais calcadas no blues. Considero Freddie Mercury o cantor supremo que habita o cosmos do universo e não acredito que há a mínima possibilidade de alguém superá-lo um dia, pelo menos até o dia em que o Planeta Terra derreter e virar uma massa cinzenta sem vida.
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