A nova indústria musical: agora os sites musicais comandam
Por Nacho Belgrande
Fonte: L.A.Weekly
Postado em 14 de fevereiro de 2010
O artigo abaixo, sub-intitulado "Fazedores de Astros: os guardiões dos portões estão sumindo - os outrora poderosos executivos tornaram-se uma espécie em extinção", é de autoria de Paul Rogers e foi publicado originalmente no L.A.Weekly.
Enquanto 2007 começava, Jon Sidel tinha sido chefe do departamento de artista e repertório (A & R) da costa Oeste dos EUA com a 'super na moda' V2 Records por sete anos. A vida era boa. Sidel, que antes tinha sido executivo de A & R na Interscope Records, estava trabalhando com gente como THE WHITE STRIPES e THE CRYSTAL METHOD; era um restauranteur bem sucedido (ex-dono de lugares disputados em Hollywood como o Swingers e o Small's); e contava com a atriz Rosanna Arquette entre suas ex-namoradas. Mas naquele janeiro, a V2 foi abruptamente fechada por novos donos, e todo o seu expediente foi dispensado. Exceto que eles esqueceram de seu principal homem em Los Angeles "Eu me senti como o joão-ninguém que trabalha na [rede americana de papelarias] Office Space," ri Sidel. "No porão, ainda trabalhando por baixo."
Antes a carreira mais poderosa no negócio da música, executivos de artista e repertório (A & R) são encarregados de achar novos artistas para gravadoras, contratando-os, e depois supervisionando seu desenvolvimento artístico. Eles acompanham o processo de gravação, incluindo a seleção de produtores, canções e singles, e o bem-estar entre o artista e a gravadora. Assim sendo, esses guardiões dos portões anônimos tem sorrateiramente influenciado as trilhas sonoras de nossas vidas.
Para muitos músicos, o 'cara do A&R' tornou-se uma figura quase mítica que podia pinçá-los da obscuridade e colocá-los nas paradas. Mas isso foi nos anos 80 e 90 – os anos da explosão do CD, antes do compartilhamento de arquivos e do iTunes – quando os grandes selos estavam tendo lucros de deixar qualquer um boquiaberto e contratando artistas de maneira relativamente livre e frequente. Quando, na virada do milênio, a indústria fonográfica ignorou a oportunidade da distribuição digital apresentada pela sua colega internet, seus lucros despencaram, ao mesmo tempo que o público perdeu interesse no repentinamente espaçoso compact disc (as vendas de discos nos EUA encolheram de 785 milhões em 2000 para 428 milhões em 2008, de acordo com o sistema de coleta de dados Nielsen Soundscan).
Demissões em massa drásticas se seguiram – mais de 5.000 pela indústria entre 2000 e 2007 – à medida que compras e fusões reduziram os grandes selos a um grupo de 'Os 4 Grandes' e marcas significativas como a Arista, V1 e DreamWorks desapareceram juntas. As patentes de A&R dissiparam-se de acordo: 127 executivos de A&R foram demitidos ou optaram por deixar seus empregos só durante o ano de 2007, de acordo com a fonte de contato para negócios 'The A&R Registry'. Mesmo alguns 'ouvidos de ouro' estabelecidos e contemporâneos como Sidel, Rob Stevendon da Island Def Jam, que contratou THE KILLERS e o FALL OUT BOY, e Mark Williams da Interscope (o executivo fonográfico no. 1 do mundo na tabela de 2005 dos 'Top 100 do A&R', uma lista anual dos melhores profissionais de A&R publicada pelo site HitQuarters.com), deixaram seus postos.
Muita gente que era do A&R permaneceu na indústria do entretenimento, agindo como empresários, consultores ou produtores. Outros migraram para profissões sem correlação alguma como o ramo imobiliário e o ensino. "Poucos conseguiram outro emprego de A&R," diz Ritch Esra, publicador da The Music Business Registry (que inclui The A&R Registry) e ex diretor de A&R da Costa Oeste da Arista Records. Alguns optaram pela semi-aposentadoria, como o veterano homem do A&R da Columbia/MCA Rob Oberman, que contratou THE BANGLES, TOAD THE WET SPROCKET e o WARRANT e agora está escrevendo um livro e jogando "muito pôquer."
Mesmo o pessoal sobrevivente do A&R desfruta de menos poder de barganha do que eles tinham uma década atrás. Enquanto executivos de artista-e-repertório das antigas conseguiam ver uma banda numa casa noturna, passar ela pelo chefe da gravadora e depois oferecer um contrato ao artista, agora eles muitas vezes dependem da aprovação de um comitê inteiro de superiores nos selos fonográficos cada vez mais sem dinheiro e cautelosos. "Eu lembro quando a A&M, a Interscope e a Geffen se juntaram em 1999," diz Michael Rosenblatt, que descobriu MADONNA, o B-52s e o THE THE, durante uma carreira de A&R em vários selos grandes. "Naquela época haviam 11 pessoas que poderiam dizer, 'Sim, você vai ser contratado.' Depois que elas fizeram a fusão, tornaram-se três. E isso aconteceu em todo canto."
"Eu acho que hoje em dia os executivos de A&R nos grandes selos estão com medo de pôr suas vidas na reta e contratarem um artista novo por medo de que se o CD de um artista novo não vender um milhão de unidades, isso poderia ser o fim do emprego deles," lamenta Michael Alago, que descreve sua carreira de A&R com a Elektra (onde ele contratou o METALLICA) e com a Geffen como "23 anos de sexo, drogas e rock & roll." Ele tem seu coração partido pela maneira como as coisas tem mudado. "Infelizmente, não há mais desenvolvimento de artistas. Onde antes você podia contratar um artista e vender 100.000 discos e ficar feliz... eu não acho que as empresas pensem dessa maneira hoje em dia." Alago agora é fotógrafo e fornece aconselhamento de A&R ocasionalmente, incluindo CYNDI LAUPER.
