Iron Maiden: O Sétimo Filho do Sétimo Filho
Resenha - Seventh Son of a Seventh Son - Iron Maiden
Por Ronaldo Celoto
Postado em 03 de janeiro de 2014
I – Introdução: Eis que o sétimo filho do sétimo filho chega ao mundo. Em mitologias e lendas mais antigas, ele poderia ser comparado a um lobisomem ou um vampiro. Para os antigos profetas, místicos e religiosos, ele seria o enviado, o escolhido, o responsável por atribuir a salvação a todos, ou, a destruição de todos. Ele nasceria, na ótica destes, com poderes sobrenaturais capazes de trazer bênçãos ou catástrofes, cura e clarividência, castigo e maldição, dependendo do lado que estes poderes se desenvolvessem. Começa então, a recontagem da batalha de sete anjos e sete demônios, para assumir o controle da alma desta criança. Começa aqui a saga do disco conceitual "Seventh Son Of a Seventh Son", do IRON MAIDEN, não por acaso, o sétimo álbum gravado pela banda, em um momento mágico de sincronia e sonoridade.
II – A Natividade: A Criança da Lua
"Sete pecados mortais
Sete maneiras de vencer
Sete caminhos santos para o inferno
E a sua jornada começa".
E assim, BRUCE DICKINSON anuncia que os portais do inferno estão a se abrir para, primeiro, lutar para impedir que o "enviado" viesse ao mundo, nesta canção avassaladora.
Evidentemente, a estrada para a perdição começa a manifestar-se, quando o próprio LÚCIFER, em pessoa, avisa à genitora da criança:
"Eu sou ele, aquele que não nasceu
O anjo caído que vigia você
Babilônia, a prostituta escarlate
Vou minar sua gratidão
Não se atreva a salvar seu filho
Mate-o agora e salve os infantes
Seja a mãe de um recém-nascido estrangulado
Seja propriedade do diabo... Lúcifer é meu nome"
Assim como fizeram os faraós no antigo Egito com os primogênitos, a ideia do demônio era matar a todos os nascidos naquele mesmo instante. E o demônio continha a alertar, agora que não conseguiu impedir que a criança nascesse, sob o signo lunar.
"E se você tentar salvar a sua alma
Eu irei atormentá-lo - você não irá crescer
A cada segundo e respiração que passa
Você estará tão sozinho
que sua alma irá sangrar até morrer"
E então, LÚCIFER decide e confessa, que, quando por ventura houver um descuido do arcanjo GABRIEL, ele irá agir:
"Sete anjos, sete demônios brigam por sua alma
Quando Gabriel se encontra em repouso
Esta criança nasceu para morrer"
E, ao final, ele proclama:
"Criança da lua - ouça a mandrágora gritar
Criança da lua - rompa o sétimo selo*
Criança da lua - em breve você será minha
Criança da lua - pegue na minha mão esta noite"
*Observação: o sétimo selo está presente durante o desenvolver do disco. Evidentemente, a conotação bíblica que remete às profecias acaba também por se misturar à saga aqui contada.
III – Infinitos São Todos os Sonhos
O poeta MARIO QUINTANA certa vez construiu versos mágicos acerca dos sonhos:
"Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo".
Sim, vivemos em um mundo que mais parece um louco sonho, carregado de tristezas, dores, traições, guerras, ilusões. Imagine, por um instante agora, amigo leitor e fã do IRON MAIDEN, o personagem principal desta saga, o "enviado", já com poucos anos de idade, e, já ciente de que possui alguns poderes para além do bem e do mal. Imagine-se por um instante, dentro da mente e do coração deste ser, a sua forma de observar o mundo, e, o seu medo de adormecer e sentir pesadelos e temores, que, na verdade, são as mensagens de clarividência, mas que para ele, ainda não podem ser concebidas de forma a traduzir a sua missão, e, sim, ainda o assustam. Começa aqui uma das mais belas canções do IRON MAIDEN em toda rica sua história.
A ansiedade e a agonia do sétimo filho são aqui, destiladas de maneira primorosa, tanto instrumental, com a bela introdução melódica das guitarras de MURRAY/SMITH, quanto pelo baixo magnificamente carregado de HARRIS, a bateria suavemente encaixada de NICKO e a voz sussurrante de BRUCE no início, a dizer:
"Sonhos infinitos, eu não posso negá-los
O infinito é difícil de se compreender
Eu não posso ouvir aqueles gritos
Mesmo nos meus sonhos mais selvagens
Acordando sufocado em suor
Com medo de dormir novamente
Pois os sonhos podem começar mais uma vez".
E assim, a natureza lírica e introspectiva da canção alcança momentos épicos de uma instrumental apoteótica e uma voz espetacular. Emocionante, diga-se de passagem!!!
"Mesmo tendo atingindo novas intensidades
Eu prefiro as noites sem descanso
Elas me fazem indagar, me fazem pensar
Existe mais que isso, eu estou no extremo
Não é o medo do que está além
É só que eu não devo responder
Eu tenho uma curiosidade, um desejo ardente,
Mas gostaria eu de ir tão longe?".
Sim, ele está cansado, carregado de vidências e imagens que não deseja presenciar mais.
Então, naquele momento, o sétimo filho clama, em tom de lamento, aos céus:
"Ajude-me. Ajude-me a encontrar
meu verdadeiro eu, sem ver o futuro.
Salve-me, salve-me de torturar
a mim mesmo até dentro dos meus sonhos
Tem de haver mais do que isso
Ou diga-me porque nós existimos
(...)
Reencarnar, jogar o jogo
Novamente e novamente e novamente".
Na minha modesta opinião, a canção "Infinite Dreams" é o melhor momento do disco!!! Momento crucial, para que, em seguida, o jovem decida, pelos poderes que presencia dentro de si (encarados como loucura que o perseguem), buscar um profeta, um guru, uma espécie de YODA (parafraseando STAR WARS) que lhe responda as perguntas e lhe mostre o caminho. Nasce então, a próxima canção, que trata desta jornada em busca de seu guia.
[an error occurred while processing this directive]IV – É Possível Jogar com os Loucos?
Uma pergunta mais do que crucial, que, entre cavalgadas de baixo e guitarras, explode em mais uma pequena mini-saga a ser vivida pelo sétimo filho, na aventura em tom de diálogo com uma espécie de "xamã", a quem ele se abre sorrateiramente:
"Dê-me o senso de perguntar
Perguntar se eu sou livre
Dê-me o senso de perguntar
De saber que eu posso ser eu mesmo
Dê-me a força para manter a cabeça erguida"
E o diálogo então, encontra sua resposta, de forma irônica e aparentemente duvidosa, antes da revelação final:
"Posso eu brincar com a loucura?
O profeta olha em sua bola de cristal
Posso eu brincar com a loucura?
Não há visão nenhuma lá afinal
Eu posso brincar com a loucura?
O profeta olhou e riu de mim
Eu posso brincar com a loucura?
Ele disse: você é cego demais para ver".
Mas o "enviado" duvida de suas palavras, e, sente neste profeta certo charlatanismo, pois tudo que ele, enquanto jovem cheio de dúvidas e anseios esperava naquele momento, era uma resposta em forma de ensinamento. Zangado, ele retruca ao profeta, e, ambos iniciam um embate de palavras:
"Eu gritei alto para o homem velho
Eu disse: não minta, não diga que não sabe,
Eu disse: você pagará por sua brincadeira,
Neste mundo ou no próximo.
Oh, então ele me encarou com um olhar frio
E o fogo do inferno queimou em seus olhos
Ele disse: você quer saber a verdade, filho?
Eu vou te dizer a verdade...
...Sua alma vai arder em um lago de fogo¨
E assim, em meio a este furor entre ambos, a pergunta que dá nome à canção continua sem respostas, e, a música se finda. Não é a melhor canção do álbum, mas tornou-se hit entre os fãs e virou single para divulgação do trabalho, e, teve vídeo oficial lançado.
