Provocações: As canções cheias de indiretas entre artistas do rock
Por Jonathan Silva
Postado em 13 de fevereiro de 2022
Tipo de composição comum no rap, as músicas "diss" (insulto, em português) são faixas onde o compositor manda aquela indireta para os desafetos. No rock, como não poderia ser diferente, tais faixas cheias de provocações também tem espaço na mídia e na boca dos fãs, que torcem sempre pela treta.
Nesta lista, iremos conferir os momentos onde os músicos lavaram a roupa suja contra seus desafetos, e alguns destes até revidaram na mesma moeda. Discussões por causa de esposa, diferenças musicais, críticas ao feminismo, término de namoro, bairrismo, acusações de homofobia e muitas outras tretas que você confere abaixo.
John Lennon vs. Paul MacCartney:
"Too Many People" e "How do you sleep?"
O sonho pode ter acabado em 1970, com o fim dos Beatles. Mas as discussões entre Paul McCartney e John Lennon ainda continuaram por mais alguns anos. A música que oficializou o desgaste entre a dupla foi "How do you sleep?", gravada por John Lennon para o álbum Imagine (1971).
O processo movido por McCartney contra os Beatles em 1970 gerou ressentimentos entre o baixista e o resto da banda. No ano seguinte à dissolução, em maio de 1971, Paul lança o álbum Ram, seu segundo álbum solo. Foi neste disco que Lennon sentiu que havia sutis provocações à sua pessoa. A começar pela capa do álbum, onde Paul segura os chifres de um carneiro, e na música "Too Many People", anos depois confirmada pelo próprio autor como direcionada a Lennon e sua esposa, Yoko Ono.
Em resposta, o guitarrista não quis saber de sutilezas e gravou "How Do You Sleep?" com citações diretas ao ex-colega baixista. McCartney foi provocado em versos como "A única coisa que você fez foi Yesterday" e "Aqueles malucos estavam certos quando diziam que você estava morto". Ah, e George Harrison ainda colaborou com uma palinha de slide guitar. Mesmo magoado com a música, Paul se reconciliou com Lennon anos depois.
Too Many People (Remastered 2012):
How Do You Sleep? (Takes 5 & 6, Raw Studio Mix Out-take) - John Lennon & The Plastic Ono Band:
David Bowie vs. Gary Numan:
"Teenage Wildlife"
Existem artistas que almejam ser reconhecidos pelos seus ídolos. Infelizmente, para Gary Numan, esse reconhecimento por parte do veterano David Bowie não ocorreu de forma generosa. Seja por diferenças criativas ou simplesmente por ego, o camaleão compôs a música "Teenage Wildlife", que integra o álbum Scary Monsters (1980), mirando no então novato Numan, considerado pioneiro do synth pop.
Acontece que Bowie não curtia o conceito futurista elaborado por Gary Numan, e na letra de "Teenage Wildlife" tal discordância deslanchou pro argumento ad hominem: "Um magnata de nariz quebrado você é/ Um dos garotos da new wave [...] Tão feio quanto um adolescente milionário/ Fingindo ser um jovem prodígio mundial". Numan, por ser fã de Bowie, não quis revidar o ataque e preferiu ficar na sua, mesmo após uma vez ter sido retirado de um estúdio de TV a pedido do próprio camaleão, onde os dois iriam se apresentar.
Teenage Wildlife (2017 Remaster):
Fred Durst (Limp Bizkit) vs Trent Reznor (Nine Inch Nails):
"Hot Dog"
O new metal cheio de palavrões e rimas de rap do Limp Bizkit não passou batido para Trent Reznor, líder do Nine Inch Nails. Em entrevista à Rolling Stone em outubro de 1999, Reznor direcionou suas críticas a Fred Durst, chamando o vocalista do Limp Bizkit de "idiota", entre outras indelicadezas. E, no melhor estilo diss rap, Durst reagiu.
