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David Bowie: O homem das mil máscaras

Por Ronaldo Celoto
Fonte: Pessoal
Postado em 08 de janeiro de 2014

Hoje é aniversário de um dos maiores ícones da história da música. E, como fã incomensurável que sou, não poderia deixar de prestar tributo ao mesmo, recontando aqui, a primeira parte de sua biografia, utilizando elementos da semiótica e do perspectivismo, da literatura e da arte enquanto imagem. Vamos juntos acompanhar ao texto? Pois, continuemos ainda, na forma introdutória.

I – Introdução

DAVID ROBERT JONES nasceu em Brixton, Londres, em 8 de janeiro de 1947. A partir daí, não entrarei em vesúvios de curiosidade de revistas de fotonovela, pois a intenção é trazer um pouco da semiótica introduzida por este descendente de irlandeses (sua mãe, MARGARET era filha de irlandeses), que estudou arte, desenho, teatro, música e que, na melhor definição trazida pelo biógrafo DAVID BUCKLEY, possui uma "notável capacidade de analisar e selecionar as idéias que estão de fora do mainstream da arte, literatura, teatro e cinema e trazê-los para dentro, de modo que o pop é constantemente alterado".

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Começa aqui o casamento perfeito entre o glam-rock e suas sete noivas: literatura, desenho, teatro, cinema, música, arte e filosofia. Começa aqui um capítulo particular que pretende demonstrar como o menino outrora entusiasmado pelo jazz de CHARLES MINGUS e JOHN COLTRANE, de repente, tornou-se DAVID BOWIE e criou o maior de todos os cultos da história da música, dotado de uma a androginia que não apenas foi andrógina, mas influenciou a moda, a poesia, as histórias de ficção, o mainstream, a publicidade e a música a partir da década de 70: o glam-rock, que teve um profeta de nome incomum: ZIGGY STARDUST, ressuscitado posteriormente para descansar e "nosferatizar" a entorpecência da noite pelas ruas de Berlim sob o codinome de THIN WHITE DUKE, cumprimentar a realidade e livrar-se de qualquer codinome, e, recentemente, abrir o álbum de família para, com o álbum "The Next Day", prestar homenagem a um de seus anjos/demônios que vivem dentro do submundo de sua memória ainda jovem.

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II – O Dia em Que NIETZSCHE Acordou de Um Sono Profundo

Antes de adentrar no universo BOWIE, convém chamar atenção para uma palavra que talvez venha recontar os próximos capítulos: Perspectivismo, que consiste numa "teoria que afirma ser o conhecimento sempre parcial, limitado pela perspectiva particular pela qual cada indivíduo observa o mundo e interage com ele, e, desta forma, temos diferentes visões, planos e pontos de vista".

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Não há, a partir do perspectivismo, um conhecimento da realidade em si. Não há verdades absolutas e imutáveis, mas há inúmeras motivações que geram posicionamentos diferentes, a partir desta sensação de mundo particular para cada ser humano.

A partir destas variações, é importante não deixar de citar a figura do pensador NIETZSCHE (foto) para este texto, lembrando suas críticas à verdade filosófica, à moral e ao indivíduo.

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Em sua crítica à verdade filosófica, NIETZSCHE afirmou:

"Toda filosofia é uma filosofia de fachada. Toda filosofia esconde também uma filosofia. Toda opinião é também um esconderijo, toda palavra também uma máscara".

Em sua crítica à moral, ele antecipa-a como uma espécie de vingança concebida contra a própria vida, evidentemente, criticando o dogmatismo social travestido de moral, senão vejamos:

"A moral é a idiossincrasia do decadente com a intenção oculta de vingar-se da vida, sempre com um bom resultado final".

Em sua crítica ao ser humano, ele é ainda mais cruel, ao destruir qualqer hipótese do "ser ou não ser" (SHAKESPEARE) ou "penso, logo existo" (DESCARTES), quando escreve:

"Afirmações do tipo: que sou eu quem pensa, que tem de existir em absoluto algo que pensa, que pensar é uma atividade e o efeito de um ser considerado como causa, que existe um ‘eu’, enfim, que já está estabele¬cido o que se deve entender por pensar, que eu sei o que é pensar. Pois se eu não estivesse já com ideias assentes sobre isso, como poderia decidir se o que está a acontecer não é talvez ‘querer’ ou ‘sentir’?"

