Heavy Metal: Os Invisíveis
Por Don Roberto Muñoz
Fonte: murderconstruct
Postado em 22 de julho de 2017
NASTY SAVAGE – "Wage of Mayhem (Part One)"
Quem nunca pegou ônibus para curtir o show da sua banda de Metal preferida? Mesmo sem grana, até rolava, ocasionalmente, uma carona, e lá ia a turma de proto-cabeludos adolescentes para ver os grandes da "old school", ou seja, a galera "das antigas". Trata-se a letra não de uma ode ao Heavy Metal, mas uma rememoração da vida do garoto a face de "SUA" banda. Galletti age como um legítimo flâneur. Um show de Heavy Metal é uma "bagunça organizada". A turma "extra-campo", que desconhece essencialmente como funciona este mundo, pode achar muito agressivo, mas violência é outra coisa – o "mosh", pura adrenalina, é uma das ações mais empolgantes que um fã pode executar num show. O meu primeiro "mosh" foi num show da banda OS REPLICANTES, em Porto Alegre, evento que não teve nenhum tipo de briga. Na boa, a nação não tem noção do quão frutífero é o Heavy Metal brasileiro, eis uma das chagas abertas na alma da musicalidade brasileira. Como diria Jack Black: – "Fuckin’ Rock!" Este petardo do NASTY começa em alta velocidade, e continua no pique até o final, música inclusa no ep "Wage of Mayhem", 2003. E de lambuja para o público, NASTY RONNY ainda homenageia as oxítonas de Tom Araya. A banda completava neste ano duas décadas de existência e ainda tinha gana suficiente para empolgar inclusive os desconfiados. A música certa na década errada? Não creio. Mas o silêncio geral em torno deste novo lançamento do NASTY SAVAGE, no século que principiava, dá o que pensar até hoje...
MURDER CONSTRUCT – "Compelled by Mediocrity"
Metal extremo. Pessoalmente, não aprecio uma voz gutural, mas neste caso é um juízo de "gosto", por isso, considero que no estilo combina. Mas trata-se aqui menos do som desta música do que o seu videoclipe, que repercute uma proposta do álbum "Results", 2012, exposta na capa. Nunca tinha visto uma capa tão radical no que diz respeito a uma crítica sobre quem manda no planeta, hoje, desde a Revolução Americana, 1776, onde todos os líderes eram maçons, proposta continuada posteriormente na Revolução Francesa, 1789. No vídeo desta música, o "olho que tudo vê", tarda a aparecer, mas o choque visual diante da imagem é inegável. Claro, a imagem do "olho" já aparece na nota de 1 dólar americano – o que indica em qual ambiente a nova casta em ascensão, a burguesa, comandará o novo mundo – mas a compreensão da banda diante de possíveis desdobramentos de tal proposta é surpreendente. Existe hoje muita crítica à Maçonaria, porém, regra geral, permeia o sensacionalismo. Há diversas teorias em cima deste tema e poucas deduções filosóficas coerentes. De qualquer maneira, tem algum material informativo no filme "Do Inferno", 2001, com Johnny Depp. É um tipo de visão, do MURDER, que pouquíssimos atualmente conseguem abarcar, tamanha a coragem de colocar publicamente perturbadoras questões sobre uma mentalidade dominante no poder mundial há mais de duzentos anos.
DYNAHEAD – "Foster"
A parte lírica deste álbum, "Chordata I e II", 2012/ 14, começa de forma sublime – lembrei-me imediatamente dos amores perdidos de Hölderlin. Nem falo da letra, mas da "melódica", na conjunção do duo guitar/ vocals no abrupto início. Ouso afirmar que possivelmente seja o álbum de Heavy, à parte da proposta gutural, mais belo que surgiu em nosso país. Aqui retorno sobre a temática da voz gutural, mas com um juízo de "valor". Considero – perdoem-me os músicos da banda, que muito respeito – a voz gutural neste álbum um passo que soa em falso. Acredito para este álbum, a voz encorpada, por vezes rasgada, potente e proveniente de uma garganta privilegiada, como na maior parte de "Foster", ao invés do gutural ou do gritado – a grande sacada do ANTHRAX a partir de "Spreading for Desease", 1985. A voz de CAIO DUARTE é impressionante, espetáculo de alto nível melódico. Duvido muito que este álbum tenha passado batido nos grandes centros roqueiros europeus, tamanha a beleza cantante concomitantemente com os arranjos musicais dos temas. Mas em nossa própria terra? Huh... Imaginem, se a ida de KIKO LOUREIRO para o MEGADETH – SCOTT IAN, no livro "I’m the Man", 2004, afirma que MUSTAINE é o pai do thrash – só foi notícia para as mídias líderes da brasilidade através de "press releases" decorados, porque falariam de um álbum tão vanguarda como "Chordata"? Bem, os vídeos das músicas completam o bom gosto artístico e as mutações do cantor remetem ao camaleônico e genial David Bowie. Congrats!
ALICE IN CHAINS – "We Die Young"
Evidente, o ALICE IN CHAINS não é uma banda invisível, muito pelo contrário, mas o videoclipe, sim, e, inclusive, pode tornar-se, se isto já não aconteceu ainda, um videoclipe "de culto" – o próprio NASTY SAVAGE é encarado como uma banda "de culto" por muitos norte-americanos extra-Flórida. A escuridão do "vídeo alternativo" de "We Die Young", álbum "Facelift", 1990, é de uma exuberância ímpar – Glauber Rocha também se lixava para iluminações modernas em seus filmes. A banda fez esta beldade imagética com uma garra invejável – que muito recorda-me aquela vontade de vencer também reverberada no videoclipe de "Sangue Frio", 1986, da banda AZUL LIMÃO, afinal, uma banda de Rock Pesado tinha que ter muita personalidade para criar algo tão "roots", numa época onde o coração brasileiro juvenil ainda se deslumbrava com "róquis" no qual óculos vermelhos e batatas fritas eram temáticas vitais. Todos os integrantes do ALICE estão à vontade no vídeo, JERRY CANTRELL parece voar e o grande LAYNE STALEY em sua primeira aparição já mostra que não está para brincadeiras, com aquela gana inconfundível – tipo "faca nos dentes", expressão utilizada por quem busca e conquista a vitória. A propósito do Grunge, importante o artigo "Grunge: Restou apenas um herói", de Jeferson Oliveira, feito com muita paixão e honestidade.
Injustiças podem acontecer em vários setores da vida. E muitas são as bandas de Heavy Metal esquecidas até hoje, apesar de seus inegáveis méritos, porque no ideário mental moderno imperam a objetividade e o pragmatismo. O Heavy Metal resgata uma época em que as músicas eram "hinos", antes de tornarem-se "canções". Período que a música flertava abertamente com a virilidade heroica. Ora, não se "dança" Heavy Metal, fato simbólico não compreendido por LADY GAGA. E também são invisíveis os competentes álbuns solos dos vocalistas JOEY BELLADONNA e STEPHEN PEARCY. A meu ver, o álbum mais arrojado de um vocalista solo, dentro do Metal, foi "Carved in Stone", 1995, de VINCE NEIL, "invisible album par excellence", puro punch: letra, ritmo & som. Mas tal resenha fica para outro artigo.
Roberto Muñoz, escritor
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