V - A Canção Que Nunca Foi Escrita
É neste momento que, de forma muito rápida, a temática da saga migra do embate para o amor proibido entre o "enviado" e a filha deste profeta. Na minha modesta opinião, poderia haver, ainda mais uma canção depois de "Can I Play With Madness", para criar uma ponte entre a forma como ambos se conheceram, até chegar a vingança do pai, que, temendo pelo sofrimento da filha (por saber o trágico destino do jovem que com ele travara uma discussão), acaba por mata-la. E, com isto, teríamos em "The Evil That Men Do" (a próxima canção que comentarei) a conclusão em forma de lamento, do jovem em prantos pela injustiça sofrida por sua amada. Mas enfim, é uma opinião pessoal, e, já tentei, por gostar do disco, até mesmo escrever uma letra e imaginar uma melodia para esta música que contasse a história entre ambos. Enfim. É algo que lamento e lamentarei para sempre, neste álbum, pois eu o adoro, e, fica impossível para a minha pessoa, não desejar que exista uma ponte de ligação entre as canções, pois, afinal, estamos a falar de uma bela história de amor. E um amor impossível e covardemente retirado de dois corações. Os mais "raivosos" leitores poderão ver isto como algo "inconcebível" para o IRON MAIDEN, construir uma canção que falasse de um amor impossível, mas é preciso ser inteligente neste momento, e, separar a ideia de que romance é coisa de "baladinhas" e entender que as grandes tragédias literárias (das quais HARRIS e DICKINSON leram a maioria delas) são concebidas por grandes paixões e duelos de amor e ódio. E que é possível construir, no heavy metal, uma temática destas de forma grandiosa, a exemplo do que já foi feito com "Wasting Love".
Feita esta observação, retornemos então à análise do álbum nesta resenha.
VI – A Morte é uma Sinfonia Por Demais Shakespeariana
Eis que "The Evil That Men Do", outra canção maravilhosa, pesada e cavalgada pelo peso do baixo de HARRIS a ditar a canção, com uma bela introdução (como sempre) de guitarras melódicas de uma das maiores duplas de guitarristas da história do heavy metal, surge para contar o mencionado lamento deste jovem sétimo filho, ao perder a amada, uma belíssima jovem com instintos de guerreira (imagem abaixo), vítima do trágico assassinato cometido pelo próprio pai, o profeta que com ele teve um duelo de palavras.
O título da canção foi formulado a partir de MARCO ANTONIO, enquanto discursava abordando a multidão de romanos depois de CÉSAR ser assassinado na peça de WILLIAM SHAKESPEARE, chamada de JULIUS CAESAR. A frase é a seguinte:
"O mal que os homens fazem vive depois deles; O bem é muitas vezes enterrado com seus ossos. — Ato 3, cena 2, O Fórum¨.
BRUCE normalmente conta esta passagem no início da canção, como fez em diversas ocasiões, inclusive nos shows da banda no Brasil. E, nesse sentido, SMITH/DICKINSON/HARRIS acertaram em cheio na influência, pois exatamente neste instante, ao ver a amada morta de forma cruel e insana, o personagem central, o sétimo filho, o "enviado" encontra-se perdido e em crise existencial, a perceber que a humanidade é má. E então, ele se aproxima, cada vez, do círculo do fogo, movido pela dor e pela revolta.
"O amor é uma navalha
E eu caminhei por sobre aquela lâmina prateada
Eu dormi na poeira com a sua filha,
Com os seus olhos todos vermelhos pelo esquartejamento de sua inocência.
E eu rezarei por ela,
Gritarei seu nome alto,
Eu sangraria por ela,
Se ao menos eu pudesse vê-la agora.
Vivendo no fio da navalha
Balançando no abismo
Você sabe, você sabe!
O mal que os homens fazem vive para sempre!".
Mergulhado num oceano de lágrimas, sangue e fúria, o sétimo filho aproxima-se então, das chamas que tanto o atormentam, e, agora, vê-se seduzido por elas, com requintes de vingança.
"Círculo de fogo,
Meu batismo de alegria parece terminar
A sétima ovelha morta,
O livro da vida está aberto diante de mim
E rezarei por você
E algum dia talvez eu retorne
Não chore por mim
No ‘além’ foi onde aprendi".
