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Poets of the Fall: Você não sabe o que está perdendo!

Resenha - Jealous Gods - Poets of the Fall

Por Ricardo Pagliaro Thomaz
Postado em 27 de setembro de 2014

Nota: 9 starstarstarstarstarstarstarstarstar

O grupo finlandês Poets of the Fall, um dos grupos de pop rock mais expressivos da atualidade chega em seu sexto álbum de carreira com algumas propostas musicais que, quem acompanha a banda já conhece e algumas coisas novas no cardápio. E quando eu digo 'coisas novas', pode ter certeza de que você que, assim como eu, é um fã confesso do trio, não se decepcionará. Existem bandas que estão por aí simplesmente por estarem, bandas e artistas rotuladas pela mídia como a "next best thing" que você passa dias e dias a fio tentando explicar porque esses caras ficaram remotamente famosos e não achará uma resposta pra isso, e existem bandas por aí que emplacam disco bom após disco bom, com a qualidade musical alcançando os mais altos picos ou pelo menos chegando perto de alcançar esses picos e sequer saem do anonimato de seu país, ou então chegam a uma certa popularidade em outros países e estagnam nessa popularidade.

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Acreditem, quem pensa que o Poets é bastante conhecido lá fora dará com os burros n'água! Há uns dois anos e meio atrás eu viajei para os EUA e visitei a famosa loja Best Buy em Orlando, quando fui perguntar a um vendedor se a loja por acaso tinha discos da banda, e a primeira reação do vendedor foi me perguntar "quem?", deixando claro seu completo e total desconhecimento pelo grupo. Perguntei para mais um vendedor do estabelecimento e mencionei novamente o nome do trio para mais umas duas pessoas nos arredores, e ninguém tinha a mais remota ideia sobre qual banda eu estava falando. Resignado, eu simplesmente mandei um "você não sabe o que está perdendo" para uma das pessoas com quem falei e acabei receitando o grupo, uma vez que o cara parecia estar bastante aberto às minhas recomendações. Saí dali me sentindo como se estivesse naquele episódio dos Simpsons onde o Homer pergunta a todos quem já havia assistido o filme Tron.

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Portanto, meus queridos, a síndrome da atração pela falta de qualidade musical é uma doença que não acomete somente o Brasil, mas também outros lugares do globo. Quem me conhece sabe que eu sou um cara bem tranquilo no quesito goste do que quiser e não deixe as pessoas dizerem do que tem que gostar, mas honestamente, me dá cãibra no cérebro às vezes tentar imaginar porque as pessoas escolhem Lady Gaga ao invés de algo com qualidade. Enfim...

Jealous Gods, lançado em vários formatos, incluindo o digital pela loja iTunes agora no dia 19 de Setembro de 2014, como sempre, com muita expectativa dos fãs, nos indica novamente uma banda coesa, com um conteúdo lírico digno de reconhecimento e capaz de ainda nos encantar com suas diversas paisagens sonoras, algumas bastante conhecidas e que sempre valem a pena serem revisitadas e como anunciado, outras um pouco diferentes do que esperávamos. É o disco em que o trio mais apostou na veia pop em comparação com os anteriores, mas há sim, as raízes roqueiras pesadas pela qual conhecemos a banda lá atrás. Agora, não é segredo algum para aqueles que me leem já há algum tempo que minhas opiniões sobre o trio finlandês sempre são entusiasmadas e cheias de virtuoso encantamento pelo som deles; mas tento sempre manter o equilíbrio entre o fanboyismo e a opinião concreta. Não será diferente aqui, ou assim espero.

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O disco abre com "Daze", o primeiro single do novo álbum, lançado em 22 de Agosto, e como todo single, tem aquele apelo radiofônico de costume, deixando algumas pessoas com a expectativa dobrada pelo conteúdo do álbum ser mais promissor. Particularmente eu até gostei da música, certamente que após escutar apenas os 1:30 minutos que a loja da Apple disponibilizou pelo aplicativo iTunes já havia dado para perceber que haveriam muitas outras promessas melhores contidas na bolacha. Enfim, boa abertura, Marko exagera um pouco demais aqui em seus falsetes, eu prefiro até que ele cante com sua voz habitual, mas isso não me incomoda, sinceramente, sem contar que o vídeo promocional que acompanha a música é belíssimo, um daqueles vídeos hiper-elaborados, bastante remanescente dos tempos da banda em seu segundo álbum, quando fizeram o fantástico vídeo para "Carnival of Rust" que ganhou até prêmios.

