Atheist: Entrevista exclusiva com o vocalista Kelly Shaefer
Por Thiago Corrêa
Postado em 24 de novembro de 2001
O Atheist surgiu no final da década de oitenta, com uma proposta indecente para a época, numa idéia que até hoje é extremamente intrigante e surpreendente: unir metal extremo a jazz, fusion, progressivo e música latina. Com essa audácia, toques inovadores, e muita criatividade e peso, o grupo lançou três álbuns, mas sem alcançar o sucesso esperado.
Como tudo que tem uma visão à frente de seu tempo, o Atheist e seus trabalhos, "Piece Of Time", "Unquestionable Presence" e "Elements", só vieram a ser reconhecidos alguns anos depois da paralisação de suas atividades, com o crescimento do metal técnico e progressivo, impulsionado por Fates Warning, Dream Theater, Spiral Architect, Spastic Ink &cia.
Kelly Shaefer, vocalista e líder dessa maluquice gerada nas bases do death metal, mostrou-se simpático e acessível, num bate papo bem interessante, no qual ele comenta a nova fase da banda e relembra um pouco o passado.
WHIPLASH! – Como surgiu a idéia de retomar as atividades do Atheist? A banda está trabalhando com seus membros originais?
Kelly Shaefer / Na maior parte do tempo, estamos trabalhando com os membros originais, exceto obviamente Roger Patterson (N. do E.: baixista que faleceu no dia 09 de Fevereiro de 1990, em acidente com o automóvel que levava o Atheist, depois de um show em Los Angeles). Nós concordamos que parecia a hora certa para relançar as gravações e ter as pessoas compreendendo-as, sabe? Como já foi escrito muitas vezes, nós éramos um pouco rejeitados quando estes discos saíram. Então agora as mentes estão abertas para o detalhe técnico e nós sentimos que é um grande momento.
WHIPLASH! – Como foi tocar de novo com seus antigos companheiros? Você sentiu alguma dificuldade ou diferença entre a última vez que tocaram e agora?
Kelly Shaefer / Nós ainda não nos reunimos realmente. Temos conversado ao telefone e eu e Rand (N. do E.: Rand Burkey, guitarrista) estaremos pegando alguns riffs juntos na próxima semana, e veremos como progride. Mas estamos mais centrados em ter nossos três discos lançados de novo, começando em Março. Há muitas pessoas que sequer ouviram essas gravações, e divulgá-las será nosso foco principal por alguns meses.
WHIPLASH! – Você abriu uma gravadora própria para o Atheist e terá distribuição da Seasons Of Mist. O que você espera dessas novas gravadoras? Por quê vocês não continuaram com a Metal Blade?
Kelly Shaefer / Bem, a Seasons Of Mist tem os direitos para a Europa apenas, então ainda temos que acertar um contrato na América. Poderá ser a Metal Blade. Estamos olhando as ofertas e adoraria trabalhar com eles de novo, caso mostrem interesse.
WHIPLASH! – Você já tem algo em mente com relação a título de músicas, do álbum, o produtor que irá trabalhar no disco, etc?
Kelly Shaefer / Não, nada ainda. Assim que tivermos algo gravado e títulos de músicas, colocaremos demos no site, para as pessoas acompanharem a progressão do álbum.
WHIPLASH! – O Atheist nunca foi visto como uma banda de death metal tradicional. Nem podia, pois a banda sempre colocou elementos de jazz e progressivo em suas músicas. Como você teve a idéia de usar este e outros ingredientes de diferentes estilos?
Kelly Shaefer / Os lances jazz vieram dos estudos de Steve Flynn (N. do E.: Baterista) em 1986. Ele era capaz de tocar qualquer coisa na velocidade que desejasse, mas precisava da influência do jazz para pôr estes pequenos detalhes complicados, que ele colocou na música do Atheist. Nós também éramos fãs de música muito bem tocada. Sempre ouvimos grupos de grande musicalidade como Rush, Yes e outros. O jazz simplesmente se encaixou em nossas influências metal e acabou se tornando realmente uma presença inquestionável. (N. do E.: nesse momento Kelly faz um trocadilho com "Unquestionable Presence", título do segundo álbum do Atheist.).