Sim, agora o sétimo filho já invocou as forças do além. Foi através do além que ele encontra a sua resposta, o equilíbrio dos seus poderes.
E é aqui que ele, literalmente, encontra a sua identidade, que será traduzida a partir da próxima canção: "Seventh Son Of a Seventh Son".
VII – O Sétimo Filho do Sétimo Filho
Mais uma belíssima canção impulsionada pela poderosa introdução, longa e cadenciada de forma proposital, para evoluir instrumentalmente de acordo com cada parágrafo da letra, que conta, um após o outro, uma espécie de autobiografia do que foi vivido até agora pelo "enviado", senão vejamos.
"Aqui eles resistem, todos irmãos
Todos os filhos divididos eles cairiam
Aqui aguardam o nascimento do filho
O sétimo, o santo, o escolhido
Aqui o nascimento de uma linhagem perfeita
Nasce o que cura, o sétimo, a vez dele
Abençoado sem saber, a medida que sua vida se descortina
Vagarosamente expondo o poder que ele detém
Sétimo filho de um sétimo filho".
Evidentemente, temos "o nascimento de uma linhagem perfeita", descrito na letra, e, "o sétimo, o santo, o escolhido", também descrito, como uma alusão a "Moonchild", e, em seguida, as expressões "abençoado sem saber" e "vagarosamente expondo o poder que detém" para recriar os dons que ainda o assustavam em "Infinite Dreams".
Na continuidade, mais uma alusão, agora a "Can I Play With Madness", os progressos e dúvidas do jovem iniciado, e, o final trágico e a sequência com "The Evil That Men Do", onde o jovem toma ciência de seus poderes e de repente, se vê na condição de usa-los, e, este é o temor, tanto para os céus, quanto para as legiões de demônios:
"Então eles viram o progresso que ele fazia
O bem e o mal, qual caminho ele irá tomar,
Ambos tentando manipular
O uso de seus poderes antes que fosse tarde demais".
De maneira épica, a canção parece ressonar uma batalha de anjos e demônios, pois, durante um dado momento, BRUCE narra, em meio a silêncio da banda e o exultar de um teclado:
"Hoje nasce o sétimo
Nascido de uma mulher o sétimo filho
E ele, por vez, filho de um sétimo filho
Ele tem o poder para curar
Ele tem o dom da segunda visão
Ele é o escolhido
Que assim seja escrito
Que assim seja feito".
E, em seguida, um coral mágico que mais parece traduzir divindades é cortado pelo solo fantástico dos guitarristas, e, o clima que ecoa perante a canção parece nos transmitir a um campo de batalha onde legiões se evocam e se amaldiçoam, e, se enfrentam para que um deles possa dizer, de forma mais alta, quem cuidará da alma do sétimo filho, para que a profecia enfim, seja cumprida. E então, o sétimo filho decide usar suas forças para cumprir o bem para com todos, ao passo em que a canção se aquieta, até o seu desfecho.
Uma música perfeita, em todos os sentidos!!! Vejam a seguir, a magnífica apresentação contida no excelente registro MAIDEN ENGLAND.
VIII – O Despertar da Profecia
Uma linda apresentação lírica de guitarras e teclados anuncia o aproximar da profecia. O sétimo filho agora é um homem com poderes para serem aplicados a fazer o bem. Ele decide peregrinar (a exemplo do que fizeram CRISTO e tantos e tantos personagens tidos como messiânicos na história da humanidade) e chega a um vilarejo, mas lamentavelmente, nenhum ser humano ao seu redor acredita nele quando ele prevê um desastre a ocorrer.
"Agora que eu sei que a hora certa chegou
Minha profecia certamente será verdadeira
O desastre eminente agiganta-se
E a vila inteira está condenada
Por que vocês não me escutam?
É tão difícil de entender
Que eu sou o verdadeiro sétimo filho
Sua vida ou morte de mim depende
Sofrimento e dor, desastre eminente
Almas gritando, a risada do demônio
Ouça o grito dos sete silvos
Lúcifer sorri, olha e espera".