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Vale também lembrar da poética das letras que é marca registrada do trio, e aqui parece que eles se superaram novamente nesse quesito. E isso, para uma banda originária de um país onde o inglês não é a língua oficial é dizer muita coisa, arrisco ainda ir mais longe e afirmar que o Poets of the Fall é o grupo que mais elabora suas letras, eles poderiam simplesmente fazer como diversas bandas por aí e atentar mais ao instrumental do que às letras de fato, mas é um dos poucos grupos que encontra o equilíbrio perfeito entre melodia e lírica. Isso fica totalmente impresso neste novo trabalho, uma vez que a faixa título é liricamente linda, tratando dos temas que o trio adora abordar como a escuridão e a luz relacionado à psique humana, sempre construindo hipérboles poéticas que deleitam os ouvidos de quem aprecia debulhar significados metafóricos em poemas, aliás, há inclusive aqui neste álbum a abordagem bíblica que discute a dicotomia humana, o problema de identificação entre meros mortais e divindades de forma bela e pitoresca, não é nenhuma surpresa portanto a escolha do título do álbum, uma vez que um dos versos da faixa título declara:

"we won't go down as frauds (Nós não acabaremos como fraudes)
Like jealous gods (Como deuses ciumentos)
We are the perfect flaws (Somos as falhas perfeitas)
Perfect with our flaws (Perfeitos com nossas falhas)"

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É de se impressionar o apuro com as palavras entre esses versos, não soa como algo que simplesmente tacaram ali a esmo, não, mas como algo que foi retrabalhado, inúmeras vezes, trocando termos quando necessário, é um trabalho lírico realmente de respeito, da escolha da palavra ideal, da musicalidade verbal, da forma e estética que irão usar para passar uma mensagem que poderia simplesmente ter sido passada de forma menos rica, mas está aqui para nós passada de forma cuidada, com esmero. Claro, seria idiotice de minha parte se dissesse que é o supra-sumo da poética, isso seria o mesmo que desconsiderar séculos e séculos de evolução estética do poema, no entanto o excelente trabalho do trio finlandês merece nosso reconhecimento. Em suma, coberta por uma manta musical fantástica e rica, o grupo destila sua poética de forma inspirada e inspira com isso seus ouvintes mais dedicados.

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"Rumors" é outro exemplo desse cuidado. É uma canção pop upbeat com uma letra muito bacana e instrumental ótimo. Vale ressaltar que, assim como o grupo é cuidadoso em suas letras também atenta este mesmo cuidado em suas melodias. Aqui nesta faixa, outra de minhas favoritas do novo disco, o clima introspectivo e a introdução com tom etéreo casa perfeitamente com a mensagem de existência efêmera do ser humano.

Então a banda resolve mudar um pouco o tom do disco a partir da faixa "Brighter Than the Sun", voltando para uma sonoridade mais pop e aparentemente mais acústica, pelo menos até certo momento, com a letra falando sobre uma sempre constante em qualquer grupo de pop rock, o amor. Mas não é aquele tipo de canção galhofa, brega sobre amor, estamos falando de Poets of the Fall, há o trabalho lírico mais elegante que sempre foi marca registrada do trio. Talvez uma das poucas vezes que fizeram uma letra que acabei achando mais simplória foi em "Cradled in Love", faixa single do quinto álbum do trio, mas é hit radiofônico, já se espera algo mais voltado para as massas, não chega a ser brega, mas não é um grande destaque lírico. Aqui em "Brighter Than the Sun" as coisas já começam a ficar mais interessantes para o guitarrista Olli Tukiainen, que passará a ser um grande destaque no álbum. Não que ele nunca tenha se destacado, Olli é um guitarrista de expressão, ele tem a rara característica de saber dosar virtuosismo e bases, o cara vem evoluindo de disco em disco em seu instrumento, como compositor de boas frases de guitarra e solos, merece muito o destaque dado a ele neste álbum, e Jaska Mäkinen, o guitarrista de turnê, mantém a parceria com Olli na guitarra de maneira bastante articulada, os dois formam um grande duo sempre que se destacam nos shows. O corinho do "oh-oh" antes do solo de guitarra também cai muito bem, especialmente ao vivo e será um ótimo catalisador para que o público interaja nos shows.

