Resenha - Nursery Cryme - Genesis
Por Raul Branco
Postado em 19 de maio de 2002
Se você liga o nome Genesis a baladas pop, pare um pouco, ouça "Nursery Cryme" e reveja seus conceitos: a banda que Phil Collins colocou nas paradas de sucesso pop de todo o mundo já foi um caso muito, muito sério.
Bom, para começar, nem era a banda de Phil Collins, mas um grupo construído em volta do quarteto Peter Gabriel (vocal e flauta), Tony Banks (teclados), Anthony Philips (guitarra) e Mike Rutherford (baixo), remanescentes da primeira e frustada formação, que lançara nos anos 60 o álbum "From Genesis To Revelation" e que, anos depois se reagrupara e gravara, acompanhados de John Mayhew (bateria), o belo álbum "Trespass" (1970).
Aconteceu, então, a mudança que colocaria o Genesis na elite do progressivo, com a entrada dos excelentes Steve Hackett (guitarra) e Phil Collins (bateria); o grupo encontrou neste quinteto a maturidade como compositores, como intérpretes e, mais importante, como banda. A formação que viria ser considerada a ideal por fãs e crítica entrou em estúdio, um ano depois, ainda produzidos por John Antnony, e gravou uma obra-prima.
O álbum abre com "The Musical Box", uma longa peça (10min30seg) que inspirou a sangrenta, bizarra e dantesca capa, onde uma menina e sua ama, no período vitoriano, jogam críquete com cabeças de outras crianças. No folheto que acompanhava o disco, há uma historieta imaginativa e gótica explicando-a em detalhes. Como música, "The Musical Box" tem grandes achados, transmitindo através da escolha de instrumentos e timbres, o clima e a trama que vão se desenvolvendo e se revelando aos poucos: a menina achando a caixa de música, maravilhando-se, o "envelhecimento" do irmão, o apetite sexual distorcido, a transformação e o epílogo. Nessa peça, quem já conhecia o grupo pôde perceber como a entrada de Steve Hackett foi proveitosa. As delicadas frases em sua Gibson e os solos mais distorcidos, sem perder a clareza, somaram muito ao som da banda. Temos que notar aqui que o trabalho de guitarra e bateria mantiveram a linha escolhida pelo grupo, mas o nível dos artistas fez a diferença. Outro destaque é o vocal de Peter Gabriel, mais interpretativo do que era até então.
A segunda faixa, como contraponto, é uma singela balada acústica de apenas 1min43seg, delicada e gentil como seu tema. "For Absent Friends" descreve suavemente, como quem vê uma cena de filme, uma visita de duas viúvas à igreja. Sua melodia é tão doce que qualquer letra, romântica ou pastoril, se encaixaria perfeitamente nela, desde que tivesse como tema a paz.
"The Return Of The Giant Hogweed", outra faixa longa, traz à memória os engenhosos e pueris filmes B de ficção científica dos anos 50, narrando a história bizarra de um arbusto gigante que destruiria a todos nós, imune a qualquer bateria herbicida. Mais notável que a música, a letra é um trunfo bem jogado por Peter Gabriel que, mais uma vez, tem a chance de ser mais um ator que um cantor. Qualquer semelhança com a narração de "Guerra dos Mundos" por Orson Welles pode não ter sido mera coincidência.
O lado B brindava o ouvinte com, na minha modesta opinião, a melhor peça do Genesis desta fase. "Seven Stones" é como um aliança de ouro com um diamante incrustado: o mineral mais cobiçado e o metal mais rico são combinados para dar um sentido palpável a um sentimento, valorizando ao mesmo tempo a jóia. A história do velho marinheiro vai entrando mais em nosso coração que em nossos ouvidos, e os acordes finais do mellotron de Banks (uma das grandes marcas registradas do Genesis), sublinhados pela bateria, é um dos finais mais felizes que qualquer música jamais teve.
