Alice Cooper: "Trash", o retorno de uma lenda
Resenha - Trash - Alice Cooper
Por Neimar Secco
Postado em 25 de dezembro de 2013
TRASH é um divisor de águas na carreira de Alice Cooper. Lançado no crepúsculo dos anos 1980, uma déada de intensas mudanças no cenário musical, TRASH, ao mesmo tempo, trouxe de volta um ícone da década anterior e fez alguns fãs mais "hardcore" questionarem: onde está Alice Cooper neste álbum?
Fim dos anos 1980, uma década inteira de acontecimentos (e esquecimentos). Interminável guerra entre Irã e Iraque, crise e colapso do Comunismo, fim da União Soviética, queda do Muro de Berlim. Novos e promissores astros aparecendo no cinema americano: o conto de fadas de E.T, o Extraterrestre; Tom Cruise levando muitos casais jovens, predominantemente as garotas, às alturas com seu Top Gun. Michael J. Fox, Christopher Lloyd e sua inesquecível DeLorean, viajando no tempo, nos levando de volta ao passado e então novamente para o futuro, na série Back To The Future, Jason ceifando vidas por trás de sua máscara assustadora, musicais modernos como Fame e Footloose...
Na música, Michael Jackson levando às alturas o mega sucesso com seu álbum multiplatinado, Thriller e seus clipes e shows mega coreografados e produzidos. (Micael Jackson, no palco, seguramente está para o pop como Freddie Mercury e David Lee Roth, nos seus melhores tempos com o Van Halen, estão para o Rock). No álbum, a cereja do bolo eram as participações especiais do novo parceiro musical -- futuramente traído por Michael (com a compra dos direitos sobre toda a obra dos Beatles), -- Paul McCartney, a surpreendente aparição da guitarra de Eddie Van Halen e o astro dos filmes de terror, Vincent Price. (Alguém, ao ler isso lembrou da parceria Alice Cooper/Vincent Price em Welcome To My Nightmare, realizada em 1975?)
Mas o nosso interesse maior aqui é o Rock, certo? Ok, os anos 1980 foram a época de destaques como U2, The Smiths, The Cure, Madonna, Cyndi Lauper. Ah sim, eu tinha dito ROCK! Então chegamos à NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal) com Iron Maiden, Saxon, Def Leppard... enquanto nos Estados Unidos, Quiet Riot assaltava as TVs e as paradas com covers do Slade (C'mon Feel The Noize e Mama, Weer All Crazee Now), o Twisted Sister, do discípulo de Alice Cooper, Dee Snider, também arrombava nossas TVs (e nossos rádios) com (o clipe hilário de) We're Not Gonna Take It. O rock farofa do Bon Jovi e seus hits melados, salvos pela ótima guitarra de Ritchie Sanbora, eram outro grande destaque da época. E o KISS nos brindava com hits como I Love It Loud (Hey hey hey, yeah! Hey hey hey, yeah). Isso sem contar com o maior fenômeno instantâneo de público e vendas de uma banda de hard rock iniciante: o estouro do Guns N´ Roses com seu álbum de estreia Appetite For Destruction, lançado em 1987, recheado de hits (e riffs) poderosos, bem como aquela que talvez tenha sido a derradeira dupla de vocalista e guitarrista carismáticos no rock: Axl Rose e Slash. Também ressurgiam com força na mesma época, David Bowie e seu amigo Iggy Pop, conterrâneo de Alice Cooper em Detroit. Deep Purple com seu Perfect Strangers e Dio com Holy Diver faziam a nossa alegria roqueira. Mas, espera! O que tudo isso tem a ver com Alice Cooper e seu TRASH? Vamos parar com toda essa enrolação e ir ao que interessa!!! Pois então vamos, mas com calma...
