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Ankh: quatro gringos tocando e se divertindo no Brasil

Resenha - Cachaça; Live at Rio ArtRock Festival 1999 - Ankh

Por Rodrigo Werneck
Postado em 02 de maio de 2008

Nota: 9 starstarstarstarstarstarstarstarstar

O Ankh é uma banda desconhecida da maior parte do público rockeiro do Brasil. Mesmo algumas pessoas que admiram a banda nem ao menos sabem que o grupo polonês tocou por aqui em 1999. O registro disso saiu somente há pouco tempo atrás, pela gravadora Rock Symphony.

O rock progressivo já teve seus dias de glória nos anos 70, no auge de grupos como Yes, Genesis, Pink Floyd e Emerson Lake & Palmer, entre outros, e mesmo aqui no Brasil com Os Mutantes, O Terço, etc. A partir dos anos 80, entretanto, começou gradativamente a se restringir a um gueto. O resultado disso é que muitos eventos legais existem sem que a grande maioria do público sequer tenha conhecimento do fato.

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Um dos exemplos clássicos é o Rio ArtRock Festival, um evento de rock progressivo que já trouxe ao Brasil diversas bandas de todos os cantos do planeta, além de abrir suas portas a bandas nacionais, muitas delas carentes de palcos para mostrar seus trabalhos. Uma dessas bandas que já nos visitou foi o Ankh (da Polônia), que se apresentou em dezembro de 1999 para uma seleta platéia de 300 pessoas no antológico Teatro da Galeria, um verdadeiro pulgueiro instalado no final de uma galeria xexelenta do bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro. Na verdade, apesar da tristeza de se ver tantas bandas boas, brasileiras e estrangeiras, tendo que se apresentar em locais não tão atrativos quanto seria de se esperar, o fato é que, no final das contas, havia algumas vantagens em se fazer um festival num clima mais informal. A possibilidade de se poder entrar com cerveja no local do show, apesar de ser um teatro com poltronas, tapete e ar condicionado, foi certamente uma delas, aumentando o clima de empolgação e descontração. Outro grande ponto foi a ausência de "toque de recolher": altos sons rolavam no Teatro da Galeria madrugada adentro. Rolavam, porque o teatro infelizmente fechou já há alguns anos.

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O show do Ankh não foi exceção: começou às 3 (!!!) horas da manhã. Mesmo assim, o público todo aguardou pacientemente, até porque era um fim de semana. O grupo não se fez de rogado e entrou com todo o pique, incendiando o palco. A qualidade de som estava à altura do show, pois a produção sempre se esmerou em ser bastante profissional nesse quesito.

A formação da banda, na época, era composta por Piotr Krzeminski (guitarra, vocal), Adam Rain (bateria, percussão), Krzysztof "Doctor" Szmidt (baixo) e Michal Jelonek (violino). O grande destaque era certamente o violino de Jelonek, não apenas musicalmente, mas também por sua vibrante performance de palco, que incluía até uma máscara macabra. Uma pena que algum tempo depois ele tenha deixado a banda, que já tem em sua discografia 4 CDs de estúdio e outro ao vivo.

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É fácil de se notar o clima de empolgação presente no local, tanto no decorrer das músicas quanto entre elas. O interessante é que a própria banda logo de cara anuncia que não toca rock progressivo (apesar do público composto totalmente por fãs do gênero), mas sim "apenas música". Talvez estivessem um pouco receosos de como seria a recepção da audiência ao som do grupo. De fato, há elementos de rock mais básico e até mesmo ingredientes da crueza e da agressividade do punk, porém há também características próprias do progressivo, até pela presença do violino, que adiciona um caráter mais erudito e experimental ao conjunto. O que interessa é que o público adorou o show, e os vocais em polonês e os arranjos inusitados ajudaram bastante nisso.

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Com o repertório calcado em seus dois melhores discos de estúdio ("Ziemia i Slonce", de 1995, e "Bedzie Tajemnica", de 1998), a banda desfilou com segurança sua música pesada e climática, com generosas porções melódicas fornecidas pelo violino. O guitarrista e vocalista Krzeminski também toca de forma discreta sua guitarra, ora executando pesados riffs, ora tocando sons esparsos e quase psicodélicos. A cozinha formada por Szmidt e Rain participa de forma correta e precisa, chegando a ter alguns momentos de brilho em composições mais rebuscadas.

Embora obviamente a experiência de ouvir um disco ao vivo perca muito em relação a assistir à própria apresentação em si onde o mesmo foi registrado, pode-se perceber que a banda estava em noite inspirada. Entre os destaques estão "Kraina Umarlych" (que inclui uma referência não creditada a "The Ripper", do Judas Priest"), "Westernpopnoc" e "Blaaza", que mesclam brilhantes evoluções no violino acompanhadas pela base pesada dos demais instrumentos. Uma espécie de encontro entre a música pop (no caso, o rock) e a música erudita. Outro grande destaque, sempre incluído em shows do grupo, é o sensacional cover para "21st Century Schizoid Man", da banda inglesa King Crimson. A escolha não poderia ter sido melhor, sendo o Crimso a banda progressiva mais pesada dentre os medalhões do gênero. Além disso, o vocal alucinado caiu como uma luva na interpretação de Krzeminski, isso sem falar no violino de Jelonek, que dá um show à parte.

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Uma surpresa ficou separada para o final. Em "Enosz", os vocais originais foram trocados por novos traduzidos para... Português! Isso mesmo, com a ajuda da produção do festival, a letra foi traduzida e os fonemas foram colocados numa folha de forma a facilitar uma leitura com pronúncia mais correta pelo vocalista. O resultado foi surpreendentemente bom, e ficou uma singela e simpática homenagem aos fãs brasileiros.

O show foi encerrado por 2 ótimas faixas. A primeira foi "W Grocie Króla Gór", que nada mais é que uma excelente versão para "Peer Gynt", fragmento de "In The Hall of The Mountain King", do compositor norueguês Edvard Grieg, e que já havia sido adaptada por outros artistas tão diversos como Rick Wakeman e Savatage. Em seguida, o fecho de ouro com os mais de 8 minutos de "Piesn O Wedrówce", que lentamente encerra o show (e o disco), quase como se arrastando para o repouso (afinal, já eram 4:30h da manhã!).

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Um detalhe final: preciso comentar sobre o porquê de se chamar de "Cachaça" o título de um disco ao vivo gravado por 4 gringos tocando e se divertindo no Brasil?

Tracklist:
1. Intro
2. Lancelot
3. Wiara
4. Swiat Sen
5. Kraina Umarlych
6. Ziemia
7. Westernpopnoc
8. Dudziarz
9. Templum
10. 21st Century Schizoid Man
11. Pulsohordofon
12. Blaaza
13. Enosz
14. W Grocie Króla Gór
15. Piesn O Wedrówce

Site: www.ankh.art.pl

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Sobre Rodrigo Werneck

Carioca nascido em 1969, engenheiro por formação e empresário do ramo musical por opção, sendo sócio da D'Alegria Custom Made (www.dalegria.com). Foi co-editor da extinta revista Musical Box e atualmente é co-editor do site Just About Music (JAM), além de colaborar eventualmente com as revistas Rock Brigade e Poeira Zine (Brasil), Times! (Alemanha) e InRock (Rússia), além dos sites Whiplash! e Rock Progressivo Brasil (RPB). Webmaster dos sites oficiais do Uriah Heep e Ken Hensley, o que lhe garante um bocado de trabalho sem remuneração, mais a possibilidade de receber alguns CDs por mês e a certeza de receber toneladas de e-mails por dia.
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