Na música "Hot Dog", que abre o álbum Chocolate Starfish And The Hot Dog Flavored Water (2000), Fred Durst toma "emprestado" versos das músicas "The Perfect Drug" and "Closer", do NIN, para direcioná-las à Trent Reznor. "Você quer me foder feito um animal. Você gosta de me queimar por dentro. Você gosta de pensar que sou a droga perfeita. Apenas saiba que nada que você faça me trará para mais perto de você". Como emprestado não sai de graça, Reznor consta como coautor da música que o provoca.
Hot Dog:
Dave Grohl (Foo Fighters) vs Courtney Love:
"I'll Stick Around"
Dave Grohl pode ser o "cara legal" do rock, mas ele também perde a paciência. Na faixa "I'll Stick Around", single do álbum debut do Foo Fighters (lançado em 95), Grohl direciona seu direito de ficar irado contra Courtney Love, vocalista do Hole. Na música, o vocalista alerta que "já aguentou por tempo demais" os ataques da viúva de Kurt Cobain. "É melhor estarmos longe um do outro", dispara Grohl.
A animosidade entre os dois durou até abril de 2014, quando se reconciliaram publicamente durante a introdução do Nirvana no Hall da Fama do Rock. Porém, em junho de 2021, Love ainda tinha o que falar sobre ter sido citada em "I'll Stick Around", caracterizando o comportamento de Dave Grohl como "abusivo" em uma postagem no Instagram. Dias depois à postagem, a vocalista se desculpou pela publicação, apagando-a em seguida.
Amy Lee (Evanescence) vs. Shaun Morgan (Seether):
"Call me When You’re Sober" e "Breakdown"
Términos de relacionamentos sempre garantem músicas sofrência em qualquer estilo musical. Na separação de Amy Lee (Evanescence) e Shaun Morgan (Seether), o que rendeu foram alfinetadas duras entre ambas as partes. A musa do rock gótico, decepcionada com a adicção de Shaun Morgan, compôs "Call me When You’re Sober" (Me chame quando estiver sóbrio) para o ex. A música foi lançada em setembro de 2006, no mesmo dia em que Morgan foi parar na reabilitação para lidar com o vício.
Ofendido com os versos de Amy Lee, Shaun compôs "Breakdown", música do álbum Finding Beauty in Negative Spaces (2007), do Seether. Inicialmente, o músico negou que a música seria uma réplica a "Call me…". Entretanto, o próprio admitiu em outubro de 2010, durante um show na Inglaterra, que fez a música para responder a ex-namorada.
Evanescence - Call Me When You're Sober (Official Music Video):
Seether Brakedown with intro about Amy Lee:
Raul Seixas vs. Belchior, Hermes de Aquino e Silvio Brito:
"Eu Também Vou Reclamar"
Tretas chiques dentro do rock brasileiro também acontecem. Incomodado com as reclamações escritas em algumas músicas da década de 70, o baiano Raul Seixas resolveu alfinetar Belchior, Silvio Brito e Hermes de Aquino na música "Eu Também Vou Reclamar", do álbum Há 10 Mil Anos Atrás (1976). Para Rauzito, Belchior, o "rapaz latino americano" de voz "chata e renitente", não tinha "cheiro nem sabor". Silvio Brito era um "chato que me grita aos ouvidos ‘pare o mundo que eu quero descer''', e a "nuvem passageira" de Hermes de Aquino não levava Raul aonde ele queria chegar.
Nenhum dos músicos citados pareceu ter se chateado com a provocação do Maluco Beleza. Belchior regravou Ouro de Tolo em 1984, no álbum Cenas do Próximo Capítulo (1984); já Silvio Brito homenageou Raul na música Um Sonho Maluco, no álbum Uma Luz (1995).
Eu Também Vou Reclamar:
MDC vs. Bad Brains:
"Pay to Come Along"
A biografia do Bad Brains, uma das bandas seminais do hardcore de Washington, não saiu impune de ter uma acusação de homofobia movida por outra lenda do hardcore americano: o MDC (Millions of Dead Cops). Os texanos de Austin alfinetaram os rastafáris da capital estadunidense com a música "Pay to Come Along", um trocadilho com a música "Pay to Cum", do Bad Brains.