WHIPLASH! – Antes do Atheist e de outros grupos inovadores, ninguém tocava metal da maneira da sua banda. Além de Rush e Yes, quais seriam as outras influências do Atheist?
Kelly Shaefer / Bem, não fomos influenciados a tocar nosso estilo estranho, por nenhuma outra banda da safra que surgiu conosco. Escutávamos uma enorme variedade de música e acho que naquela ocasião a maioria dos ‘garotos metal’ ouviriam apenas metal. Essa é a razão para o som que refletia de maneira unidimensional. Não que isso fosse ruim, mas apenas não quebrava barreiras. Naquele tempo fomos evitados, porque não tocávamos death metal tradicional, e ninguém sabia como nos rotular ou comercializar. Logo não obtivemos muito apreço. É legal que agora as pessoas admirem nosso estilo. Melhor tarde que nunca, certo? Bandas da cena metálica que nos influenciaram seriam: Dark Angel ("Darkness Descends" apenas), Kreator (somente "Pleasure To Kill") e Slayer é lógico (a era "Reign In Blood" e "Hell Awaits"). Amávamos Obituary, mas não fomos de fato inspirados por eles.
WHIPLASH! – Atheist, Cynic e WatchTower sempre são mencionados como expoentes das bandas de metal técnico. Como você se sente sendo uma referência para outros conjuntos?
Kelly Shaefer / Eu acho que é sensacional, uma amostra de respeito que nunca recebemos enquanto estivemos em atividade. E estamos muito felizes porque as pessoas finalmente sentaram, ouviram os discos e perceberam que há muita loucura e qualidade em todas as gravações do Atheist. Rand Burkey é um dos guitarristas mais espetaculares que já vi, tocando todas aquelas músicas numa guitarra de mão esquerda; totalmente insano de assistir. Roger Patterson é facilmente o melhor a tocar baixo no contexto metal. É difícil alcançar a pegada que ele tinha. E também havia Steve Flynn, que é simplesmente irreal como baterista. Eu tenho enorme respeito por todos eles, e fico alegre por outros terem percebido o que eu fiz.
WHIPLASH! – O sucesso de bandas de metal técnico, como o Spiral Architect, influenciou o retorno do Atheist?
Kelly Shaefer / Bem, eu não diria isso. Mas ajudou a saber que as pessoas estão curtindo grupos como o Spiral Architect. Então confirmou o que pensávamos, que as pessoas estavam cansadas de metal chato e repetido, e queriam um metal de ‘homens pensantes’, e isso é o que o Atheist sempre foi. Nós estamos felizes por sermos listados como influência, ficamos muito honrados com isso.
WHIPLASH! – Nesse tempo entre o fim e a retomada das atividades do Atheist, você lançou dois álbuns com a banda Neurotica, tem um direcionamento diferente relacionado a seus lançamentos anteriores. É alternativo, apesar de ter mais peso que outros grupos desse estilo. Alguns de seus fãs não gostaram. Quando começou seu interesse por música alternativa? Você ainda quer tocar esse tipo de composição? E o novo Atheist, terá influências alternativas?
