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Ceará: Bremen Quixadá, um dos pioneiros da cena

Por Leonardo M. Brauna
Postado em 18 de outubro de 2013

Prestigiado por conhecer o Heavy Metal na época de ouro de seu renascimento, BREMEN QUIXADÁ é um dos primeiros roqueiros da cidade de Fortaleza que viu surgir o termo ‘Headbanger’ ou ‘Metalhead’ que, naturalmente, viria a definir o seu comportamento junto com o de seus amigos. Nem mesmo as dificuldades, como o preconceito da época foram capaz de intimidar esse ser humano que viveu intensamente a sua mocidade como um guerreiro do Metal. BREMEN que como pessoa reúne no mesmo pacote a sua experiência com simplicidade, respeito e responsabilidade, me contou como adquiriu tudo isso, onde tenho o prazer de compartilhar com você a nossa conversa, para que possamos entender melhor como se "arquitetou" um dos maiores cenários do Metal nordestino, o da capital cearense.

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Você conheceu o Rock ‘n’Roll chegando ao final da década de 1970, ou seja, um período em que o Rock pesado estava "enfraquecido" devido o ‘boom’ da música Punk e o surgimento da onda Pop. No entanto pôde acompanhar todo o renascimento do Heavy Metal com o crescimento da NWOBHM e suas ramificações mundo a fora. Fortaleza, por ser uma cidade com cultura regional muito forte, sentiu essas mudanças que acontecia no universo roqueiro?

Bremen Quixadá: Meu primeiro contato com o Rock, segundo minha mãe, foram as guitarras rasgadas de ‘Alegria, Alegria’ do CAETANO VELOSO em 1969, eu tinha dois anos e ela comprou o compacto – ela me disse que eu não parava de pedir pra repetir a música (risos), mas falando a partir de quando me lembro foi em 1977 na casa do meu tio mais novo – LED ZEPPELIN, AC/DC e RUSH, aquilo me foi impactante, mesmo muito novo e mergulhado numa cultura regional e clássica ao mesmo tempo, pois meu pai era "parido" pelo LUIZ GONZAGA e minha mãe por balé clássico, mas ao ouvir aquilo parecia que tudo havia zerado e eu havia encontrado meu mundo.Claro que meu tio foi até 1980 a minha única fonte de informação, inclusive foi ele quem me apresentou também ao Progressivo através do GENESIS, além de que, com a nossa cultura regional, realmente poucos haviam como aprofundar naquela época seu conhecimento sobre o que vinha acontecendo, basta ver a geração roqueira antes da minha, conversando com eles, poucos se interessavam pelo Heavy Metal, era mais pelo Progressivo, Blues, Fusion e o Rock dos anos setenta, tendo o SABBATH, QUEEN, PURPLE, KISS, dentre outros inclusos nesse meio. A partir de 1980 com treze anos fui começando a fuçar e procurar pelo mais pesado até me dar de cara com o ‘Maiden Japan’, creio que no final de 1981 na loja ‘Francinet Discos’, daí pra frente lascou tudo de vez.

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Em Fortaleza, você e seus amigos foram os primeiros a ouvir vertentes da música mais extrema, como EXODUS, SLAYER, METALLICA, VENOM etc. Quem eram e como conheceu essas pessoas, enfim, Como surgiu o movimento Headbanger na cidade?

Bremen: Ao ouvir o Thrash Metal a coisa tomou uma forma alucinante, mas o Rock in Rio que foi em janeiro de 1985, podemos dizer que teve importância para botar fogo em tudo. Nossa turma foi sendo formada se encontrando nas praças, nas rodas de amigos, surgindo na rapidez e na dinâmica que o Metal havia tomado conta de nossas vidas, daí era cada indivíduo indo desesperadamente a procura de algo novo pra passar para todos, ninguém guardava nenhuma informação pra si, a euforia em chegar com algo novo e mais pesado era impressionante entre nós, foram momentos únicos e inesquecíveis e todos são unânimes em falar isso. Mandar pintar a mão capa de disco em uma blusa na ‘Carleal’ da Rua Floriano Peixoto era bom demais, sair vagando na cidade com jaqueta cheia de patches, coturnos do exército, cinto e pulseira de pregos... você já imagina como era. Enfim, ser Headbanger naquele tempo era desafiador devido ao momento do país, bem como viver no Nordeste como vivíamos.

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Ao que consta em alguns depoimentos, o movimento punk já era uma realidade em Fortaleza mesmo antes de haver uma cena Headbanger. Quando os roqueiros começaram a se organizar uma espécie de atrito com Punks surgia também. O que ocasionou essa indiferença entre as partes?