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Qualquer tentativa de homenagear o homo sapiens, dentro deste contexto, naufraga dilaceradamente na semiótica criada por NIETZSCHE. Esqueça-se aqui, dos conceitos de semiótica criados em cursos de jornalismo e publicidade. A semiótica aqui possui uma interpretação livre de toda e qualquer concepção, é uma semiótica pessoal, minha, anarquizada, desenraizada de qualquer corrente de citações e citações e mais citações. É a semiótica a partir da perspectiva, que inseri dentro deste texto para falar de DAVID BOWIE e cruzar alguns de seus elementos com NIETZSCHE, a arte e a literatura.

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E, neste contexto literário, indispensável trazer o pensamento de UMBERTO ECO (foto), que traduz a semiótica pelo modo como o ser humano significa tudo que o rodeia, evidentemente, enraixando-a ao perspectivismo, que define algo de acordo com diferentes visões e pontos de vista de cada observador.

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Pronto. Temos NIETZSCHE e ECO fundidos em um único ego chamado DAVID BOWIE. Podemos prosseguir juntos? Pois, então vamos. Afinal, já acordamos NIETZSCHE de sua tumba, agora vamos convida-lo para um chá londrino na mesa de BOWIE.

III – A Imagem Como A Grande Máscara do Rock’n’Roll

Se o rock’n’roll era a sonoridade para qual DAVID BOWIE encontraria um perspectivismo e uma semiótica pessoal para semear suas crias, evidentemente, ele teria de pensar no perspectivismo do impacto que deveria ser trazido pela imagem.

Dentro deste zodíaco de músicos que já haviam se preocupado com a imagem, ele tinha desde LITTLE RICHARD a ELVIS PRESLEY, passando pelos STONES em seus áureos tempos de "Satanic Majesties Request", culminando com a imagem da conquista interestelar protagonizada pelos cosmonautas em seu primeiro pisar sobre a Lua, enquanto que STANLEY KUBRICK, no cinema, dissecava toda e qualquer forma de esperança associada ao progresso das máquinas. E, a partir daí, utilizando a máscara como simbiose de toda e qualquer palavra que sairia de sua boca, BOWIE fundiu a dualidade do homem aproximada de um ser sem consistência instintiva, ou seja, assexuadamente interagente com tudo e com todos.

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E, decidiu mergulhar esta dualidade no liquidificador da luxúria e da lascividade dos ternos rosados e os excessos de maquiagem de LITTLE RICHARD, passou pelo misticismo um tanto fantasioso, numa década regada a "paz e amor" e as influências musicais ali geradas, e, contagiou-se do hedonismo ambíguo pós-hippie, para enfim, simplesmente dizer: "Ground control to Major Tom".

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A partir deste chamado de rádio, que parecia querer enviar uma mensagem às estrelas, BOWIE percebeu que poderia ter inúmeras máscaras, e, a partir deste primeiro "pisar sobre a Lua das mentes e almas de todos os jovens", ele diria o que quisesse, de acordo com o seu perspectivismo em relação ao mundo, e, possibilitando a quem o copiasse, ter também, os seus próprios pontos de verdade. Fetilizava-se enfim, o "embrião da Geração Prometeu", se permitem assim chamá-lo, já que todos o conhecem por outro nome: ZIGGY STARDUST.

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IV – O Universo é Andrógino

E então as várias perspectivas nascidas com ZIGGY rugiam contra o universo e a condição humana regada de violência, a falta de paz e de amor livre. Era preciso um super-homem para inundar a humanidade de uma nova perspectiva. E, novamente, BOWIE busca no ideal do "além-homem" concebido por NIETZSCHE a sua resposta.