Chegamos ao nosso ponto de partida. Welcome To My Nightmare tinha sido a última mega produção de Alice Cooper nos anos 1970. Seus álbuns da segunda metade dessa década oscilaram entre musicalmente irregulares (o que não quer dizer ruins) e marcados pelas duras batalhas contra o alcoolismo. O álbum seguinte, Alice Cooper Goes To Hell, não teve a mesma consistência e qualidade musical, e para agravar a situação, o projeto de uma tour para promovê-lo foi abortado devido ao estado de saúde delicado de Alice. Mas ele deixou pelo menos duas gemas: a faixa de abertura "Go To Hell" e a linda balada, que foi o single de maior vendagem da história da Warner Bros.: I Never Cry. Lace and Whiskey e From The Inside completaram a década e a trilogia (iniciada com Alice Cooper Goes To Hell) de álbuns autobiográficos de Alice Cooper, mas isso é tema para uma nova matéria.
Os anos 1980 até prometiam com o lançamento de Flush The Fashion, que teve como único (e modesto) hit Clones (We're All). Mas depois de tantas considerações sobre a década que chegava ao fim, peço licença para pular direto ao TRASH.
Os anos 1980 não tinham produzido nenhum grande hit para Alice Cooper. O que ainda mantinha sua carreira num grau de importância eram as turnês (descontado o hiato entre fim de 1982 e primeira metade de 1986, ano do lançamento de Constrictor).
Depois de duas tentativas louváveis com os ótimos Constrictor (1986) e Raise Your Fist And Yell (1987) e suas respectivas irreparáveis produções de palco, TRASH foi o gol de placa que consolidou a vitória depois de tantos anos de batalha contra o alcoolismo e em que o nome e a fama de Alice Cooper haviam ficado ofuscados em meio ao turbilhão das bandas já citadas nesse texto.
Chegando aos vinte anos de carreira, Alice Cooper tinha o que comemorar: foi uma das maiores estrelas da música da primeira metade dos anos 1970 e venceu o álcool, o que lhe trouxe a lucidez e a saúde de que precisava e das quais já tinha começado a usufruir nos três anos e duas turnês anteriores. Mas TRASH foi um marco.
Gravado pela então maior gravadora do mundo: Epic/CBS, produzido por Desmond Child, produtor e "hitmaker" que já havia trabalhado com Bon Jovi, Aerosmith e KISS, entre tantos outros, e contando com uma banda afinadíssima:
John McCurry (guitarra)
Hgh McDonald (baixo)
Bobby Chouinard (bateria) e
Alan St. John (teclados),
além de vários convidados ilustres que fizeram de TRASH uma verdadeira celebração para Alice Cooper.
Participaram do álbum:
Jon Bon Jovi (vocais na faixa título)
Ritchie Sanbora (guitarra na balada Hell Is Livin' Without You)
Steven Tyler (vocal na balada Only My Heart Talkin')
Joe Perry (guitarra em House Of Fire)
Kip Winger -- cuja carreira solo foi muito impulsionada por seu trabalho com Alice entre 1986 e 87 -- (em I'm Your Gun) e também do Aerosmith:
Tom Hamilton (baixo), na faixa-título (Trash) e
Joey Kramer (bateria em "Trash")
A temática do álbum não poderia ser mais apropriada para quem tinha como foco fazer um álbum de qualidade, mas também altamente acessível, de fácil assimilação. Todas as faixas de TRASH falam de relações amorosas. "Poison" é uma poderosa canção que fala de dependência afetiva, do "vício" por outra pessoa, da não possibilidade de resistir à tentação e também de fantasias sadomasoquistas.
I wanna love you but I better not touch (Don't touch)
I wanna hold you but my senses tell me to stop
I wanna kiss you but I want it too much (Too much)
I wanna taste you but your lips are venomous poison
You're poison running through my veins
You're poison
I don't want to break these chains
Quero te amar, mas melhor eu não tocar (não toque)
Quero te abraçar, mas meus sentidos me dizem para parar
Quero te beijar, mas eu quero demais (demais)
Quero sentir seu gosto, mas seus lábios são venenosos
Você é veneno correndo pelas minhas veias
Você é veneno
Não quero romper essas correntes
O arranjo excelente somado à letra altamente provocante e ao clip excepcional fizeram de "Poison" o hit pelo qual Alice e seus fãs esperaram por tantos anos, tendo chegado à 9ª posição na Billboard.
Outros hits do álbum foram:
-- House Of Fire, música originalmente composta por Joan Jett, que decidiu, na época, não utilizá-la. Oferecida a Alice, que acrescentou alguns versos à letra original, tornou-se mais um hit desse tão esperado retorno ao sucesso.