Kelly Shaefer / Neurotica e Atheist estão em planetas musicais diferentes, sabe. Eu nunca tentaria envolver um estilo alternativo com o Atheist, não há espaço para isso no contexto do grupo, então pode descartar essa idéia. O Neurotica é uma grande banda de hard rock e eu procurei o lado mais lucrativo da música. Estou muito orgulhoso dessa banda, é ótima e tem excelentes melodias e pegadas. De qualquer forma, o Atheist será sempre uma banda louca de metal. Sobre os fãs do Atheist não gostarem do Neurotica, você está enganado. Na verdade, a resposta dos fãs antigos tem sido inacreditavelmente positiva. Como você vê, o Neurotica não é uma banda merd* alternativa. É um grupo foda de hard rock com passagens inteligentes e intricadas, quase metal, e ótimas melodias. Meu vocal é bem diferente. Canto na maior parte do tempo, com alguns gritos aqui e ali, mas na maioria são vocais bem limpos, modernos e suaves. É um novo som de rock, e espero que os fãs de Atheist pelo menos visitem o www.mp3.com, façam o download de algo do Neurotica e chequem por si próprios.
WHIPLASH! – O Dream Theater abriu as portas para muitas bandas de metal com toques progressivos. O Atheist é mais pesado que o Dream Theater, mas ambos possuem esse tipo de influência. Com isso, você acha que o Atheist será mais aceito e compreendido que em sua primeira fase?
Kelly Shaefer / Sim, com certeza, porque o trabalho de base já foi feito por bandas como Atheist, Dream Theater, Cynic, etc. Algumas pessoas estão incomodadas, pois vários grupos atuais de metal técnico usam bastante teclados em suas músicas, e nós nunca faremos isso. Nós também nunca faremos técnico antes de pesado. O peso vem primeiro conosco e em segundo a questão técnica. Mas sempre achamos uma forma de integrar os dois uniformemente ao longo das músicas. Acho que esses discos sairão de uma forma melhor que da primeira vez, e acredito que a Seasons Of Mist vai fazer um eficiente trabalho promovendo-os.
WHIPLASH! – Você alguma vez imaginou que uma banda de metal progressivo chegaria ao sucesso que o Dream Theater alcançou?
Kelly Shaefer / Na Europa acho que as pessoas estão mais envolvidas com esse estilo, então não me surpreende eles terem se saído bem lá. Mas na América não é exatamente o mesmo, e eles fazem grande sucesso, creio eu. Fico contente com isso, pois fez as pessoas apreciarem boa musicalidade.
WHIPLASH! – Vocês deixaram a cena quando o Sepultura fazia um enorme sucesso. Atualmente os maiores expoentes brasileiros do metal no mundo, são Angra e Krisiun. Qual a sua opinião sobre estes grupos?
Kelly Shaefer / Ainda não os ouvi, mas o Sepultura arrebentava (risos).
WHIPLASH! – O Atheist provavelmente teve mais contato com a música brasileira, pois gravou uma faixa chamada "Samba Briza". Quando houve esse contato com a música do Brasil?
Kelly Shaefer / Aquilo foi na verdade uma composição pequena que Tony Choy (N. do E.: segundo baixista do Atheist, que tocou antes no Cynic) escreveu sozinho. Ele estava muito envolvido com a percussão Latina, como você pode perceber na audição de "Elements" (N. do E.: terceiro lançamento do Atheist). Tony fez um trabalho incrível com a seção rítmica para aquele disco, e em tempo recorde. Tudo ficou pronto em cerca de dois meses.
WHIPLASH! - O Brasil está tendo alguns shows ótimos, incluindo diversas bandas fora do mainstream. Esperamos ter o Atheist aqui alguma vez. Esse espaço é livre, para você deixar a sua mensagem.
Kelly Shaefer / Nós queremos avisar a todos os fãs de metal progressivo que o Atheist está voltando com ímpeto e garra. Vá, compre estes três discos, e você verá uma incrível técnica e alguns riffs ferozes ao estilo Atheist. Diga a seus amigos, conte a todos os novos garotos da cena, que eles precisam ouvir o Atheist. Os relançamentos sairão em Março, e poderão ser comprados na Seasons Of Mist. Gostaria de agradecer ao Whiplash! pela entrevista, e desejar toda sorte ao site. Esperamos ter um novo álbum do Atheist em breve. ‘All hail well played metal’.
Site Oficial do Atheist
http://www.atheist-music.com
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