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A respeito deste ideal trazido por NIETZSCHE, melhores palavras eu não poderia encontrar, do que as inseridas num belíssimo trabalho da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, na edição da revista Contemporânea n. 3 – ano 2004:

"Este espírito livre é o que Nietzsche chama de Super-Homem (ou Além do Homem). O filósofo, otimista com a humanidade, vê um futuro brilhante para os homens que conseguirem livrar-se das amarras das ideias absolutas e adotarem o perspectivismo como meta. O Super-Homem de Nietzsche será metaforizado na figura fictícia de Zaratustra, um sábio consciente da realidade das máscaras e da vida como sucessão de perspectivas." (E. Saint-Clair)

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Adentramos então, nas máscaras que o álbum "The Man Who Sold The World" (1970/1971) já carregava, mas uma áurea mais existencial. A começar pela capa, mostrando um BOWIE vestido de mulher, ou seja, o novo protótipo de ser, enraizado em duas metades, um quase-messias ainda não transformado no roqueiro andrógino que viria no ano seguinte, mas ainda assim, carregado de melancolia.

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Soturnamente, este homem dizia de si mesmo: "I laughed and shook his hand, and made my way back home/I searched from form and land/For years and years I roamed/I gazed the gazeless stare at all the millions hills/I must have died alone, a long long time ago".

Passado e presente encontravam-se face a face num mesmo homem. Um deles teria vendido o mundo, ou seja, se entregado aos ditames sociais. O outro procurava vagar sem resposta, a entender o porquê de tudo isso. E então, um deles dizia ao outro: "You´re face to face/With the man who sold the world".

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Novamente, a imagem do super-humano de NIETZSCHE, numa canção chamada "The Supermen", a proclamar um mundo absolutamente novo e mágico:

"When all the world was very young
And mountain magic heavy hung
The supermen would walk in file
Guardians of a loveless isle
(...)
Strange games they would play then
No death for the perfect men
Life rolls into one for them
So softly a supergod cries
Where all were minds in uni-thought
Power weird by mystics taught
No pain, no joy, no power too great
Colossal strength to grasp a fate
(...)
Far out in the red-skies
Far out from the sad eyes
Strange, mad celebration
So softly a supergod dies".

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E o existencialismo não para por aí. Na canção "The Witdth of a Circle", BOWIE recria ilusões poéticas e mutações quase que em forma de meditações, regadas a uma canção pesadíssima afiada pelas excelentes guitarras de MICK RONSON (uma espécie de RANDY RHOADS do início dos anos 70).

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A letra transborda por buscas interiores e cita o pensador KAHLIL GIBRAN, e, anuncia o mito da caverna de PLATÃO, em colisão com o homem comum que estava guardado dentro de si:

"All the roads were straight and narrow
And the prayers were small and yellow
And the rumour spread that I was aging fast
Then I ran across a monster who was sleeping by a tree.
(...)
And he laughed insane and quipped "KAHLIL GIBRAN"
So I cried for all the others till the day was nearly through
For I realized that God´s a young man too
(...)
He struck the ground a cavern appeared
And I smelt the burning pit of fear
We crashed a thousand yards below".

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Saímos da citação de "Width of a Circle" para atingir o momento em que "Hunky Dory" (1971) era lançado, trazendo uma alusão ao homem superior, e, muitos, muitos pontos de androginia.

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Grandiosas canções, entre elas, a sempre bela "Oh! You Pretty Things!", contava a história de um homem este que deveria se desprover de todas as antigas verdades absolutas, que atrasavam a sociedade e corrompiam o mundo com dogmas, e, evoluir em busca de uma consciência superior, uma nova era: "Look out at your children/ They’re the start of a coming race/ You gotta make way for the Homo Superior".

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Antes de atingir o ápice através do já anunciado ZIGGY STARDUST, a canção "Changes" também proclamava: "Turn and face the strange/ Changes".

Nada mais distante do senso comum, do que um músico vir proclamar a todos os seres humanos que se voltassem para o seu interior, e, encontrassem uma resposta até então desconhecida. Visualmente, a maquiagem ditava o ritmo da época.

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Não era o mergulho proposto por LENNON anos antes, mas o mergulho além do comportamento de amor e solidariedade, um olhar com perspectiva futurista.

E ainda tínhamos "Life On Mars?", certamente uma de suas melhores canções entre todas já compostas, melodicamente linda, cuja letra evidentemente, remetia à busca por inteligências para além deste mundo, diante da vida particularmente sofrida de uma garota a observar e passar pelos problemas do mundo. Notem como o visual de BOWIE já era maravilhoso.

