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Whitesnake: Bancando o advogado do diabo de David Coverdale

Resenha - Purple Album - Whitesnake

Por Ricardo Pagliaro Thomaz
Postado em 29 de julho de 2015

Nota: 8 starstarstarstarstarstarstarstar

Eu já havia falado uma vez quando falei sobre o Made In Japan de 2013 e falo aqui novamente: se tem um cara por quem eu faria papel de advogado do diabo, este cara é o David Coverdale. Eu sou um incurável apaixonado pelo som do Whitesnake. Tenho praticamente toda a discografia do grupo e curto cada um dos discos da banda. Sei que há alguns que são menos amados que outros pelos fãs, mas mesmo esses discos eu encontro desculpas para defender! Essa paixão pelo som dos caras não só me faz, de certa forma, apreciar até um disco de "covers" como também cria uma certa expectativa em este significar o fim da linha para Mr. Coverdale.

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E dizendo "de certa forma", eu não quero de forma alguma depreciar o novo lançamento do Whitesnake aqui, muito pelo contrário! Eu até gostaria de recomendar desde já a vocês, vão atrás deste lançamento, até mesmo por questão de comparação. É um álbum, como sempre, bem produzido, com um trabalho instrumental impecável da banda de Coverdale e também contando com seu trabalho vocal ímpar. Ih, olha eu aí me fazendo de advogado do diabo novamente!

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Enfim, vamos contabilizar e tirar as conclusões, mas primeiro vamos definir o que é isto que temos em mãos agora. Vamos começar pela definição da serpente branca em pessoa, Mr. David Coverdale; em uma entrevista, ele diz que estamos em território do Purple, sim; e completa que, o que fizeram foi "colocar um tom diferente de tinta e um carpete com pele de cobra à frente da lareira". E vamos ser francos, de forma alguma o cara está errado. O que temos aqui é uma revisitação de Coverdale aos seus dias de Deep Purple, na metade dos anos 70, quando integrava a banda em seus marcos III e IV, correspondentes aos anos de 1974 a 1976.

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Temos também um outro fator que podemos usar ao sair em defesa da serpente. O vocalista do Deep Purple, Ian Gillan sempre se negou a interpretar as músicas desta fase da banda. Segundo ele, isso geraria animosidade entre a banda e os fãs que veriam as músicas sendo interpretadas de forma diferente e não-original, por isso ele sempre se recusou a cantá-las no Purple. Por vezes até completa com a desculpa de que essas músicas não soam como "músicas do Purple" para ele. Em outras palavras, o cara não executa essas músicas na banda pela mesma razão que David Lee Roth não executa as músicas do Van Halen da época de Sammy Hagar, ou seja, por pura frescurinha mesmo.

Faz todo sentido então que David Coverdale tome para si estas músicas da banda, até porque ele participou das composições delas, e as execute no Whitesnake. E sejamos francos, se Coverdale não tivesse executado estes clássicos do Rock em sua banda durante todos esses anos desde sua saída do Purple, eles teriam caído no triste esquecimento, assim como aconteceu com as músicas do marco I do Purple com Rod Evans. Até aí tudo bem. Mas há um certo problema em resolver regravá-las após anos.

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E eu não estou questionando a competência do cara nem nada disso! O problema dessa empreitada está justamente no fato de que Coverdale já não está mais com 20 ou 30 anos de idade, e seu gogó já não é o mesmo de quando começou no Purple. Eu sei que o cara está muito melhor do que Ian Gillan que hoje só tem um fiapinho de voz sobrando; mas isso não elimina o fato de que ele teve que reduzir bem a tonalidade de todas as músicas para aguentar cantá-las, como faz nos shows. Agora, uma coisa é você fazer essas músicas nos shows, outra bem diferente é regravá-las. E aí, você tem que aguentar as inevitáveis comparações com o material original.

Portanto, vamos analisar este novo álbum do Whitesnake sob as duas óticas, como um disco de regravações e como um disco independente e sem amarras e ver o que melhor funciona.

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PRIMEIRA ÓTICA. Se encararmos ele comparando com as versões originais destas músicas, é claro que nosso sentimento de fã não irá aprovar muitas destas novas versões. A faixa que abre o disco por exemplo, "Burn" comparada com a original de 74 não soa tão bem quanto; tem mais técnica instrumental, o que não é ruim, mas mesmo assim não faz jus ao clássico. Reb Beach e Derek Hilland são bons no que fazem, mas não se igualam a Ritchie Blackmore e John Lord nas jams. Coverdale reproduziu a forma como a canta nas turnês atuais, o que é legal, e a gente entende que seja assim até mesmo pela idade do cara, mas regravá-la vai gerar esse tipo de reação dos fãs; o mesmo vai para "Stormbringer", que fecha o álbum, ganhou uma versão boa, mas inferior, se comparada com a original.

