Guitarristas: e quando o virtuose canta mais que o vocalista?
Por Richard Navarro
Fonte: BMU / ASE Press Music
Postado em 24 de fevereiro de 2015
Na história da música não é raro encontrarmos músicos que acumulam outros talentos além de seu instrumento principal, e outros que até abandonam seu posto original para se tornarem frontman. Este foi por exemplo o caso clássico de Phil Collins, que era o baterista do Genesis antes de assumir a função deixada por Peter Gabriel, e mais tarde consolidar uma grande carreira solo. Outros virtuoses, por mais que tenham o dom da voz, preferem se concentrar no seu instrumento e se limitam a fazer backings que, em alguns casos, torna-se quase um desperdício. Numa banda que tem ninguém menos que Jon Bon Jovi como vocalista, ter a atenção roubada pelos backings privilegiados de um certo guitarrista Ritchie Sambora, não é pouca coisa. O tão talentoso quanto polêmico guitarrista Timo Tolki é outro que merece citação. Além de exímio guitarrista e compositor, vale lembrar que ele foi responsável pelos vocais dos primeiros álbuns do Stratovarius, até ser "rendido" por Timo Kotipelto que, segundo o próprio alegou na época, "cantava bem melhor".
A lista de exemplos de instrumentistas que reúnem esse talento especial "extra" não é nada pequena. No cenário do Metal brasileiro isso não é diferente. Um dos exemplos mais impressionantes é de Danilo Lopes (Ceremonya/ex-Eterna) que, apesar de ser um dos bateristas mais técnicos e habilidosos da cena, também é conhecido pela sua bela e poderosa voz, que faz uma mescla perfeita de Dio com Geoff Tate. Tudo bem que ele tinha a frente um incrível Leandro Caçoilo (hoje no Seventh Seal) e ficava páreo duro, mas o dueto entre os dois era coisa linda de se ver, ou melhor, "ouvir". Outro exemplo próximo é o multi-instrumentista e produtor Tito Falaschi (hoje "baterista" do Zaltana), que na época que era baixista do Symbols impressionava nos duetos de voz com seu irmão Edu Falaschi, por sua incrível extensão vocal que, por vezes, remete a Glenn Hugles. Assim como no caso Danilo/Caçoilo (fase Eterna), o Symbols proporcionou outro dos mais incríveis duetos de voz da história do Metal brasileiro, somando a potência e alcance de Tito, com o belíssimo timbre e interpretação de Edu, que se completavam perfeitamente.
Mas não é raro encontrarmos bandas em que um dos músicos canta melhor que o próprio vocalista. Aliás, dependendo do gosto e ponto de vista, acontece até com frequência.
Porém, existem também os casos em que a banda tem um grande vocalista, e um guitarrista que, apesar de extremamente virtuoso em seu instrumento, também canta muito bem. Musicalmente, a banda só tem a ganhar em versatilidade e harmonia vocal. E claro, se um dia por acaso o vocalista estiver doente, tem um parceiro muito competente ali para segurar a bronca. E quero mencionar aqui pelo menos dois gratos exemplos de virtuosos que mandam muito bem nos vocais: Pedro Esteves e Guilherme de Siervi, respectivamente, guitarristas das bandas Liar Symphony (SP) e Skyrion (RJ).
O primeiro, reconhecido como grande produtor, compositor e instrumentista, com destaque em revistas como Burn e Young Guitar no Japão, segurou uma verdadeira bucha às vésperas das gravações de "Spirit Machine" (2004), o terceiro álbum de sua banda Liar Symphony. Na ocasião, o então vocalista Villo Nolasco resolveu abandonar a carreira no Metal para se dedicar a outros projetos. Diante de contratos que a banda precisava cumprir com a gravadora no Brasil e Japão, e a dificuldade de oficializar um vocalista à altura naquela situação, Pedro Esteves, que já era responsável pelas belas aberturas de voz nos discos e shows, acabou assumindo esse posto com muita competência.
