Ira: O grande álbum solo do baixista original
Resenha - Gaspa - Bass Player
Por Alexandre Campos Capitão
Postado em 06 de setembro de 2015
O baixista original do grupo cult paulistano mostra em seu vôo solo que há vida sim fora do Ira. E uma vida com classe e elegância. Gaspa – The Bass Player é um discaço de rock´n roll, e nos provoca a sensação de nunca ter dado a devida atenção ao seu talento.
Quando o Ira surgiu a referência para analisa-los eram as chamadas bandas mod. Em parte porque realmente eram uma influência no seu visual e som, e em parte porque a mídia de ontem e sempre, usa a comparação como forma de expressar sua mediocridade. E se formos utilizar a comparação para falar sobre Ricardo Gaspa, encontramos muitas semelhanças com o baixista do The Who, Mr. John Entwistle. A postura discreta no palco, a performance contida, em contraste com a solidez sonora de uma parede de abrigo anti-atômico.
Enquanto o guitarrista e o vocalista se estapeiam por qualquer fiapo de spot light, era o baixista quem ganhava respeito. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Embora Edgar Scandurra seja um baita guitarrista, Nasi seja uma figuraça que merece respeito, e o batera André Jung não seja engraçado como Ketih Moon, é Gaspa quem revela talento e bom gosto, muitas vezes oculto pelo seu perfil low profile, mas que fica em evidência nesse seu disco solo.
Quem acompanha a movimentação do Gaspa na noite paulistana, sabe que não é novidade nenhuma sua incursão pelo rockabilly, pelo blues, pelo rock´n roll clássico e todo esse universo. E é nessa linha que The Bass Player caminha.
O álbum abre com Sobre o Outono, um rockão com baixo de pau comendo solto, e você já começa a sentir seu joelho entortando, aquele famoso sintoma que os ortopedistas chamam de Espasmo Evispreslyano.
Em seguida vem Outubro de 65, uma canção de Marcelo Nova, o maior rocker do país, extraída do excelente O Galope do Tempo. Um riff de guitarra matador, arranjo classudíssimo, e o mérito da dupla Gaspa/Nova não ter caído na tentação oitentista da deliciosa Simca Chambord, tornando tudo ainda mais divertido.
Na terceira faixa, o que havia começado bem, consegue subir mais um degrau, e ganha o respeito definitivamente. Gaspa conduziu o álbum de maneira a se anistiar da ditadura Stray Cats. Eu explico. Se foram Eddie Cohram, Gene Vincent, Carl Perkins, os criadores do rockabilly, o trio dos gatos vadios liderados por Brian Setzer fez a coisa com tanta competência, 30 anos depois, que estabeleceu um novo padrão, tudo que é rock´n roll após seu surgimento, vem com seu selo de homologação. Seja nas linhas de guitarra, na performance, na bateria tocada em pé, seja lá no que for. Ah, meu amigo, mas esse Gaspa é liso, e quando o Stray Cats tentou lhe cravar as unhas, ele meteu o pé no seu rabo e continuou sentado no sofá do rock´n roll clássico, mas com personalidade própria, sem nenhum pelo de bichano em sua roupa. Mistério é uma canção que resume do que se trata esse álbum, uma bela produção, climática cinquentista, grandes guitarras, baixo sólido, tudo vintagemente bem escolhido.
A balada Eu Não Consigo Ser Alegre o Tempo Inteiro é de autoria de Wander Wildner e traz o próprio nos vocais, conduzido e conduzindo ao lado de um belo slide guitar. Tudo de Mim é fruto da parceria Gaspa/Scandurra, e o vocal de Karol Sun faz lembrar algum dos melhores momentos dos Mutantes, talvez pelo efeito em sua voz.
O clássico do Ira Tanto Quando Eu, serve para escancarar o quanto Gaspa domina o baixão acústico, sua técnica coloca o rabecão em primeiro plano. Marcelo Nova retorna tirando onda, "é, menino Gaspa, a coisa tá assim". Enquanto o bass player se aventura cantando.
"Amor cigano, sigamos, então", nos versos de Ciganos, embala outra bela balada, que dispensa a leitura das mãos.
Tarde Vazia nos lembra de quão talentoso compositor Gaspa é. Essa linda canção não sairia das mãos de qualquer um. Karol Sun retoma os vocais, e dessa vez sua voz me transportou para o timbre vocal de uma mulher ao telefone. Pode ser que tenha sido induzido a pensar isso pela letra da canção. De qualquer forma, é maravilhoso quando uma canção produz imagens dentro de nós.
Rosa dos Ventos é outra que reforça o terreno que Gaspa quer estacionar sua Vespa. Expandindo seu som, mas mantendo o sotaque que o agrada.
Wander Wildner assume novamente o vocal para fechar a conta. O Tolo dos Tolos deixa tudo claro, tolo mesmo é quem não coloca Gaspa no lugar que merece. Mas ele não parece preocupado com isso, mantém sua expressão impávida, assim como John Entwistle, assim como todos que sabem o que estão fazendo.
Gaspa – The Bass Player está entre os melhores álbuns entre todos da família Ira, onde incluo a própria discografia do grupo, e os demais discos solo dos seus integrantes, ou ex-integrantes. Não, não é exagero. O Ira acertou muito, mas quando errou, errou pra valer. Quando seus membros pulavam a cerca para transar com rap, música eletrônica, ou quem quer que abrisse as pernas pra eles, voltavam sempre pra casa com marcas de batom e cheirando perfume de outra, nunca deixando essas escapadas apenas no quarto das suas amantes. Ao meu ver, essas aventuras lhes fizeram mais mal do que bem. Diferente dos puladores de cerca Nasi e Escandurra, Gaspa não cometeu esses pecados, e se o fez, fez como se deveria, sem deixar rastros. Se experimentou outros braços deixou isso apenas na memória, sem abalar seu casamento. Ele é fiel. Os carros conversíveis, a lambreta, o topete, as costeletas, são testemunhas. Gaspa é rock´n roll. E vice versa.
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