Apocalypse: grande nome do rock progressivo nacional
Por Vicente Reckziegel
Fonte: Witheverytearadream
Postado em 26 de outubro de 2012
Outro grupo que dispensa maiores apresentações, principalmente para os amantes do rock progressivo. E a banda gaúcha Apocalypse pode ser considerada a principal referência do gênero no Brasil, possuindo um grande e merecido reconhecimento mundial pelo brilhante trabalho apresentado nestes quase trinta anos de carreira. Uma vitória, sem sombra de dúvida, mas principalmente por continuar em ascensão, e não simplesmente acomodar-se sobre os feitos do passado. Tive a oportunidade de entrevistar Eloy Fritsch, tecladista, fundador e principal compositor do Apocalypse que, numa conversa sincera e muito interessante, traz um panorama geral de toda a carreira da banda, principalmente do ótimo Box-set "The 25th Anniversary". Amanhã irei publicar a segunda parte da matéria, falando sobre esse lançamento. Entreguem-se ao mundo do Apocalypse...
Vicente - Ano que vem o Apocalypse estará completando 30 anos de existência. Quando iniciaram em 1983, imaginavam chegar a três décadas na estrada, numa forma de fazer inveja e ainda em ascensão no cenário musical?
Eloy Fritsch – Quando iniciamos éramos uns guris e tudo não passava de brincadeira. Era muito divertido reunir os amigos para tocar e aos poucos fomos percebendo que gostávamos muito de estar compondo e tocando. A gente só queria fazer nossa própria música. Na época nossa música já soava diferente de outros grupos da região e, a medida que evoluíamos tecnicamente, cada vez mais nos aproximávamos do rock progressivo, estilo que trilhamos todos esses anos. Não tínhamos nem ideia como seria no futuro, quem ainda estaria na banda, quanto teríamos de retorno... Realmente é muito tempo de banda. No Brasil são poucos grupos que mantém um projeto por anos. Fico feliz que depois de quase três décadas o Apocalypse tenha produzido muita música, tocado em vários festivais, gravado muitos CDs e recebido o reconhecimento dos fãs e da crítica através de prêmios e homenagens. Isso nos enche de orgulho e motivação para continuar no caminho que escolhemos que é a música autoral.
Após o show do Apocalypse, Eloy Fritsch recebe em 2009 o troféu Vasco Prado da Universidade de Passo Fundo em homenagem aos 25 anos de banda.
Vicente - Com todo esse tempo de estrada, vários shows realizados e discos lançados, quais seriam os próximos objetivos do Apocalypse?
Eloy Fritsch – Estaremos lançando em breve o DVD "The Bridge of Light" que trará o concerto que fizemos na íntegra. Uma das melhores formações do Apocalypse. Um belo registro que já havia sido lançado em CD e que somente em 2012 as edições dos vídeos ficaram prontas.
Vicente - Vamos falar do sensacional Box-set "The 25th Anniversary". Como nasceu a ideia deste projeto tão ambicioso, e como foi colocá-lo em prática?
Eloy Fritsch – O Apocalypse estava para completar 25 anos e achamos importante valorizar esse momento e registrar a história da banda. Então encaminhamos um projeto para a lei de incentivo a cultura e conseguimos um financiamento para realizar o Box Set. Trabalhamos muito na produção do material. Mas agora vemos que valeu a pena o investimento porque resultou em um material muito bonito que já recebeu prêmios. Na verdade o Box Set do Apocalypse é um conjunto de projetos. Temos o CD ao vivo Magic Spells oriundo de um projeto anterior do Apocalypse e que estava praticamente pronto, o DVD que precisou ser editorado incluindo as melhores gravações de shows da banda, o livro que foi escrito durante o tempo do projeto, o poster e o CD 2012 Light Years from Home. Este último, sem dúvida foi o mais trabalhoso porque é composto apenas por músicas inéditas. Durante o processo de composição e gravação o baixista e o baterista se retiraram do Apocalypse e isso foi desestimulante para aqueles que permaneceram na banda tocando o barco. O projeto quase não aconteceu por causa dessas desistências. O CD 2012 foi gravado em quarteto com o Fábio Schneider assumindo a bateria e eu tocando os teclados e o baixo. No final o disco ficou muito bem gravado e maduro. Gosto muito do resultado que conseguimos porque cada disco do Apocalypse tem novidades. Nunca fizemos um disco parecido com o anterior. Artisticamente isso é muito bom.