Outro achado é "Harold The Barrel", que se segue. A música vai contando mais uma historieta, dessa vez através de um noticiário, de pessoas na rua e dos protagonistas do drama que se desenrola e culmina num suicídio anunciado várias vezes. Antes que Harold pule do alto do prédio, todos tentam dissuadi-lo, inclusive sua mãe. Essa, por sinal, é apresentada brilhantemente através do arfar resfolegante por ter subido os degraus de um prédio, onde seu filho se encontra no parapeito, sonhando estar a muitas milhas distante, navegando num barco em alto-mar. Seu final, inconcluso, é outro ponto marcante, e você não tem como evitar se sentir despencando junto com o infeliz Harold.
Tal e qual no lado A, uma peça mais suave serve de intermezzo entre histórias tão dramáticas e vigorosas. Agora é "Harlequin", que tem um arranjo mais calcado nas guitarras e violões, com os vocais cantando versos quase soníferos, de tão suaves que são, com imagens calmas como "All, always the same / but there appears in the shade of dawning / though your eyes are dim / all of the pieces in the sky."
Para finalizar, outra música de longa duração, como convém aos temas progressivos. Ambientada na Grécia Heróica, conta o mito de Hermafroditus, semideus que foi unido num só corpo a uma ninfa. Novamente baseando seu arranjo desde a introdução no som orquestral do mellotron e do órgão, "The Fountain of Salmacis", abre um pequeno espaço, no meio da peça, para que guitarra e flauta se destaquem, já que a cozinha Rutherford/Collins é simplesmente impecável nessa faixa. Vale a pena prestar atenção também nos vocais que se sobrepõem, reforçando a dualidade da origem do filho de Hermes e Afrodite que se funde a ninfa Salmacis (para quem não sabe, atualmente o termo hermafrodita designa indivíduos que possuem ambos os sexos).
Após esse disco perfeito, o Genesis gravaria outra obra de arte, "Fox Trot", álbum que finalmente levaria o grupo para os quatro cantos do mundo e que levaria o público em geral a descobrir esta maravilha que é, ainda hoje, "Nursery Cryme".
Outras resenhas de Nursery Cryme - Genesis
Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps



Internautas protestam contra preços de ingressos para show do AC/DC no Brasil
Os três clássicos do Iron Maiden que foram "copiados" do Michael Schenker Group
Os três melhores guitarristas base de todos os tempos, segundo Dave Mustaine
Como James Hetfield, do Metallica, ajudou a mudar a história do Faith No More
A banda que não ficou gigante porque era "inglesa demais", segundo Regis Tadeu
A melhor banda de metal de todos os tempos, segundo Scott Ian do Anthrax
O álbum que rachou o Deep Purple: "O Jon gostou da ideia, mas o Ritchie não"
A única música do "Somewhere in Time" do Iron Maiden que não usa sintetizadores
Os dois solos que, para Ritchie Blackmore, inauguraram a "guitarra elétrica inglesa"
West Ham une forças ao Iron Maiden e lança camiseta comemorativa
Slash dá a sua versão para o que causou o "racha" entre ele e Axl Rose nos anos noventa
O "detalhe" da COP30 que fez Paul McCartney escrever carta criticando o evento no Brasil
Os 10 melhores álbuns do DSBM em uma lista para checar sua saúde mental
A maior lenda do rock de todos os tempos, segundo Geezer Butler do Black Sabbath
A categórica opinião de Kiko Loureiro sobre Slash
Chris Cornell: Alguns fatos sobre o músico que nem todos conhecem
Youtuber expõe miséria que Spotify repassa a bandas de metal brasileiro



O maior baterista de todos os tempos para Phil Collins; "nunca tinha visto nada parecido"
A canção do Genesis que a banda evitava tocar ao vivo, de acordo com Phil Collins
As 10 melhores músicas da fase progressiva do Genesis segundo leitores da revista Prog
A banda com a qual Phil Collins disse estar "no céu" ao trabalhar
Os 11 álbuns prog preferidos de Geoff Downes, tecladista do Yes e Asia



