Los Hermanos
Postado em 06 de abril de 2006
Biografia originalmente publicada no site Dying Days
Por Alexandre Lopes / Alexandre Luzardo
Uma das referências hoje no rock brasileiro, o Los Hermanos percorreu um caminho tortuoso até chegar ao reconhecimento merecido. Além de ser um raro exemplo de banda que surge independente e conquista o seu espaço em gravadora grande sem abrir mão das próprias convicções, o Los Hermanos precisou passar pela dura prova de superar a força de seu próprio hit. Catapultados para os quatro cantos do país com "Anna Júlia", o grupo teve de suar a camisa para mostrar que não era apenas uma sensação de verão.
A história do Los Hermanos começa pelos arredores da faculdade PUC do Rio de Janeiro. Marcelo Camelo - aspirante à jornalista e músico de fim de semana - cansou de entoar as próprias canções para si mesmo no quarto e começou a procurar mais pessoas para montar uma banda. Depois de participar de vários projetos - em sua maioria bandas instrumentais - Camelo conseguiu fechar um círculo de amigos para montar seu projeto e convidou o amigo do curso de Publicidade, Bruno Medina para integrar o grupo.
A formação embrionária do Los Hermanos então era formada por Marcelo Camelo, Rodrigo "Barba" na bateria, Bruno Medina nos teclados e o baixista Felipe, que largou a banda logo depois. Acompanhavam a banda ainda o trompetista Márcio e o saxofonista Carlos que compraram seus instrumentos com o intuito de tocar numa banda de jazz.
Depois de uma série de pequenos shows em bares e festas a formação da banda foi variando; por fim, foram adicionados à trupe o "curinga" Rodrigo Amarante (que se destaca por se arriscar em vários instrumentos diferentes) e o baixista Patrick. Após mais algumas apresentações, eles gravaram duas demos: Amor e Folia (de Janeiro de 98) e Chora (de Setembro de 98).
Desde o início a banda chamava a atenção pelo seu som característico, com arranjos não convencionais combinando o peso do hardcore com arranjos de metais carnavalescos e letras inspiradas em sambas de roda. Em determinado momento, o som da banda foi descrito como "polka hardcore". E provavelmente foi por esta sonoridade incomum que o organizador do festival Abril Pro Rock, Paulo André, resolveu chamar o Los Hermanos para integrar o cast de bandas do ano de 1998, após ter sido contatado pelo empresário/amigo do grupo (Alex) que deixou uma das fitas demos com ele.
Camelo e cia. logo perceberam que não podiam fazer feio nessa oportunidade de ouro para a banda. Voaram para o Recife, para participar do festival e dividir o palco com Marcelo D2, Arnaldo Antunes, Sepultura, entre outros. Após uma estranheza inicial provocada por aqueles cariocas de terno e gravata, o público pernambucano se deixou levar pela pegada enérgica de músicas como Descoberta", "Azedume" e "Pierrot" e os arranjos esquisitos da trupe. O show foi um sucesso; a banda foi a revelação do Abril Pro Rock e assinou um contrato com a Abril Music em 1999.
Ao gravar seu primeiro álbum, auto-intitulado (que quase foi batizado de "Azedume"), a banda fez algumas concessões as idéias da gravadora. Pelo fato de nunca terem estado num estúdio de grande porte, e talvez intimidado pelas possibilidades que poderiam explorar, o Los Hermanos gravou o disco sem utilizar equipamento próprio. O comando das sessões de estúdio ficou a cargo do então iniciante produtor Rafael Ramos (da banda Baba Cósmica e que na época apresentava o Quiz MTV ao lado de Adriane Galisteu). A gravadora exigiu também uma faixa radiofônica, e a banda gravou "Primavera" com esta intenção. Mas a Abril Music se interessou mais por uma composição nova de Marcelo Camelo, que por pouco não entraria no álbum: "Anna Júlia".
A banda no set do clip "Anna Júlia" A preferência da gravadora pela canção - que Marcelo Camelo escreveu sobre o amor não-correspondido do amigo Alex pela tal Anna Júlia - se mostrou nacional. Assim que foi lançada, a música foi arrebatando posições cada vez mais altas nas rádios cariocas, e depois pelo país inteiro. O circuito de shows da banda foi aumentando consideravelmente, chegando a fazer 23 shows em um mês e até dois shows por dia.