Mais um belo momento de vocalização de BRUCE, e, a canção se arrasta em forma de uma verdadeira batalha. Poderia, pela temática, ser tão grande e épica quanto "Rime Of The Ancient Mariner", mas acabou ser mais curta e ter menos de cinco minutos. Nada que a diminua, ao contrário, é mais um belíssimo momento do MAIDEN, como em todo disco.
Uma vez mais, ele tenta, agora sob a ironia de LÚCIFER, que anteviu que ele pecaria já na primeira canção ("Moonchild"), e, todos os acusam de ser primeiro, um falso profeta, e, depois, o culpam pelo ocorrido.
"Eu tomarei suas vidas em minhas mãos
Seu destino, sua sorte está em minhas visões
Ouçam o que eu digo e vocês verão
O que acontecerá, por favor me ouçam
Agora que eles vêem que o desastre já ocorreu
Eles colocam toda a culpa em mim
Eles sentem que eu trouxe uma maldição
Não sabem eles que o tormento
Continua comigo, sabendo que eu ando sozinho
Pelos olhos do futuro eu vejo
Eles nem mesmo sabem o que é o medo
Eles não sabem que sou eu o amaldiçoado".
Desolado diante do vilarejo destruído, ele sente que caminha cada vez mais, para o destino trágico.
Ainda assim, ele persiste, tentando aumentar ainda mais seus poderes, na tentativa de ajudar mais pessoas, mesmo que ele continue a ser desacreditado por todos.
IX – O Terceiro Olho
E, através da ampliação de seus poderes, a clarividência começa a crescer de tal forma, que ele vive em dois mundos e confunde-se entre o real e o imaginário, assustando-se, e, chocando-se com os seus próprios limites. Começa aqui uma das melhores canções do disco, a fantástica "The Clairvoyant", que, a exemplo de ¨Infinite Dreams¨ e ¨Seventh Son¨, também foi composta inteiramente por HARRIS.
Uma introdução de baixo marca o ritmo, e, em seguida, a bateria, as guitarras incendiárias e os teclados rompem com um novo petardo, rápido e direto.
E a letra? Autobiográfica (sob a ótica do sétimo filho) em forma de clamor e luta de um homem destinado a ser herói, tentado por anjos e demônios, e, desacreditado, assim como um dia foi JESUS, por seu próprio povo.
"Sinto o suor escorrer da minha testa
Sou eu ou são sombras que
Dançam na parede
Isso é um sonho ou é o presente
É uma visão ou normalidade que vejo
Diante de meus olhos
Eu pergunto por que, eu pergunto como
Parece que as forças ficam mais fortes
A cada dia
Eu sinto uma força, um fogo interior
Mas eu estou amedrontado eu não estarei mais preparado para controlar isto
Existe tempo de viver e tempo de morrer
Quando é a hora de encontrar o criador
Existe um tempo para viver, mas não é estranho
Que assim que você nasce você esteja morrendo".
Uma palavra para definir a canção: ES-PE-TA-CU-LAR !!!
X – A Morte Abençoa Os Que Nela Se Abraçam
No final do filme "Blade Runner", o replicante ROY, vivido brilhantemente por RUTGER HAUER, conclui: "Eu vi coisas que vocês nunca acreditariam. Naves de ataques em chamas perto da borda de Orion. Vi a luz do farol cintilar no escuro, na Comporta Tannhauser. Todos esses momentos se perderão no tempo como lágrimas na chuva. Hora de morrer".
É com este mesmo ressonar, que o sétimo filho percebe que está a morrer. LÚCIFER sorri novamente, e, assim como ele terminou a primeira canção "Moonchild" avisando: "Eu te verei amaldiçoado no final da noite", ele inicia a última conclusão da saga, dizendo: "O demônio em sua mente te capturará na sua cama à noite".
Uma citação digna de OSCAR WILDE e seu clássico DORIAN GRAY. Mas, diferentemente de alguém que vende sua alma ao diabo em troca de beleza, este sétimo filho, enlouquecido, se vê falecer diante do excesso de vontade e poder que ele quis emanar em prol de seu mundo. Há uma alusão bíblica clara aqui, ao CRISTO e a todos os líderes que, de alguma forma, foram mortos e esquecidos por seu povo. A metáfora da traição humana, a maçã de todos os sarcasmos, segurada nas mãos do demônio para ferir o "enviado".