O profissional de A&R da era digital localiza públicos (majoritariamente online) tão avidamente como ele procura por artistas. "Nos dias antigos eles estavam procurando por qualquer lasca e pedaço, e se eles achassem algo reluzente na grama, eles catavam e o lapidavam," Esra diz. "Hoje eles não estão procurando por talento, eles estão procurando por um negócio em andamento... que a cultura e o mercado digam a ele o que é bom e bem-sucedido."
Steve Knopper, autor de 'Appetite for Self-Destruction: The Spectacular Crash of the Record Industry in the Digital Age' (tradução livre: Apetite por Auto-Destruição: A Espetacular Queda da Indústria Fonográfica na Era Digital) concorda: "Não há mais tantas pessoas cuja especialidade é ir às casa noturnas e achar os melhores artistas e cavá-los e ser um tipo de contato de uma pessoa pra uma máquina de reprodução de sons; os que vão pra Mineápolis e pegam THE REPLACEMENTS e HÜSKER DÜS e SOUL ASYLUMS da vida e deixam o resto."
Hoje em dia há pouca necessidade de sair de perto de seu laptop, muito menos sair de casa. Diz Rosenblatt, agora vice-presidente sênior do site LP33 de "descoberta de música na internet", "seja lá quem for a próxima grande banda, ela está no MySpace. Mas vai tentar achar! Então o que temos aqui na LP33 é um time de programação. A gente ouve bandas novas e emergentes; as bandas que a gente mostra na nossa home page e nossos diferentes canais são as bandas que nós fizemos a cura... separamos ela do meio da bosta."
A LP33 inclui a Treadstone Music Intelligence, uma rede de 150 caçadores de talento criados por outra ex-executiva de A&R, Paula Moore.
A história de Rosenblatt ilustra o que alguns observadores tem chamado de "o novo A&R". Artistas podem alcançar públicos substanciais através de sites de relacionamento, iTunes e serviços de distribuição de música digital como o TuneCore. Se eles forem bons, blogs influentes como o Brooklyn Vegan, Gorilla Vs Bear e o Stereogum, além do portal de blogs The Hype Machine e sites como o LP33, irão rapidamente espalhar notícias sobre eles. Artistas de sucesso como a banda pop de Nova Iorque VAMPIRE WEEKEND originalmente tinham fãs capturados por meio de blogs. "Os artistas agora sabem usar o YouTube, e eles sabem como usar o ProTools pra fazer um disco," Kopper explica. "Essa coisa toda costumava ser inacessível pra eles, o que o cara do A&R tinha que fazer, eles podem fazer agora... o guardião do portão não é mais apenas uma pessoa; é essa coisa complexa."
Agora aptos a vender sua música online na forma de downloads, os artistas não mais precisam de um selo pra que a música deles vá pras lojas de discos que ainda restam. Livres de entraves legais, as bandas levam pra casa uma melhor porcentagem de sua renda – e desfrutam de total controle criativo – mediante venda de seus estoques diretamente pros fãs. "Dez aos atrás, toda banda queria um contrato de três discos na Interscope. Aquilo era o cálice sagrado," diz Rosenblatt, " e agora, por causa da internet, o homem atrás da cortina foi exposto."
"Não há dúvida de que a arte do A&R foi pras mãos dos próprios fãs", explica Ron Handler, que trabalhou em A&R pra DreamWorks Records e Interscope/Geffen e contratou gente como RISE AGAINST e PAPA ROACH. Um site de música como o Pitchfork e alguns dos blogs mais importantes tem mais influência na descoberta de uma banda do que um executivo de A&R numa gravadora grande. "Sempre haverão filtros pra talento, é que eles só mudaram de posições. O talento sempre sobe ao topo. A única coisa que mudou é que os caçadores de talento agora são o Pitchfork e o Stereogum ao invés da Interscope e da EMI."
Handles hoje é dono de uma empresa de produção de filmes.
Sidel, que administra a Sidel Services (uma empresa de A&R operando "fora do sistema"), recolhe-se à sua realidade. "A maneira que eu defino o A&R agora, é que não é realmente sobre achar essa banda que eu acho que seja a mais legal do mundo. É mais sobre entender o contexto no qual um artista pode vingar na internet, naquela zona onde as pessoas procuram por música, e como a música deles se encaixa naquilo."
Curiosamente, a página inicial do computador de Sidel é o Pitchfork.
Enquanto a relação revolucionada entre artista e fã marginalizou o A&R dos grandes selos, a arte de descobrir e alimentar talento não está morta. Apesar de quase todos os novos artistas serem familiarizados com a Internet, eles precisam de ajuda pra fazer sua música se destacar numa rede nunca antes tão congestionada. E apesar disso não precisar envolver um grande selo (ou qualquer selo), a rota do faça-você-mesmo tem um teto de sucesso. Se um artista quer o mega-estrelato como Lady Gaga ou Rihanna, ainda é necessário trabalhar com as empresas fonográficas "de música grande" restantes (que tem acesso ao Walmart, Best Buy e coisa do tipo) e seu aparato de A&R. Enquanto artistas tarimbados na net como Colbie Caillat e Lily Allen construíram grupos de seguidores impressionantes sendo artistas independentes, ambos agora estão com selos grandes. E o grande selo mais bem-sucedido atualmente, a Atlantic Records, é encabeçada por Craig Kallman, um ex-executivo de A&R que descreveu sua empregadora como uma "empresa progressiva, direcionada por A&R, de conteúdo voltado para o artista."
"O sistema tradicional ainda está funcionando," acrescenta Knopper. "É apenas uma versão diminuída de si mesmo."
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