Coincidentemente ou não, "Spirit Machine' é o disco mais vendido da banda, que inclusive está fora de catálogo. Logo depois que o álbum foi lançado, Pedro só teve tempo de fazer quatro shows como vocalista/guitarrista, até que Nuno Monteiro assumisse os vocais com maestria, para fazer a turnê de "Spirit Machine" e gravar os próximos álbuns do Liar Symphony, como o recém-lançado "Before the End" (2014), o quinto CD de estúdio da banda. "Na época eu gravei as vozes da demo do disco, apenas como guia, para mostrar as músicas para o dono da gravadora, enquanto a gente procurava um vocalista. Para minha surpresa, ele gostou e insistiu para que eu gravasse pra valer. Mas foi apenas por necessidade mesmo. Fico feliz que as pessoas tenham gostado, mas prefiro ficar só na guitarra. O Nuno é um vocalista muito superior", explica o modesto Pedro Esteves. Já seu companheiro de banda, levanta sua bola: "A diferença de se ter um guitarrista que também é um ótimo vocalista, são as harmonias vocais que fazemos nos CDs e nossos shows. Quem já foi num sabe do que estou falando!", comenta Nuno Monteiro. "O Savatage é uma banda que sempre admirei pelas harmonias de vozes, todos cantam muito bem. Acho que é o que busco para o Liar, e acho que contribuindo com os backings eu já estou feliz", conclui Pedro Esteves.
Confira a performance do guitarrista Pedro Esteves, como vocalista:
- "Spirit Machine" (Liar Symphony):
- "Tarot Woman" (Rainbow cover):
O segundo mencionado, Guilherme de Siervi, é guitarrista da banda carioca Skyrion, que está em meio aos últimos preparativos para o lançamento do segundo álbum do grupo, "The Edge", com os vocais da bela e excelente Clarissa Moraes.
Guilherme, apesar de ter uma preferência declarada por vocais femininos (vide sua banda), é outro instrumentista virtuoso agraciado por um privilegiado dote vocal. Um tempo atrás, ele chegou a gravar sem compromisso um vídeo cantando o clássico "We All Die Young" da banda fictícia Steel Dragon, do filme Rock Star, com uma segurança e pegada de fazer inveja a muito vocalista solo. O vídeo repercutiu muito bem, Guilherme gostou da "brincadeira" e mais recentemente foi além: gravou um segundo vídeo, cantando nada mais nada menos que "Carry On" do Angra, o desafio máximo para qualquer vocalista que almeja atingir as notas mais altas. Mesmo cantando de forma claramente descontraída, com direito até "air guitar" e outras brincadeiras nas partes instrumentais, Guilherme "fanfarrão" de Siervi novamente se saiu muito bem no hit imortalizado por Andre Matos.
Ambos vídeos repercutiram tão bem, que Guilherme já prepara material para lançar uma banda paralela ao Skyrion. No caso, um projeto solo onde, além de tocar todos os instrumentos, também irá explorar esse seu talento vocal. "Ainda não tem um nome definido. É um projeto bem eclético, engloba tudo no Metal: Hard Rock, Power, Prog...Mas eu estou gravando todos os instrumentos só na pré produção. Na gravação séria eu vou chamar um pessoal", explica Guilherme. Levando em consideração que o músico é um dos guitarristas mais virtuosos e respeitados da cena Metal do Rio de Janeiro, é impressionante a facilidade e qualidade com que exerce a arte de cantar.
Confira a performance do guitarrista Guilherme de Siervi como vocalista:
- "We all Die Young" (Steel Dragon cover):
- "Carry On" (Angra cover):
Estes são apenas alguns exemplos, em meio a inúmeros instrumentistas com talento vocal maior ou no mínimo, no nível de muitos bons vocalistas solo. Portanto, os vocalistas medianos que se cuidem: "Algum guitarrista pode tomar seu lugar!"
Sites relacionados:
www.liarsymphony.com
www.skyrion.net
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