Syd Barrett: Biografia, Influência e Análise dos Discos
Por Francisco Grynberg
Postado em 14 de março de 2010
Syd Barrett é um dos personagens mais emblemáticos no mundo do Rock. O que mais impressiona é que Syd lançou apenas um álbum com o Pink Floyd, banda da qual participou por alguns anos e dois álbuns na carreira solo. Desde o começo da década de 70 até o ano de sua morte (2006), viveu uma vida pacata em Cambridge na Inglaterra sem fazer aparições públicas e muito menos shows.
Mais do que propriamente sua obra (que é curta e justamente por isso muitos não dão muita importância), a figura de Syd é importante para se entender o movimento de psicodélico e também o que o Pink Floyd se tornaria depois de sua saída. Vamos começar com uma breve biografia.
Biografia
Roger Keith Barrett nasceu em Cambridge em 1946. Filho de uma família de classe média, desde cedo se aventura no mundo da música. Ainda jovem, conhece Roger Waters, com quem formaria banda mais tarde. Aos 14 anos, recebe o apelido de Syd, tirado do nome de um baixista de jazz da região chamado Sid Barrett (o "y" veio para diferenciar do original). Outro fato importante na vida de Barrett é a morte de seu pai quando ele tinha 16 anos. Mais tarde, Syd frequentou uma Faculdade de Belas Artes antes de entrar para o Pink Floyd.
Mesmo quando se tornou músico profissional, manteve o hábito de pintar. Na juventude, participou de algumas bandas que faziam pequenas apresentações em bailes ou festas e escreveu algumas canções como "Effervescing Elephant".
Em 1964, se muda para Londres para entrar no Camberwell College of Arts. Um ano depois entra no Pink Floyd, então Tea Set. Na época, participavam da banda o guitarrista Bob Klose, o tecladista Rick Wright, o batersita Nick Mason e o então guitarrista Roger Waters. Chris Dennis foi o vocalista por algum tempo, até que Syd assumiu o vocal e a guitarra, Waters tendo virado baixista e Klose tendo saído da banda alguns meses depois.
O nome da banda é ideia de Syd que junta os nomes de dois compositores obscuros de blues: Pink Anderson e Floyd Council. Inicialmente a banda se chama "The Pink Floyd Sound."
É nessa fase que Syd começa a escrever mais músicas, sempre com letras extravagantes e originais. A banda vira uma das favoritas de vários clubs como o UFO Club, o Marquee e o Roundhouse.
Mas a banda dá o salto para o sucesso no ano de 1967. Aparecem em um documentário, lançam os singles "Arnold Layne" e "See Emily Play" e o disco de estreia, o cultuado "Piper at the gates of dawn" (gravado em Abbey Road).
A banda se consolida como a mais importante do emergente cenário psicodélico britânico, com composições curtas, experimentais, não-lineares, viajantes e inovadoras. É e Syd o maior responsável por essas músicas. Quase todas as composições do primeiro álbum são dele (Waters assina uma música).
Se já há algum tempo o jovem compositor tomava LSD (e as viagens o inspiraram em muitas das músicas) o sucesso faz com que Syd abuse no uso do alucinógeno. Isso porque ele queria que a banda continuasse desconhecida do grande público e não conseguia se ver na função de frontman de uma grande banda. Cada vez sentindo-se mais pressionado, não vê nenhum saída que não fosse se alienar cada vez mais fazendo uso da droga.
Começa o processo de alienação e enlouquecimento do compositor. Assim como suas composições, seu comportamente se torna totalmente imprevisível. Syd muitas vezes ficava olhando para o nada, e isso no meio de apresentações (Waters mais tarde definiria os seus olhos como black holes na música "Shine On..."). Por causa de seu comportamento, fica cada vez mais complicado para a banda se apresentar ao vivo.
É nesse momento que David Gilmour se junta à banda.
Inicialmente, a ideia era que Syd continuasse compondo mas quem tocaria ao vivo seria Gilmour. A ideia não dá certo e Barrett sai da banda em março de 68. Sai no álbum "Saucerful of Secrets" sua última contribuição, "Jugband Blues". A faixa representa o adeus de Barrett à banda, onde Syd fala de sua alienação em relação aos outros membros de forma sarcástica.
A letra da música deu fruto a diversas interpretações. Algumas sugerem que Syd faz uma crítica aos companheiros que o afastam, em outras pode ser interpretada como um adeus lúcido de Barrett da banda, uma última prova de sua genialidade.
