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Vinicius de Moraes: dez atitudes que provam que o Poetinha tinha alma rock

Por Victor de Andrade Lopes
Fonte: Sinfonia de Ideias
Postado em 17 de julho de 2020

Nesta quinta-feira, 9 de julho, estamos exatos 40 anos à frente do dia em que Vinicius de Moraes nos deixou. Qualquer pessoa que esteja lendo este texto sabe de quem estou falando, pudera, foi um dos músicos e poetas brasileiros mais importantes do século XX.

Associado à Bossa Nova e à MPB em geral, Vinicius tem parcerias memoráveis com nomes do naipe de Tom Jobim, Toquinho, Dorival Caymmi e Baden Powell. Mas a alma do "Poetinha", como ficou conhecido, era mesmo rock 'n' roll e eu vou provar neste post, que foi escrito com base principalmente em informações retiradas de dois livros sobre o mestre: Vinicius Portenho: As Inesquecíveis Temporadas de Vinicius de Moraes na Argentina e no Uruguai, de Liana Wenner (2012); e sua breve biografia escrita por Geraldo Carneiro (1984). Ambos constam na bibliografia do Sinfonia de Ideias, que você encontra acessando o site e clicando em "Bibliografia" no menu superior ;)

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1: Ele era boêmio. Muito boêmio

Vinicius era tão conhecido pela obra artística quanto pela boemia. Abusou do álcool como se não houvesse amanhã - quase que literalmente, uma vez que perdeu a vida relativamente cedo, porém consciente de que poderia tê-la prolongado. Suas bebedeiras deixavam muitas lendas do rock setentista no chinelo.

A boemia quase virou negócio no último ano de sua vida, quando criou um bar (convenientemente chamado de "Cirrose") juntamente aos sócios argentinos Héctor Peyrú e Martín Molinari (Vinicius apresentou-se inúmeras vezes na Argentina e no Uruguai e criou laços com ambos os países vizinhos). O local foi projetado por Paulo Jobim (filho de Tom) e sua esposa, Elaine Jobim.

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Infelizmente, a empreitada não foi muito para frente: Vinicius morreu nove meses após a inauguração da casa e os sócios estrangeiros simplesmente sumiram, deixando as dívidas do local para a família de Moraes.

2: Era tão boêmio que os militares o demitiram por isso, e não por motivos políticos

A boemia de Vinicius era tão desregrada que, quando a ditadura militar brasileira baixou o temível Ato Institucional Nº5 (AI 5), a demissão - ou "aposentadoria compulsória" - do poeta foi quase imediata. Após mais de 20 anos de serviços diplomáticos, Vinicius era forçado a deixar o Itamaraty. E os oficiais do governo não se preocuparam com firulas: o memorando dizia, simplesmente: "demita-se esse vagabundo". Não foram citados possíveis posicionamentos políticos de Vinicius em momento algum. E como se não bastasse, os militares até enalteceram a sua obra.

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Existe uma discussão entre pesquisadores sobre Vinicius ter sido demitido pela bebedeira ou pela falta de assiduidade. Mas fato é que, pelo menos oficialmente, não se tratou de perseguição política. Haja moral e bons costumes...

3: E falando nos militares... ele não apoiou a ditadura

O uso desmedido de álcool e cigarro podem ter comprometido sua saúde, mas não parecem ter afetado seus neurônios; assim, ele era contra a ditadura, como grande parte da classe artística, o que obviamente inclui o rock. Contudo, diferente de colegas como Chico Buarque, seu ativismo era mais discreto. O pau comia solto, mas ele seguia cantando sobre amor, levando-o a questionar o sentido de sua própria obra em meio àquele caos. Nunca fez nada que motivasse um exílio, embora tenha considerado esta possibilidade - ele se apresentava em Portugal no momento em que o AI-5 era baixado.

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Vinicius foi indiretamente atingido pelo regime em 1976, quando seu amigo, o pianista Tenório Cerqueira Jr., foi sequestrado pelos militares da Argentina em Buenos Aires para nunca mais ser visto. Sabe-se que ele morreu em poder dos agentes, talvez só argentinos, talvez argentinos e brasileiros.

Um ataque mais direto, porém menos doloroso veio antes, em 1974, quando os censores lhe impuseram uma suspensão de 30 dias longe dos palcos por conta da música "Valsa do Bordel", que ele ousou cantar antes da aprovação das autoridades "competentes". Ao fazê-lo, atacou "a moral da nação", segundo os militares, que também apontaram uso de "humor vulgar" em apresentações em Belém e Brasília.

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Vinicius obviamente se defendeu, dizendo que os versos em questão eram uma homenagem a Pablo Neruda, poeta chileno morto no ano anterior, e um gesto de repúdio a 1973 como um todo, por ter levado ainda outros dois grandes Pablos: Casals (violoncelista) e Picasso (pintor), ambos da Espanha.

