Extreme agrada com músicas novas e esquenta o frio no Best of Blues and Rock
Resenha - Extreme (Best of Blues and Rock, São Paulo, 02/06/2023)
Por André Garcia
Postado em 04 de junho de 2023
Para os fãs, Extreme é uma grande banda de hard rock inspirada em Van Halen e Living Colour; para os haters, é a banda de um guitarrista fritador e o vocalista que flopou no Van Halen; para os leigos, a banda daquela balada que toca no motel e faz o povo acender o isqueiro no show.
Fotos: André Velozo
Embora já esteja na estrada faz mais de três décadas, o Best of Blues and Rock foi apenas sua terceira passagem pelo Brasil: a primeira foi em 1992 e a segunda muito tempo depois, em 2015. Essa apresentação só aconteceu graças ao guitarrista, que teve todos os motivos do mundo para cancelar. Após machucar feio o joelho no começo de maio jogando basquete, se dedicou intensamente à sua recuperação e ainda assim relatou ter sentido dores no dia do show. Foi necessário que ele procurasse um médico, tomasse umas injeções e subisse ao palco com um aparelho no joelho — tipo um exoesqueleto.
Tudo isso para reencontrar os fãs brasileiros e às vésperas de seu novo lançamento. "Six", seu sexto álbum de estúdio, que sai 15 longos anos após seu antecessor.
Meus receios de assistir a uma banda chata de um fritador e um flopado, ou que vive de passado agarrada a uma antiga balada, foram dissipadas logo nos primeiros minutos. Comete uma injustiça aqueles que ainda insiste em a colocar em qualquer prateleira abaixo de uma grande banda de hard rock.
O quarteto subiu ao palco com alguns minutos de atraso, às 18h55 de uma fria noite com sensação térmica de 16 graus. A área externa do auditório do Ibirapuera já estava coberta por um mar de cabeças e camisas pretas quando ouvimos Nuno Bettencourt aquecendo com as luzes ainda apagadas. Após o palco se iluminar, eles começaram a tocar "Decadence Dance", já desde o começo parecendo bem à vontade, como se estivessem em casa.
O som do festival estava muito bom, o que favoreceu particularmente ao Extreme por conta dos complexos timbres e efeitos que Nuno usa. Há momentos em que em uma única música ele explora vários sons diferentes, todos sempre claros, limpos e perfeitamente audíveis. Tudo soou muito bem ao vivo.
Nuno Bettencourt, que até hoje ainda enfrenta a resistência de alguns, superou seu joelho machucado para mostrar por que é considerado um dos mais talentosos de sua geração. Se por um lado a lesão pareceu ter afetado sua mobilidade pelo palco, não parece ter afetado em nada sua capacidade de tocar guitarra. Ninguém faz um guitarrista do quilate de Brian May se rasgar em elogios por acaso. Comete um erro crasso quem ainda insiste em acreditar se tratar de uma cópia de Eddie Van Halen. Extremamente habilidoso, não comete excessos ou deixa o virtuosismo em primeiro lugar, como um Malmsteen da vida. Os momentos em que ele se destaca foram os pontos altos do show, e geralmente arrancaram sorriso dos fãs — como um mágico que tira um coelho da cartola em festa infantil.
Gary Cherone em momento algum me lembrou o vocalista que flopou no Van Halen. Esbanjando energia e carisma, ele se "moveu como Jagger" a noite toda. Inquieto, preencheu o palco estando em todos os lugares: das passarelas em V à frente do palco à parte lateral, e até mesmo escalou uma pilha de amplificadores para se sentar no topo dela. Só não esteve em mais de um lugar ao mesmo tempo porque é fisicamente impossível. O Blazer de lantejoulas com o qual ele entrou no palco para se proteger do frio durou apenas uma única música.
Em termos vocais, aos 61 anos (com corpinho de 40) ele não tem mais a extensão vocal de outrora, o que o leva a ser mais comedido nos agudos e investir mais no domínio dos médios. Curiosamente, ele tem seguido o caminho vocal traçado por seu antecessor no Van Halen, Sammy Hagar, quando tinha sua idade.
A banda fez um ótimo uso da boa iluminação do evento, usando as luzes como uma extensão do que estava sendo tocado. Em músicas diferentes o palco era iluminado de formas diferentes. Em certos momentos a música começava com um tom e mudava na hora do solo, quando seguia um caminho mais psicodélico. É sempre bacana quando a luz é encarada como parte do espetáculo.
Uma coisa que me chamou atenção foi o apelo que o Extreme tem junto ao público feminino. A mulherada de longe era quem mais estava dançando e curtindo o show. Desconfio que isso tenha a ver com Nuno Bettencourt, que arrancou diversos gritos de "gostoso" e afins.
Era de se esperar que algumas músicas novas de seu vindouro álbum já fossem testadas ao vivo. "Rise", "#rebel" e "Banshee" foram aprovadas pelo festival. Se depender do Best of Blues and Rock, já podem ser incorporadas ao repertório da turnê. Um feito notável, já que é muito comum em show de banda veterana os fãs pularem nos clássicos, mas bocejarem e mexerem no celular quando chegam as músicas novas. De jeito nenhum esse foi o caso.
Um dos destaques foi a introdução de "Play With Me", onde puxaram um trecho de "We Will Rock You". Para quem não sabe (ou lembra), Gary Cherone já cantou com o Queen no show de tributo a Freddie Mercury em 1992. Outro ponto alto foi Nuno com seus arpejos insanos ao violão no instrumental "Midnight Express", um dos momentos mais aplaudidos. A seguir veio o momento mais aguardado do show, que foi o mega hit "More Than Words" — que o Ibirapuera cantou junto, mas ninguém acendeu isqueiro. Gary já estava só de colete e cachecol.
A seguir, Nuno voltou à guitarra e a banda voltou ao rock, mas no quesito intensidade me pareceu um degrau abaixo. Em "Hole Hearted" foi a vez do guitarrista mostrar suas habilidade com rápidas e fortes palhetadas em um violão de 12 cordas com uma cadência de Bo Diddley. Em "Get the Funk Out" o show voltou a esquentar e teve um convidado para lá de especial: Mateus Asato, o guitarrista do momento. Ele, que já tocou com Luan Santana, Sandy e Tiago Iorc, e tem arrancado elogios de nomes como Bruno Mars, John Mayer, Shawn Mendes… e Nuno Bettencourt.
O show foi fechado com um belo dueto de guitarra, o que parece ter deixado Nuno particularmente feliz. Tipo o filho único que não tem com quem brincar quando recebe a visita de um primo que gosta das mesmas coisas que ele.
[an error occurred while processing this directive]Foi uma grande apresentação que certamente fez o Extreme subir um degrau no conceito de muita gente: quem já gostava, gostou ainda mais; e quem torcia o nariz (como eu, confesso), deu o braço a torcer.
Setlist:
Decadence Dance
#rebel
It’s a Monster
Rest in Peace
Am I Ever Gonna Change
Banshee
Play with Me
Midnight Express
More Than Words
Cupid’s Dead
Rise
Hole Hearted
Flight of the Wounded Bumblebee
Get the Funk Out
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