Bremen: Sim, era mesmo, inclusive não tenho notícia de que houvesse diferenças entre os "roqueiros" e os punks. Eu tive contato com a música punk também no início dos oitenta, mas não me bateu nenhuma empatia e deixei pra lá. Depois de alguns anos já com o movimento Headbanger consolidado aí sim começou esse atrito, muito mais por procura de domínio de território que por outra coisa. Lógico que havia choque de pensamentos como, por exemplo: eles falavam que nós éramos alienados porque o Heavy Metal não instigava nenhum tipo de protesto ou revolução cultural e nós dizíamos que eles eram uns rebeldes sem causa nenhuma e que só queriam mesmo se drogar e não tomar banho (risos) imagine só. Como éramos todos muito jovens não procurávamos medir consequências, daí sempre aconteceram confrontos. Cheguei a conversar muito com o ‘Dedé Podre’ (N.R.: personagem simbólico do movimento punk de Fortaleza, já falecido) sobre isso, algumas vezes que nos encontrávamos sozinhos e estávamos sóbrios (risos), mas era muito difícil de resolver, só o tempo resolveu mesmo, o surgimento do Hardcore e do Crossover nos aproximou mais...

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Em 1985, alunos da UECE (Universidade Estadual do Ceará) resolveram angariar recursos para a sustentabilidade do movimento estudantil ‘Caminhar’. Encabeçados pelo casal ‘Dora Gadelha’ e ‘Wellington Santos’ resolveram fazer uma festa para Headbangers usando apenas som mecânico. O evento que se chamava ‘Tempestade Metálica’ se tornou um "grito de liberdade" para os jovens roqueiros e até punks que presenciaram a queda do regime militar no Brasil. Que lembranças você tem daquela noite?

Bremen: Foi inesquecível, estávamos nesse sábado na minha casa assistindo umas fitas de vídeo cassete, quando chega um amigo (Ronaldo) falando que viu um cartaz em um poste com a propaganda do evento, ficamos malucos e começamos a nos comunicar uns com os outros e marcamos pra nos encontrar na frente do lugar. Na verdade a Dora e Cia. nunca imaginaram que aquela quantidade de gente vestida de preto iria invadir o local naquela noite, inclusive muitos punks, pois não havia ainda problemas de relacionamento entre as partes. Foi muito legal, para nós uma realização. Termos um local para podermos agitar era muito bom. Aos detalhes da festa deixo para a Dora e o Wellington comentarem um dia.

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No ano seguinte mais duas edições do ‘Tempestade Metálica’ aconteceram no emblemático ‘Clube do América’. Aquele local, com o passar do tempo, foi se tornando um ‘reduto’ de roqueiros dos anos oitenta. Quais os festivais que mais marcaram a cidade naquela época?

Bremen: Esse dois foram marcantes devido ter reunido uma quantidade considerável de pessoas apenas para agitar com som mecânico, já que no terceiro só teve a apresentação da ASMODEUS. Consolidou a cena, amizades e o Metal em nossa cidade. Tiveram alguns com som mecânico também no ‘Clube Santa Cruz’, um deles com o sorteio de uma guitarra, imagine só. Já Festivais com apresentações das bandas locais e de outros estados foram espetaculares . Temos muito a agradecer ao Ricardo Catunda da ‘Purgatory’ pela sua ousadia e coragem naquela época. Passo sempre em frente aonde era o ‘América’ e um sentimento de perda sempre bate. Só quem estava lá sabe o que significou para nós aqueles momentos.

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Naqueles tempos, apesar da carência de tecnologia de comunicação, já existia uma reciprocidade muito grande com os bangers de outros lugares, tanto é que Fortaleza já recebia visitas de bandas de estados como Rio Grande do Norte e Piauí - e também os bangers do Ceará já se aventuravam em terras diferentes para "festejar" com os novos irmãos. Quando começou essa quebra de fronteiras?

Bremen: Isso. Principalmente com os estados vizinhos, como exemplos têm o MEGAHERTZ (PI) e SODOMA (RN). O Festival ‘Setembro Rock’ de 1986 em Teresina foi marcante para nossa região, tivemos DORSAL ATLÂNTICA entre nós, imagine o ‘rebuliço’ (N.R.: palavra que no Ceará define ‘agitação’). Praticamente fechamos um ônibus rumo ao Piauí, até hoje comentamos com nossos amigos de lá sobre esse evento. Quando nos juntamos também para ir ao VENOM/EXCITER em Brasilia, 1986 foi muito bom também, fizemos amizades fora de nossa região que geraram excelentes resultados para nós. Eu juntamente com outros amigos ajudei na divulgação do ‘Bestial Devastation’ do SEPULTURA por aqui, inclusive ultimamente falei com o PAULO JÚNIOR depois do show no ‘Siará Hall’ sobre isso. Também ajudamos o VULCANO, temos citações nos agradecimentos de ‘Bloody Vengeance’, nossa amizade com o ZHEMA continua até hoje. Esse intercâmbio era todo via carta, daí a dificuldade e importância.