Segundo o que foi relatado em fanzines punks no começo dos anos 1980, a treta começou quando o Bad Brains declinou uma parceria de turnês com o MDC após saber que a banda texana tinha integrantes homossexuais. A gota d’água para Dave Dictor, vocal do MDC, foi o sermão espiritual que os rastas deram no Randy "Biscuit" Turner, vocalista da banda de hardcore Big Boys e amigo de Dictor, que hospedou o Bad Brains em sua casa durante uma turnê no Texas. O motivo? Randy era assumidamente gay, o que seria uma ofensa à visão religiosa do grupo. A resposta de Dave Dictor ao Bad Brains foi bem direta: "Não precisamos da sua doutrina fascista de Jah".
Pay to Come Along:
Sex Pistols vs New York Dolls:
"New York" e "London Boys"
Antes de gerenciar os Sex Pistols, o controverso Malcolm McLaren teve uma experiência intensa ao ser empresário do New York Dolls, já nos momentos finais da primeira fase da banda novaiorquina, em 1975. Talvez tenha sido ideia do Malcolm botar o quarteto punk de Londres para zoar com a cara do finado Dolls em "New York", música do álbum Never Mind The Bollocks (1977).
Na letra, Johnny Rotten insulta os proto-punks mandando-os "calarem a boca", chamando-os de "pobres bichas" e "um monte de merda". Ainda faz piada com as músicas Pills (Ainda com essas pílulas/ Analgésicos com emoções baratas) e Looking for a Kiss (Vocês estão selados com um beijo). Em 1978, o ex-guitarrista do New York Dolls, Johnny Thunders, revidou a indireta na música "London Boys", identificando a mente por trás do diss dos Pistols: "Você (Johnny Rotten) precisa de um acompanhante pra mijar. Ele (Malcolm McLaren) segura sua mão e balança seu pinto".
New York (Remastered 2012):
London Boys:
NOFX vs. Kathleen Hanna:
"Kill Rock Stars" e "Deceptacon"
Sutileza nunca esteve entre os atributos do NOFX, e por isso a "indireta" escrita pela banda na música "Kill Rock Stars", do álbum So Long and Thanks for All the Shoes (1997), tinha nome e endereço: Kathleen Hanna, vocalista do Bikini Kill e Le Tigre. O título da canção era uma referência ao selo independente homônimo gerenciado por Hanna.
Logo de cara, o vocalista Fat Mike já ironiza: "‘Mate as estrelas do rock’, que irônico, não é Kathleen? Você está sendo coroada a mais nova rainha". As críticas da banda eram direcionadas ao feminismo radical de Hanna, que consistia, segundo o NOFX, em "culpabilizar e odiar os homens". No primeiro álbum do Le Tigre, de 1999, Hanna revida em "Deceptacon", onde a cantora afirma que as letras da banda "são tão imbecis como um chão de linóleo''. Entendeu a referência, fã de NOFX?
Kill Rock Stars:
Deceptacon:
Lynyrd Skynyrd vs. Neil Young:
"Sweet Home Alabama"
O amor do Lynyrd Skynyrd pelo Alabama fez com que os músicos ficassem bem na defensiva quando um certo "senhor Young" direcionou críticas ao estado americano. A banda se referia ao canadense Neil Young, que nas canções "Southern Man" e "Alabama" chamava atenção dos sulistas contra o racismo na região. Sem meias palavras, o Lynyrd alertou: "Eu espero que o Neil Young se lembre que um homem sulista não o quer por perto, de qualquer maneira."
Mas então o Lynyrd odiava Neil Young? Não exatamente. O saudoso vocalista Ronnie Van Zandt (morto em 1977) era fã do músico canadense. Ele relatou que estava preocupado com uma possível generalização por parte de Young. "Nós pensávamos que Neil Young estivesse atirando em todos os patos para matar um ou dois". Na sua biografia publicada em 2012, Neil Young admitiu que suas palavras soaram "acusatórias e condescendentes", e parabenizou a banda pela música.
Southern Man:
Sweet Home Alabama:
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