Capa do novo CD de estúdio do Apocalypse (2011)
Vicente - O livro que acompanha o material, contando a história da banda e contendo imagens e fatos importantíssimos, é um dos pontos altos do Box-set. Conte-nos um pouco sobre ele.
Eloy Fritsch – O livro foi escrito em português e inglês pelo ex-editor da revista paulista Hard Rock Valhalla, o jornalista Eliton Tomasi. Ele já acompanhava a história da banda e acabou tornando-se o produtor do Apocalypse por alguns anos. Dessa forma ele acompanhou de perto o que aconteceu com o Apocalypse e transformou isso em um lindo livro. O Eliton foi incansável na produção dos textos que foram revisados por membros da banda. No Brasil temos pouquíssimas publicações sobre grupos de rock progressivo nacional, então sua contribuição é muito grande, não só para o Apocalypse, mas para a história e a cena do rock nacional. A diagramação foi toda feita pelo próprio vocalista Gustavo e as fotos foram tiradas do arquivo da banda. Minha esposa Lauren tem muita coisa guardada e não usamos 1% no livro. Mas as imagens que usamos pontualmente representam as diversas fases, formações e momentos do Apocalypse. O livro ainda traz um timeline do que ocorreu na história do Apocalypse em cada ano. Essa parte foi escrita somente em inglês pelo carioca Leonardo Nahoum, autor da Enciclopédia Brasileira do Rock Progressivo.
Apocalypse – Show realizado em 2012
Vicente - No CD "Magic Spells" e no DVD "The 25th Anniversary Concert" a banda demonstra toda sua competência técnica ao vivo. Como foi a gravação destes registros?
Eloy Fritsch – O Magic Spells foi o primeiro registro ao vivo oficial em inglês do Apocalypse. Foi gravado durante a tournê que fizemos no Rio Grande do Sul. Em 2005 assinamos com uma gravadora do Chile para lançar. Mas eles tiveram problemas financeiros e o material foi guardado para uma próxima oportunidade. Quando surgiu o projeto do Box Set resolvemos lançar essas gravações e ainda incluir no CD duas trilhas de estúdio para as músicas Escape e Not Like You. O DVD traz o Concerto de Rock em comemoração aos 25 anos do Apocalypse realizado em 2009 no Salão de Atos da UFRGS com a participação do ator e músico Hique Gomez. Além desse registro o DVD inclui dois momentos marcantes da história do Apocalypse: a música Waterfall of Golden Waters (Cachoeira das Águas Douradas) gravada no Teatro municipal de Niterói e duas músicas do Concerto The Bridge of Light realizado no UCS Teatro em Caxias do Sul: Ocean Soul e Last Paradise. No final a editoração de todo o DVD foi feita pelo guitarrista Ruy Fritsch.
Vicente - E o novo disco, "2012 Light Years From Home", que acompanha o Box-set, traz a estréia de Fabio Schneider na bateria. Como rolou a gravação e, principalmente, como foi compor e tocar sem seu parceiro de longa data, Chico Fasoli, na bateria?
Eloy Fritsch – O Fábio Schneider é nosso amigo de longa data. Ele estava tocando na Orquestra Sinfônica quando convidamos para entrar no Apocalypse. Ele sempre acompanhou a trajetória do Apocalypse e quando o nosso primo Chiquinho precisou sair da banda por motivos pessoais o Fábio topou o desafio de estudar as músicas anteriores que estávamos tocando nos shows e ainda gravar todo o 2012 Light Years from Home. Foi um projeto desafiador porque voltamos a formação de quarteto que gravou esse disco e fizemos um show em São Paulo no Sesc Vila Mariana. Depois o Rafael Schmitt assumiu o baixo e continuamos tocando em quinteto.
Fabio Schneider – baterista do Apocalypse
Vicente - E o retorno dos fãs, como tem sido para este material?