O "fenômeno Anna Júlia" atrapalhou a banda a repetir a dose com outra faixa de trabalho. Naquele que pode ter sido o maior erro do plano (?) de divulgação da Abril Music, "Primavera" é escolhida como o segundo single do álbum "Los Hermanos". A canção não fracassou comercialmente, ainda que obviamente não tenha repetido o sucesso da anterior. Mas o maior problema foi a exposição demasiada do lado pop da banda (que já vinha da super-exposição de "Anna Júlia), o que acabou afastando boa parte do público que seguia o Los Hermanos desde o começo.
"Primavera" ganhou um videoclip caprichado. Após gravar um vídeo medíocre para "Anna Júlia" (a própria banda se envergonha dele), o Los Hermanos decidiu segurar as rédeas da direção de arte do vídeo de "Primavera". Misturando vários conceitos falhos com a história do clip, com um resultado bem diferente dos videoclipes nacionais de então.
Percebendo que haviam se tornado "uma banda de uma música só", o Los Hermanos ainda lançou "Quem Sabe", juntamente com um vídeo mostrando cenas de shows da banda, mas a repercussão foi mínima. Terminada a exaustiva turnê de um disco que era subestimado pelo "fator Anna Júlia", o grupo se isolou em um sítio em Piraí, no Rio de Janeiro, para começar a pré-produção de um novo álbum para 2001. Com esse isolamento, os músicos puderam se reaproximar como amigos, superando o estresse sofrido durante a fatigante turnê. Mas logo no início do processo de composição, a banda percebeu que sua formação não estava de acordo com seus planos futuros. Assim sendo, o baixista Patrick Kaplan foi demitido, sendo substituído informalmente pelo amigo Kassin. Mais tarde, Patrick entrou para o Rodox, banda do vocalista Rodolfo, ex-Raimundos.
Após um mês e meio e todas as músicas arranjadas, a banda definiu que o produtor do novo disco seria Chico Neves. Enquanto as gravações seguiam um ritmo frenético de criação, a Abril Music se mostrava descontente com a escolha do produtor. Os trabalhos de gravação foram finalizados sem participação do selo, e o material final foi recusado pela Abril. Após uma demorada negociação com a gravadora que durou meses, o Los Hermanos concordou em remixar o disco com Marcelo Sussekind. Após esta medida conciliatória, o disco chegou às lojas, não muito diferente do trabalho original.
"Bloco do Eu Sozinho", o disco remoído por meses de isolamento e discussões com a gravadora, foi finalmente lançado em 2001, trazendo uma banda bem diferente daquela conhecida pela "Anna Júlia". Os arranjos peculiares pareciam acentuados com o uso expressivo de instrumentos de sopro. A euforia dos instrumentos, contrastada com a dor das letras de Camelo e Amarante deu lugar a temas mais adultos e bem mais construídos. A obsessão da banda pela temática do carnaval antigo, que se fazia presente desde a primeira demo, dava o tom do primeiro single, "Todo Carnaval Tem Seu Fim".
A primeira reação da mídia em geral foi de estranheza a mudança no som da banda, que resolveu seguir uma direção contrária e menos apelativa ao sucesso comercial de "Anna Júlia". A banda foi percebendo que o cerco ao seu redor fechava com a má repercussão que o novo disco rendeu nas primeiras semanas. Ainda que o álbum tenha recebido alguns elogios da crítica, o espaço na mídia era muito reduzido. A Abril pouco investiu em divulgação, o disco não tocou no rádio e a agenda de shows ficou mais escassa. Até porque a estrutura do novo show, com um naipe de metais, era mais cara. Para piorar, o público da banda na turnê anterior, que passava de duas mil pessoas, foi reduzido a menos de quinhentas cabeças - no máximo - por show.
