As controvérsias e o legado da passagem de Blaze Bayley pelo Iron Maiden nos anos 90
Por Yuri Apolônio
Postado em 20 de julho de 2023
O Iron Maiden é a banda que proporcionou talvez a troca mais acertada de vocalista da história do metal, quando dispensou Paul Di’Anno para contratar Bruce Dickinson, então vocalista do Samson. Mas uma coisa é substituir Paul Di’Anno, outra é substituir Bruce Dickinson, para muitos a voz definitiva do metal tradicional (sem diminuir a importância do primeiro vocalista para o início do Maiden).
Não à toa, muita gente estranhou quando a banda chama para a vaga Blaze Bayley, um vocalista com características extremamente diferentes de Bruce. Mas pra gente entender a escolha por Blaze, a gente precisa voltar um pouco no tempo para a traumática saída de Bruce Dickinson.
Quando Bruce anuncia, antes da "Real Live Tour, em 1993, que deixaria a banda, o sentimento entre os músicos era de que a Iron provavelmente acabaria. Steve Harris, em paralelo, passa por um processo de divórcio com a mulher com quem estava junto desde a adolescência.
Daí, não tendo muito o que fazer, além de gastar a fortuna adquirida com o Maiden, os integrantes se unem no desejo de superar a saída de Bruce e seguir lançando obras relevantes.
Conta-se que mais de 1.500 fitas de vocalistas foram ouvidas pela equipe da banda. Desses candidatos 12 foram chamados para teste. O trabalho empregado, contudo, resulta na escolha de um vocalista desconhecido para 99,9% do público naquele momento, mas favorito do líder do Iron Maiden desde o início.
É compreensível que o público geral estranhou a escolha, uma vez que nomes como Michael Kiske, recém saído do Helloween, e Geoff Tate, do Queensryche, haviam sido especulados.
Contudo, havia um critério, não oficial na época, mas revelado anos depois pelo baterista, Nicko McBrain, que o Iron Maiden, por ser uma banda britânica, buscava um vocalista daquele país. Além de procurarem alguém que não soasse necessariamente como Bruce Dickinson ou Paul Di’Anno, mas, como explicaria Steve Harris, um vocalista que tivesse sua própria voz. E baixista já conhecia a pessoa ideal para a vaga.
Blaze Bayley e o Iron Maiden já se conheciam há algum tempo, sua banda até aquele momento, o Wolfsbane havia excursionado pelo Reino Unido junto com o Iron Maiden em 1990, ocasião em que Steve Harris teria se encantado com o vocalista. Tanto que seria Steve quem iria atrás de Blaze para convidá-lo a fazer testes para o Maiden quando na saída de Dickinson. Ou seja, nem foi Blaze quem enviou seu material para o Maiden.
Blaze disse que não entender o porquê do Iron Maiden tê-lo escolhido, uma vez que ele era muito diferente de Bruce, tanto no estilo quanto na voz. Ao mesmo tempo, para ele, tocar com a donzela era como jogar uma final de Copa do Mundo pela seleção inglesa.
Conta-se que desde o início, Blaze teve apoio irrestrito dos demais membros, o sentimento, de acordo com o novo vocalista era de, entre aspas, "muita camaradagem".
De acordo com o também novo produtor do Maiden, Nigel Green, o X Factor teve como grande diferencial o envolvimento de Blaze e o compromisso assumido por todos os músicos na produção do álbum. Tanto foi, que a banda chegou a gravar o bom número de 14 novas canções, as quais 11 aparecem na versão padrão do álbum. A situação, contudo, começa a mudar quando o "X Factor" é lançado e passa o menor tempo no Top 10 do Reino Unido desde o início da banda
Mas a pior parte eram as apresentações ao vivo. Para executar as canções do "X Factor", Blaze tirava de letra, mas era evidente a incapacidade do novo vocalista em executar as músicas da fase de Bruce, a mais popular do Iron Maiden.
Nesse ponto, até mesmo os próprios membros da banda diriam anos depois que poderiam ter pegado "mais leve" com o novo integrante. Pra ser sincero, não me entra na cabeça até hoje que canções desafiadoras até mesmo para Bruce Dickinson eram executadas na tonalidade original, sem qualquer mudança para se adequar às características de Blaze.
Como se não bastasse, pouquíssimas canções da fase com Paul Di’Anno eram incluídas no setlist. Estas, embora também tivessem seus desafios, eram muito mais simples do que qualquer faixa dos sete álbuns que Bruce havia registrado com o Iron até então.
