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Rock progressivo e Ulisses: comparações entre o gênero e o clássico da literatura

Por Flávio Siqueira
Postado em 03 de janeiro de 2014

Nota introdutória: como está explícito num pequeno trecho do texto abaixo, "Rock progressivo e Ulisses" foi escrito numa tentativa de metalinguagem compreendendo o último capítulo do livro Ulisses, de James Joyce, no qual ocorre um monólogo (ou fluxo de consciência) que expõe integralmente o pensamento da personagem. Daí a falta de pontuação. Ao texto, pois.

Sim, um escritor de rosto fino e nariz aquilino sempre seduziu os amantes da literatura não todos é verdade porque quando se cria uma obra calcada de extremos e exageros corre-se o risco de ser amado ou odiado e James Joyce escreveu Ulisses para a grande libertação literária do século XX e Ulisses é uma obra tão livre e experimental que a meu ver não é para ser compreendida mas lida como se fosse uma espécie de ácido literário e aos 22 anos eu decidi enfrentar a árdua mas ao mesmo tempo prazerosa tarefa de degustar as páginas lisérgicas de Ulisses e na época minha referência principal de rock progressivo era o Pink Floyd e eu ainda não havia me atentado ao sabor das pérolas progressivas como Van der Graaf Generator e Camel e Hawkind e tantas outras bandas progs fantásticas e somente quase quatro anos depois de ler Ulisses é que percebi como esse livro e o rock progressivo possuem características em comum e que o que os permeia é a fusão de linguagens ou seja você lê Ulisses e de repente se depara com o estilo teatral empregado no capítulo 15 ou ouve rock progressivo com uma guitarra distorcida e é surpreendido com linhas melódicas de saxofone com sonoridade jazzística e Ulisses é uma paródia da Ilíada de Homero e é uma reinvenção de uma grande obra literária e o rock progressivo de certa forma também é uma reinvenção mas uma reinvenção do jazz e da música erudita e do próprio rock and roll e a Canterbury Scene deu novas roupagens ao jazz e o prog italiano sempre teve sua estrutura calcada na sonoridade barroca e é como se o jazz e a música erudita saíssem dos padrões que os circundavam antes do final da década de 60 para se recriarem e o rock progressivo por se valer de uma grande liberdade de improvisação é como se fosse uma espécie de fluxo de consciência musical o fluxo de consciência é o estilo narrativo que permeia Ulisses patente principalmente no último capítulo no qual o monólogo de Molly Bloom escrito por James Joyce sem pontuação exceto por hífens por uma vírgula e pelo ponto final após a declaração afirmativa de Molly extrai o âmago do pensamento da esposa adúltera do emblemático Leopold Bloom e mãe do erudito Stephen Dedalus e ler um texto escrito pelas vias do fluxo de consciência é passear livremente pela mente do personagem e é uma torrente psicológica desnuda e então escrevendo dessa maneira posso apontar que a concepção entre o rock progressivo e Ulisses surgiu tão de repente na minha cabeça que eu disse a mim mesmo eureca porque eu não havia pensado nisso antes então fiquei encucado com essa ideia por um tempo até perceber que de fato eu poderia estar diante de uma comparação verossímil e talvez o rock progressivo fosse o grito de Molly Bloom disperso em sofisticadas notas de jazz ou ainda suas lágrimas derramadas na sonoridade erudita então talvez a agonia de Molly seja um rock sinfônico e Ulisses é mesmo um épico da literatura e isso é mais uma coincidência entre o livro e rock progressivo pois notem que no prog rock há o que chamam de épico ou seja músicas longas às vezes ultrapassando 20 minutos de duração como Echoes do Pink Floyd ou Tarkus do Emerson Lake e Palmer ou então as duas partes de Tubular Bells do Mike Oldfield e as músicas do Tales from Topographic Oceans do Yes o álbum que é amado ou odiado eu vejo muita gente vangloriando esse disco e vejo muita gente falando mal dizendo que é um álbum quantitativo e não qualitativo e que é um disco tão megalomaníaco e por falar em megalomania foram músicas assim dentre outros motivos que fizeram insurgir a cena punk porque a gente sabe que o movimento punk foi uma resposta aos exageros do rock progressivo e os punks queriam acabar com aquela miríade de notas eles achavam o prog um pé no saco e diziam porra pra que serve tudo isso então três acordes pra eles era o suficiente e os fãs mais velhos do prog rock devem recordar que Johnny Rotten do Sex Pistols andava com a camiseta com os dizeres I Hate Pink Floyd ou seja o punk se tornou um símbolo de movimento antirrock progressivo mas talvez os punks representassem naquela época a opinião de muitas pessoas atualmente porque de certa aqueles que não conhecem o rock progressivo podem achar que o estilo é exagerado e chato assim como aqueles que não leram Ulisses também devem considerar o livro exagerado e chato então eis aí mais uma coincidência entre Ulisses e o rock progressivo e como podemos notar o rock progressivo mas o fato é que Ulisses foi um marco na literatura modernista ao romper com o tradicionalismo estético da literatura e o rock progressivo talvez seja comparável ao movimento modernista mas também o prog abarca muito da literatura barroca no sentido de ser uma linguagem musical mais culta e também pessimista porque é impossível não falar do pessimismo tendo dentro do rock progressivo álbuns como The Wall do Pink Floyd e barroco também no sentido mais musical possível é a sonoridade do prog italiano recheada de linhas melódicas de flauta e bem como o Jethro Tull é um tanto barroco em sua musicalidade e após várias comparações entre Ulisses e rock progressivo se me perguntassem você acha que o rock progressivo é a maior vertente do rock e você gostaria de que o prog voltasse à efervescência de outrora e aí então eu responderia sim eu disse sim eu quero Sim.

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Sobre Flávio Siqueira

Nascido e criado em Brasília, aos 14 anos pegou emprestado um "The Best of" do Pink Floyd. O choque foi tão grande que resolveu aprender guitarra somente para executar o solo de "Time". De lá pra cá vem estudando guitarra e apreciando bandas de stoner, grunge e rock progressivo, além de muito blues e algumas coisas de jazz e música erudita. Atualmente toca guitarra numa banda que mescla influências de stoner, grunge e uma pitada de rock psicodélico.
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