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Violeta de Outono

Postado em 06 de abril de 2006

Por Sidney Conceição Júnior

Rinoceronte na montanha de geléia

Fabio Golfetti, 42 anos, é produtor, guitarrista e vocalista do Violeta de Outono, a mais cultuada banda do rock paulistano. Guru para uma geração de músicos e fãs, e um nome muito respeitado no meio musical brasileiro, Fabio surpreende pela sua humildade e simplicidade nesta entrevista, sem descuidar um minuto sequer do filho Gabriel, de dois anos, que dormia enquanto Ednéia, sua esposa, levava Victoria, a filha de sete para passear. A viagem tem início...

Meados dos anos 80, recém-saído dos porões da ditadura, o Brasil passava por um período de efervescência cultural, estimulado pelos novos tempos e pelos planos econômicos. Surgia no país uma cena roqueira consistente. Basta dizer que a maioria dos grandes nomes do rock nacional da atualidade são daquela época.

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Uma das mais íntegras representantes desse período é a banda Violeta de Outono, liderada pelo guitarrista e vocalista Fabio Golfetti. A história, porém, tem início nos anos 70, quando Fabio, então com onze anos, conheceu Pink Floyd e Led Zeppelin. Surgiu aí a vontade de tocar e Fabio iniciou os estudos clássicos de violão. O Genesis, de Steve Hackett, e o Yes, de Steve Howe, eram então suas maiores inspirações.

Havia muitos festivais em São Paulo nessa época, principalmente no teatro Bandeirantes, com bandas como O Terço, Os Mutantes, O Som Nosso de Cada Dia e o Made in Brazil. Fabio e seus amigos da Pompéia (bairro paulistano) não perdiam nenhum desses shows. Entre esses amigos estava Angelo Pastorello, que estudava violão com o mesmo professor de Fábio. Aos 17 anos, ganhou sua primeira guitarra, "Uma Les Paul vinho feita por um luthier chamado Vitório".

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O clima propício da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU), onde Fabio ingressou em 1978, foi um fator determinante para sedimentar o seu ingresso no mundo musical - Tive uma "visão" do que eu realmente queria ser - conta. Nessa época ele formou a banda Lux e começaram os primeiros shows nas festas e festivais da USP. Em 1983, então com a banda Ultimato, Fabio conheceu, o baterista Claudio Souza. O som do Ultimato, nas palavras de Fabio, era um "instrumental-jazz-punk". Porém a banda sentia falta de uma voz. Foi aí que apareceu o cantor Guilherme Isnard, ex-Voluntários da Pátria.

Inspirados pela canção da banda progressiva Gong "Zero the hero", a banda foi batizada de Zero. A partir daí as coisas começaram a acontecer. Pouco mais de um ano após a formação do Zero, a banda foi contratada pela CBS para a gravação de um compacto e participação em uma coletânea, que também marcou a estréia de uma outra banda faria muito sucesso depois – o Capital Inicial. "Heróis / 100% Paixão", o compacto, foi lançado em 1985, época em que a banda praticamente já não existia, com seus integrantes mais preocupados com seus projetos e bandas paralelas. Pouco depois, Guilherme Isnard, acompanhado de outros músicos, reformulou a banda, gravando dois discos com certa repercussão.

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Fabio sentiu que era o momento de recomeçar. Com o baterista Claudio Souza, montou uma nova banda, com um estilo atemporal e único. Era o início do Violeta de Outono. Mas ainda faltava uma peça para completar o quebra-cabeça. Fabio então se lembrou do antigo amigo de colégio Objetivo e dos festivais do Teatro Bandeirantes. Assim, Angelo Pastorello, foi convidado para assumir o contrabaixo.

Sem pressa, o repertório da banda foi sendo formado. As letras, misteriosas, inspiradas em poesia chinesa e filosofia oriental, convidavam a uma viagem contemplativa: "Você sabe que não temos tempo, dia eterno, noite escura adentro". Uma curiosidade é que Fabio compôs as letras primeiramente em inglês, a língua nativa do rock, somente depois elas ganharam as definitivas versões em português.

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Depois de algumas despretensiosas gravações caseiras, Fabio enviou a fita para algumas rádios. Para surpresa geral da banda, em São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre suas músicas começaram a ser executadas.

Em Toda Parte

Dezembro de 1985. Mais de um ano depois de sua formação, o Violeta de Outono estreou no palco do Teatro Lira Paulistana, num show com a banda Sotaque. O Violeta de Outono era uma banda misteriosa, com letras idem, sobre a qual o público pouco sabia.

O próximo passo foi o convite que receberam de René Ferri, dono da Wop Bop (loja de discos no centro de São Paulo, que Fabio e seus amigos freqüentavam em busca dos álbuns importados de suas bandas favoritas), para gravarem um disco que seria distribuído como brinde aos clientes da casa. Naquele período, a banda negociava a participação numa coletânea independente.