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O seu nome sempre está ligado a algumas estórias onde muitas delas se tornaram lendas, a mais famosa é o episódio da casa ‘Duques e Barões’ nos anos oitenta onde ocorreu um confronto direto com punks. O que realmente aconteceu ali para terem chegado às vias de fato?

Bremen: As causas desses embates sempre eram variadas, mas naquele dia especificamente, eu dei em cima da ‘Flor Punk’ (N.R.: garota bastante conhecida da cena underground de Fortaleza) e o namorado dela veio tomar satisfação, daí deu no que deu (risos)

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Na sua visão quais as principais "diferenças" que distingue o jovem Headbanger de trinta anos atrás para o que vive hoje na cena? O que mudou nesse cenário?

Bremen: O mais legal que acho no Heavy Metal é que já se vão mais de 30 anos e a essência não muda, a única diferença pra mim é a tecnologia e o momento que vivemos hoje, quando estou por aí e vejo a meninada consigo imediatamente viajar no tempo e manter a minha juventude acesa. E o mais interessante é quando eles vêm falar conosco para saber como era naquela época e numa ansiedade visível de ter vivido tudo aquilo. Eu só digo a eles que vivam o hoje intensamente, com responsabilidade se possível, para que daqui a trinta anos aconteça o mesmo com eles, pois o Metal ainda vai bem longe.

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Vamos falar de religião. O Rock Cristão não é um estilo novo dentro do Rock ‘n’ Roll, algumas bandas já vêm desde os anos 70, mas a partir dos anos oitenta a evolução tem se intensificado até o surgimento do ‘White Metal’. Como uma pessoa religiosa você acha que esses dois campos devem seguir caminhos homogêneos?

Bremen: Eu tenho um pensamento bem formado sobre isso. Em 1988 eu tive um problema muito sério com alcoolismo e até me afastei completamente da cena, só vivia em bodegas e bares do centro da cidade, quase não trabalhava mais, situação muito difícil, meus amigos, Doge e Régis, eram os únicos que ainda conviviam comigo nessa época. Daí minha mãe pediu para umas pessoas do Shalom (N.R.: comunidade religiosa com fundamentos carismáticos) se aproximarem de mim para tentar ajudar. Eles me ofereceram emprego de operador em uma rádio de Pacajus (município da grande Fortaleza) onde trabalhei uns seis meses com muita dificuldade, tendo que conciliar o trabalho a um problema tão sério. Ao final do ano eu tive uma experiência espiritual muito forte por lá. Consegui parar de beber, voltei ao meu trabalho, mas como operador de PA e estúdio de gravação com eles, não parei de pesquisar um só momento, foi aí que fui apresentado ao White Metal com mais profundidade: STRYPER, PETRA, WHITE CROSS, BRIDE, VENGENCE RISING, BELIEVER dentre outras que têm qualidades absurdas. Muito tempo já se passou e com ele a maturidade – não consigo ver problema sem se ter a liberdade de fazer o que quiser da sua vida, a não ser que prejudique alguém. O Heavy Metal não é de ninguém e ao mesmo tempo é nosso, e por isso o que cada um quer colocar na sua letra é direito de cada um. Só não aceito que tentem me induzir a nada, pois em minha opinião e consciência mando eu.

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Foi um prazer poder fazer essa entrevista com você e espero que o cenário cearense sempre possa ver na sua história um dos grandes exemplos de amor pelo Heavy Metal.

Bremen: O prazer foi meu não tenha dúvidas. Inclusive venho te parabenizar por tudo que tens feito. Suas iniciativas e atitudes são um orgulho para nós cearenses. Abraços a todos e "LONG LIVE THE LOUD"...

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Como consegui viver de Rock e Heavy Metal

FOTOS: arquivo pessoal

Contato:

https://www.facebook.com/bremen.quixada?fref=ts

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Sobre Leonardo M. Brauna

Leonardo M. Brauna é cearense de Maracanaú e desde adolescente vive a cultura do Rock/Metal. Além do Whiplash, o redator escreve para a revista Roadie Crew e é assessor de imprensa da Roadie Metal. A sua dedicação se define na busca constante por boas novidades e tesouros ainda obscuros.
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