Prika Amaral fala sobre o passado, o presente e o futuro da Nervosa
Por Mateus Ribeiro
Postado em 18 de janeiro de 2025
A história da banda de Thrash/Death Metal Nervosa começou a escrita em 2010, pela guitarrista Prika Amaral e pela baterista Fernanda Terra. Quinze anos depois, o grupo figura entre as grandes forças do Metal brasileiro.
Ao longo de sua respeitável caminhada, a banda liderada por Prika (que assumiu os vocais em 2023) lançou cinco discos de estúdio, o último deles, o ótimo "Jailbreak". O quarteto também se apresentou em grandes festivais, como o Wacken Open Air e o Bloodstock, realizados respectivamente na Alemanha e na Inglaterra.
Para celebrar seus 15 anos, Prika e suas companheiras cairão na estrada e farão shows em diferentes lugares do mundo. A primeira dessas apresentações será realizada no dia 25 de janeiro, em São Paulo.
O aniversário da Nervosa foi um dos assuntos da entrevista que Prika Amaral concedeu ao Whiplash.Net. A frontwoman também falou sobre o início de sua trajetória, grandes shows, planos para o próximo disco e muito mais. O bate-papo pode ser conferido a seguir.
A Nervosa completa 15 anos em 2025. De 2010 para cá, a banda se apresentou em muitos países e se consolidou como uma força do metal. Quando tudo começou, você imaginou que pudesse chegar tão longe?
"Tudo começou em fevereiro de 2010, quando eu e a baterista Fernanda Terra decidimos montar uma banda de thrash metal formada só por mulheres. O sonho existia, e nós sonhamos tudo o que aconteceu com a Nervosa ao longo desses anos, mas não sabíamos se isso iria de fato acontecer, a gente estava mais concentrada em trabalhar pra que isso acontecesse."
Quais foram as bandas que influenciaram a criação da Nervosa?
"Me lembro que quando eu e a Terra nos reunimos para decidir detalhes sobre a banda, a gente falou muito sobre Slayer, Sepultura, Motörhead, Ratos de Porão, Pantera, entre outras bandas. Mas nós individualmente tínhamos nossas influências particulares, ela vindo de uma escola punk e eu vindo de uma escola thrash/death, e nas quatro primeiras músicas que compusemos juntas já pudemos ver essa mistura ali, e aí se fundiram as raízes da Nervosa. Passamos um ano e meio procurando por vocalista e baixista, várias meninas passaram pela Nervosa nessa fase, mas nada funcionava dentro do que a gente estava buscando. Depois desse longo período em estúdio ensaiando e compondo, veio a Fernanda Lira para completar o que faltava, o estilo da voz dela lembrava muito o Zetro Souza (Exodus) e Schmier (Destruction), e isso fez sentido com a raiz thrash metal que criamos antes."
Prika, você nasceu em Bragança Paulista. Como era ser uma headbanger em uma cidade do interior paulista? E como é a cena por lá?
"A cena em Bragança na minha época era mais punk do que metal, e eu gosto de punk, então eu transitava entre o punk e o metal.
As coisas no interior são mais difíceis, não tínhamos lugar para tocar, não havia bares que abrissem portas pra gente e nem nada. Os eventos eram feitos em quadras de escola de samba, onde tinha um palco e era acessível alugar e fazer eventos. Mas o mais comum eram os encontros nas casas dos bateristas da cidade que normalmente tinham uma garagem ou um quartinho no fundo com bateria, e ali a gente se encontrava pra fazer jams, ouvir música e sonhar em ser músico (...).
Eu comecei tocar guitarra em 1999, em 2002 comecei a ter várias bandas de garagem, mas sempre como guitarrista. Em 2004, surgiu um convite para eu ser vocalista de uma banda punk/hc, a banda já tinha uma vocalista, mas eles queriam que eu fizesse um gutural, e eu aceitei porque gostava da banda. Foi minha primeira experiência profissional, fizemos alguns shows legais, mas eu não tinha a mínima noção do que eu estava fazendo com a minha voz, naquela época não tinha Youtube e nem informação sobre como cantar gutural e nem professores especialistas nesse tipo de técnica (pelo menos eu não tinha acesso), então, eu sentia minha garganta machucada no final dos shows, eu colocava muita força pra cantar porque achava que tinha que ser assim. Depois de pouco tempo, a banda parou porque todos estavam mais focados em suas vidas particulares, e eu fiquei na sede de viver mais aquilo, mas não acreditava em mim como vocalista porque eu sempre fui guitarrista, e então, em 2007 me mudei pra São Paulo pra viver de música de verdade, e como guitarrista!"