Máscaras...muitas máscaras vertidas e fundidas dentro da mente de um único compositor, que, tentava mostrar-se ao mundo através de suas múltiplas faces, de suas influências literárias até aquele momento, das roupas que pegava nas caixas de entulho dos teatros chineses e readaptava sua costura ao estilo que ele visualizava. Mas ainda faltava um golpe, um flerte fatal, uma estrela cadente que não apenas caísse de forma confusa com poemas concretos por demais simbólicos.

Sim, a estrela que anunciava um novo céu a partir de novas perspectivas precisava sangrar, suar, ser desejada, ser consumida, ser destruída pelas multidões ao ponto de querer destruir-se por completo. E o grande plano então, completou seu ciclo: "The Rise And Fall Of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars" (1972). O fim da filosofia e da poesia concreta em homenagem a outros pensadores e filósofos para enunciar a humanidade a mergulhar dentro de si. E, o início da compulsão, de cada um dos seres humanos, por si próprio, por seu corpo, por sua fragilidade e sua coragem ao mesmo tempo, e, o fim do medo de desejar o que ainda era proibido: a imagem e semelhança de si mesmo, não importando qual seria o sexo.

V – O Maior de Todos os Cultos e o Nascimento do Profeta do Desejo

Concentrar o equilíbrio espiritual entre homem e mulher. Ou seja, ter duas almas, duas vezes mais sabedoria, duas vezes mais poder, duas vezes mais premonição, duas vezes mais amor, duas vezes mais desejo. Cabelos vermelhos, a indicar o fogo vivo e ardente da vontade, da não obediência. E, o Evangelho do Hedonismo transcrito por MICK JAGGER, torna-se a bíblia do jovem ZIGGY, recém-aterrissado no Planeta Terra.

Sua fama de rockstar avança depressa, e, comove multidões ao anunciar, por meio de sua clarividência, na canção "Five Years", que o mundo se destruirá em cinco anos.

"We had five years left to sighing in
News guy wept and told us
Earth was really dying
Cried so much his face was wet
Then I knew he was not lying
I heard telephones, opera house, favourite melodies
I saw boys, toys, electric irons and TVs
My brain hurt like a warehouse
It had no room to spare
(...)
We´ve got five years, stuck on my eyes
We´ve got five years, what a surprise".

Enquanto o fim não chega, sua expoente fertilidade cósmico-sexual não se preocupa com estereótipos. Sem esconder-se, ele olha para a multidão e chama:

"Keep your eletric-eye on me babe
Put your ray-gun to my head
Press your space-face close to mine, love
Freak out on a moonage daydream".

E, se o convite não funciona, ele apenas brinca com a própria imagem, a chegar sorrateiramente por entre os lençóis de todos que o aguardam, na maravilhosa "Moonage Daydream":

"I’m an alligator
I’m a mama-papa coming for you
I´m the space invader
I´ll be a rock ´n´ rollin´ bitch for you
Keep your mouth shut."

Mas, diante dos sete pecados capitais, qual seria o mais apropriado para um herói que não empunha a espada, mas a guitarra, deixar a todos perplexos, uma última vez? Evidentemente, a resposta reside entre a vaidade e a soberba. Estamos a falar de máscaras, e, as máscaras só são usadas para esconder ou revelar, transpor ou chocar. E BOWIE tinha muitas e muitas máscaras para mostrar.

De repente, ZIGGY estava apaixonado por ele mesmo. Transformado num messias que previa a catástrofe e chamado a todos para aderirem ao desejo através da música e do amor, antes que a destruição chegasse. E, em seguida, ele percebia que seu ego era tanto, que ele, por momentos, já não conseguia ajudar a ninguém, e, tornava-se ao mesmo tempo, consumidor e consumido. Era como um messias que não possuía dedos para tocar e curar.

"Making love with his ego
Ziggy sucked up into his mind
Like a leper messiah".

E ao fim, ele decide tirar a máscara e encontra, atrás dela, um homem morto, que não pode mais viver da música, e, precisa terminar com sua banda e seus projetos, para viver com a nova máscara, mais liberto de todas as perspectivas, e, mergulhado agora, na suavidade de olhar para dentro não mais para questionar através de outros olhares, mas apenas, repousar dentro de si mesmo.

