A música de Bob Dylan em que ele não cantou nem tocou, e em 50 anos jamais tocou ao vivo
Por André Garcia
Postado em 04 de fevereiro de 2025
Pode pegar qualquer lista daquelas de álbuns do Bob Dylan dos melhores para os piores que eu garanto que entre os piores sempre vai estar o insuportável álbum duplo "Self-Portrait" (1970).
Recheado de covers, músicas antigas gravadas ao vivo e canções tradicionais, de suas 24 faixas apenas quatro eram músicas novas composições de Bob Dylan. Uma delas foi a faixa de abertura "All the Tired Horses" que chocou os fãs por não trazer o trovador americano cantando e nem tocando nenhum instrumento.
Em vez disso, o que temos é cantoras em um coro daqueles de backing vocals gospel repetindo a frase "Todos os cavalos cansados ao sol / Como eu poderia cavalgar?" sobre a progressão de acordes dó, lá menor, mi menor e sol.
Até hoje essa música é uma anomalia mesmo no bizarro e excêntrico catálogo de Bob Dylan (até álbum de canções natalinas tem) por ser a única em que ele não cantou, não tocou nenhum instrumento e jamais tocou ao vivo.
O site Setlist.fm comprova isso. Lá tem computado mais de 4 mil músicas em milhares de shows dele — e não tem registro de nenhuma vez que ele tenha tocado "All the Tired Horses".
"Self-Portrait" foi resultado de um período em que Bob Dylan estava farto de ser Bob Dylan e não aguentava mais o escrutínio e idolatria que envolvia tudo que ele fazia. Portanto, ele decidiu lançar um disco ruim de propósito, para que ninguém gostasse e, assim, os fãs largassem do pé dele.
Em entrevista de 1984 para a Rolling Stone ele confessou que na época do "Self-Portrait" ele só queria viver sua em paz, longe dos holofotes, ao lado de sua família em Woodstock, mas o incessante assédios dos hippies não deixava:
"Foi como uma onda de loucura que cercava minha casa dia e noite. […] De alguma forma, parecia que eu era visto como parte daquele movimento […] As pessoas vinham dos bosques a qualquer hora do dia ou da noite e ficavam batendo na porta, era como se sugassem meu sangue. Tivemos que mudar para Nova Iorque."
"Foi aí que eu pensei: 'Que se f*da! Quero que essa gente me esqueça. Quero fazer algo de que elas não consigam gostar, algo com o qual não possam se identificar. Assim, eles vão pegar, ouvir, e dizer 'Vamos passar para o próximo porque ele não está mais nos dando o que queremos.' Sabe? Assim eles iam procurar outra pessoa [para encher o saco]."
Conforme publicado pela Far Out Magazine, em outra ocasião ele disse que aquilo teve a ver também com seu burnout com as pressões e exigências da indústria fonográfica e sua insaciável sede por dinheiro: "Eu não ia ser uma marionete de ninguém, então com aquele disco ['Self-Portrait'] eu descobri como acabar com aquilo."
Ou seja, se ele tentou fracassar e conseguiu… então foi "Self-Portrait" um fracasso ou um sucesso? Essa é apenas uma entre as inúmeras perguntas sem resposta que circulam Bob Dylan.
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