"Seed of Death", do álbum "Jailbreak", tem uma introdução melódica, que me lembrou o início de uma balada. Em algum momento, uma balada foi cogitada? Há planos para gravar uma no futuro?
"Eu sempre acreditei que a arte é livre. Eu amo o metal que é meu estilo musical favorito, mas eu não concordo com algumas regras que os mais conservadores criam, porque essas regras fazem as coisas serem forçadas e eu acredito que a verdadeira arte tem que ser espontânea. Não vou deixar de compor algo legal do qual estou inspirada porque o melódico não é bem aceito por alguns. É impossível agradar a todos, o meu foco sempre foi não criar regras e deixar a inspiração me levar, e sempre tento passar isso para as meninas. Somos uma banda de metal com influências musicais diversas. Nunca vamos deixar de ser metal, mas sempre vamos misturar coisas e estar abertas para que a arte se expresse e não vamos reprimir inspirações."
O clipe de "Jailbreak" é muito divertido. Como surgiu a ideia de gravar o vídeo?
"‘Jailbreak’ fala sobre se libertar daquilo que te prende e te impede de ser feliz por completo. Fala muito sobre não ter vergonha de ser quem você é, e sobre acreditar nos seus sonhos e ir vivê-los sem medo.
Quando eu e a Helena [Kotina, guitarrista] compusemos o instrumental pensamos muito na vibe Judas Priest e Motörhead. Queríamos uma música para ouvir pilotando uma moto numa estrada.
Quando a gente teve que pensar no roteiro para o videoclipe foi fácil, a gente só descreveu o que já tínhamos imaginado, ou seja, moto + amigos + bar. E aí juntamos todo o pessoal que gosta de metal em Trikala (cidade onde moramos na Grécia), fomos gravar no bar da Helena, e claro a galera que tinha moto custom para completar toda essa vibe. E pra gravar foi super divertido e fácil, só colocamos a música e todo mundo começou a curtir e foi uma grande festa. A galera ali é muito fã da Nervosa e estavam ouvindo a música pela primeira vez muito antes de ser lançada. Foi um momento inesquecível e muito legal."
Nos primeiros discos da Nervosa, há músicas cantadas em português. Vocês pretendem voltar a gravar em português?
"Sim! E gostaria muito de cantar em espanhol também. Mas às vezes a inspiração te leva pra outro lugar. Como disse antes, eu não gosto de forçar nada, então prefiro compor sem ter a obrigação de fazer alguma coisa específica. Mas pretendemos gravar mais músicas em português sim."
Por falar em composições, com a quantidade de atrocidades acontecendo no Planeta Terra, escrever letras ficou mais fácil?
"O ser humano em geral sempre foi podre, pra mim sempre tenho coisas para reclamar. O que mudou é que sempre achei que a humanidade aprendeu com algumas atrocidades que aconteceram no passado, mas agora vemos que não, os erros sempre se repetem e sempre vai ser assim, porque o ser humano nunca vai aprender nada pelo simples fato que crueldade não tem a ver com aprendizagem. A maldade não tem limites e é por isso que a maior parte dos seres humanos são corruptos. O egoísmo e a sede de poder são maiores que qualquer coisa para a maioria.
Então, não acho que seja mais fácil, é igual. Apenas eu que mudei minha perspectiva, que antes era mais sonhadora e agora é mais realista."
Voltando a falar sobre a turnê de 15 anos, vocês pretendem passar por cidades onde nunca se apresentaram?
"A gente decidiu fazer uma turnê curta porque foi o único período que tínhamos livre, e se não fizermos assim, iríamos ficar mais um ano sem turnê no país de onde a Nervosa nasceu, e [isso] não é justo com os nossos fãs. Todas as cidades dessa turnê a Nervosa já tocou [antes], mas não com essa formação. Vai ser a primeira turnê por aqui comigo nos vocais e com a Nervosa com duas guitarras. Estamos muito felizes e ansiosas."
O anúncio da tour diz que a banda tocará faixas de todos os álbuns. Os fãs podem esperar alguma surpresa, como a inclusão de alguma música que nunca foi tocada ao vivo?
"Sim! Preparamos um setlist muito funcional e interativo. Vai ser o show mais longo que a Nervosa já fez, afinal de contas lançamos 5 álbuns e uma demo, é muita música. Mas admito que o set está mais focado no último disco, já que o público brasileiro nunca viu a gente tocando as músicas desse álbum. Então combinamos a comemoração dos 15 anos de Nervosa com a divulgação do último disco."
Existe a possibilidade de alguma ex-integrante participar da turnê?
