Buzzcocks
Por Márcio Ribeiro
Postado em 06 de abril de 2006
The Buzzcocks é uma das bandas punk mais populares e certamente uma das mais influentes. Diferente da revolta política muito em voga em bandas como os Sex Pistols, Pete Shelly escreve letras angustiadas, às vezes engraçadas, sobre amor com a perspectiva típica dos adolescentes. A banda por sua vez entrega o recado com intensidade, velocidade e fúria em canções melodicamente pop de no máximo três minutos, soando quase como um cruzamento entre os Sex Pistols e os Monkees.
Peter McNeish e Howard Traford se conheceram no Bolton Institute of Technology em 1975. Ambos gostavam de ouvir Velvet Underground e Howard era particularmente fascinado pelo som dos Stooges. Arrumaram um baterista e formaram um trio para tocar despretensiosamente, cobrindo qualquer coisa desde Stooges a Brian Eno. Depois de um tempo a brincadeira acabou mas continuaram amigos e acabaram indo juntos assistir duas apresentações dos Sex Pistols em Londres. O efeito desses shows foi, para esses dois rapazes, a mola propulsora de toda a carreira.
Voltam para casa com o firme propósito de montar uma banda punk. Formam então os Buzzcocks, para serem em Manchester o mesmo explosivo sonoro que os Pistols estavam sendo em Londres. Como seu mentor Johnny Rotten, mudam seus nomes; Peter McNeish se torna Pete Shelly e Howard Traford torna-se Howard Devoto. A banda ainda incluiria Garth Smith no baixo enquanto a bateria continuou por um longo período sem dono fixo. Depois de muitos ensaios, procuraram e propuseram aos Pistols uma apresentação em Manchester, onde os Buzzcocks abririam para eles. Porem, às vésperas da apresentação, Garth e o baterista na ocasião, pulam fora.
O show dos Pistols transcorreu-se com o habitual impacto, sendo um tremendo sucesso. Assistindo entre o público, Shelly e Devoto conhecem Steve Diggle, que é então convocado para assumir o baixo. Por último, através de um anúncio no jornal Melody Maker, conhecem John Maher. Passam os próximos meses ensaiando, até estarem prontos para sua estréia, em julho de 1976, novamente abrindo para o Sex Pistols no Lesser Free Trade Hall, em Manchester.
A partir daí o Buzzcocks não para mais, tocando sucessivamente pelos próximos três anos e fazendo de Manchester a segunda capital do punk, perdendo apenas para Londres. Gravam em outubro um álbum demo que incluiria "You Tear Me Up", "Love Battery", "Boredom", "Breakdown" e "Orgasim Addict". Enfim, boa parte do que é encontrado no futuro disco oficial e mais alguns futuros compactos. No final do ano excursionam com os Pistols e toda uma aglomeração de bandas punks, no que ficou conhecido como "The Anarchy Tour". Entre essas bandas estavam The Damned, The Clash, Generation X e The Sluts. Registrando o evento, o DJ e cineasta David Letts filma tudo em super-8, lançando mais tarde com o nome de "The Punk Rock Movie".
Pete Shelly consegue negociar um empréstimo com seu pai para bancar as gravações do seu primeiro compacto. Assim nascia "Spiral Scratch", o primeiro vinil da banda, como também o primeiro projeto feito na base do "faça você mesmo" na história do punk. A partir da iniciativa de Shelly, inicia-se toda uma filosofia e tendência nova no comportamento do mercado que alteraria a indústria. Gravado no dia 28 de dezembro de 1976, o compacto inclui as músicas "Breakdown" e "Times Up" no lado A e "Boredom" e "Friends of Mine" no lado B; todas composições da dupla Shelly-Devoto. Uma curiosidade a se divulgar é que tudo foi gravado em um só take com o solo de guitarra gravado posteriormente, em overbub. A exceção seria "Boredom", gravada sem overdubs, direto do terceiro take. Não se gravava música assim desde "Please, Please Me" em 1963. Foram confeccionadas mil cópias e lançadas em janeiro de 1977, vendendo bem.
Por volta de março Devoto larga a carreira musical para voltar aos estudos. Pete Shelly assume os vocais e Steve Diggle larga o baixo assumindo a segunda guitarra. Para o baixo volta Garth Smith. O nome Buzzcocks já atrai um público específico; todo um estilo punk e sua música pronto para ferver, apesar da total falta de apoio da mídia. Somente em setembro os Buzzcocks assinam com a United Artists um contrato que lhes permitiriam toda liberdade artística. Para testar essa liberdade, sai em outubro o single de estréia, "Orgasm Addict" que é banida das rádios BBC mas que consegue sua vendagem na base do boca a boca. Podem imaginar isso hoje em dia? Obter um sucesso comercial sem nenhum apoio das rádios? Pelo contrário, com sucessiva propaganda negativa na mídia contra o estilo?
No decorrer desses eventos, Howard Devoto volta à cena musical e funda a banda Magazine. Garth Smith é sumariamente dispensado e no seu lugar entra Steve Garvey. Esta formação permanece até o fim do grupo em 1981 e pode ser chamada de formação clássica da banda. No final do ano o segundo single, "What Do I Get?" atinge o topo das paradas e abre o caminho para o LP de estréia, "Another Music In A Different Kitchen", em março de 1978. Guitarras cortantes como serra elétrica e a veia pop tão característica de Shelly fazem deste um disco 100% Punk, um monumento à sua época. É difícil não se encantar com o peso, velocidade e agressividade de temas como "Fast Cars", "You Tear Me Up", "Love Battery", "Autonomy", "Fictionromance" ou "I Don't Mind".