-- Only My Heart Talkin', que conta com os vocais de Steven Tyler. Alice faz uma homenagem a ele no clip da música. Sua namorada (amante) parte em um carro com o nome TYLER escrito na placa.
[an error occurred while processing this directive]-- Bed Of Nails
Essa é a música sadomasoquista por excelência. Diz o trecho sussurado por Alice na abertura da música:
(I love the way you hurt me, my tears, your wine
Your thorns withdraw my blood and fall like crimson rain.
Light candles in the pale moon shining above us.
The line between pleasure in pain has slowly vanished
Reaching deeper and deeper into a void of your venomous love)
(Adoro o jeito que você me machuca, minhas lágrimas, o seu vinho
Seus espinhos retiram meu sangue e caem como como chuva vermelha
Velas acesas sob o pálido brilho da lua sobre nós
A linha entre prazer e dor lentamente desapareceu
Chegando cada vez mais fundo dentro de um vazio de amor venenoso)
Além de "Poison", "Bed Of Nails", "Only My Heart Talkin'", "Trash" e "House Of Fire", fica difícil destacar outras faixas do álbum, não por falta de qualidade, mas, ao contrário, por serem muito equivalentes entre si.
As faixas do álbum são:
1. Poison (Cooper, Child, McCurry) [4:28]
2. Spark In The Dark (Cooper, Child) [3:51]
3. House Of Fire (Cooper, Jett, Child) [3:46]
4. Why Trust You? (Cooper, Child) [3:12]
5. Only My Heart Talkin' (Roberts, Goldmark, Cooper) [4:46]
6. Bed Of Nails (Cooper, Warren, Child) [4:20]
7. This Maniac's In Love With You (Cooper, Teeley, Held, Child) [3:47]
8. Trash (Cooper, Frazier, Sever, Child) [4:01]
9. Hell Is Livin' Without You (Cooper, Bon Jovi, Sambora, Child) [4:11]
10. I'm Your Gun (Cooper, McCurry, Child) [3:47]
Embora não seja considerado um trabalho digno do "personagem" e da lenda de Alice Cooper, TRASH cumpriu com maestria um objetivo tão arduamente perseguido durante toda uma década que o precedeu: o de trazer de volta ao cenário das paradas e dos grandes shows de rock um personagem essencial à história (do Rock): Alice Cooper
NOTAS:
-- Um título cogitado para o álbum antes da escolha por TRASH foi Low Class Reunion.
-- O riff principal de "Poison" foi gravado originalmente por John Waite em uma música sua (Encircled) que também foi co-escrita por McCurry, um dos compositores de 'Poison'). John (autor do riff) levou a ideia a Desmond Child e uma nova música foi composta a partir desse riff.
-- A banda de apoio para a turnê de TRASH (Alice Cooper Trashes The World) foi a seguinte:
Al Pitrelli - guitarra
Pete Friesen - guitarra
Tommy 'T-Bone' Carradona - baixo
Jonathan Mover - bateria (substituído por Eric Singer nos shows dos EUA e Austrália)
Derek Sherinian - teclados
Devon Meade - backing vocals
-- Al Pitrelli foi recomendado por Steve Vai, que Alice havia convidado para compor a banda para a turnê de TRASH, mas que não pôde se comprometer, pois já estava trabalhando com o Whitesnake na ocasião.
-- O set list da turnê sofreu alterações durante sua realização. O que ficou registrado no vídeo oficial Alice Cooper Trashes The World foi o seguinte:
Hello Hooray (tape - antes de Alice subir ao palco)
Trash
Billion Dollar Babies
I'm Eighteen
I'm Your Gun
Desperado
House of Fire
No More Mr. Nice Guy
This Maniac's In Love With You
Steven
Welcome to My Nightmare
Ballad of Dwight Fry
Gutter Cat versus the Jets
Only Women Bleed
I Love the Dead
Guitar Solo (Introdução de Poison)
Poison
Muscle of Love
Spark in the Dark
Bed of Nails
Bis
School' Out
Under My Wheels
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