Syd lançaria em 1970 "Madcap Laughs" e "Barrett", seus dois álbuns solos com participações e produção de membros de sua antiga banda. Os álbuns não alcançam grande sucesso. As composições seguem praticamente no mesmo estilo do Pink Floyd. Letras simples, experimentalismo, mas sem a mesma pegada das composições anteriores. Algumas são arrastadas e em outras as letras são simplórias. Parece que a chama de genialidade foi aos poucos se apagando mas de certa forma continuava lá. Após mais alguns anos de tentativas e fracassos, Syd larga o mundo da música e vai morar em Cambridge, vivendo até a morte uma vida normal como já dito.
Influências no Pink Floyd
Syd era a mente criativa por trás do grupo. Logo após a saída do compositor, os integrantes se viram numa situação complicada em que a banda simplesmente não tinha líder. Até que Roger Waters assumisse essa posição, foram lançados alguns discos. Nessa época, Wright, Gilmour e Waters queriam traçar rumos diferentes o que fez com que por algum tempo ficaram perdidos conceitualmente e musicalmente. Cada membro estava experimentando bastante por conta própria e buscando uma nova direção para o som da banda. Nesse périodo cada um, com exceção de Mason, contribui com canções próprias. É a fase de transição entre o psicodélico e o progressivo.
A banda continua experimentando mas uma nova identidade começa a se formar. Já em álbuns como "Atom Earth Mother" e "Ummagumma" temos composições mais longas e estruturalmente mais complexas. É a nova identidade da banda, cada vez mais se aproximando do som progressivo único que a tornou famosa.
Já no disco "Meddle", na faixa final "Echoes" de 23m, por exemplo, vemos uma banda distante da psicodelia de Barrett. Mas aonde está a influência de Syd na obra da banda? Basta ver os temas de alguns dos discos mais famosos, impossível não relacionar à personalidade de Syd. Nesses casos, o que mais intriga Waters não é a influência musical mas sim o personagem Syd Barrett.
Em "Dark Side of the Moon", temos como tema, além de uma crítica à sociedade da época, as coisas que podem levar um homem à loucura. A associação com Syd é óbvia. Já em "Wish You Were Here", álbum seguinte a "Dark Side...", temos as maiores referências à Syd. A começar pelo tema central: a ausência (nos remetendo à falta de Syd). Mas a maior referência é numa música dedicada ao próprio Syd, "Shine On You Crazy Diamond" (nas iniciais temos as letras S Y D). Na letra da música, claramente uma homenagem ao ex-membro da banda temos mais referências ao caráter do "Crazy Diamond".
A letra, brilhantemente composta por Waters fala do caráter de Syd e de seu processo de enlouquecimento. Também traz a nostalgia expressa por Waters dos tempos iniciais da banda quando Syd ainda brilhava.
O título da música também é bastante significativo. Além disso, é umas das músicas mais sofisticadas e sentimentais ddo grupo onde Roger Waters se faz porta-voz e resolve abrir essa antiga ferida (saída de Syd).
Outro evento curioso é a aparição de Syd durante o processo de gravação dessa música. Gordo, careca e com as sobrancelhas raspadas, ninguém o reconheceu por alguns minutos. A cena parece ter comovido os integrantes da banda pelo que foi contado depois. Foi a última vez que eles viram Syd.
Podemos também ver uma outra referência na nostálgica balada "Wish you Were Here".
Talvez a última vez que a sombra de Syd se faz presente é no disco "The Wall" de 1979. Novamente, o tema do disco parece ter sido inspirado em Barrett em certa medida. Em linhas gerais, conta a história de um homem que aos poucos vai se alienando de tudo à sua volta, como que construindo um muro invisível que os separa dos demais. Novamente, a referência na minha opinião é clara.
Concluimos que Syd, mesmo tendo participado de apenas um disco como integrante, é fundamental não só para entender os discos que vieram depois como uma figura marcante para todos da banda, que continou inspirando Waters e cia mesmo anos depois de sua saída. Citando Waters: "Sem ele o Pink Floyd jamais teria existido, com ele jamais teria continuado".
[an error occurred while processing this directive]Importância de Syd na música e legado
A figura que Syd passou é a do típico gênio excêntrico. Não só pela criatividade e originalidade mas também pela personalidade diferente dos demais, imprevisibilidade e comportamentos no mínimo estranhos. Muitos insistem em não reconhecer a importância de Syd na psicodelia, porém na minha opinião ele foi o maior expoente do cenário psicodélico inglês e alguém capaz de sempre tentar coisas novas, fugindo da padronização do Rock da Invasão Britânica. Junto com os Beatles, o Pink Floyd é considerada uma das mais influentes bandas psicodélicas do final dos anos 60 e isso graças à inventividade de Syd Barrett.