Mas a banda perseverou e à medida que o grupo conseguia marcar mais shows para mostrar seu novo álbum (a esta altura, a gravadora estava realizando um trabalho praticamente nulo de divulgação), a situação foi se estabilizando. Aos poucos, o belo vídeo de "Todo Carnaval Tem Seu Fim" foi chamando a atenção de mais pessoas, até aquelas que antes renegavam o "fenômeno Anna Júlia". Estava se fortalecendo o novo conceito que o Los Hermanos abraçaria dali para frente; o de ser uma banda fiel a si mesma.
O show no Rock In Rio 3 - em uma das tendas montadas para apoiar os intervalos de atrações dos palcos principais - teve uma ótima repercussão entre os fãs, que se intensificavam a cada apresentação. O "Bloco do Eu Sozinho" não tocava nas rádios, mas o boca a boca entre os fãs e o site na internet catequizaram cada vez mais curiosos pela nova face da banda, mais ambiciosa, tanto liricamente quanto instrumentalmente.
A banda participou ainda do Luau MTV e figuraram no evento Ford Models fazendo a trilha incidental, intercalando músicas novas com improvisos. A partir dali, toda aparição do Los Hermanos era comentada entre os fãs de música, fossem admiradores da banda ou não. Foi o fenômeno do boca a boca que virou o jogo.
Cerca de dois anos de shows e alguns clipes ("Sentimental" e "Fingi Na Hora Rir") foram o bastante para firmar a posição da banda como artistas autênticos em seu trabalho. Com o final da turnê, o grupo iniciou as preparações para um novo álbum para 2003. Buscando o mesmo retiro de antes em outro sítio - desta vez em Petrópolis - o Los Hermanos deu início à pré-produção do sucessor de "Bloco do Eu Sozinho". Um programa para a MTV foi gravado, mostrando a rotina de ensaios da banda no sítio, em clima de total descontração.
[an error occurred while processing this directive]Voltando do sítio, a banda sofre um baque: a tão controversa Abril Music faliu. Mesmo sem ter uma nova gravadora definida, o grupo resolveu dar seguimento à gravação do disco. Um certo tempo depois, a BMG Ariola foi anunciada como nova gravadora do Los Hermanos. Após três meses o novo álbum (temporariamente intitulado como Bonança) estava pronto e a ansiedade pelo novo trabalho do grupo era tanta que uma demo contendo as novas faixas vazou na Internet - coisa que aconteceu inicialmente com o álbum Elephant do White Stripes e o Hail to Thief do Radiohead. Era a primeira vez que acontecia algo do tipo com uma banda brasileira. A banda não ficou muito contente com a notícia, pois as gravações se tratavam de um ensaio sem compromissos, com arranjos inacabados e instrumentos desafinados. Mas de certa maneira, a repercussão destas gravações ajudou a aumentar o interesse pelo novo disco da banda.
Finalmente lançado no meio de 2003, Ventura superou as expectativas da crítica e dos fãs. Diferente de "Bloco do Eu Sozinho", desta vez o Los Hermanos teve todo o espaço merecido para divulgar suas novas composições a todo tipo de público, agregando cada vez mais fãs pelo país e fora dele - fizeram shows em Portugal e Espanha em Setembro daquele ano. O boca a boca em torno da banda se intensifcava e cada vez que o Los Hermanos retornava a alguma cidade encontrava um público maior e mais entusiasmado, cantando todas as músicas. Nas entrevistas, a banda adotou uma postura inteligente onde se desvinculava da segmentação. O Los Hermanos se declara uma banda aberta a quem quiser escutar, fugindo da imagem "indie" que se formava em torno deles, com todas as armadilhas que um rótulo costuma propor. Essa postura serena se reflete no som de Ventura, um caminho coerente traçado a partir do álbum anterior. Mesmo soando mais reservado e com menos peso, as músicas não perderam a intensidade e o poder de emocionar o ouvinte.
[an error occurred while processing this directive]O palco da turnê 'Ventura' Em 2004 a banda se dedicou aos shows, percorrendo vários estados do país. No segundo semestre será lançado um DVD ao vivo marcando definitivamente a turnê de Ventura na história da banda, e já no fim do ano o foco será a preparação do quarto álbum, desde já muito esperado pelos fãs.
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