"When the kids had killed the man
I had to break up the band".

Claro, sua morte não ocorreria dentro das canções. O golpe final de suas máscaras seria dado em pleno palco. Mas antes, uma cria ainda mais lasciva, numa das mais belas capas de discos já criadas até hoje, seria produzida. E, vamos a "Alladin Sane" (1973).

VI – O Tempo Se Curva em Quaaludes e Vinho Tinto

A capa do álbum (foto) realmente inquieta, transcende e transmite. Lágrimas sobre o ombro de um profeta cansado, mas ciente de que ainda pode dar um último suspiro.

E de repente nos vemos a imaginar uma volta pelos arredores da cidade londrina, para saborear um sábado um tanto quanto romântico, regado a doces lembranças de um tempo onde o hedonismo dominava os olhos de todos os jovens. E então surge a belíssima música "Drive in Saturday":

"Let me put my arms around your head
It´s hot, let´s go to bed
(...)
And try to get it on like once before
When people stared in Jagger´s eyes and scored
Like the video films we saw"

A referência ao amigo MICK JAGGER está presente na canção, mas não se trata de alusão ao homossexualismo propriamente dita, e, sim, um convite a toda e qualquer liberdade de escolha e de desejo, remetendo a lembrança aos tempos em que JAGGER seduzia os expectadores com suas aparições televisivas, um tempo que, aos olhos do profeta andrógino, parecia mais puro do que o é a realidade em que ele está a viver. Mas é uma canção que serve para todos os estereótipos e menções a um sábado carregado de boas vibrações.

Mas o profeta, muitas vezes, sente-se cansado. Provido, repentinamente, de uma elegia shakespeariana dentro de sua alma, ele se avalia a partir da imagem de um ator totalmente destroçado, perdido e rasgado em meio aos seus personagens. "Cracked Actor" ecoa, com riffs deliciosos e um belo refrão, a fazer homenagem ao que ele conheceu de melhor em toda a humanidade: o cinema, e, através dele, mais um de seus alter-egos onde ele se transportou através da imaginação nas telas hollywoodianas, mas não pode viver tais papéis:

"I´ve come on a few years from my Hollywood Highs
The best of the last, the cleanest star they ever had
I´m stiff on my legend, the films that I made
Forget that I´m fifty cause you just got paid
Crack, baby, crack, show me you´re real
Smack, baby, smack, is that all that you feel
Suck, baby, suck, give me your head
Before you start professing that you´re knocking me dead".

É uma metáfora shakespeariana do "ser ou não ser", que mostra que o músico que clamava pelo Super-homem, o novo aeon, o novo ser humano futurista, cada vez mais encontra-se perdido em meio ao homem comum. A lágrima continua a cair de seus ombros. Mas a maquiagem? Ah...esta ele ainda não quer tirar.

O tempo surge então, como real inimigo de BOWIE, na dilacerante homenagem que ele faz ao que realmente destrói impiedosamente qualquer pretensão de imortalidade: a vida.

Em uma das mais belas canções já escritas por ele (uma de minhas favoritas em toda a sua carreira), ele compõe uma epopeia maravilhosa. Não por acaso, além da letra, escolhi a versão da turnê de "Glass Sipder" para mostrar a beleza visionária e poética desta cria. É o rompimento de um relacionamento doloroso, mas é também (se assim permitirem-se imaginar os fãs que, como eu, gostam de ver três ou quatro sentidos em cada canção), o rompimento de ZIGGY consigo mesmo, para, no inesquecível concerto a ser realizado no HAMMERSMITH ODEON, imortalizar-se.

"Time - He´s waiting in the wings
He speaks of senseless things
His script is you and me, boy
Time - He flexes like a whore
Falls wanking to the floor
His trick is you and me, boy
Time - In Quaaludes and red wine
Demanding Billy Dolls
And other friends of mine
Take your time
The sniper in the brain, regurgitating drain
Incestuous and vain, and many other last names
I look at my watch it say 9:25 and I think Oh God I´m still alive
We should be on by now
You - are not a victim
You - just scream with boredom
You - are not evicting time
Chimes - Goddamn, you´re looking old
You´ll freeze and catch a cold
´Cause you´ve left your coat behind
Take your time
Breaking up is hard, but keeping dark is hateful
I had so many dreams, I had so many breakthroughs
But you, my love, were kind, but love has left you dreamless
The door to dreams was closed. Your park was real dreamless
Perhaps you´re smiling now, smiling through this darkness
But all I had to give was the guilt for dreaming
We should be on by now".

