Muse: o segundo disco e a definição da identidade.
Resenha - Origin of Symmetry - Muse
Por Hugo Alves
Postado em 16 de novembro de 2015
Nota: 10
Menos de dois anos depois de lançar seu primeiro disco, o notório "Showbiz", o MUSE terminou uma bem-sucedida primeira turnê e se isolou em diversos estúdios a fim de lapidar suas novas canções, compor e gravar seu segundo disco. Eles se revezaram entre os estúdios Ridge Farm, Real World, Astoria (de propriedade do ex-Pink Floyd David Gilmour), Richmond, Abbey Road (do clássico dos Beatles) e Sawmill. Tanto trabalho assim tinha um motivo: a experiência adquirida após anos no underground, gravação de EPs demo, gravação de um disco e turnês, MUSE finalmente definiu sua identidade artística e musical, e era chegada a hora de transpor isso para o CD. Essa definição acarretou numa tímida, porém decisiva mudança na direção musical, algo que veio a expor ao mundo quem era o trio de fato e, diferente do primeiro disco (no qual a banda mostrou de onde veio), a que veio. Sob essa premissa nasceu, a 17 de Julho de 2001, "Origin of Symmetry", hoje um marco na carreira dos britânicos e um disco sempre lembrado com muito carinho e euforia, tanto pela banda como pelos fãs.
O disco começa com "New Born", uma das canções mais comemoradas da banda, que chega intimista, com sua introdução no piano e voz sombria de Matthew Bellamy (voz, guitarra e piano), para logo em seguida desaguar numa canção furiosa sobre um recém-nascido num mundo cheio de coisas ruins com as quais ter de lidar, inevitavelmente. A canção é uma das muitas trilhas sonoras que o MUSE viria a compor e gravar que são perfeitas para o fim do mundo, e este disco como um todo é assim. Esta canção tem tanta força que foi escolhida para ser o segundo single de promoção do álbum. Outra canção que marcou foi "Bliss", a segunda do disco e o terceiro single desta fase. Esta merece destaque pela introdução extremamente técnica e muito bela ao piano, obra de Matthew Bellamy que, neste disco, resolveu mostrar seus dotes como pianista e não ficou devendo a nenhum membro de orquestra por aí. A introdução – que também serve de mola-mestra para a canção, como um todo – lembra muito a música-tema do vídeo-game "Top Gear", muito popular nos anos 1990 e disponível para plataformas como SNES, por exemplo (se não me engano, Matt chegou a dizer numa entrevista que havia relação entre uma coisa e outra, ele se inspirou, algo assim – corrijam-me se eu estiver errado).
E, se nas duas canções anteriores, Bellamy ainda não havia se provado um exímio pianista, em "Space Dementia" ele "chutou o balde", conduzindo toda a canção num andamento bastante complicado para os dedos, mas belíssimo aos ouvidos. E, confirmando minha teoria de que este disco poderia facilmente integrar a trilha sonora para o fim do mundo, temos "Hyper Music", que lembra um pouco de Grunge (considerando que Nirvana foi uma das maiores influências do trio) misturado com Red Hot Chili Peppers. Tão forte é a canção, que veio a ser o quarto single de promoção do disco. Mas a força motriz do disco é, de fato, "Plug in Baby", o trunfo da obra. Essa canção – a primeira escolhida como single para esta nova fase – definiu uma identidade musical para a banda e a catapultou para o sucesso. A introdução soa como um exercício de escalas para aquecer os dedos, mas é muito acertada. Outra coisa que chamou a atenção no disco, mas principalmente nesta canção, é o fato de que o baixo de Chris Wolstenholme é o que segura as canções, o que deixou muito mais espaço para que Matt Bellamy se aventurasse enquanto vocalista e fosse ainda mais criativo, deixando apenas nuances interessantes de guitarra nos versos, muito barulho nos refrãos e o "xeque-mate" fica mesmo para as introduções, pontes e solos. E a bateria de Dominic Howard, como já era de se esperar, é um soco no saco, no melhor sentido da expressão (se é que há bom sentido em levar soco no saco, enfim). Até hoje, "Plug in Baby" é canção obrigatória nas setlists de shows do MUSE.