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Também o mesmo vale para as versões de "Love Child" que até tem partes bacanas e que eu acrescentaria na versão original, mas também soa menor do que a original; há casos que podemos relevar até mesmo pelo ganho de peso e pelo melhor trabalho vocal e instrumental, como em "The Gypsy", que ganhou uma versão muito boa; mas se pegarmos outro exemplo, como em "Lady Double Dealer", veremos que mesmo o peso extra pouca diferença faz quando ouvimos a energia mais pungente da música original, mesmo que Coverdale esteja cantando a plenos pulmões, e, como já falei, nos shows nós entendemos os motivos da tonalidade mais baixa, o problema é traduzir isso para uma regravação em um álbum.

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Agora, há casos que podemos sim apreciar o esforço da reinterpretação, uma vez que ela se saiu muito bem, e até por vezes tão bem que chegamos até a comparar com a original e perceber que a música foi melhorada. Aqui temos por exemplo, "Sail Away", que eu achei muito bacana nesta versão mais acústica e muito bem trabalhada, incluíndo até uma homenagem a Jon Lord, que fez parte tanto do Purple quanto da história do Whitesnake, mas eu consigo entender perfeitamente quem diz que prefere a versão do Purple. "Soldier of Fortune" também ganha uma versão acústica aqui, sendo que Coverdale já até havia dispensado instrumentos nas últimas turnês e cantado ela à capella mesmo.

"Mistreated" é uma tentativa louvável de reproduzir o trabalho sem igual de riffs e frases marcantes de Blackmore e apesar do tom bem mais baixo, que desde a retomada da banda em 2006 eles vem adotando e pouco a pouco vem reduzindo por causa da voz de Coverdale, eles ainda conseguem segurar devido à voz ríspida e rasgada do cara, que ainda tem força de sobra para transmitir agressividade e energia para a música. "Holy Man", originalmente cantada por Glenn Hughes no Purple, ganha aqui uma versão bonita por Coverdale e sua banda; ainda prefiro a música cantada com a voz soul de Hughes que soa coisa de outro mundo, espetacular, mas aqui os caras fazem uma boa homenagem, maneiram no shredding das guitarras, fazem um instrumental bacana, enfim, ótima versão.

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Mas a grande surpresa do álbum ficou para agora, em que David Coverdale canta "You Keep on Moving" com sua banda e os vocais de back até tentam emular aquela voz soul de Glenn Hughes, mas apesar de ficar só no "chegou perto", foi uma das melhores versões do álbum. E vamos combinar aqui, imaginar essa música ser interpretada sem a presença ilustre de Glenn, isto é impensável, deveriam ter chamado o cara pelo menos para esta música! Que bom que ele está comparecendo na turnê.

Enfim, como um disco de regravação/homenagem, até vale ouvir, mas em um grande número de casos, fica-se prestando atenção e pensando lá atrás da sua cabeça, nas versões originais destes clássicos do Rock.

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SEGUNDA ÓTICA. Vamos fazer de conta que não conhecemos as versões originais das músicas e encarar o álbum como mais um novo disco do Whitesnake, independente de passado algum para comparar. Será que funciona? Não somente funciona como também se trata de um dos melhores lançamentos da banda dos últimos anos, um que reúne muitas características que todos os fãs da banda sempre gostaram. Temos o peso, a agressividade e o estilo clássico em faixas como "Burn", temos o blues e a melodia crua em pauladas como "The Gypsy", "Mistreated" e "You Fool No One", temos o lado soul da banda em petardos como "Holy Man" e a maravilhosa "You Keep on Moving". Temos também o lado épico do Hard Rock sempre vigoroso e enérgico em grandes faixas como "Love Child", "Stormbringer" e as excelentes baladas "Sail Away" e "Soldier of Fortune".

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Percebeu? É tudo uma questão de com qual ótica você encara o disco. E baseado nisso, podemos concluir que Coverdale continua sendo ele mesmo, e o Whitesnake continua sendo o Whitesnake e mantendo sua clássica sonoridade, pesada, brutal, ríspida, direta e sem frescuras, e por vezes, épica e com grandes temas. Por outro lado, eles foram mexer com os clássicos, o que obviamente causará o desprazer de alguns fãs, então você que acha estes clássicos do Rock intocáveis, fique sabendo que eu te entendo, cara. Por outro lado, Coverdale tem tanto direito de tomar posse destas músicas quanto Blackmore, Hughes ou qualquer membro do Purple que participou na época da composição destes clássicos, que sempre estarão lá para ouvirmos, não importa quantas vezes resolvam regravá-los.