ZIGGY está, realmente, cansado. Ele teve de morrer em uma obra de arte concebida em disco, mas sobreviver com um visual que concatenava um raio em sua face, como que (na minha modesta opinião) a anunciar a sua ressurreição, como que a dizer que a androginia adquiria mais um elemento em suas muitas máscaras.

Mas, qual o perspectivismo, qual a semiótica a ser admirada pela humanidade que então assistia e ouvia a todo aquele efervescer andrógino na Europa? Já não havia mais respostas. A mensagem fora transmitida. Cada ser humano era livre para vestir-se, amar, sonhar e viver de acordo com o seu perspectivismo e sua semiótica. O homem acima do bem e do mal de NIETZSCHE, mesclado ao inteligente observador de UMBERTO ECO, já adquiria asas costuradas a pano, batons, purpurina e botas de salto alto. Não era mais um "Super-Homem", mas um "Super-humano assexuadamente feliz".

Se o recado já estava dado, assim como um dia, um messias caminhou sobre a Terra, transmitiu o recado, e, morreu em nome deste recado para todos, BOWIE não pensou duas vezes e conclamou o último espetáculo em sua casa, diante de toda uma geração que, mais do que acompanhada de flores em suas mãos, foi vestida e caracterizada como ele. E ele respondeu depressa, para dizer a todos que nada que é dourado permanece. Mas o brilho um dia emanado durará para sempre.

VII – A Morte Pede Passagem Para Anunciar Que Ainda Existe Vida

Sua arma era o violão. Suas maquiagens estavam perfeitamente excessivas. Seu coração disparava e suava em meio aos olhares que o seduziam e eram seduzidos por ele. O que se viu naquela noite de 1973 foi chamado pelos críticos como o maior concerto de rock já exibido.

Além dos grandiosos sucessos, BOWIE trouxe uma versão peculiarmente apoteótica para "My Death", inicialmente concebida por JACQUES BREL.

Acompanhem a letra e o vídeo, e, todos sentirão a sensação magnífica de ler e ouvir esta canção. E o final, se me permitem, é daquelas ironias mais fantásticas que somente um rockstar como ele poderia fazer: homenagear sua plateia não dizendo a palavra que eles esperavam, mas um singelo "thank you".

"...My death waits like an old roué
so confident, I´ll go his way
whistle to him
and the passing time...
...my death waits like a bible truth
at the funeral of my youth
all weep loud for that
and the passing time..
...my death waits like
a witch at night
as surely as our love is right
let´s not think about the passing time...
...But whatever lies behind the door
there is nothing much to do...
...angel or devil, I don´t care
for in front of that door...
...there is...you.
My death waits like a beggar blind
who sees the world through an unlit mind
throw him a dime
for the passing time...
...my death waits there, between your thighs,
your cool fingers will close my eyes,
let´s think of that and the passing time...
...my death waits to allow my friends
a few good times
before it ends
so let´s drink to that
and the passing time...
...For whatever lies behind the door
there is nothing much to do...
...angel or devil, I don´t care
for in front of that door...
...there is...you.
My death waits there among the leaves
in magician´s mysterious sleeves,
rabbits and dogs, and the passing time...
...my death waits there, among the flowers
where the blackest shadows, blackest shadows cowers
so let´s pick lilacs for
the passing time..
...my death waits there, in a double bed
sails of oblivion and my head
so pull up the sheets against
the passing time...
...But whatever lies behind the door
there is nothing much to do...
angel or devil, I don´t care
for, in front of that door...there is..."

Não bastasse tamanha emoção, ele ainda continua, anunciando a todos que este será o último show que eles irão fazer. Perplexos, músicos, plateia e diretores de câmera, convidados, entre outros, chocaram-se com a notícia. E mais uma vez, uma nova máscara fora derrubada. A máscara de alguém que queria deixar bem claro que música é e pode ser sim, imagem acima de tudo, imagem acima das canções, imagem acima das letras. Música pode ser desejo, mas pode ser egoísmo. Música pode causar comoção, mas também pode influenciar exageradamente. Música pode causar admiração e acima de tudo, traduzir uma mensagem de libertação.