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"Love Will Come to You", uma balada mais acelerada, mostra o trio aqui tentando reinventar um pouco seu som, essa pode ser considerada uma daquelas novas paisagens sonoras, trazendo bastante influência do folk e do europop e criando belas linhas acústicas de violão. E falando em novas paisagens sonoras, temos uma grande novidade aqui no disco. Marko Saaresto e sua bela e imponente voz, pela primeira vez deixa o microfone de lado para que os instrumentistas da banda se apresentem em uma jam instrumental intitulada "Rogue", sim, a primeira composição instrumental do grupo, algo que eu espero sinceramente que continuem explorando no futuro, essa faceta instrumental que anteriormente não havia sido explorada, pois a banda está repleta de músicos do mais alto calibre, capazes de compor e criar temas incríveis como este aqui, em que Olli e Jaska compõem um duo imbatível nas guitarras, mostrando muito do lado "Rush" do grupo, Jani Snellman, o baixista destila linhas de seu baixo carregado com um fraseado ótimo, aliada às guitarras, ao tecladista Markus "Captain" Kaarlonen com suas bases e efeitos que tecem o cobertor sonoro para o grupo interagir e ao excelente e preciso trabalho de bateria de Jari Salminen, todos em grande forma instrumental compondo poesia sonora de altíssima qualidade. Ponto positivo para Marko aqui que saiu um pouco de cena para que seus amigos nos presenteassem com esse incrível trabalho instrumental, cheio de fraseados interessantes, virtuose e feeling.

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Então a banda resolve retomar o tom sóbrio com que o trabalho veio sendo apresentado até a terceira faixa e nos apresenta "Rebirth", uma balada basicamente com violões, o teclado de Captain e chocalhos no fundo acompanhando o ritmo. Uma música bastante introspectiva, lenta, linda, com uma letra beirando o discurso de proporções épicas em termos de o que se deve fazer para se provar de fato o amor de alguém, algo intangível para muitas pessoas. Em "Hounds to Hamartia" temos a narração moderna de um caso de amor que evoca tragédia grega; 'Hamartia' é um termo trazido do livro "A Poética", de Aristóteles, que significa basicamente um erro de julgamento que leva o herói a cometer um trágico engano, como se pode notar nos versos:

"No more tragic love for sale in the crooked gallery (chega de amor trágico a venda na galeria distorcida)"

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Então o amor como descrito nos versos passa a ser enxergado como algo que ofende os deuses, um pecado gravíssimo, denominado "Hubris" na mitologia grega, novamente a pegadinha com o título do álbum, como no verso:

"Just like magic Hubris leads, leads its hounds, hounds to Hamartia (Como mágica, Hubris leva seus miseráveis a Hamartia)"

E então eu retomo a discussão sobre falta de qualidade musical atual, presente na indústria e questiono como é possível que algo como Lady Gaga (ou demais sensações da modernidade) pode estar no topo das paradas e não a música pop que evoca tragédia grega de forma tão simbólica? Por que algo tão rico e com tanto conteúdo não explode nas paradas do mesmo jeito que o fast food que domina as rádios hoje em dia? Pensemos nisso, enquanto caminhamos para o final.