Eloy Fritsch – Todos tem gostado muito do novo CD 2012 e demonstrado o orgulho que sentem pelo fato do Apocalypse ter produzido um Box Set de qualidade. Os colecionadores então nem se fala. Como sempre estamos vendendo mais no exterior que no Brasil.
Os quatro cavaleiros do Apocalypse que gravaram o CD 2012 Light Years from Home – da esquerda para a direita: Gustavo Demarchi, Eloy Fritsch, Ruy Fritsch e Fábio Schneider
Vicente - É praticamente impossível fazer destaques individuais ao disco, pois todas as faixas têm um potencial fantástico. Mas baladas como Morning Light e Blue Angel ficaram ótimas. Quais seriam as músicas que indicaria para quem ainda não conhece o Apocalypse.
Eloy Fritsch – Morning Light e Blue Angel são ótimas baladas. Eu gosto muito dessas composições. Acho que cada música desse novo CD carrega sua própria energia, tem sua identidade em relação ao conjunto da obra. Nesse disco temos baladas, hard rock e principalmente rock progressivo. Cada um que provar da experiência auditiva dessa realização vai entrar em sintonia com aquela música que melhor fechar com suas vibrações. Isso é muito pessoal. Mas sem dúvida Morning Light é uma ótima música para começar a conhecer o Apocalypse.
Link para o vídeo lyrics da música Morning Light:
Vicente - As letras do disco, em sua grande maioria, mostram um grande otimismo. Acredita ser este um reflexo do atual momento vivido pela banda?
Eloy Fritsch – As letras sempre foram poéticas, místicas, em defesa da natureza e contra a destruição do Planeta. O Apocalypse é um aviso de que temos que cuidar uns dos outros e de nosso planeta. Sempre queremos transmitir uma mensagem otimista para as pessoas. O Apocalypse é a renovação, a esperança e a revelação de um mundo melhor, e não a destruição como muitos pensam.
O vocalista Gustavo Demarchi e Fábio Schneider na bateria (2012)
Vicente - Inclusive, a épica e complexa faixa-título, com seus mais de 13 minutos de duração, é um grande exemplo dessa mensagem. Como foi a composição desta música em particular?
Eloy Fritsch – Eu compus essa música ainda em 2008. Mas só conseguimos finalizar as gravações dela em 2011. Gostei muito de fazer a 2012 porque ela possui todos os elementos do rock sinfônico fornecendo um espaço maior para partes instrumentais com simulação de orquestra e também coral. Ao contrário das outras composições desse CD como Take my Heart, A Cry in the Infinity, Morning Light e Blue Angel que possuem um discurso musical mais direto e baseado na canção valorizando muito a parte vocal, compus partes instrumentais intercaladas pela voz, incluindo instrumentos solistas como o órgão e o minimoog. Como o percurso da obra musical é maior o desafio está em equilibrar a energia entre as diversas passagens musicais buscando manter o interesse do ouvinte. A música é repleta de ideias que são desenvolvidas e que às vezes resultam em momentos dramáticos e mais tensos que apresentam surpresas ao fã do rock progressivo. Nesta música podemos ouvir diversas referências ao ELP e ao Triumvirat, tenho muito a agradecer aos ícones do rock progressivo Keith Emerson e Jurgen Fritz por me mostrar o caminho com suas gravações magníficas. A 2012 é realmente uma música especial que ampliou diversos recursos musicais que o Apocalypse já estava explorando nos CDs anteriores: acordes quartais, alternância de compassos, ritmos provindos do jazz e arranjos corais e orquestrais. O Apocalypse tem alguns épicos como Vindo das Estrelas, Do Outro Lado da Vida, A um Passo da Eternidade, Último Horizonte, que são faixas longas em que a banda investe muito mais tempo e energia para sua realização. Fico muito feliz em escrever que a música 2012 Light Years from Home entra para esse seleto grupo de músicas que chamamos de rock progressivo sinfônico brasileiro.
Apocalypse (2011) – Ruy Fritsch (guitarra e backing vocals), Fábio Schneider (bateria), Gustavo Demarchi (voz e flauta), Rafael Schmitt (baixo) e Eloy Fritsch (teclados eletrônicos e backing vocals)
Vicente - Apocalypse é uma daquelas bandas que "sofrem" com o problema de serem mais reconhecidas no exterior que em seu próprio país. Acredita que esse é um caminho sem volta, ou ainda acreditam na força do cenário nacional, no público apoiando suas bandas?