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No fim das contas, a visitinha de Coverdale a seu passado se justifica, até mesmo por sua promessa de tempos atrás de fazer uma turnê com clássicos do Purple, e ajuda manter viva a chama da MK3 do Purple, formação da qual muita gente até hoje admira e se inspira. E se Coverdale não consegue se desvincular de seu passado na banda, tanto melhor para nós, que poderemos ter a garantia de continuar a ouvir alguns destes clássicos nas turnês da banda pelos anos que ainda virão. Isso, claro, vai depender da validade de uma afirmação que o cara fez em uma entrevista, em que ele disse: "pensei que seria legal sair, como se diz, da forma como entrei para este negócio da música". David... amigão... deixa de pensar bobagens e continue cantando!

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Ah sim, e antes de eu finalizar, há também a versão Deluxe do álbum, para quem sentiu falta de mais músicas do Come Taste the Band, há mais duas releituras dele, "Lady Luck" e "Comin' Home", que não ficaram ruins, mas quando se ouve as versões originais com Bolin na guitarra, fica óbvio que não se compara. Além disso, esta versão ainda contém um DVD que vem com videoclipes para algumas das regravações, como o belíssimo vídeo que a banda fez de "Stormbringer". Isso sim é algo imperdível!

Ufa, é melhor eu parar agora, porque essa conversa de ser o advogado do diabo já gastou, daqui a pouco eu viro o Al Pacino aqui! Brincadeiras à parte, como fã, eu compreendo a vontade de Coverdale de relembrar seus primeiros anos de carreira, mas ao mesmo tempo torço para que o Whitesnake retorne uma próxima vez com um disco de inéditas e continuem a fazer o que sempre souberam fazer melhor.

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The Purple Album - Deluxe Edition - CD/DVD (2015)
(Whitesnake)

Tracklist do CD:
01. Burn (do álbum Burn)
02. You Fool No One (interpolating "Itchy Fingers") (do álbum Burn)
03. Love Child (do álbum Come Taste The Band)
04. Sail Away (featuring "Elegy for Jon") (do álbum Burn)
05. The Gypsy (do álbum Stormbringer)
06. Lady Double Dealer (do álbum Stormbringer)
07. Mistreated (do álbum Burn)
08. Holy Man (do álbum Stormbringer)
09. Might Just Take Your Life (do álbum Burn)
10. You Keep On Moving (do álbum Come Taste the Band)
11. Soldier of Fortune (do álbum Stormbringer)
12. Lay Down Stay Down (do álbum Burn)
13. Stormbringer (do álbum Stormbringer)
Versão Deluxe:
14. Lady Luck (bônus track) (do álbum Come Taste the Band)
15. Comin' Home (bônus track) (do álbum Come Taste the Band)

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todas as faixas escritas e originalmente tocadas por Deep Purple MK3, exceto faixas 3, 10, 14 e 15, escritas e tocadas por Deep Purple MK4

DVD extra:
01. Lady Double Dealer (Music Video)
02. Sail Away (Music Video)
03. Stormbringer (Music Video)
04. Soldier Of Fortune (Music Video)
05. Purple Album Behind The Scenes
06. Purple Album EPK

Selo: Frontiers Records

Whitesnake é:
David Coverdale: voz
Reb Beach: guitarra
Joel Hoekstra: guitarra
Michael Devin: baixo, gaita
Tommy Aldridge: bateria

Músico adicional:
Derek Hilland: teclados

Discografia anterior:
- Forevermore (2011)
- Good to Be Bad (2008)
- Restless Heart (1997)
- Slip of the Tongue (1989)
- Whitesnake (1987)
- Slide It In (1984)
- Saints & Sinners (1982)
- Come an' Get It (1981)
- Ready an' Willing (1980)
- Lovehunter (1979)
- Trouble (1978)
- Snakebite (1978)

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Website:
http://www.whitesnake.com

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Sobre Ricardo Pagliaro Thomaz

Roqueiro e apreciador da boa música desde os 9 anos de idade, quando mamãe me dizia para "parar de miar que nem gato" quando tentava cantarolar "Sweet Child O'Mine" ou "Paradise City". Primeiro disco de rock que ganhei: RPM - Rádio Pirata ao Vivo, e por mais que isso possa soar galhofa hoje em dia, escolhi o disco justamente por causa da caveira da capa e sim, hoje me envergonho disso! Sou também grande apreciador do hardão dos anos 70 e de rock progressivo, com algumas incursões na música pop de qualidade. Também aprecio o bom metal, embora minhas raízes roqueiras sejam mais calcadas no blues. Considero Freddie Mercury o cantor supremo que habita o cosmos do universo e não acredito que há a mínima possibilidade de alguém superá-lo um dia, pelo menos até o dia em que o Planeta Terra derreter e virar uma massa cinzenta sem vida.
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