Super Fly
Por Silvio Essinger
Postado em 06 de abril de 2006
Desde Raul Seixas - a mosca que pousou na sopa da MPB - que a Bahia não deixa de colaborar ativamente para a evolução do rock brasileiro. Em 2003, chega a vez do Superfly bater as asas e fazer um zumbido diferente num cenário em que a axé music é preponderante: com seu segundo disco, O vôo da mosca, a jovem banda de Salvador consolida as promessas de Superfly, o CD de estréia, de 2001, fazendo um mergulho em suas raízes sonoras nordestinas, mas sem perder o peso do instrumental roqueiro. "Meu avô era repentista", conta o vocalista Bruno Marques, para quem era inevitável que o grupo - até por uma questão de evolução sonora - acabasse tingindo de nordeste o seu som baseado no rock pesado de americanos como Stone Temple Pilots e Deftones. Mas, como tudo na vida, houve um caminho a percorrer.
E, para o Superfly, ele começou quatro anos atrás, com shows pelos mais variados buracos roqueiros de Salvador e algumas gravações demo. Que acabaram chamando a atenção da gravadora BMG para aquele novo grupo formado por Bruno, Marcelo Mosca (Guitarra), Adriano McBrody (baixo) e Jão Travassos (bateria).
Mesmo a relativa inexperiência e as dificuldades em se destacar num mercado que contava com bandas tão fortes quanto Raimundos e Charlie Brown Jr. não conseguiram desviar a rota do Superfly (o nome é homenagem ao filme policial de blaxploitation cuja magistral trilha foi feita por Curtis Mayfield) rumo ao sucesso: num acontecimento absolutamente espontâneo, a eletrizante música Sozinha acabou virando tema do programa de esportes radicais Caminhos da aventura, da apresentadora Dani Monteiro. Ela está lá novamente, em O vôo da mosca, como faixa bônus de encerramento. Mas o novo disco traz uma nova banda, escolada por shows nos mais diferentes palcos - de pátios de colégios ao Festival de Verão de Salvador - e bem diferente daquela banda do primeiro disco. Para alçar esse seu Vôo, o Superfly teve seis meses inteiros para compor e gravar. Assim, passava dias inteiros em um estúdio no bairro soteropolitano da Pituba, ouvindo e fazendo música. De manhã, os discos rolavam no CD player - Bossacucanova e Gilberto Gil conviviam com as guitarras dos americanos do Incubus na maior paz, enchendo as cabeças dos rapazes de idéias miscigenadas, que acabaram por encontrar eco nas músicas de o Vôo da mosca (título que faz referência ao nome da banda, mas foi tirado de um antigo choro de Jacob do Bandolim).
No processo de mutação da super mosca baiana, as músicas foram ficando mais longas que de costume (sempre com mais de três minutos de duração) e instrumentalmente mais ricas, com elementos de psicodelismo, bossa, funk, baião, heavy metal e o que mais coubesse na estética do Superfly - um resultado típico de uma banda em que a composição de todas as faixas é feita de forma coletiva. Sal e mar, a faixa de abertura, por exemplo, começa praieira, à la Dorival Caymmi, e depois surfa nas ondas de chumbo do rock pesado californiano. Já as melodias do novo Superfly ganharam asas e voaram na direção do sertão, onde também se encontrou a inspiração para as letras. A de Seu Antônio surgiu instantaneamente na cabeça de Bruno, como a de todo bom repente. Já a da balançada porém tensa Lembranças veio da observação do sofrimento e da beleza do povo nordestino. A temática regional se mantém em outras faixas como Véu de prata (um poema musicado), Cabeça de cera (a que traz mais influências da música de umbanda, mixadas com boa dose de heavy metal), Canal d´Oxum e Sinhá (que traz samples de trechos de Morte e vida severina, da minissérie de TV baseada na obra de João Cabral de Melo Neto).
Para um disco incomum no cenário do rock brasileiro, uma capa incomum: a banda optou por um trabalho limpo, pouco roqueiro, a cargo do veterano César G. Vilella, o homem que inventou a capa de disco da bossa nova, em trabalhos para João Gilberto e os artistas da pioneira gravadora Elenco (Tom Jobim, Nara Leão, Edu Lobo e etc). Assim, aliando o melhor tradição brasileira e um bocado de experimentação elétrica, o Superfly parte para a conquista de seu lugar ao sol da MPB - com amadurecimento e personalidade, para vôos ainda mais altos, agora com o guitarrista Marcelo Jesuíno, substituto mais do que à altura de Rick, que resolveu sair logo após a gravação do disco. Com o profissionalismo como meta, o Superfly aposta em novas histórias para o rock brasileiro.
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