Eloy Fritsch – Acredito no potencial da nossa música. Quanto mais ela tocar as pessoas mais estaremos cumprindo nosso papel de compositores e músicos. Não podemos nos deixar afetar pela situação da música no Brasil. Notamos um cenário desanimador para os grupos de carreira que não são apoiados nem pela comunidade e nem pelo governo. Nós sempre buscamos nosso próprio espaço e parceiros que pudessem contribuir com a nossa música. Foi assim em 2011 quando nossas músicas foram arranjadas para orquestra e coral e apresentadas em um grande concerto em nossa cidade natal. Foi uma apresentação de alta qualidade musical que nos encheu de orgulho por estar tocando nossas composições juntamente com tantos músicos no palco. Foram momentos mágicos.
Apocalypse tocando com a Orquestra e o Coral de Caxias do Sul em Concerto realizado em 2011 ( foto Maicon Damasceno)
Vicente - Vocês já tocaram com bandas de diferentes estilos e sonoridades, desde Uriah Heep e Pendragon, até Ira! e Nenhum de Nós. Como foi dividir o palco com estas bandas?
Eloy Fritsch – Quando tocamos com os grupos pop como Ira e Nenhum de Nós foi um grande contraste. Sem dúvida o som do Apocalypse combina bem mais com Uriah Heep e o Pendragon.
Ruy Fritsch tocando guitarra no Apocalypse em show realizado no Canecão – Rio de Janeiro – na abertura do Uriah Heep (2009)
Vicente - Quem é do Rio Grande do Sul e mesmo do sul do Brasil, sabe o prestigio e o alcance que o Planeta Atlântida possui na mídia. Assim como sabem que o Rock, principalmente o mais pesado ou de nuances mais técnicas, nunca teve muito espaço. Como surgiu essa oportunidade de tocar no festival?
Eloy Fritsch – Naquela época a gravadora Atração de São Paulo lançou o CD The Best of Apocalypse com as gravações dos Cds franceses. O falecido Renato Sirotsky, produtor do evento, ouviu o Apocalypse e gostou do som da banda. Ele já havia assistido shows do Genesis e do Asia e achou semelhanças do som que fazíamos com essas bandas inglesas maravilhosas. Na época éramos um quarteto com a mesma formação do Asia e talvez isso tenha ajudado na comparação. Então resolveu incluir a gente nesse mega festival para tocarmos rock progressivo. Foi muito legal!
Vicente - Em poucas palavras, o que acha das seguintes bandas:
Marillion: conhecemos os músicos quando tocaram no Brasil. O show deles foi maravilhoso. Garden Party é uma de minhas preferidas. Eles influenciaram muito o Apocalypse nos anos 1990.
Yes: minha banda progressiva predileta com grandes composições do rock sinfônico e a voz angelical do maravilhoso Jon Anderson.
Genesis: perdi a conta de quantas vezes ouvi Cinema Show do Genesis. Grande influência para o Apocalypse.
King Crimson: um grupo importante para o progressivo. Mas me identifico mais com o estilo do ELP. Depois do Yes, o ELP é minha banda de rock progressivo preferida.
Rush: um trio sensacional. O show deles é pura energia. Prefiro a fase progressiva como o épico Xanadu.
Vicente - Uma mensagem para os fãs e amigos que curtem o trabalho do Apocalypse e apostam no Rock nacional.
Eloy Fritsch – Gostaria de agradecer ao Vicente por esta oportunidade de responder e comentar um pouco sobre o projeto musical do Apocalypse. Também somos gratos a todos que acompanham a trajetória do Apocalypse, incentivam e divulgam nossa música no Brasil e no exterior. Na era do mp3, entendo o The 25th Anniversary Box Set do Apocalypse como um oásis para os fãs e colecionadores de rock em geral. Aproveitem esse premiado lançamento e continuem incentivando a música autoral em nosso país. Fiquem ligados nas novidades em nosso site www.apocalypseband.com porque em breve estaremos materializando novos projetos musicais.
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