A banda lança uma serie de compactos até que em setembro chega às lojas "Love Bites", o segundo LP. Um álbum com dois temas instrumentais, "Walking Distance" e "Late For The Train", além dos usuais temas tão típicos de Shelly; "Real World", "Ever Fallen In Love", "Nostalgia", "Just Lust", "Sixteen Again", "Nothing Left" e "ESP". Em 1979 a banda começa a mostrar sinais de esgotamento, mas ao invés de descansarem entram no estúdio e gravam o terceiro LP: "A Diferent Kind Of Tension". O álbum é possivelmente o menos "energizado" da banda, embora nele estejam incluídas clássicas composições de Shelly como "Paradise", "You Say You Don't Love Me", "I Don't Know What To Do With My Life" e "I Believe". O álbum é lançado em agosto e em seguida viajam para sua primeira excursão na América. Durante a sua passagem, os americanos lançam a coletânea "Singles Going Steady". Com apenas quatro músicas encontrados nos dois primeiros álbuns, essa coletânea oferece material disponível até então, apenas em compactos. Este talvez seja o disco mais indicado para se avaliar as composições de Pete Shelly, o grande hit maker da geração punk.
Em 1980 a banda tira férias do palco, diminuindo para um mínimo as apresentações ao vivo. Esse mínimo incluiu uma excursão americana. Gravam as músicas para o projeto "Part 1 - 3", que a gravadora lança como três compactos simples ("Part 1", "Part 2", "Part 3") durante o ano. Preparam-se para gravar material para o quarto LP em início de 1981, porém a EMI, que comprara no ano anterior a United Artists, insiste que "Singles Going Steady" seja lançado na Inglaterra antes de bancar outro álbum. A banda recusa a exigência da gravadora e Shelly decreta o fim dos Buzzcocks, livrando-se assim do contrato. "Part 1 - 3", acaba saindo em formato de LP em 1984 pelo selo IRS.
Ainda em 1981, Pete Shelly lança o single "Homosapien" seguido de um LP com o mesmo nome pelo selo Arista. O disco oferece bastante do potencial pop característico do seu trabalho mas em um ambiente totalmente novo. Muitos teclados, substituindo inclusive os baixos; uma bateria eletrônica somada a uma bateria viva, embora esta sem muita presença. É como se Shelly quisesse mesmo se ouvir longe do som que lhe fez famoso. Temas como "Homosapien", "Yesterday's Not Here", "Love In Vain", "Witness Of Change", "Telephone Operator", "Guess I Must Have Been In Love With Myself" e "I Generate A Feeling" se tornam uma interessante releitura tecno da musicalidade de Shelly. "I Don't Know What It Is" e "In Love With Somebody Else" tem guitarras mais presentes e provavelmente teriam constando no álbum que a EMI não quis financiar.
Steve Diggle e John Maher formam "Flag Of Convenience" enquanto Steve Garvey se muda para New York e lá toca com uma banda local chamada Motivation. Todos esses trabalhos acabaram tendo carreira curta, sendo substituídos por outros projetos. O quarteto se reune novamente em 1989 e passam a excursionar pelos Estados Unidos. Em 1990 Maher sai e no seu lugar entra Mike Joyce, ex- baterista dos Smiths. Ele continua até o final daquele ano mas, tanto ele quanto Garvey, cansados das constantes turnês, acabam saindo.
Uma nova formação com Shelly e Diggle, mais Tony Barber no baixo e Phil Barker na bateria passa a excursionar. Em 1993 a banda lança o primeiro CD com material inédito, "Trade Test Transmission". Um Cd dinâmico que mostra como Shelly não perdeu o jeito para compor melodias que pegam. Mantendo a tradição, a banda excursiona sem parar, acabando por chegar no Brasil. Apresentam-se num domingo de novembro em 1995 no Garage, reduto punk e metal, situado numa dessas áreas mais movimentadas à noite, ao lado do conhecido reduto das refugiadas da Vila Mimosa, o ponto das meretrizes mais gastas da cidade do Rio de Janeiro.
Em sua passagem pelo Brasil, o show incluiu "I Don't Know What To Do With My Life", "Unthinkable", "Last To Know", "When Love Turns", "I Don't Mind", "Love You More", "Autonomy", "Get On Your Own", "Do It", "Isolation", "Why Can't I Touch It?", "Fictionromance", "Why She's A Girl From The Chainstore", "Breakdown", "Promises", "Noise Annoys", "Harmony In My Head", "I Believe", "What Do I Get?", "Orgasm Addict", "Fast Cars", "Boredom", "You Say You Don't Love Me", "Oh Shit!" e "Ever Fallen In Love". O tempo passa mas essa banda continua com uma apresentação convincente para um público que queira saborear o autêntico punk dos anos setenta.
Seis meses depois, na primavera de 1996 lançam "All Set". Depois de tantos anos, não se pode esperar a mesma fúria de quando se é um adolescente. O disco está longe de ser fraco ou de se perceber perda no potencial pop de suas composições, mas infelizmente passou despercebido. Demoraria mais três anos até que em 1999 Pete Shelly e banda lançam outro CD com canções novas chamado simplesmente "Modern". Aqui a banda utiliza mais parafernália eletrônica, principalmente nas composições de Steve Diggle. Temas bons dentro da habitual atmosfera pop fazem os Buzzcocks continuar a soar melhor do que a maioria das bandas punk ainda em atividade.
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