O defeito do rock brasileiro dos anos 70 e o diferencial das bandas dos 80, segundo Roger Moreira
Por Gustavo Maiato
Postado em 24 de agosto de 2025
Nos anos 1970, o rock brasileiro ainda parecia engatinhando em busca de uma identidade. Havia nomes importantes, como Rita Lee, Raul Seixas e grupos como O Terço, mas, em boa parte das vezes, as bandas nacionais soavam como cópias menos inspiradas de suas influências estrangeiras. Décadas depois, o vocalista Roger Moreira, dos Ultraje a Rigor, seria categórico em uma entrevista à revista Bizz de 1985.
Ultraje A Rigor - Mais Novidades

"Naquele período, os grupos eram meio na cola dos importados, e a cópia ficava sempre mais chutada. Hoje em dia o pessoal está mais ligado mesmo em fazer um rock brasileiro, com as condições daqui, os temas daqui."
Essa diferença de abordagem ajudaria a marcar o início da chamada "geração 80", quando nomes como Ultraje, Paralamas do Sucesso, Titãs, Legião Urbana e tantos outros transformaram o rock em um fenômeno cultural e de massa no Brasil.
Rock nacional dos anos 1970 e 1980
Se o instrumental do rock brasileiro dos anos 70 já tinha força, o ponto fraco eram muitas vezes as letras. O jornalista Sérgio Martins lembrou recentemente, em seu canal no YouTube, como isso sempre o incomodava.

"O Made in Brazil, que é uma banda tradicional, tinha versos como ‘Hey, larga meu pé, você até parece chiclé’. O Patrulha do Espaço fez uma canção chamada ‘Columbia’, em que diziam: ‘Eles subiam aos céus e voltou, uô, uô, é o maior dos pássaros, Colúmbia’."
A virada veio justamente com a chegada da Legião Urbana, cujo primeiro disco, lançado em 1985, redefiniu o que significava escrever rock em português. No recém-lançado livro Será – Crises, Genialidade e um Som Poderoso, o produtor José Emílio Rondeau revela os bastidores turbulentos do álbum e mostra como Renato Russo se recusou a ceder às pressões da gravadora para suavizar os versos.

Segundo Sérgio Martins, que acompanhou tudo de perto na época da Bizz. "A geração Brasília virou o jogo num cenário dominado por riffs fortes, mas versos que beiravam o absurdo. Renato Russo trouxe letras que realmente diziam algo. Eu escutava ‘Ainda É Cedo’ e achava que tinha sido feita pra uma ex-namorada minha. Depois fui entendendo tudo o que a Legião dizia ali."
Na mesma entrevista de 1985, Roger Moreira também recordou como o Ultraje a Rigor foi assimilando o sucesso aos poucos. Músicas como "Inútil" e "Eu Me Amo" demoraram para estourar, mas quando "Ciúme" explodiu nas rádios, não havia mais volta. "Não chega a assustar porque a gente esperava e gosta disso. Mas tem sustos como o do lambari."

Entre cópias mal resolvidas dos anos 70 e a força lírica da geração 80, o rock brasileiro passou por uma transformação profunda. A crueza e a simplicidade que Roger defendia — "o rock tem de ser simples" — se uniram ao cuidado de Renato Russo com as palavras. O resultado foi uma música que não apenas lotava estádios, mas também falava diretamente à experiência do público brasileiro.

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