Outra canção muito amada pelos fãs e que tem força de single, apesar de não o ser, é "Citizen Erased". Muitos fãs consideram esta canção como o pico do disco devido a uma das muitas teorias da conspiração que viriam a permear a carreira do MUSE nos anos que se seguiram a "Origin of Symmetry". A tal teoria diz que até "Plug in Baby", o disco tem canções bastante pesadas e agitadas e em "Citizen Erased" há uma mistura disto com nuances mais leves, soturnas até, e estas seriam o "carro-chefe" da segunda parte da obra. Seja como for, esta canção vai ainda mais além, tendo sido a fonte da qual o trio beberia por pelo menos mais dois discos para compor outras tantas canções. Guitarra distorcida com harmônicos atônicos, um interlúdio calmo e um puta som apocalíptico dão o tom da obra.
"Micro Cuts" é uma das canções do MUSE na qual Matt mais abusa dos falsetes ao cantar, chega quase a soar como canto lírico! O instrumental é poderoso e a cozinha formada por Chris Wolstenholme (baixo) e Dominic Howard (bateria) desce a porrada. O clima, no entanto, é quebrado por "Screenager", canção com levada no violão e que tem provavelmente a sonoridade mais atípica do disco e talvez de toda a carreira dos rapazes, chega a ser difícil de identificar o tom da canção. "Darkshines" começa com jeitão muito Indie, mas misturado com algo de cowboy. Fica com bluesy no meio, mas só pra voltar ao refrão e terminar com aquele "barulho" típico da banda.
Com o disco se encaminhando para o final, o MUSE resolve se aventurar com uma canção cover (provavelmente a única dentro da discografia regular da banda) e a escolhida para esta categoria é uma pepita de ouro que merece parágrafo à parte chamada "Feeling Good". Essa canção foi composta por Anthony Newley e Leslie Bricusse e ficou famosa através da voz de Nina Simone. Desde então, vários artistas se aventuraram com esta canção, mas pode ser dito que o MUSE a transformou em uma de suas canções sem, no entanto, desrespeitar a versão original. Um cover de luxo, daqueles que chutam os rabos de todas as outras tentativas. Matt dá um show de voz e criatividade (a parte do megafone é simplesmente genial). Não obstante, tornou-se por muito tempo uma das obrigatórias nos shows.
"Megalomania" vinha com título perfeito para o que seria o MUSE dali para a frente. Parece que eles sempre tinham uma ideia do que seria do próximo disco e metem tudo na última do disco em questão. É um lamento desesperador de quem sabe que o fim ainda não teve seu desfecho, mas que já começou.
Com "Origin of Symmetry", o MUSE finalmente mostrava que tinha algo a dizer, e ordenava que parássemos e ouvíssemos. O disco chegou ao terceiro lugar nas paradas do Reino Unido, e surpreendeu com o segundo lugar das paradas na França e na Bélgica, além do quinto lugar na Itália e sétimo na Áustria. Esse disco marcou a mudança musical na banda, com o baixo de Wolstenholme mandando nas canções e dando espaço para que as mesmas fluíssem muito melhor. Muito mais do que isso, esse é o disco definitivo do que o MUSE intencionava. Eles queriam dominar o mundo. Hoje, 14 anos depois, continuamos a acompanhá-los e, se eles ainda não alcançaram esse objetivo, com certeza estão muito mais próximos disso, e "Origin..." tem grande parte nisso. Num momento brevemente posterior, a banda continuou a seguir sua fórmula inovadora e certeira e coisas maravilhosas começaram a acontecer em sua carreira.
Mas este futuro fica reservado para uma nova resenha...
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