Accept "virou comunista" com o álbum "Russian Roulette?
Por Tchelo Emerson
Postado em 13 de março de 2022
O canal Metal Musikast está publicando uma série especial com resenhas em vídeo de todos os álbuns da banda Accept. Semelhante ao que é feito com músicas e letras do Iron Maiden no especial "Explicando Iron Maiden - Senjutsu", a série traz comentários, curiosidades e análises de cada álbum da grande banda alemã.
O vídeo inédito fala sobre o álbum "Russian Roulette", gravado entre os meses de outubro de 1985 e janeiro de 1986, tendo sido lançado no dia 21 de abril de 1986.
Você pode ver o vídeo completo no player a seguir.
É importante prestar atenção para a data de lançamento, pois em 1986 o mundo ainda vivia sob a "Guerra Fria", que dividia o planeta em dois blocos de países que se separavam em decorrência das opções ideológicas dos seus governantes. De um lado, o oriente, liderado pela antiga União Soviética, adepta do regime comunista; do outro, o ocidente, capitaneado pelos Estados Unidos, sob regime político-econômico capitalista.
Este estado de coisas deixou o Accept ficou em posição delicada, já que a capa do álbum "Russian Roulette" trazia os membros da banda em trajes típicos russos (em alusão ao título do disco, "Roleta Russa").
Peter Baltes (baixista) já disse em entrevista que toda a turnê pelo Leste Europeu foi cancelada em virtude da capa do álbum, pois havia hegemonia da ideologia comunista naquela região e havia a acusação de que a banda havia "debochado" dos russos com aquela capa.
Do outro lado do espectro ideológico em disputa o Accept não teve melhor aceitação com seu novo álbum, pois os norte-americanos pensavam que a banda havia se tornado "comunista", em favor do regime político russo.
Os membros da banda afirmaram que a capa fazia alusão ao principal tema que passa por várias letras do álbum: um manifesto anti-guerra. O tema da capa representada a crítica à guerra, que seria, segundo a banda, uma espécie de roleta russa, um jogo estúpido que causa morte e sofrimento, no qual as partes envolvidas sabem como o jogo começa, mas não sabem como o mal poderá terminar.
Musicalmente, entendo que se trata de um excelente álbum, que acabou colocado em segundo plano na discografia do Accept por obra dos próprios integrantes da banda e por seus empresários, já que ficaram descontentes com os números das vendas na época.
O Accept havia vendido 2 milhões de cópias do álbum "Balls to the Wall", chegando à posição 74º da Billboard norte-americana. a banda tentou alçar voos comerciais maiores com a superprodução polida à exaustão do álbum seguinte, "Metal Heart", mas as vendas não aumentaram (o álbum alcançou a posição 94ª da Billboard dos EUA).
Os alemães tentaram, então, um retorno às raízes com "Russian Roulette". Dispensaram o produtor responsável pela produção comercial e radiofônica de "Metal Heart" (Dieter Dierks), e resolveram partir para a autoprodução, com engenharia de som do amigo de infância do vocalista Udo Dirckschneider, Michael Wagner.
O resultado é um excelente álbum, com sonoridade mais suja e músicas um tanto quanto mais agressivas que aquelas do álbum anterior.
A faixa de abertura, "TV WAR" já dá as cartas logo no início: heavy metal tradicional, rápido, com palhetadas abafadas, solos inspirados e refrãos marcantes.
A letra é uma crítica à banalização da violência das guerras que são transmitidas pelas emissoras de TV, tirando a sensibilidade do público para as mazelas dos conflitos armados.
"Monsterman" seria um clássico do Accept se estivesse em algum disco anterior, pois é um heavy metal inspirado, apresentando o melhor que o Accept fez em sua carreira.
A faixa-título tenta resgatar a sonoridade do "Balls to the Wall". é uma boa música. Seria chamada de "War Games", mas para não haver confusão com um filme de sucesso da época, que levava o mesmo nome, a banda resolveu alterar para "Russian Roulette", embora o refrão repita diversas vezes a expressão "War Games".
"It´s hard to find a way" segue o estilo radiofõnico do álbum anterior, com a sujeira que caracteriza a produção do "Russian Roulette".
"Aiming High" segue o mesmo estilo da "Monsterman" e poderia figurar tranquilamente no "tracklist" do álbum "Restless and Wild". Destaque para a seção rítmica conduzida pelo brilhante baterista Stefan Kaufmann e pelo excelente baixista Peter Baltes.
"Heaven is Hell" é a mais genérica do disco, tentando mais uma vez resgatar a sonoridade do "Balls to the Wall", com uma letra que fazia críticas à hipocrisia religiosa.
A mesma tentativa de beber na fonte do álbum mais vendido do Accept até então acontece em "Walking in the Shadow".
"Man enough to cry" tem um riff que nos remete imediatamente ao riff de guitarra da música "Man on the Silver Mountain", da banda Rainbow, demonstrando mais uma vez como o guitarrista Ritchie Blackmore era grande influência para os guitarristas do Accept, Wolf Hoffmann e Jörg Fischer.
"Stand Tight" encerra o álbum com sua marcha marcial, tão comum no estilo do Accept.
A banda fez uma turnê de promoção do álbum ao lado das bandas Ratt e Dokken, mas a decepção com as vendas levaram os integrantes do Accept a tomar uma decisão drástica: demitir o vocalista Udo Dirkschneider.
Esta história será tema do próximo vídeo da série ACCEPT - DISCOGRAFIA COMENTADA publicada pelo canal Metal Musikast no youtube.
"Another second do me
Depois do sucesso do álbum anterior ("Balls to the Wall"), que atingiu a marca de 2 milhões de cópias vendidas, a banda Accept queria aumentar ainda mais a sua base de fãs, principalmente nos Estados Unidos. Para isso, a banda resolveu contar com a produção de Dieter Dierks, que já havia ajudado a banda Scorpions a atingir o sucesso na América.
O produtor decidiu que a banda deveria permanecer dois meses numa casa alugada na região de florestas de Vermont (EUA), onde os músicos compuseram as músicas que viriam a formar a "tracklist" do próximo álbum.
As músicas foram gravadas em demos e polidas à exaustão, para receber uma produção voltada para o mercado norte-americano.
Depois da estadia na casa em Vermont, o Accept saiu para 6 meses de turnê pelos Estados Unidos, sendo a banda de apoio nos shows de bandas como Kiss, Iron Maiden e Ozzy Osbourne.
A banda não ficaria indiferente ao contato com o sucesso dessas bandas principais, que faziam shows em arenas para 10 mil a 20 mil pessoas.
A gravação digital (uma das primeiras bandas de heavy metal a gravar em sistema digital foi o Accept) e a intenção de cair nas graças das rádios americanas fez com que a sonoridade do álbum "Metal Heart" fosse suavizada e polida, aproximando, às vezes, o som dos alemães da sonoridade dos ingleses do Def Leppard, que já experimentava grande sucesso com seu álbum "Pyromania", lançado em 1983.
Outra referência para os alemães do Accept eram seus compatriotas do Scorpions, que lotaram arenas nos Estados Unidos nas turnês de promoção dos aclamados álbuns "Blackout" e "Love at first Sting".
O álbum "Metal Heart" abre com a faixa-título, com introdução da Marcha Eslava, de Tchaikóvsky, que logo dá lugar para um poderoso riff de heavy metal tradicional alemão. A música possui um refrão marcante, com os coros tão característicos do som do Accept. No solo, o guitarrista Wolf Hoffmann faz inserção da música "Für Elise", do compositor alemão Beethoven. Toda essa riqueza de detalhes contribuiu para tornar essa música um verdadeiro hino, não só da banda, mas do heavy metal como um todo.
[an error occurred while processing this directive]A letra faz referência à batalha ser humano vs. máquina, lembrando que na época em que foi escrita o assunto sobre corações artificiais e transplantes estava em voga.
Além disso, Wolf Hoffmannn deu entrevistas na época da promoção do álbum dizendo que o tema central do trabalho era uma espécie de afirmação da postura do Accept no sentido contrário aos temas satânicos e brutais que são adotados por algumas bandas de heavy metal. O guitarrista chegou a demonstrar certa satisfação quando a MTV bania vídeos de bandas cujas letras possuem temas brutais, como o Slayer, por exemplo.
O baixista Peter Baltes disse na época que o Accept era uma banda que trazia temas "positivos" em suas letras e que não compactuava com o conceito adotado por bandas de black metal que veiculam mensagens satânicas. Ele afirmou que queria ter um público positivo em torno do Accept e, para conseguir isso, a banda deveria ter mensagens mais positivas em suas letras, longe do satanismo e da brutalidade das bandas de black metal, pois, ainda segundo o baixista, tais bandas levam um impressão errada para o heavy metal.
Outro destaque do disco é a música "Midnight Mover", que possui uma sonoridade mais próxima do hard rock, assumindo aquela abordagem mais comercial e radiofônica mencionada. Outras músicas do álbum têm a mesma sonoridade, como "Up to the Limit" e "Screaming for a love Bite".
Destaque-se, ainda, a música "Wrong is Right", um "speed metal" que, se não fosse pela produção polida, nos remeteria ao metal tradicional do álbum "Restless and Wild".
A curiosidade fica por conta da música "Teach us to Survive", que foi composta para figurar numa trilha sonora de um filme, mas acabou sendo usada no álbum do Accept. Trata-se de uma música influenciada por "krautrock", com um tanto de rock progressivo e um clima de filme do espião 007.
[an error occurred while processing this directive]No geral, o álbum é ótimo e se tornou um clássico da banda. Nos Estados Unidos e na Europa houve quem criticasse o direcionamento mais comercial do som do Accept em "Metal Heart", mas no Brasil acabou se tornando um álbum muito cultuado pelos fãs de música pesada.
A resenha completa pode ser assistida no player de vídeo a seguir
O vídeo é o sétimo da série chamada "ACCEPT - DISCOGRAFIA COMENTADA", que vai abordar curiosidades sobre todos os álbuns da banda que desbravou a cena musical dos anos 70 e 80 para inaugurar um circuito para o heavy metal na Alemanha.
METAL MUSIKAST no Youtube é um novo canal para os fãs de metal encontrarem muita informação e histórias sobre as principais bandas de várias vertentes do metal.
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