Joy Division: a biografia de Ian Curtis escrita por sua viúva
Por Mário Pescada
Fonte: Ideal Shop
Postado em 01 de março de 2016
Nota: 8
Embora faça mais de 35 anos que Ian Curtis faleceu, ainda hoje ele e o JOY DIVISION continuam atraindo o interesse de gerações, mesmo tendo lançado apenas dois discos.
O que Deborah Curtis mostra no livro não é a visão de banda com detalhes sobre os dois discos. São sim relatos da vivência dela ao lado de uma pessoa emocionalmente instável. O livro foi fonte para o filme Control (2007) de Anton Corbjin, também sobre a vida de Ian Curtis. O prefácio é de Kid Vinil, que assistiu o JOY DIVISION ao vivo em Londres em janeiro de 1980.
O casal Curtis se conheceu na adolescência, quando Deborah namorava o amigo de Ian, Tony Nuttal. Deborah descreve Ian como um cara muito reservado no colégio, de poucos amigos e fã de DAVID BOWIE, JIM MORRISON, LOU REED e IGGY POP. Nessa época, ele fazia uso de solventes, maconha e até de remédios roubados de idoso e já tinha inexplicáveis ataques de raiva, podendo partir para agressões físicas e danos materiais. Detalhe: Ian já falava sobre suicídio nesse período, mas ninguém o levava a sério.
Os dois acabam se aproximando e começam a namorar. Ian também era muito ciumento, ao ponto de proibir Deborah de usar maquiagens e conversar com seus amigos homens de serviço. As coisas andaram rápido demais para o casal e logo ficaram noivos (até nesse dia Ian acaba dando um "show" na frente de todos convidados) e com apenas 19 anos se casam. As coisas pareciam estar dando certo, ele até conseguiu emprego no Ministério da Defesa após uma tentativa frustrada de vender discos em um mercado local.
Ian tinha convicção de que conseguiria ter uma banda de sucesso e isso ficou mais claro para ele e seus colegas Peter Hook, Bernard Summers e Terry Manson depois de terem visto uma performance do SEX PISTOLS (era como "se eles conseguiam ser uma banda, qualquer um podia"). Então fundam o Warsaw (inspirado na música de DAVID BOWIE, "Warszawa"). A banda faz alguns shows sem chamar muita atenção e acabam mudando para JOY DIVISION. A sonoridade muda do punk para algo mais coeso e com letras mais trabalhadas. Apesar das coisas estarem andando razoavelmente bem, as brigas entre o casal e as mudanças de comportamento de Ian começam a ganhar força.
Começam então a chamar a atenção de gravadoras pequenas e de um crescente público que ficava atônito com as performances de Ian sobre o palco com seus trejeitos esquisitos, braços voando para todos os lados, um olhar fixo e congelante - muito similar aos seus ataques epiléticos que se tornariam cada vez mais constantes e violentos.
Em 1979, o nascimento da única filha do casal, Natalie, e o primeiro disco Unknow Pleasures é lançado. A revista Sounds escreveu uma crítica na época com o nome de "Disco da Morte" e que ele seria um estimulante caso o ouvinte estivesse pensando em suicídio. Ainda assim, nem Deborah, nem seus colegas de banda pareciam perceber que Ian já dava sinais de que precisava de ajuda.
Deborah passa a ser sumariamente ignorada por ele e pelo resto da banda. Surge então Annik Honoré, a amante que ele carrega para a turnê da banda pela Europa. Se Ian já era uma pessoa complicada antes, com duas mulheres ele se perde mais ainda, oscilando entre prazer e culpa pela situação - que ele mesmo construiu. E é justamente esse furacão de sentimentos confusos e conflitantes que Closer (1980) foi construído, o que explica as letras e o tom mais arrastado e depressivo do que o disco anterior.
Com tantas evidências que as coisas estavam tomando um rumo perigoso, o leitor começa a se perguntar como que ninguém percebeu que Ian estava afundando. Nem Deborah sabe explicar, ela assume no livro. Segundo ela, naquela época havia poucos estudos sobre epilepsia (hoje sabe-se que pessoas que tem epilepsia tem cinco vezes mais chances de praticar suicídio).
Os problemas de Ian se agravam. Os ataques de epilepsia nos palcos e o uso de remédios com bebidas fez com que as coisas piorassem rapidamente: sua total falta de interesse pelas coisas e pessoas ao seu redor só aumentava (ele não chegou sequer a participar da festa de 1 ano da filha). Ian chega a tentar suicídio por overdose de medicamentos, mas é socorrido a tempo.
Cansada das suas manipulações, infidelidade e inconstâncias, Deborah decide então pedir o divórcio, mas ainda assim participava da vida de Ian, deixando a impressão de que ansiava por uma reconciliação com ajuda especializada. No caminho de uma consulta psiquiátrica, ele teria dito que seu sonho era gravar um disco e um single e que isso teria sido alcançado com Unknow Pleasures e Transmission, respectivamente, e que não havia restado então mais nada para ele fazer. Todas as pistas de que algo estava para acontecer eram claras, só não via quem não queria!
Nos últimos três capítulos, Deborah descreve os momentos finais de Ian Curtis. Na véspera de embarcar para a sua primeira turnê rumo aos Estados Unidos, ele assistiu ao filme Stroszek, sobre um homem que termina se suicidando por não conseguir escolher com qual das duas mulheres da sua vida ficar (a vida imitando a arte). Ian retorna para a casa do casal (nessa época tinha saído de casa e voltado a morar com os pais) e escreve uma carta contraditória de despedida a Deborah. Era dia 18 de maio de 1980 quando, pela manhã ao voltar para casa, Deborah encontra o corpo dele ajoelhado no chão da cozinha ainda com a corda do varal ao redor do pescoço, enquanto na vitrola tocava The Idiot, do IGGY POP.
O livro traz ao final um rico material: fotos coloridas de Ian (desde a infância até cinco dias antes de sua morte), toda a discografia detalhada da banda (incluindo faixa a faixa dos dois discos, EP´s, coletâneas, ao vivo, singles, etc.), escritos, letras de todas as músicas gravadas e inacabadas (todas em inglês e traduzidas), além de uma lista com todos os shows feitos (com datas e locais).
Tocando a Distância: Ian Curtis e o Joy Division - Deborah Curtis
Edições Ideal (2014) - 315 páginas
Preço médio: R$ 35,00
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