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Em "Clear Blue Sky" temos aquele som clássico tão característico do Poets do começo e outra letra bacana evocando nostalgia para, logo após a banda nos apresentar a mais um novo horizonte musical e, paralelamente a música que acabou dividindo um pouco as opiniões dos fãs, pelo menos na direção musical que tomou, "Choice Millionaire", muito remanescente do europop, aliás, totalmente remanescente do europop, dando a impressão de que o grupo pretendeu flertar com o tipo de som mais popular, mas há sempre a máscara por trás de tal flerte. Observe os seguintes versos:

"So put a lacquer on your hunger (Então ponha um laquê em sua fome)
Parade the sky that you're under (Desfile no céu acima de você)
Without heedless impressions (Sem impressões descuidadas)
No one needs more confessions (Ninguém precisa de mais confissões)"

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Uma análise realmente descuidada da música dá mesmo a impressão de que o grupo está caminhando em terreno perigoso, mas após uma olhada de perto aos versos tão certeiros na crítica da luxúria e da aparência sem sentido que a mídia nos obriga a engolir todo dia, percebemos as reais intenções dessa aproximação tão forte com o popular. Ponto para o trio que trouxe o assunto a tona de maneira tão bacana e elegante. Não vou mentir, quando ouvi o sample do iTunes realmente tive uma impressão negativa também, mas me deixei levar pela aproximação com os vocais meio "rapeados" do europop, afinal, poderia ser surpreendido; e o Poets me convenceu de que, como diz a frase do verso, não precisam de mais confissões, já me provaram por A mais B que irão me surpreender de alguma forma.

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O que nos leva à faixa que fecha o disco, "Nothing Stays the Same", que termina o disco de forma bem melancólica, ao ouvir a letra, me imaginei em um daqueles pesadelos malucos do Max Payne em que tudo parece estar fora do lugar, um ambiente distópico, desfigurado, até que Olli, o bom samaritano das guitarras expressa seus fraseados no instrumento de forma épica em meio à essa distopia, fechando o disco com o sabor delicioso de ter escutado mais um álbum excelente do trio e que, como de costume, me deixou com sentimentos divididos. Feliz em ter constatado que o Poets retornou com mais um trabalho fabuloso nas mãos e melancólico de que tamanho esmero musical tenha passado tão rápido e tenha parecido tão curto.

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Falei demais novamente, não é? Pois é, mas creio que meu falar está em devida proporção com a grande qualidade musical que a banda nos oferece aqui. Falei tudo isso simplesmente para dizer o seguinte: se você já conhece o Poets of the Fall, então vá atrás de mais esse lançamento do trio; se não conhece, retomo minha fala ao cara de Orlando: você não sabe o que está perdendo!

Jealous Gods (2014)
(Poets of the Fall)

Tracklist:
01. Daze
02. Jealous Gods
03. Rumors
04. Brighter Than the Sun
05. Love Will Come to You
06. Rogue
07. Rebirth
08. Hounds to Hamartia
09. Clear Blue Sky
10. Choice Millionaire
11. Nothing Stays the Same

Selo finlandês: Insomniac, Playground

Discografia anterior:

- Temple of Thought (2012)
- Alchemy Vol. 1 (2011)
- Twilight Theater (2010)
- Revolution Roulette (2008)
- Carnival of Rust (2006)
- Signs of Life (2005)

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Site oficial:
http://www.poetsofthefall.com

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Sobre Ricardo Pagliaro Thomaz

Roqueiro e apreciador da boa música desde os 9 anos de idade, quando mamãe me dizia para "parar de miar que nem gato" quando tentava cantarolar "Sweet Child O'Mine" ou "Paradise City". Primeiro disco de rock que ganhei: RPM - Rádio Pirata ao Vivo, e por mais que isso possa soar galhofa hoje em dia, escolhi o disco justamente por causa da caveira da capa e sim, hoje me envergonho disso! Sou também grande apreciador do hardão dos anos 70 e de rock progressivo, com algumas incursões na música pop de qualidade. Também aprecio o bom metal, embora minhas raízes roqueiras sejam mais calcadas no blues. Considero Freddie Mercury o cantor supremo que habita o cosmos do universo e não acredito que há a mínima possibilidade de alguém superá-lo um dia, pelo menos até o dia em que o Planeta Terra derreter e virar uma massa cinzenta sem vida.
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