Mas, mesmo diante da traição humana, o simples elevar de poderes, mesmo sabendo dos perigos e riscos, não consistiria também, em um pecado?
Ou melhor, em um dos sete pecados? Temos a luxúria, a avareza, a gula, a ira, a vaidade, a preguiça e a soberba. A meu ver, a soberba, que consiste na manifestação de orgulho, foi o pecado anunciado. Alguns poderiam pensar na luxúria, mas creio que não, pois o significado da palavra luxúria é "apego e valorização extrema aos prazeres carnais, à sensualidade e sexualidade; desrespeito aos costumes; lascívia". E o sétimo filho, mesmo sabendo de seus riscos, de seu sofrimento, escolheu elevar seus poderes, e, com isto, enlouqueceu e condenou-se à morte.
Abaixo, escolhi um vídeo com a canção, para homenagear o inesquecível CLIVE BURR. Com relação à canção em si, é mais um petardo metálico cavalgado, ao estilo de "The Evil That Men Do", ¨Sun and Steel¨, e, outras que a ¨DONZELA¨ criou.
E eis que voltamos à frase inicial do sétimo selo, prevista em "Moonchild". Ao abrir o sexto selo, de acordo com os presságios bíblicos, a lua verter-se-á em sangue. E, eis que a canção diz exatamente isto:
"A lua é vermelha e sangrenta
O sol está queimado e preto
O livro de vida está calado
Não há como voltar atrás".
E assim, o sétimo selo é aberto, o selo causado pelos próprios homens contra si, que, cansado, acaba por orgulhar-se por poder, enfim, morrer, e, finalmente, descansar dos sonhos e pesadelos:
"Seria a morte é outro aniversário?
Um modo para dar seus sonhos como perdidos?"
E, uma vez mais, ele dá um último suspiro, enquanto conclui:
"Só os bons morrem jovens
Todo o mal parece viver para sempre"
E assim, fecha-se o ciclo da vida do sétimo filho do sétimo filho, assim como encerra-se de maneira nobre esta notável trabalho, entre os últimos recitares de BRUCE DICKINSON, que repetem o que foi dito na introdução do disco:
"Sete pecados mortais
Sete maneiras de vencer
Sete caminhos santos para o inferno
Sete ladeiras para baixo
Sete esperanças ensanguentadas
Sete são seus fogos ardentes
Sete os seus desejos".
E por fim, fecham-se as cortinas deste álbum mais do que indispensável para toda e qualquer discoteca básica que se preze. A formação é clássica: ADRIAN SMITH, DAVE MURRAY, BRUCE DICKINSON, NICKO MCBRAIN e STEVE HARRIS. ¨Infinite Dreams¨, ¨The Clarvoyant¨ e a canção título ficaram a cargo da autoria de HARRIS, como já dito, e, as demais, ele dividiu com SMITH/DICKINSON, e, uma delas, com MURRAY (¨The Prophecy¨). Em uma recente turnê no melhor estilo flashback, a banda reproduziu o espetáculo MAIDEN ENGLAND na integra, para relembrar a época em que foi desenvolvida a turnê para este álbum excepcional (foto).
E, o disco acabou por virar uma revista em quadrinhos, lançada pela NFL Comics (foto).
Por fim, após explanadas todas as canções, antes da conclusão, convém convidar o leitor para acompanhar comigo um pouco das influências desta associação "messiânica" do "Sétimo Filho do Sétimo Filho" em outros campos, além da música, muitos derivados desta (música, cultura, cinema, política, televisão), e, outros (religiosos, proféticos) responsáveis por originar tal lenda. São informações colhidas de diversos sites de pesquisa, nada mais, mais que abrilhantam um pouco a temática aqui mencionada. Vamos juntos?