Seguem pequenas reviews dos álbuns de Syd, seja com o Pink Floyd seja na carreira solo.
Reviews
"The Piper at The Gates of Dawn" (1967)
O título do álbum, gravado em Abbey Road e lançado em 1967, foi inspirado num capítulo de um livro infantil. Syd assina todas as composições com exceção de "Take Up Thy Stethoscope and Walk" (a mais fraca do disco) de Waters. Como o próprio Waters declarou, naquela época a banda se resumia ao gênio criativo de Syd, que buscava inspiração muitas vezes em viagens geradas pela LSD.
O que dizer sobre a sonoridade do álbum? Barrett sempre optou por composições curtas e simples, com temas fantásticos e que remetessem às vezes à infância, outras vezes ao espaço sideral e tudo isso numa atmosfera onírica. Ele resolve nesse primeiro álbum extrapolar qualquer tipo de padrão e forma estrutural criada anteriormente.
[an error occurred while processing this directive]O som também difere de qualquer trabalho anterior. É experimental não só musical mas também tecnicamente: Syd usou diversos aparelhos e instrumentos para criar sons de eco, ou barulhos bizarros por assim dizer. Syd também sempre trabalhou nas letras, que são simples mas com valor simbólico. Ele mesmo admitiu que gostava de "brincar" com os diferentes significados de cada palavra. Os vocais também pertencem a Syd.
Enquanto isso, o resto da banda preferia composições mais longas e instrumentais (aspecto claro no segundo PF). Desse estilo, temos "Instertellar Overdrive", umas das viajantes da banda. Com duração de 9 minutos, a banda simula durante a música diversos sons para criar a atmosfera de uma viagem no espaço. Pioneiro e genial. Um dos melhores do Rock Psicodélico. Porém, é um disco de difícil assimilação. A cada ouvida se torna melhor e você nota mais detalhes. Destaques para "Lucifer Sam", "Matilda Mother" e "Bike".
"Madcap Laughs" (1970)
No primeiro disco solo de Barrett, produzido por Gilmour e Waters, continua a atmosfera psicodélica nas músicas que são novamente bem simples e com ênfase no vocal. Sem os sons psicodélicos usados nas músicas do Floyd, nesse álbum temos como instrumental basicamente simples batidas no violão acompanhadas de baixo e bateria (não sempre). O vocal particular de Syd continua o mesmo, às vezes um pouco gritado (e desesperado).
Algumas letras tendem a ser um pouco infantis mas novamente podem receber diferentes interpretações. Ocorreram diversos problemas durante as gravações que começaram já em 1968 e foram interrompidas até 1969. Uma das coisas mais difíceis de lidar foi o fato que Syd geralmente tocava e gravava as músicas anteriormente.
Como todos sabemos, seu caráter impresível se aplicava também na música e muitas vezes ele simplesmente adiocionava ritmos a vontade, sem nenhum tipo de padronização. Isso dificultou muito o trabalho dos músicos contratados (entre eles o baterista do Humble Pie). Algumas músicas são angustiadas e refletem o estado mental de Syd na época. Em outras, o clima é mais animado e leve, como podemos ver em "Here I Go", uma das melhores do álbum.
Destaques não só para a citada "Here I Go", como para "Dark Globe", "If It's in You" e "Octupus".
"Barrett" (1971)
Segundo e último disco solo de Barrett. A sonoridade é mais complexa que a do primeiro trabalho tendo músicas mais sofisticadas (mais solos e estrutura menos linear) fugindo das batidas de violão do anterior. Também é mais psicodélico que o anterior, voltando ao uso de alguns sons psicodélicos dos tempos de Pink Floyd. O vocal e as letras nesse disco são menos importantes que no anterior, já que o instrumental é mais interessante.
É porém na minha opinião pior que o anterior apesar de ter vários bons momentos. Isso porque em determinados momentos é um pouco arrastado e deixa a desejar. É o adeus de Barrett do mundo da música, e nos mostra muitas das características que o fizeram conhecido mundialmente.
Apesar das sessões de gravações terem sido mais rápidas que as de "Madcap Laughs", isso não impediu que Syd mostrasse várias vezes seu comportamento instável como na sua única perfomance solo quando saiu do palco no começo do show e não voltou.
Os produtores do álbum foram Wright e Gilmour; Vale citar também a capa, composta por insetos desenhados pelo próprio Barrett.
Destaques para "Baby Lemonade", "Dined and Wined", "Dominoes", "Gigolo Aunt".
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