Uma vez libertada a "sua" humanidade, em nome da androginia, ele anuncia o seu suicídio, com o maior de todos os desfeches: "Rock and Roll Suicide", enquanto as asas do tempo fumam o seu último cigarro.

"Time takes a cigarette, puts it in your mouth
You pull on your finger, then another finger, then your cigarette
The wall-to-wall is calling, it lingers, then you forget
Ohhh, you´re a rock ´n´ roll suicide
You´re too old to lose it, too young to choose it
And the clock waits so patiently on your song
You walk past a café but you don´t eat when you´ve lived too long
Oh, no, no, no, you´re a rock ´n´ roll suicide
Chev brakes are snarling as you stumble across the road
But the day breaks instead so you hurry home
Don´t let the sun blast your shadow
Don´t let the milk float ride your mind
They´re so natural - religiously unkind
Oh no love! You´re not alone
You´re watching yourself but you´re too unfair
You got your head all tangled up but if I could only make you care
Oh no love! you´re not alone
No matter what or who you´ve been
No matter when or where you´ve seen
All the knives seem to lacerate your brain
I´ve had my share, I´ll help you with the pain
You´re not alone!
Just turn on with me and you´re not alone
Let´s turn on and be not alone (wonderful)
Gimme your hands cause you´re wonderful (wonderful)"

É a canção de amor definitiva para toda uma geração andrógina que se libertou de todos os medos e preconceitos, e, amou-se mais do que todo o universo ao redor. Fechavam-se então, as cortinas de um homem de mil máscaras. Mas para ele, era apenas mais uma delas que caia de seu rosto.

Este magnífico concerto de despedida do maior de seus personagens, foi lançado em álbum pela RCA somente em 1983.

Como curiosidade, ainda no mês de outubro 1973, BOWIE lançou em outubro do mesmo ano, o álbum de covers "Pin Ups", que havia sido gravado em julho nos estúdios do "Château d’Héroubille" (França).

O trabalho continha faixas de SYD BARRETT, PETE TOWNSHEND, BRUCE SPRINGSTEEN e JACQUES BREL (entre outros), este último, numa belíssima releitura para a canção "Port of Amsterdam", muito superior à original, finalizando, de forma épica, o conceito mais luminoso que já surgiu em toda a história da música.

VIII – Epílogo

E assim termina a primeira parte de uma doce homenagem a um dos músicos mais influentes e visualmente transcendentes de todos os tempos.

A intenção foi retrata-lo a partir do universo da literatura e da arte, duas de suas principais influências, e, trazer NIETZSCHE, PLATÃO, ECO, SHAKESPEARE, e, tantos e tantos outros inspiradores de toda a humanidade, catalisados por BOWIE para criar um culto e uma atmosfera que influenciou não apenas a música, a moda, os costumes, a forma de encarar a sexualidade e a liberdade, principalmente.

Haverá, evidentemente, novas matérias sobre o querido "camaleão", diante de perspectivas diferentes, que darão continuidade a uma pequena biografia musical e artística sobre seus feitos. Quem sabe não possamos explorar o cinema, a moda, a poesia, com matérias mais amplas sobre a contribuição de BOWIE nesse sentido.

A todos vocês um muito obrigado e um abraço em forma de música. E ao querido DAVID ROBERT "BOWIE" JONES, meus parabéns pelas 67 primaveras.

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Sobre Ronaldo Celoto

Natural do Estado de São Paulo, é escritor, professor, poeta e consultor em direito, política e gestão pública. Bacharel em Direito, com Mestrado em Ciência Política, atualmente cursa Doutorado em Direito, Justiça e Cidadania pela Universidade de Coimbra. Além destas atividades, dedica diariamente parte de seu tempo à pesquisa e produção de artigos científicos, contos, romances, matérias jornalísticas, biografias e resenhas. Seus interesses pessoais são: cinema, política, jornalismo, literatura, sociologia das resistências, ética, direitos humanos e música.
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