4: Ele odiava o sol

Vinicius odiava o sol - pura e simplesmente. Era um homem da Lua. Como todo bom metalhead, era uma criatura das trevas. Bwahaha. Brincadeiras à parte, ele era um verdadeiro animal de hábitos noturnos. É à noite que a boemia atinge seu ápice, então faz todo sentido.

5: E falando na noite... era nela que ele gostava de gravar

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Sendo um homem noturno, é natural que Vinicius preferisse realizar suas sessões de gravações de álbuns à noite. Por exemplo, em uma de suas temporadas em Buenos Aires, surgiu a oportunidade de registrar uma das apresentações em disco. Como a acústica da casa de eventos não era das melhores, o show teve de ser simulado em estúdio. Para imitar uma plateia, o produtor Alfredo I. Radoszynski chamou cerca de 30 pessoas, que se fingiram de público. A brincadeira durou duas noites e as gravações só se encerravam na manhã seguinte, às 8h. Assim foi criado o bem-sucedido Vinicius de Moraes Grabado en Buenos Aires con Maria Creuza y Toquinho: com "sangue, suor e sêmen".

6: "Sangue, suor e sêmen" era com o que ele escrevia poesia

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Quando já era consagrado, Vinicius manifestava desinteresse pela geração mais nova de poetas brasileiros porque não escreviam com "sangue, suor e sêmen". Para ele, poesia feita com base em coisas fantasiosas e inatingíveis era menos nobre que aquela feita para as coisas da vida: amigos, mulheres, prazeres e afins. Ou ao menos as coisas que ele vivia. A poesia de Vinicius nada mais era que o seu cotidiano (d)escrito em versos.

Nas próprias palavras do carioca, ele se desiludiu com a incapacidade de seus colegas "para fecundá-la, para manchá-la de sangue, suor e sêmen, para banhá-la de lágrimas de amor, para cobri-la da saliva grossa de beijos apaixonados".

Convite à reflexão: dos seus artistas de rock/metal favoritos, quais falam de assuntos fantasiosos? Quais trazem elementos do dia-a-dia para suas letras?

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7: Sabia que ia morrer e seguiu vivendo intensamente

Numa atitude que deixaria Lemmy com inveja, Vinicius ignorava solenemente recomendações médicas e exames que alertavam para a óbvia deterioração de sua saúde.

Um momento emblemático disso foi o jantar que teve com seu médico num restaurante em Montevidéu. À mesa, entregou ao doutor os resultados de uma bateria de exames. Quando seu pedido, uma farta paella, chegou, Vinicius olhou para ela, olhou para o doutor visivelmente consternado com o que os exames lhe diziam, e procedeu ao desjejum sem freios, poupando sua companhia de desperdiçar saliva com sermões. Nas palavras do próprio médico, estava se suicidando.

8: Teve muitas, muitas mulheres

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Vinicius era um galanteador nato e isso se traduziu no impressionante número de nove casamentos ao longo da vida. Hoje, alguns de seus poemas são considerados machistas ("Formosa" e "Minha Namorada", por exemplo), mas na época ele era pegador até dizer chega. Não naquele estilo glam metal em que você come mais mulheres do que refeições por dia, mas se tinha algo que ele compreendia bem mais do que a média dos homens, era o coração feminino.

9: Até cocô era objeto de estima para ele

Quando Vinicius dava a descarga, nem sempre era um momento fácil. Às vezes, quando a peça era de seu agrado, ele sentia sua perda conforme ela ia embora para o esquecimento do esgoto. Ele chegou até a estabelecer uma tipologia do cocô, dando nomes aos diversos formatos que os excrementos humanos assumem.

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10: Seus shows eram prosa pura

Numa atitude talvez nem tão rock ‘n’ roll, Vinicius acostumou-se a se apresentar ao vivo em meio a longos discursos ao público, proferindo extensas reflexões sobre os temas das músicas que cantava. Num show típico de rock/metal, isso provavelmente renderia uma chuva de objetos arremessados contra os músicos, mas o clima intimista que era característico aos shows do Poetinha eram terreno mui propício para essa quase-verborragia. Sem falar, claro, que meia hora de Vinicius falando ainda entretém mais que cinco minutos de boa parte da música nacional atual.

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FONTE: Sinfonia de Ideias
https://bit.ly/vinicius40

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Sobre Victor de Andrade Lopes

Victor de Andrade Lopes é jornalista (Mtb 77507/SP) formado pela PUC-SP com extensões em Introdução à História da Música e Arte Como Interpretação do Brasil, ambas pela FESPSP, e estudante de Sistemas para Internet na FATEC de Carapicuíba, onde mora. É também membro do Grupo de Usuários Wikimedia no Brasil e responsável pelo blog Sinfonia de Ideias. Apaixonado por livros, ciências, cultura pop, games, viagens, ufologia, e, é claro, música: rock, metal, pop, dance, folk, erudito e todos os derivados e misturas. Toca piano e teclado nas horas livres.
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