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Em julho de 1986, foi lançado um vinil em 45 rotações, com três músicas, intitulado simplesmente "Violeta de Outono". Uma aura de mistério envolvia o disco desde a sua capa: apenas o nome da banda e das músicas entre dunas, numa foto de Ansel Adams, um fotógrafo norte-americano, considerado um mestre em paisagens.

Já na primeira faixa, a banda mostrava a que viera: "No percurso rumo ao prédio oculto, desolado o sol se põe à oeste, Lua em gancho, triste, sons do vento Parte o coração o frio do Outono" cantava Fabio, na música "Outono", adaptada do poema "Claustro de Outono" de Li Yu, escrito no século X, o hino da banda. O disco que começou como um brinde, terminou o ano como um dos trabalhos mais elogiados pela crítica especializada, com a banda sendo apontada como revelação de 1986 pela extinta revista Bizz.

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Ainda nesse ano, o Violeta de Outono realizou um de seus maiores e mais importantes shows, junto com a banda Ira!, na Praça do Relógio da USP, para mais de dez mil pessoas. "Tocamos num momento especial, o céu estava maravilhoso, fim de tarde, nuvens espessas, deu um clima especial à ocasião. Eu gostei demais daquele show", lembra Fabio. Para coroar o final de um ano grandioso, o Violeta de Outono assina contrato com a gravadora RCA, que estava criando um selo especializado em rock alternativo, o Plug, aproveitando o aquecimento econômico provocado pelo Plano Cruzado.

O disco foi lançado em julho de 1987 e, além das músicas "Outono" (em nova gravação) e "Dia Eterno", já consagradas pelos fãs, continha uma versão irretocável e definitiva do clássico psicodélico dos Beatles "Tomorrow Never Knows". O Violeta teve total liberdade na gravação do disco, feito num enorme estúdio na sede da RCA, utilizado antigamente na gravação de orquestras. A banda buscou, na ambiência da sala, captar toda a energia do seu som ao vivo. A música "Dia Eterno" teve direito a um videoclipe, gravado no Observatório Nacional, no Rio de Janeiro. O disco recebeu o prêmio de segunda capa mais bonita do ano, também pela revista Bizz.

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Seguiu-se um período de entressafra, antes da renovação do contrato com a RCA, e a banda foi procurada pelo selo Wop Bop. Um velho sonho tornava-se realidade: a gravação de um disco com as músicas das bandas que influenciaram o Violeta de Outono, intitulado Early Years. Acompanhados de programações eletrônicas, violas, violinos e do sax de Lívio Tragtenberg, foram gravadas músicas dos Beatles, Rolling Stones, Pink Floyd e Gong.

O disco Early Years é um marco na música brasileira, pois foi a primeira experiência em que elementos eletrônicos foram incorporados à música acústica no país, algo comum hoje em dia. Os shows de lançamento foram no MASP, que teve o seu grande auditório lotado nos três dias de apresentação. Um verdadeiro retorno ao período psicodélico, com som de qualidade impecável e projeções no palco, shows marcantes para Fabio.

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O contrato com a RCA foi renovado em 1989 e foram iniciadas as gravações do novo disco, "Em toda Parte", onde o flerte com a eletrônica foi ainda maior, mas o resultado final não satisfez à própria banda. Com o atraso de Early Years, gravado no ano anterior, o Violeta de Outono protagonizou mais uma situação única na história da música brasileira: foram colocados no mercado dois trabalhos inéditos simultaneamente, por gravadoras diferentes. Mas, como Fabio diz, "acabamos perdendo um pouco o momento certo".

Nesse mesmo ano, Fabio iniciou um trabalho paralelo, o Ópera Invisível, ligado diretamente ao seu "guru" Daevid Allen, da banda Gong. Seu primeiro trabalho solo foi muito elogiado no exterior.

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Declínio de Maio

A primeira baixa no Violeta de Outono ocorreu em 1990, quando Claudio Souza largou as baquetas, sendo substituído pelo seu xará Claudio Fontes. A banda entraria em compasso de espera por mais de um ano, com apenas alguns shows esparsos realizados, até que Claudio Souza retornasse em março de 1992, porém a banda só voltaria ao circuito definitivamente no final de 1994.

Nesse período Fabio voltou-se ao Ópera Invisível, realizando alguns shows, um deles, parte da ECO 92, acompanhado do seu ídolo e guru Daevid Allen. Em 1993, numa viagem ao Nepal, Fabio começou a compor as músicas de seu primeiro disco solo, com o projeto Ópera Invisível, já rebatizado como Invisible Opera Company of Tibet, na verdade um projeto idealizado por Daevid Allen, que conta com bandas irmãs na Inglaterra, na Austrália e na Cálifórnia, além da sua "versão tropical" comandada por Fabio.