XI – Influências da Lenda do Sétimo Filho do Sétimo Filho no Cinema e Televisão
Há um filme recente, muito bem escrito, porém simples em termos de produção e imagens, que trabalha com esta possibilidade, chamado "Midnight Son", em meio a uma paisagem urbana moderna e uma história que não exagera em deformidades físicas ou façanhas sobrenaturais, apenas ilustra esta possibilidade dia após dia, da transformação de um ser humano simples em alguém "diferente". Há um outro filme, ainda mais recente, do ano de 2013, chamado "O Sétimo Filho", que carrega uma trama adaptada por Matt Greenberg, que se ambienta no ano 1700 e acompanha Thomas J. Ward, o sétimo filho de um sétimo filho, que pode ver criaturas das trevas, mas não sabe como lidar com seus poderes sobrenaturais. Ele é então treinado pelo Caçador e Feiticeiro John Gregory para ser um exorcista de verdade, contra a horda de ogros, feiticeiras e fantasmas que surgem sempre que o sol se põe.
Em STAR WARS, o mestre YODA por diversas vezes, assim como os demais, acreditam na lenda do escolhido, aquele que viria trazer luz sobre as trevas, e, que teria poderes e dominaria os elementos da força acima de todo e qualquer nível. Nitidamente, as influências sobre a vinda do "salvador", transformadas por BEN KENOBI da denominação de "sétimo filho" para a palavra "The Chosen" também evidenciam-se.
No episódio de TWILIGHT ZONE, intitulado ¨Still Valley¨, o personagem "Paradine" recebe um livro de bruxaria de um homem velho que reivindica ser o sétimo filho de um sétimo filho, como foi o pai do homem velho.
Em DOCTOR WHO, no episódio intitulado ¨Terror do Zygons¨, o jovem ANGUS, é um sétimo filho de um sétimo filho e afirma o poder da segunda vista.
Na série de televisão CHARMED, há um personagem para o episódio ¨That Old Black Magic¨, o sétimo filho, que se chama ¨The Chosen One¨.
Na série de televisão THE STORYTELLER, episódio ¨The Child Luck¨, um rei malvado se propõe a matar o sétimo filho de um sétimo filho, que está profetizado para se tornar rei.
No filme THE SEEKER, um menino, que é o sétimo filho de um sétimo filho, é encarregado do dever de salvar o mundo de ser dominado pelas trevas.
XII – Influência da Lenda do Sétimo Filho do Sétimo Filho na Literatura, Música e Entre Alguns Povos
Na saga SPIDERWICK, afirma-se que o sétimo filho de um sétimo filho (ou filha a sétima filha de um sétimo) vai nascer com ¨The Sight¨ (A Visão), que lhe permite que ele ou ela vejam fadas.
Na série de romances do escritor ORSON SCOTT CARD intitulada ¨The Tales of Alvin Maker¨, ALVIN é o sétimo filho de um sétimo filho, e, acredita-se que tenha inspirado o trabalho de composição da canção "Alvin Journeyman", do próprio IRON MAIDEN.
O próprio "Seventh Son Of a Seventh Son", aqui resenhado, teve inspiração nesta lenda folclórica acerca do sétimo filho do sétimo filho, que, para muitos, não é uma lenda, e, sim, uma profecia.
Em países latinos como a Argentina, a lenda é atribuída a lobisomens. Na Irlanda, ela faz menção ao caso do curandeiro PAUL JOSEPH CRAWLEY, que foi um sétimo filho de um sétimo filho e era conhecido na cidade irlandesa de ¨Scranton¨, famosa pela mineração de carvão, para curar muitas doenças de pele. Em todo o Reino Unido, acredita-se que o sétimo filho de um sétimo filho vai nascer com poderes sobrenaturais.
XIII – O Sétimo Filho do Sétimo Filho na História Política e Religiosa: Algumas Associações
A lenda do enviado, do salvador, acaba por encarnar, de alguma forma, o momento histórico do "Sebastianismo", criado por Portugal, e, que foi um movimento místico-secular que ocorreu em Portugal na segunda metade do século XVI como consequência da morte do rei D. SEBASTIÃO na "Batalha de Alcácer-Quibir", em 1578. Basicamente é um messianismo adaptado às condições lusas e à cultura nordestina do Brasil. Traduz uma inconformidade com a situação política vigente e uma expectativa de salvação, ainda que miraculosa, através da ressurreição de um morto ilustre.