Claro que a famosa teimosia de Steve Harris explica em partes essa decisão, mas me espanta a falta de tato de todos os demais envolvidos ao verem o vocalista estático no meio ao palco, transparecendo a extrema dificuldade para tentar executar aceitavelmente canções como "Hallowed Be Thy Name", "The Evil That Men Do", "The Trooper", só pra citar algumas algumas, e mesmo assim seguir a mesma fórmula pelas 128 noites da turnê do X-Factor.
Não à toa, uma dezena de shows teve ser cancelado pelo fato de Blaze ficar sem voz.
Apesar dos resultados ruins, o Maiden bancou o vocalista e lançou um segundo álbum com ele: o Virtual XI, composto e gravado em muito menos tempo que o anterior e contando somente com 8 canções.
O Virtual XI é provavelmente o disco que marca o auge da centralização de Steve Harris frente ao Maiden. Desde o Fear of the Dark, os álbuns do banda eram gravados no estúdio particular do baixista, em uma de suas casas de campo.
Além de creditado como compositor único em metade das canções e ser co-autor de outras três, Harris também produziria o álbum, novamente ao lado de Nigel Green, e ainda seria o responsável por gravar os teclados. Sim, isso explica a textura horrível dos teclados em "The Angel and the Gambler".
Agora, sejamos francos, o declínio do Maiden no que diz respeito à popularidade, em especial no mercado americano (o maior mercado consumidor do mundo, com sobras), tem início com o "Seventh Son of a Seventh Son", em 1988, e piora consideravelmente a cada álbum lançado.
Mas é no "Virtual XI" que o Iron Maiden atinge o seu ponto mais baixo, obtendo as piores posições nas paradas desde o "Killers", de 1981, além de ser o primeiro álbum da banda a vender menos de 1 milhão de cópias nos período iniciais.
Para piorar, a falta de flexibilidade do setlist devido às limitações de Blaze, fez com que o repertório dos shows fosse praticamente o mesmo da turnê anterior, contando somente com a adição de canções do álbum mais recente. Outro problema ainda se repetiria: shows da perna americana da turnê seriam cancelados devido a problemas com a voz de Blaze.
Apesar de ainda ser um sucesso na América do Sul e em países menores economicamente, o Iron estava encolhendo e só havia uma saída
Antes mesmo do fim da tour, em dezembro, a decisão nos bastidores já estava tomada: Adrian Smith retornaria para a guitarra, sem a substituir qualquer guitarrista, e Bruce Dickinson retornaria aos vocais, substituindo Blaze Bayley. Somente uma pessoa não sabia disso.
Steve ainda deixa Blaze passar o natal e as férias em paz até demiti-lo, em janeiro de 1999, situação que deixou o vocalista em choque. Para Blaze, que diz ter notado mais tarde que os membros da banda ficavam chateados por estarem tocando para públicos menores, não havia, contudo, qualquer desconfiança de que ele seria demitido.
[an error occurred while processing this directive]O retorno de Bruce e Adrian aos palcos com o Maiden ocorre já no ano de 99, com a "Ed Hunter Tour". No ano seguinte, a banda lança o primeiro de inéditas com a nova formação: o excelente "Brave New World", que devolve ao Iron o status de banda que lota estádios pelo mundo todo. Até hoje, julho de 2023, o Maiden mantém a sólida formação com três guitarras e Bruce nos vocais, além de outras cinco obras lançadas após o "Brave New World".
Blaze, por sua vez, conta que demorou um pouco para se recuperar após o choque de ser tratado como bode expiatório pelo declínio do sucesso comercial do Iron Maiden. Mas no mesmo ano de 2000, ele lança sua primeira obra solo, o notável "Silicon Messiah", e torna-se um funcionário do metal. Já são 9 álbuns solo, o mais recente de 2021, além de seis álbuns ao vivo lançados nessa nova empreitada.
Ao mesmo tempo que o Maiden não facilitou em nada para que Blaze fosse mais bem sucedido. Para ser justo, Harris e outros membros sempre se referem ao período como difícil, mas ao mesmo tempo sempre defendem as obras da fase com Blaze, declarando ter orgulho de diversas obras daquela época. Mesmo ao vivo, a banda nunca deixou de executar canções daquele período, com Bruce, desta fez, fazendo os vocais de Bayley.
Blaze anos mais tarde diria compreender a decisão tomada pelo Iron e que não guarda nenhum sentimento ruim pelos membros do grupo. Inclusive, ele foi visto neste início de julho de 2023 no meio do público, num show do Maiden na inglaterra.
Bem que a banda poderia seguir o exemplo dos alemães do Helloween e reunir todo mundo, nem que seja por um show, trazendo Paul Di’Anno, que ainda canta, mesmo estando em uma cadeira de rodas, e Blaze, antes que seja tarde demais.
[an error occurred while processing this directive]Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps