Festival em Rio Claro: vitória no cenário musical feminino
Resenha - Festival de Rock Feminino em Rio Claro (Rio Claro, 20/03/2010)
Por Laura Udokay
Fonte: Blog Laura Udokay
Postado em 04 de abril de 2010
Cheguei à simpática Rio Claro ao meio dia (e alguns ponteiros), sábado vinte de março. Desci da van que trouxe, além desta que voz escreve, mais cinco almas para cobrir o oitavo ano do evento dedicado às mulheres.
O FESTIVAL DE ROCK FEMININO de Rio Claro já ganhou o PRÊMIO DYNAMITE 2007. O objetivo é divulgar a arte da mulherada roqueira e ajudar a instituições de caridade. Para entrar, as pessoas levaram, além de um carinho especial por rock, uma caixa de leite que valia por ingresso, destinada ao Fundo Social de Solidariedade e Rede do Câncer. A apresentação do festival foi realizada pelo músico e ex-VJ da MTV, THUNDERBIRD.
E lá estou eu, um tanto perdida com o inédito de participar da minha primeira coletiva de imprensa para a banda de fechamento SHADOWSIDE. Caminho entre a garotada, digo garotada, porque o público se resumia em meninos e meninas adolescentes, franja no olho e bermudas coloridas, maquiagem que em menos de duas horas se desenhavam escorridas pelo rosto, pois cidade do interior queima. Esse era, no geral, o visual das meninas, os caras seguiam quase a mesma linha e andavam aos bandos pitando seus cigarros "legais" para tão pouca idade.
Essa vista grossa aconteceu logo após eu comer meu sanduíche (feito em casa) e beber dois copinhos de água mineral, optei em lambiscar algo fornecido pela organização do evento, o cardápio se resumia em bolacha salgada e rosquinha de coco, além é claro, da água sem gelo. Em poucas palavras resumi o almoço legado ao povo da imprensa.
Devidamente adornada pela credencial "tamanho família", vago a esmo para caroçar as bandas. ISTHA foi o primeiro grupo a subir no palco principal (pois haviam dois, te contei?), por volta da uma da tarde, a organizadora do evento VIVIAN GUILHERME estampava de vocal, ANDRÉ WINKEL na guitarra, HENRI SANTANGUNS no baixo e VITOR CAMBUÍ espanca a bateria. O som dessa gente mistura thrash metal, hard rock, metal melódico e new metal. Bem, a vocalista tem voz aguda (falta algo), o instrumental é bom e as canções cativam.
Caiu-me o queixo quando ouvi e vi em cima do segundo palco (o não principal) uma guria franzina, de cabelos escuros na altura dos ombros com pinceladas de azul, à frente de seu peito pendia uma guitarra enorme e vermelha, nisto compunha uma dupla do mais perfeito matrimônio. NATHALIA da banda NOTA PROMISSÓRIA nasceu com dom. Ela tem apenas onze anos e assombrou em canções do IRON MAIDEN e METALLICA. Suas companheiras de banda são: MARIANA RUZZI de quinze (vocal e teclado), GABRIELA ROSALINI de quatorze (baixo) e GABRIELA RUZZI (bateria). O som das meninas passa longe do rock e metal, todavia merece citação, as garotas têm muita estrada para rodar, mas tem carta Az no baralho, e se chama NATHALIA.
Logo em seguida, vou com a Elaine Oliveira "de não convém citar veículo" e o Henrique Inglez "de também não convém citar veículo", tomar algo gelado, pois a nossa escassa água morna perdia cada vez mais espaço. Fico na água de coco a preço abusivo, pois creio, a balconista sacou que éramos forasteiros, o Henrique levou quase duas horas para tomar sozinho uma garrafa de cerveja, e a divertida Elaine bebericou refrigerante intercalando sua descontração com alguns palavrões inerentes ao seu vocabulário. Eu só dava risada, pois sentada ali, assistimos (às três da tarde) as portas do comércio local fechando para o público. Rio Claro deixou bem claro que é cidade do interior e devidamente pacata. Ainda ali, a garotada marchava em direção ao festival com suas roupas pretas sob um sol de arder até o chifre do capeta.
Voltamos ao local do rock e metal, onde a banda HELL’O BITCH (será que é uma alfinetada para com a nojentamente meiga Hello Kitty?) de São Paulo já cantava no palco principal. Som bem bacana mesmo, e bem pesado mesmo!
Quando a banda HOVÁRIO ocupava, por volta das cinco e pouco da tarde, o palco principal (também), fiquei com medo da vocalista. Ela usava maquiagem insinuando sangue escorrendo da boca, uma garota grandalhona e que cantava (urrava) um thrash metal vomitado. Não me pareceu oportuno o instrumental ligeiramente manjado e quase repetitivo, porém bem executado pelas damas escabrosas de São Paulo.
Acabado o berreiro, rola o som da banda MAFALDA MORFINA de Fortaleza. As garotas agradam, o instrumental é de respeito. O álbum de estréia é SONHOS CONTRÁRIOS e apresenta alguns hits de artistas renomados.
Destaque também para outra banda paulista: KEYS OF THE LIGHT. Rock lírico, a vocalista KETHELIN COCCHI vestia um tubinho preto basicão, acho que os marmanjos tiveram uma boa vista. Com sua franja angelical ela manejava o teclado e alternava notas com uma flauta doce, sua voz é bela e tipicamente delicada, chega a ser de propósito a sua sutileza, pois faz contraponto com as ótimas execuções de guitarra, bateria e baixo. O cara da batera estava sentado em uma cadeira de plástico branca, eita falta de estrutura para os coitados.
Havia um polaco loiro que cantava adestradamente as letras junto com a banda, depois eu vi o mesmo sujeito na pista em frente o palco principal quando acontecia a apresentação do SHADOWSIDE, o cara cantava com a mesma dedicação.
Houve, como é sempre provável em festivais, os contratempos. Duas bandas não compareceram, uma delas, o BELLE, tiveram problemas na estrada, horas depois, conseguiram chegar a Rio Claro e deram um jeito de tocar, o que não poderia deixar de ser inusitado e grosseiro, depois da banda de fechamento.
Bem, mas retrocedendo um pouco nas horas, a coletiva iria acontecer às sete, houve atraso. E ainda bem. Pois novamente o calor fez a mim, Adriano (de outra mídia), Elaine e Henrique marcharem seus corpos fatigados e suas gargantas secas (pois nosso chá de água acabou lá pelas três da tarde), até um boteco descambado em frente ao evento. Como diria Estanislaw Ponte Preta em uma de suas crônicas: "pedimos licença as moscas e entramos". A coreana atrás do balcão e portadora de um português sofrível nos vendeu uma breja geladona, sentamos nossos traseiros nas cadeiras sujas, sobre a mesa encardida apoiamos nossos braços e cevada liquida (sempre pedindo passagem as moscas).
Pouco depois, o assessor de imprensa da banda SHADOWSIDE, Cóstabile, veio nos arrebatar do local de degradação física e mental. E eu não poderia, nem em sonho, chegar grogue para minha primeira coletiva de imprensa. Consegui chegar sã, sentei junto aos outros jornalistas e "pau na máquina".
DANI NOLDEN começou por falar que eles escutam os mesmos sons de quando a banda começou: RAMMSTEIN, DISTURBED, DEEP PURPLE, DURAN DURAN e, inclusive, ela confessa ser amante de blues. "Sempre foi assim, então o amadurecimento do grupo é natural.
Não planejamos, foi um aprendizado com estrada, e aconteceu DARE TO DREAM de uma forma sem pensar", afirma.
Ao ser questionada se houve garotas que se inspiraram nela a seguir carreira como metaleiras, DANI diz que no início não, porém, de uns tempos para cá isso vem mudando, "eu espero que nós todos da banda consigamos incentivar mais meninas, porque não é pela falta de espaço, é falta de interesse das mulheres no metal."
A garotinha NATHALIA, do NOTA PROMISSÓRIA é proferida por mim, quero saber o que a DANI pensa sobre esses talentos precoces. Antes de responder ela desenha um sorriso no rosto e defende ser essa a idade certa para começar, lamenta por não ter iniciado mais cedo também. "Eu gostaria de ter me dedicado a música antes, e uma banda assim, com integrantes de onze a quinze anos, quando eles tiverem vinte vão estar excelentes. Tem que continuar nesse caminho, não desistir, até porque é uma escolha cheia de pedras".
DANI fala como é comum ouvir nãos, antes de começar a colher os louros do reconhecimento. E bandas promissoras acabam por desistir, pois é uma luta constante, ficar longe da família devido as longas viagens em turnê, pouco tempo para descansar, enfim, as pedras...