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Um fato inusitado apressou o retorno do Violeta aos palcos: em 1994, Fabio estava fazendo alguns shows com o Invisible Opera, tendo Claudio Souza como baterista. Numa quarta-feira, Fabio resolveu fazer algo diferente: Chamou Angelo e colocou o nome do Violeta de Outono no cartaz de divulgação do show. O resultado foi que o teatro do Centro Cultural São Paulo teve a sua lotação esgotada em plena quarta-feira.

As gravações do novo disco "Mulher na Montanha" têm início no ano seguinte, porém a volta ao mercado do Violeta de Outono não foi com novidades. Os dois discos gravados para a RCA foram remasterizados e lançados num único cd. E outra loja de discos, dessa vez a Record Runner, lançou "Eclipse", um show histórico gravado no Sesc em 1986, numa noite em que a banda fez dois shows devido à quantidade de pessoas que ficaram do lado de fora do Sesc Pompéia na primeira apresentação. O novo disco gravado, "Mulher na montanha", seria lançado somente em 1999, pela gravadora inglesa Voiceprint.

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O Violeta de outono se afastaria novamente do cenário musical, realizando somente alguns shows esparsos, sempre com lotação esgotada. Em 1997, com o trio original acrescido do reforço de Fabio Ribeiro nos teclado, apresentaram-se no Rio Art Rock Festival. O show foi gravado, e lançado em 2000 pelo selo Rock Symphony, do Rio de Janeiro. Nas palavras de Fabio, "Foi um disco em que tivemos pouco envolvimento com a produção e a parte técnica, o pessoal do Rio fez praticamente tudo sozinho, mas considero que o disco conseguiu captar o melhor do nosso som ao vivo". Três dias no Centro Cultural São Paulo, em junho de 1998, marcaram as últimas apresentações da formação original do Violeta de Outono.

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Outra Manhã

Com o lançamento do disco "Mulher na Montanha", o Violeta de Outono voltou a chamar a atenção da mídia. A volta era iminente, porém Angelo e Claudio resistiram ao chamado de Fabio. A saída foi reformar a banda com novos músicos. Chegaram Sandro Garcia pro baixo e Gregor Izidro para a bateria, trazendo novas vibrações. "E é uma coisa curiosa, porque o Sandro tem dez anos a menos do que eu, e o Gregor tem dez anos a menos que o Sandro", diz Fabio.

Nos anos de 2000 e 2001, muitos shows foram realizados, inclusive uma abertura para a banda Camel, no Olímpia. Até que, em julho de 2001, quando a banda voltava de uma viagem ao Rio de Janeiro, Sandro anunciou que estava saindo, para dedicar-se aos seus projetos pessoais. Alguns shows já estavam marcados e Fabio resolveu chamar Angelo Pastorello de volta ao Violeta, para cumprir estes compromissos. Angelo vem e fica definitivamente. Após os shows, começam os ensaios para a gravação do novo disco.

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Quando questionado sobre o porquê de esse revival oitentista atualmente em voga no cenário musical brasileiro, Fabio tem uma teoria de que as bandas da década de 80 tinham uma identidade, um trabalho consistente, que conseqüentemente resistiu melhor ao tempo. Já as bandas novas misturam tantas coisas, tem tantas referências, que acaba se tornando difícil fazer um som próprio, ter uma identidade.

Essa identidade própria é uma das maiores razões da longevidade do Violeta de Outono, nas palavras de Fabio, o "Rock não ligado a nenhum movimento". Simplesmente o "Rock é rock mesmo!", declara Fabio, numa alusão ao título brasileiro do filme "The song remains the same" estrelado pelo Led Zeppelin.

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Entre o Violeta de Outono, o selo Voiceprint e seu estúdio caseiro, Fabio ainda acha tempo para preparar alguns pratos da culinária indiana e, às vezes, desenhar sites. A arquitetura foi deixada para trás. Futebol? O são-paulino Fabio, apesar de gostar muito do esporte, não tem acompanhado muito os jogos.

Os fãs não perdem por esperar. Fabio Golfetti está com um novo disco do Violeta de Outono saindo do forno, e, se nenhuma gravadora se interessar, o disco será lançado de forma independente pelo selo britânico Voiceprint, do qual Fabio é representante, sua principal ocupação nos últimos tempos, quando não está com a banda. Aliás, os fãs da banda são um capítulo à parte. São fiéis e, embora de tribos distintas (góticos, hippies, rockabillys, punks, mods), não perdem um show. O Violeta atrai os grupos mais distintos, formando uma grande família.

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Assim como Steve Howe, Steve Hackett, Syd Barrett e Daevid Allen, entre outros, foram importantes influências para Fabio. O trabalho do Violeta de Outono vem, desde a década de 80, influenciando um grande número de pessoas que buscam algo mais do que simples música. Buscam algo que lhes toque a alma.

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