No Brasil, em pleno século XIX, o "Sebastianismo" chegou ao Nordeste, assumindo características próprias a partir do imaginário popular. Em Pernambuco tornou-se mais violento, e, teve conotação político-religiosa. Posteriormente, a influência messiânica à procura do "escolhido" também fez estourar o fenômeno de "Canudos", chefiado por ANTONIO CONSELHEIRO.
Em tempos modernos, uma emissora de televisão baseou-se na lenda do JECA TATU, mesclou-a com conotações messiânicas e criou a novela "O Salvador da Pátria", com um inesquecível personagem vivido por LIMA DUARTE.
Até os dias atuais, a conotação messiânica ainda é atribuída e esperada de alguns políticos. Em outros países, de KENNEDY a MARTIN LUTHER KING, de MANDELA a LULA, a carência humana pela identificação para com seus ídolos, e, a verdadeira "cura" social esperada deles.
Em termos religiosos, esta conotação ainda possui requintes dos personagens nascidos coincidentemente a 25 de dezembro: HÓRUS (Egito) a NAMÃ (índios norte-americanos), ATTIS (Frígia), KRISHNA (Índia), DIONÍSIO (Grécia), MITTRA (Pérsia), e, evidentemente, o mais divulgado de todos, JESUS CRISTO.
Seria, evidentemente, um privilégio discorrer mais sobre eles, mas o assunto estenderia para um campo não pertencente propriamente ao site, e, ficaria extenso por demais.
Mas o que fica com todas estas associações, é a mensagem de que sempre procuramos por salvadores que não nós mesmos, quando deveríamos, utilizando a razão, acreditar que uma sociedade governada pela mais pura forma de justiça, não precisaria mártires ou libertadores, pois não haveria nada a ser temido.
Mas, onde poderemos encontrar esta tal sociedade, é uma pergunta que jamais conseguiremos responder.
Feitas as explanações, vamos agora, à conclusão para este belo trabalho musical de extremo heavy metal gerado pela "DONZELA DE FERRO".
XIV – Conclusão: Um dos Grandes Álbuns da História do IRON MAIDEN
O disco fala por si só. Muitos preferem "Somewhere In Time", porque foi certamente, o disco que apresentou o IRON MAIDEN em termos comerciais ao Brasil. O festival ROCK IN RIO fez com que a banda e suas canções ficassem conhecidas, mas as vendas realmente despontaram a partir de "Somewhere In Time". Impactante, inovador, com temática futurista, era esperado que a próxima cria dos britânicos viesse também, com um excelente contexto por detrás das canções.
E "Seventh Son Of a Seventh Son" cumpriu perfeitamente esta particularidade. É um disco coeso, cuja temática poderia, até mesmo, ser mais explorada e ter sido transformada em canções maiores (um álbum duplo, por exemplo), que seria tão excelente quanto é. Há como já dito, todo um conceito de início, meio e fim extremamente bem inserido por HARRIS e sua trupe, de forma brilhante.
O escritor PAULO COELHO tem uma frase muito propícia para definir esta passagem de grandes canções para canções com lendas: "A lenda pessoal é aquilo que você sempre desejou fazer. Todas as pessoas, no começo da juventude, sabem qual é sua lenda pessoal. Entretanto, à medida que o tempo vai passando, uma misteriosa força começa a tentar provar que é impossível realizar a Lenda Pessoal. Esta força que parece ruim, na verdade está ensinando a você como realizar sua Lenda Pessoal. Está preparando seu espírito e sua vontade, porque existe uma grande verdade neste planeta: seja você quem for, quando quer com vontade alguma coisa, é porque este desejo nasceu na alma do Universo".
E o mago STEVE HARRIS sabia muito bem o que estava a fazer, quando, seguindo os caminhos de seu coração, sua lenda pessoal, ele sonhou em conceber o embrião daquela que, sem dúvida, é uma das bandas mais cultuadas de toda a história, e, uma das mais importantes de todos os tempos: IRON MAIDEN.
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