Por ser mulher, DANI deve estar acostumada com questionamentos, e não poucos, sobre quais são as adversidades de estar inserida em um mundo mais majoritariamente masculino. "O que me parece é que não é diferente, a única coisa é que há uma dificuldade em ser levada a sério".
Este é o momento onde o assessor da banda acelera a coletiva, afinal, um grupo de garotas sobe ao palco principal e o lugar começa a ficar mais barulhento. Testes de microfones e o típico: "som, som, testanto, soooom", sussurrado do palco que fica ao lado do Backstage nos convoca para debandada. No entanto, um momentâneo silêncio nos dá a ilusão de tempo estendido, bobagem, o que podemos contra o tempo?
Agora na linha assédio, DANI afirma que teve apenas uma experiência ruim, onde um rapaz se comportou um tanto exagerado, "eu vejo que as meninas são mais atiradas que os caras". E é verdade, afinal, os homens podem até berrar seus gracejos pejorativos, mas as moças, e infelizmente devo endossar, se excedem mais no histerismo.
"A mulher no rock e heavy metal está, cada vez mais, provando que não é só um segmento. Assim como no caso dos homens dançarinos, sempre acham que um e outro são homossexuais, é um preconceito. A mulher não tem tanto interesse pela música pesada como os homens, é algo natural, e eu não vejo o público de rock como sendo meio a meio", explica DANI.
Pergunto ao baixista RICARDO PICCOLI, uma vez sendo rosto novo na banda, como ele encara essa inserção. "É uma oportunidade muito legal. Eu andava meio parado, montei um estúdio e estava só produzindo, não tocava mais. Então, para mim esta sendo ótimo", finaliza.
A banda já iniciou a composição para um disco novo, "planos a gente tem sempre", declara DANI em risos partilhados com RAPHAEL MATTOS. E eles comentam a influência que o RICARDO deve exercer nesse álbum futuro. "Eu acredito que o próximo disco virá mais pesado, porém com a mesma melodia", acrescenta DANI.
A banda sairá em turnê pela Europa, devem fazer um show em Angola no mês de julho, seguidos de alguns shows no Brasil e uma turnê européia de inverno, um pouco mais longa, em novembro ou dezembro. "Disco novo, provavelmente iremos começar a gravar no início do próximo ano", conta DANI.
Sai o assunto sobre essa torrente de shows gringos em São Paulo, os integrantes da banda afirmam que os paulistas se acostumaram com o excesso de shows internacionais. DANI intercala com a afirmação de que as pessoas acabam tendo muita opção e nem sempre podem ir a todos, afinal, haja grana para custear tudo isso, preços nas alturas e espectadores a passar vontade.
"Mesmo as bandas internacionais não estão com o mesmo público de algum tempo atrás. Por exemplo, o STRATOVARIUS chegou a tocar aqui no Brasil para sete mil pessoas, e no último show tinha apenas oitocentas".
Depois, não perdi a chance de escorar de tiete, tirei algumas fotos no melhor estilo "Facebook" e o próximo passo era aguardar pelo show dos santistas.
Meio moribunda de sono, beirando às onze da noite, assisti SHADOWSIDE no palco principal. Experiência nova, e se não fosse o sanduba de presunto, que o Henrique chamou de Vale-Chaves e reclamou da falta de suco de tamarindo, cujo evento cedeu aos jornalistas, provavelmente eu teria sucumbido.
Abaixo, vídeo da música "Red Storm" no evento.
Pouco mais de meia noite adentramos na van e rolamos de volta para Sampa. O motorista parecia um tanto bêbado, talvez de sono, alguém aí dá mais?
Se rock combina com inferno, então esse festival tem tudo a ver, pois calor era para todos, dieta de pão e água também, o banheiro feminino não tinha luz elétrica, a água das torneiras e privadas acabou às quatro da tarde e todo tipo de nojeira se apresentava nos sanitários. Apesar de algumas deficiências, esse festival é uma vitória no cenário musical feminino. E como diz titio Marco Antonio: "Só o rock salva!"
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Para mais informações sobre o FESTIVAL DE ROCK FEMININO e bandas, acesse o link abaixo.
E para quem não sabe, a DANI NOLDEN é amante dos felinos, tem quatro bichanos em casa. Miau!
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