"Não, acho que ainda é muito cedo pra isso, um dia quem sabe. Mas acho que seria algo para mais de 20 anos de estrada. Agora estamos na nossa tour do ‘Jailbreak’ e não quero tirar as meninas novas no momento que será a primeira vez delas no Brasil, exceto para a Helena, mas quando ela veio em 2022, estava cobrindo a baixista que não pode vir, mas dessa vez vai ser a primeira vez dela como guitarrista e membro oficial. Então, por agora, acho melhor focar no presente."
Há planos para gravar um álbum ao vivo durante a turnê?
"Queremos muito! Mas nem sempre o equipamento das casas permite essa gravação. Então, isso torna tudo mais trabalhoso e caro. Mas estamos trabalhando pra tentar fazer isso possível."
Quais shows foram os mais marcantes da história da Nervosa? E existe algum que vocês gostariam de esquecer?
"Difícil dizer um ou dez, porque a Nervosa fez muitos shows marcantes pra mim, a gente toca todo ano em festivais, nos palcos principais, para milhares de pessoas, mas posso destacar o Wacken em 2023, o Tons Of Rock na Noruega com o Metallica ano passado, Summer Breeze Brasil ano passado (2024) e o Rock in Rio em 2019.
O que eu gostaria de esquecer é um show em 2013 que tocamos com o Destruction no antigo Via Marquês, em São Paulo. Nesse dia, eu estava com a minha tendinite muito atacada, porque estava trabalhando numa empresa por 10 horas no computador e depois ia gravar o disco da Nervosa por 4 horas, tocando palhetadas extremamente rápidas e meu braço estava com uma inflamação que já não passava com nenhum remédio. Mas tive que fazer esse show, e eu não conseguia segurar a palheta, ela caia toda hora e eu não estava conseguindo tocar. O show foi muito ruim pra mim, toquei mal e passei por muita dor, me arrependo de não ter cancelado, mas na época não queria fazer a banda perder essa oportunidade e achei que eu podia dar conta, e na verdade não dei. Mas acontece, precisamos errar para aprender, a lição é não repetir o erro."
No show do Summer Breeze Brasil 2024, você teve problemas com a guitarra e passou parte do show sem o instrumento. Como foi lidar com essa situação?
"Foi uma situação muito particular, pois as cordas eram novas, tinha acabado de trocar, e nunca aconteceu de quebrar um encordoamento novo em mais de 13 anos fazendo isso, mas sempre tem a primeira vez né... Hahahaha. Como uso ponte floyd rose, não havia como nosso roadie trocar e regular a guitarra. Nessa ocasião não foi possível trazer guitarra reserva, pois tivemos outros problemas.
Para não acabar com o show, eu decidi seguir apenas cantando, e isso só foi possível porque temos duas guitarras agora. Foi um momento muito legal porque o público se surpreendeu e todos começaram a se empolgar com a ideia. Eu me diverti muito, me deu mobilidade e consegui interagir mais com a galera.
Para essa turnê de agora temos guitarra reserva, então isso não vai acontecer mais."
Vocês ouvem estilos diferentes do metal? Quais estilos?
"Sim, todas nós ouvimos outras coisas além do metal. A Gabriela [Abud, baterista] é a mais eclética, ela ouve realmente de tudo. Eu, a Helena e a Helpyre [baixista] já somos mais old school, ouvimos outras coisas, mas não de tudo.
Eu, particularmente, fora do metal ouço blues, funk americano dos anos 70, soul e bandas de rock dos anos 70. Nada muito além disso. Eu sempre tento me manter antenada em todos os estilos, então eu escuto uma vez para conhecer e ver o que está sendo feito, mas gostar eu não consigo. Até mesmo dentro do metal tem muita coisa que não me agrada muito, acho que é dentro do normal, não sou uma pessoa radical, por isso me disponho a ouvir e dar uma chance, mas se não me agrada não há o que fazer, é isso."
Como estão os planos para o próximo disco de estúdio?
"Temos muitos planos para esse ano, estamos construindo algo para o próximo disco que vai ser mais uma revolução na história da Nervosa (sem troca de formação). Mas estamos trabalhando desde o ano passado em um disco novo, e dessa vez o processo está sendo um pouco diferente, por isso exige mais tempo.
Esse ano planejamos lançar algumas surpresas relacionadas a comemoração dos 15 anos de Nervosa, e isso vai acontecer durante o ano."
Para finalizar, por favor, deixem uma mensagem para os fãs.
"Gostaria de agradecer o apoio incondicional do público brasileiro à Nervosa, e é por isso que decidimos começar a nossa comemoração de 15 anos de Nervosa no Brasil, uma forma de agradecer e valorizar a galera que impulsionou a gente desde o começo. Muito obrigada a vocês da imprensa sempre pelo respeito e apoio. Obrigada e a gente se vê por aí!"
Para conferir a agenda de shows da Nervosa, acesse o site oficial da banda.
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